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O direito de todos à educação: política de ações afirmativas na educação

Entendida como o processo de favorecimento às condições de acesso contínuo aos espaços da sociedade, a inclusão social visa garantir a qualidade de vida a quaisquer cidadãos. Sabe-se que a conjuntura política e social brasileira distancia nossa sociedade de um contexto inclusivo, tal qual como planejado nas políticas públicas nacionais de um modo geral. O processo histórico de desigualdade social, que afeta diretamente a esfera cultural, social,

de saúde e educacional, reflete posturas de segregação a grupos minoritários em nosso país. A este grupo, Moreno (2009) pontua que, com viés sociológico do termo, se identificam por um subgrupo marginalizado, apartados socialmente do contexto nacional, podendo até constituir-se em uma maioria da população brasileira, em termos quantitativos. As minorias são caracterizadas pela posição de não dominância que desempenham no âmbito social, verificando uma questão de superioridade da maioria frente ao poder, criando situações de desfavorecimento e vulnerabilidade relacionadas às demandas sociais que envolvem a população geral.

Nesse contexto, a promulgação da Declaração dos Direitos Humanos (UNESCO, 1998), ao final da Segunda Guerra Mundial, em 1948, traz um direcionamento no trabalho para a eliminação das desigualdades sociais, econômicas e sociais de grupos menos favorecidos. Desse modo, levanta-se a discussão a respeito de políticas de ações afirmativas, que visam atenuar distâncias e oferecer igualdade de oportunidades. Com caráter de ser um conjunto de políticas públicas e privadas que visa combater a discriminação racial, religiosa, de gênero e deficiência, além de reparar os efeitos da discriminação praticada no passado, tais ações objetivam efetivar a igualdade de acesso a bens fundamentais, como a educação e emprego. (GOMES, 2003) Os primeiros históricos de política de ações afirmativas são de origem norte-americana, por volta de 1960, quando surge um movimento nos Estados Unidos na busca de meios para melhorar as condições de vida da população negra, dada a evidente segregação racial existente no país. Exige-se então que, para além da eliminação das leis antissegregacionistas, fossem criadas melhores condições de oportunidades para a população. Aos poucos, outros países adotaram tais medidas, adaptando-se à realidade vivenciada, estando sempre focados em questões raciais, étnicas e de gênero. (MOEHLECKE, 2002)

No Brasil, tais orientações amplamente discutidas na situação da Constituição Federal (BRASIL, 1988) defendiam a igualdade de direitos ao evidenciar que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”, conforme descrito em seu artigo 5º; mediante este torna-se legalmente inadmissível qualquer tipo de discriminação. Esse documento traz ainda alguns apontamentos a favor de grupos minoritários específicos ao

estabelecer no artigo 37º, um percentual de vagas na contratação de pessoas com deficiência em organizações públicas, o que representa o despertar das políticas nacionais no favorecimento às ações afirmativas.

O artigo 6º, ainda da Constituição de 1988, levanta que o caráter fundamental da educação como direito adquirido constitui-se em um instrumento importante para a efetivação de outros direitos. Na mesma linha, Oliveira et al. (2012) comenta que “a educação tem um papel fundamental na consolidação da mobilidade, pois deve colocar todos no mesmo ponto de partida, proporcionar a todos os cidadãos a oportunidade de estudo, fundamental, médio ou superior” (p.344). O direito à igualdade, juntamente com o direito fundamental à educação exige que o Estado cumpra seu papel no que concerne a mecanismos de efetivação dos direitos garantidos legalmente.

Pelo exposto, pode-se concluir que as ações afirmativas surgem para pautar, principalmente, em âmbito governamental, o desenvolvimento de políticas públicas (OLIVEIRA, et al., 2012) que visam abarcar as finalidades destacadas. Assim, oportunidades de acesso à universidade por grupos minoritários, em situação de vulnerabilidade, têm-se constituído um tema recorrente na atualidade.

Os primeiros movimentos em nosso país, a favor da implementação de ações afirmativas na educação superior, datam de 1993, período em que foi constituída a proposta de Emenda Constitucional, indicando a concessão de bolsa de estudos, reparação histórica com a matrícula de descendentes de escravos em escolas públicas, estabelecimento de um Fundo Nacional para o Desenvolvimento de Ações Afirmativas, além do estabelecimento de cotas mínimas a determinadas minorias, dentre outras sugestões (MOEHLECKE, 2002). Segundo Valdés (2005), desde então, trabalhar com esse grupo, buscando a aproximação dessa parcela da população à comunidade passou a ser uma das políticas do Estado, sendo o tema foco de múltiplos estudos e pesquisas, em grande medida, decorrente das conferências e de eventos internacionais em prol da Educação para Todos.

Analogamente, a busca pelo alinhamento de condições para quem está na condição de desvantagem, tem sido considerada o elemento que direciona a criação de medidas afirmativas de equiparação de oportunidades. Para a

legitimação do direito de igualdade, torna-se necessária a adoção de ações afirmativas consideradas como

[...] uma ação reparatória/ compensatória e/ou preventiva, que busca corrigir uma situação de discriminação e desigualdade infringida a certos grupos no passado, presente ou futuro, através da valorização social, econômica, política e/ou cultural desses grupos, durante período limitado. A ênfase em um ou mais desses aspectos dependerá do grupo visado e do contexto histórico e social. (MOEHLECKE, 2002, p. 203)

Com base nessas alusões, as ações afirmativas podem ser compreendidas como um instrumento de inclusão social voltado a grupos mais vulneráveis que possuem um histórico de negligência ou discriminação no que se refere à concretização de seus direitos. Abarcados por esse rol de possibilidades de medidas que visem diminuir a distância entre os desiguais, políticas nacionais são elaboradas.

A importância disso, Moreira (2011) acrescenta que desde a elaboração do Plano Nacional de Educação, em 2001, há previsão de recursos e apoios que atenuem as desvantagens de grupos minoritários, sobretudo àqueles que sofrem prejuízos diante do acesso à educação superior em igualdade oportunidades e ações aos processos de seleção a esse nível de ensino.

Por certo, o caráter seletivo da educação vai ampliando horizontes e sendo, aos poucos, democratizada, permitindo que uma parcela antes sem acesso, chegue ao ensino superior. Exemplos concretos das propositivas que objetivam minimizar as lacunas entre as menções políticas e a realidade social permitem observar a elaboração de programas como PROUNI - Programa Universidade para Todos e FIES - Fundo de Financiamento Estudantil, que visam ampliar a demanda de estudantes e auxiliar na expansão de ingressantes à educação superior.

Dessa forma, na tentativa de atender às prerrogativas direcionadas a determinados grupos que se encontram em desvantagem social, a Lei nº 11.096/2005 (BRASIL, 2005), que institui o PROUNI, objetiva ampliar o acesso e garantir a permanência, mediante auxílio financeiro aos estudantes contemplados. O programa é uma ação de concessão de bolsas de estudos, em universidades privadas a estudantes que cursaram o ensino médio

completo em escola pública ou que obtiveram bolsas integrais em escolas particulares, compreendendo ainda uma parcela de bolsas destinadas para negros, indígenas e pessoas com deficiência. De acordo com Duarte (2009), essa medida garante a isenção de impostos para aquelas instituições que aderem ao programa. Mesmo considerando a importância do PROUNI, cabe mencionar que essa medida visa atender interesses econômicos e delegar as responsabilidades que o Estado não atende.

Nota-se que, ainda que seja direcionado a instituições de ensino privadas, há a menção de uma parcela da população até então não referenciada: as pessoas com deficiência. Oliven (2012) constata que, embora seja uma medida que possibilita o acesso de pessoas com deficiência à universidade, menos de 1% dos beneficiários, no período de 2005/2011, do programa fazia parte desse grupo. A autora questiona que, muito embora seja ofertada a vaga, não se sabe quais foram as condições oferecidas para a permanência nos cursos e sua conclusão.

Junto desse, programas como o FIES demonstram ações com propostas de aumento do número de vagas de ingresso, a mobilidade estudantil, a revisão da estrutura acadêmica, a ampliação das políticas de inclusão e assistência estudantil, a articulação da graduação com a pós-graduação e da educação superior pública com a educação básica. Tal programa, institucionalizado pela Lei nº 10.260/2001 (BRASIL, 2001b), destinado a estudantes regularmente matriculados em cursos de graduação de instituições particulares de ensino, possibilita o financiamento de 50% da mensalidade.

As políticas mencionadas possibilitaram o aumento da demanda nas universidades, o que favorece a eliminação de diversos obstáculos de ingresso e permanência na educação superior, possibilitando uma maior abertura das instituições de nível superior àqueles que até recentemente não tinham condições de acessá-la. Para Oliven (2012), é preocupação do Estado corrigir o caráter elitista da universidade, tornando os cursos de graduação mais acessíveis.

Nessa direção, o Decreto nº 7.234/2010 (BRASIL, 2010), responsável pela criação do Plano Nacional de Assistência Estudantil - PNAES, procura ampliar as possibilidades de permanência de estudantes de classes socioeconômicas menos favorecidas, matriculados em cursos de graduação

das IFES, objetivando promover a igualdade de oportunidades entre os estudantes e contribuir para a melhoria do desempenho acadêmico. No que tange ao atendimento das demandas existentes, torna-se importante considerar a “necessidade de viabilizar a igualdade de oportunidades e contribuir para a melhoria do desempenho acadêmico” (BRASIL, 2010, art. 4º). O programa prevê em seu artigo 3º, em consonância com diversas ações, o “acesso, participação e aprendizagem de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades e superdotação” (BRASIL, 2010), para que haja a implementação de forma articulada das atividades de ensino, pesquisa e extensão para estudantes matriculados nas IFES. Na sequência, nota-se que foi instituída a Lei nº 12.711/2012 (BRASIL, 2012) que regulamenta a reserva de vagas em IFES para candidatos que tenham cursado o ensino médio integralmente, em escola pública.

Observa-se assim, que o delineamento apresentado demonstra algumas medidas em favor do acesso e a permanência de grupos minoritários no contexto universitário, considerando que estas sobretudo decorrem, também, das lutas e movimentos sociais. Ademais, ações que concretizem práticas efetivas precisam ganhar força nesse cenário, para tornar as normativas, propostas exequíveis. Assim, o próximo tópico trará um breve apontamento que fundamenta o movimento inclusivo de modo mais específico, direcionado às pessoas com deficiência, de modo a aproximar-se das políticas e, sobretudo, apoiar o debate diante das normativas que propõem medidas inclusivas na universidade.