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CAPÍTULO 1 – ORGANIZAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL DO TURISMO, POLÍTICAS

1.3 O DIFERENCIAL COMO DESAFIO DA COMPETITIVIDADE DO TURISMO

Os novos tempos desafiam o turismo, pois a competitividade passou a definir o êxito de um destino turístico em se manter no mercado frente aos seus concorrentes. Nesse sentido, fatores como planejamento e gestão poderiam fortalecer a dimensão de monitoramento (BARBOSA, 2014) tornando o destino mais competitivo, a partir dos seus resultados de intervenção espacial definidos nos seus instrumentos de planejamento. Para atender a nova demanda de mercado que busca por mais independência e experiência turística (BRASIL, 2018), é necessário construir uma visão inovadora e com novos procedimentos de organização, e para tanto, estudos sobre competitividade turística ganham atenção da academia.

Territórios concentradores de fluxo turístico e equipamentos que os sirvam, quando organizados, podem criar e manter indicadores de crescimento em escala positiva. Frente a esta tendência de crescimento, surgem novos conflitos e dúvidas sobre a interação das comunidades locais com a força do capital de grandes grupos empresariais externos, um setor em constante batalha entre forças endógenas e exógenas na composição da oferta turística. No cerne deste conflito, surge a discussão da condição de competitividade do turismo, agravado quando se considera os símbolos e a cultura local como principal elemento de diferencial de um destino, que deve naturalmente ser agregado ao conjunto de dimensões da competitividade. No turismo, a tendência para análise da competitividade é de que ela esteja mais voltada para aspectos internos do que para a mera comparação com concorrentes. Então,

Os primeiros estudos sobre competitividade eram voltados para as empresas, analisando as estratégias das mesmas para desenvolverem a competitividade (Ritchie &Crouch, 2003; Dwyer& Kim, 2003), com destaque para o pioneirismo de Porter (1989). Os estudos sobre competitividade voltados para as destinações turísticas surgiram a partir de Porter (1989), Beni (1993), Ritchie e Crouch (2003), Dwyer e Kim (2003) e Mota, Vianna e Anjos (2013), há pouco mais de uma década. (VIANNA; ANJOS; ANJOS, 2012, p. 475).

Compreender e explicar a competitividade no turismo é um desafio, primeiro porque as referências sobre o tema vêm das ciências econômicas e da administração sugerindo melhorar a capacidade de oferta frente aos concorrentes, mas quando se trata de aplicar esse posicionamento numa atividade que tem como característica de oferta um produto intangível e que pode agregar variados aspectos do lugar, a ideia de objetividade e parâmetros de comparação é rapidamente superada. Por isso, segue a tentativa de explicar a evolução do conceito de competitividade de destinos turísticos e sua aplicação.

Ruiz e Gândara (2012) fizeram um resumo cronológico da evolução do estudo sobre competitividade turística onde relatam que no início foi definido como a capacidade do destino em manter-se no mercado e melhorar com o tempo, adicionando ao conceito ideias de sustentabilidade e prosperidade econômica dos moradores, alegando que estudos anteriores focavam no preço, outros focaram nos atributos da imagem ou nos atrativos do destino. Alguns pesquisadores se voltaram a desenvolver metodologias para medição da competitividade de um destino turístico, e outros autores desenvolveram sistemas compostos com focos holísticos.

Santos (2012) alerta para uma possível perda de identidade dos lugares gerada pela competitividade, porque há uma valorização dos elementos econômicos e de mercado, em detrimento aos elementos humanos e coletivos. Assim,

Um exemplo é a cultura. Um esquema grosseiro, a partir de uma classificação arbitrária, mostraria, em toda a parte, a presença e a influência de uma cultura de massas buscando homogeneizar e impor-se sobre a cultura popular; mas também, e paralelamente, as reações desta cultura popular. Um primeiro movimento é resultado do empenho vertical unificador, homogeneizador, conduzido por um mercado cego, indiferente às heranças e às realidades atuais dos lugares e das sociedades. Sem dúvida, o mercado vai impondo, com maior ou menor força, aqui e ali, elementos mais ou menos maciços da cultura de massa, indispensável, como ela é, ao reino do mercado, e a expansão paralela das formas de globalização econômica, financeira, técnica e cultural (SANTOS, 2012, p. 70).

Um exemplo disso é a reprodução de resorts, um formato de hospedagem que pouco ou nada interage com a cultura do lugar, apenas reproduz um forma de consumo de viagem ligada ao uso exclusivo de um equipamento concentrador de serviços turísticos. Neste caso, não se põe no foco da comparação da competitividade o destino turístico e seu conjunto de oferta, mas fica restrito a um equipamento de meio de hospedagem que pode ser comparado aos seus concorrentes pela qualidade dos serviços ofertado, mas não pelo diferencial do lugar onde está instalado.

Buscando o desenvolvimento da atividade, os estudos se ramificaram em diferentes abordagens e a partir de ferramentas de medição da competitividade turística em seus diversos aspectos. Então,

A competitividade de destinos turísticos pode ser definida, como um conceito multidimensional, que requer a superioridade em diversos aspectos para ser obtida. É um conceito dinâmico e para acompanhar o complexo processo concorrencial, os destinos turísticos são pressionados pelo desafio de se manterem competitivos frente ao mercado (RUIZ; GÂNDARA, 2012, p. 04).

De acordo com Chiavenato (2007, p. 117), na busca pela vantagem competitiva, “a essência da estratégia reside na criação de uma posição única e valiosa, que envolve a escolha de um arranjo interno de atividades. Tal arranjo permitirá à empresa diferenciar-se de seus concorrentes para oferecer algo que eles não conseguem fazer”.

Para Fonseca (2005), na disputa pelo consumidor, há uma procura cada vez maior pela personificação e diferenciação dos produtos, e na atividade turística isto pode ser facilmente visualizado através da elaboração de produtos turísticos que buscam cada vez mais, a diferenciação do espaço local para atender nichos de mercado.

No espaço urbano, mais influenciado pelas tecnologias da informação e pelas formas globais de ordenamento, identificar o diferencial em meio às tendências de globalização, parece cada vez mais difícil. Harvey (2011) destaca que a padronização e a uniformidade de linha de montagem adotada pelos países capitalistas pós Segunda Guerra Mundial para transformação espacial em novas formas mais verticalizadas, surgiram da tentativa de superar problemas políticos, econômicos e sociais, mas considera errôneo descrever como fracassadas as diversas soluções modernistas encontradas pelos países para os dilemas de desenvolvimento e redesenvolvimento. A partir daí, enfatiza que as transformações radicais das paisagens sociais e físicas das cidades capitalistas, muitas vezes tinham pouca relação com elas, porque aparentemente planejadores urbanos se declararam inimigos da diversidade, temendo o caos e a complexidade por considerá-los desorganizados, feios e irremediavelmente irracionais. Isso fez com que fosse comprometido o sistema de complexidade antes mais organizado do que desorganizado, uma vitalidade e uma energia de interação social que depende crucialmente da diversidade, da complexidade e da capacidade de lidar com o inesperado de maneira controlada e criativa.

A competitividade perseguida pelo turismo pode estar menos ligada à superação de tecnologias ou qualidade avançada na prestação de serviços e mais próxima da percepção sobre o espaço vivido, sobre as características específicas do lugar visitado, e as possíveis experiências únicas que poderão compor a oferta turística, independente da interpretação individual sobre a imagem apresentada. O desafio, portanto, está na identificação dos símbolos do espaço vivido, nas suas tradições, na força da cultura organizacional local, ao menos, o que restou dela (GOELDNER e RITCHIE, 2009).

Sobre uma visão mercadológica, Petrocchi (2009, p. 03) reforça “para que um destino de turismo seja bem sucedido, é preciso estar comprometido com a missão de atrair, encantar e manter turistas como clientes.”Assim como as empresas, os destinos turísticos também são estimulados pelo mercado e pela competitividade e dependem de ter êxito diante de seus concorrentes para serem competitivos.

Para além de identificar o diferencial em relação aos concorrentes a partir de um elemento específico, a competitividade proposta aqui busca a identificação profunda da oferta de um destino. Mais que meros equipamentos e serviços, a busca segue para as manifestações culturais e os usos dos recursos naturais que podem ser tão diferentes de um lugar para outro. Portanto, a competitividade parte do autoconhecimento, das peculiaridades e originalidades do lugar, que por si, poderão significar o diferencial tão buscado na competitividade, mas neste caso, sem tanta dependência de se comparar ao concorrente. Portanto,

A composição de um destino turístico (que é formado por várias empresas encarregadas de desenvolver atividades ligadas ao turismo) remete a uma situação inerente a qualquer tipo de empreendimento que possua diversas empresas que busquem um espaço para oferecer seus produtos e serviços, que é a concorrência. Apesar disso, não há como se ignorar o fato de que quanto maior o número de empresas envolvidas, maior a necessidade de que estas sejam competitivas para que possam permanecer ativas no mercado (VIANNA; ANJOS;ANJOS, 2012, p. 49).

Todavia, a discussão da competitividade no turismo precisa separar, de um lado, a abordagem da gestão empresarial, do outro, a gestão do turismo. Na gestão empresarial é relevante analisar o sucesso do modelo de negócio, a execução do seu planejamento, a especificação do público consumidor, a cultura organizacional, e a valorização dos clientes internos, seus trabalhadores. No caso dos destinos turísticos, é convergente a preocupação com o planejamento, a coerência dos Planos de Desenvolvimento Turísticos, mas o maior desafio vai para a gestão descentralizada com envolvimento de entes públicos e não públicos, normalmente sendo daquele a competência de fomentar e mobilizar o grupos mais representativo do sistema turístico em questão. Diferente do olhar mais interno da empresa de turismo, o destino se concentra no ambiente das interações espaciais, no conjunto de suas formas e funções, dos equipamentos e dos indivíduos que lhes dão vida ofertando ou demandando serviços.

Numa perspectiva de gestão do destino que dialogue com as empresas e instituições, a competitividade do turismo brasileiro dispõe de diretrizes nacionais estabelecidas pelo Ministério do Turismo desde o ano 2008 por meio do Projeto Destinos Indutores do Turismo

Nacional. Vinculado ao Macroprograma de Regionalização do Turismo, o projeto previa o desenvolvimento do estudo da competitividade de sessenta e cinco destinos brasileiros com capacidade de indução do desenvolvimento regional, gerando como resultado o Índice de Competitividade do Turismo (ICT), lançado anualmente entre 2008 e 2016, em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Pequenas e Micro Empresas (SEBRAE) e a Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Conforme Brasil (2015), a melhora do ambiente de negócios no país, o aumento da escolaridade de empresários acima da média da população e, ainda, o surgimento de uma legislação mais favorável ao empreendedorismo de pequeno porte, impuseram a elevação do patamar de competitividade das empresas para assegurar-lhes a sobrevivência no mercado.

A metodologia para avaliação da competitividade dos destinos turísticos brasileiros utilizou a noção de eficiência, focada em resultados presentes no destino, defendendo que uma vez conhecido o ambiente interno, a organização passa a ter o poder de gerir e de potencializar seus recursos, uma vez que a presença de um recurso, diferenciado e único, representa vantagem competitiva. Para melhorar a alocação de recursos e para atingir determinados objetivos, a competitividade do turismo determina quais são os objetivos e propósitos aos quais se visa alcançar. Conforme Brasil (2018), para consolidação do Projeto Destinos Indutores do Turismo, a competitividade é analisada a partir de treze dimensões: 1. Infraestrutura geral; 2. Acesso; 3. Serviços e equipamentos turísticos; 4. Atrativos turísticos; 5. Marketing e promoção do destino; 6. Políticas públicas; 7. Cooperação regional; 8. Monitoramento; 9. Economia local; 10. Capacidade empresarial; 11. Aspectos sociais; 12. Aspectos ambientais, e; 13. Aspectos culturais.

Apesar de não haver consenso sobre os determinantes da competitividade, a metodologia do Índice de Competitividade Turística apresenta alguma semelhança com modelos internacionais, mas deve se preocupar primeiramente em separar os elementos que seriam suas causas e suas conseqüências, para então determinar as formas de mensurá-las (SETTE, 2018).

Cada uma das treze dimensões do ICT elencadas no estudo do MTur conta com variáveis que orientam sua análise, mas o desafio que se apresenta, diz sobre o formato de política pública e sobre a contribuição do estudo para as interações sociais e transformações espaciais pós desenvolvimento do estudo. O uso dos resultados pelos agentes da cadeia de

produção do turismo, o suporte desta análise ao planejamento do turismo e, no caso do descontinuidade pelo MTur, a política pública poder ser utilizada como metodologia de aplicação local, com cada destino considerado indutor do turismo, pela sua capacidade de atração de fluxo, sendo também capaz de conduzir sua própria competitividade, com a identificação das suas fragilidades e forças, e valorizando seu diferencial de oferta.

1.4 GOVERNANÇA COMO ESTRATÉGIA DE DESCENTRALIZAÇÃO DA