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Capítulo Ii – Enquadramento Teórico

4. O ensino da contabilidade em Portugal

4.3. O ensino da teoria da contabilidade

Centrando-nos mais especificamente no ensino da teoria e da história da contabilidade, começamos por apresentar um estudo realizado por Guimarães (1999) que, com o intuito de perceber a atual situação do ensino da história e da teoria da contabilidade em Portugal, realizou um questionário a docentes de contabilidade de 59 instituições de ensino superior portuguesas.

Uma das conclusões deste estudo é que, nos estabelecimentos de ensino superior (EES), é dada pouca relevância a aspetos relacionados com a teoria da contabilidade e

com a história da contabilidade, apurando, ainda, que as escolas têm bastante menos interesse no estudo desta temática do que os docentes da área da contabilidade (Guimarães, 1999).

Este autor salienta o papel da história da contabilidade para que o presente e o futuro da ciência contabilística não seja posto em causa e para manter unida a teoria à prática contabilística, considerando essencial não se separar estas duas realidades. A este propósito, alerta para o facto da prática contabilística não estar a dar primazia nem à teoria nem à história da contabilidade, facto que consideramos ser prejudicial à ciência contabilística, ao seu desenvolvimento e à própria prática contabilística.

Neste estudo, o autor também apresenta algumas das conclusões de um outro estudo levado a cabo pelo Centro de Estudos de História da Contabilidade da Associação Portuguesa de Técnicos de Contabilidade (APOTEC), em 1997, no qual se concluiu que, para a amostra do estudo, citado em Guimarães (1999):

 o ensino da evolução da contabilidade é apenas abordado superficialmente, com exceção de dois EES;

 os responsáveis da disciplina não têm o estudo da história da contabilidade como matéria importante a abordar no ensino;

 nenhum dos EES da amostra possui uma unidade curricular (UC) inteiramente dedicada à história da contabilidade; e

 as UC dos programas de ensino estão preparadas para o ensino das técnicas da contabilidade geral e não para o estudo da história da contabilidade.

Fora de Portugal, a propósito do ensino da teoria da contabilidade, apresentamos dois estudos, o primeiro realizado no Brasil e o segundo nos EUA, que demonstram que a situação vivida em Portugal, no que a esta temática respeita, não é muito diferente da que é vivida noutros países, encontrando-se idênticas preocupações e lacunas.

O primeiro é o estudo exploratório de Sacramento (1998), levado a cabo em dezanove faculdades públicas do Brasil, através de um questionário realizado aos professores da disciplina de teoria da contabilidade dessas faculdades, cujo objetivo é a apresentação de problemas relacionados com o ensino da teoria da contabilidade nos cursos de graduação das faculdades de Ciências Contábeis.

Neste estudo constatamos que no Brasil, à semelhança do que verificamos em Portugal, a teoria da contabilidade encontra-se influenciada pela abordagem normativa – metodologia dedutiva – em detrimento da abordagem positiva – metodologia indutiva (Sacramento, 1998).

Para a autora, se os professores não têm conhecimento da possibilidade da contabilidade de explicar e predizer os fenómenos contabilísticos, porque não possuem uma visão científica, também não conseguirão fazer com que os alunos aumentem e melhorem o conhecimento e possam aprender a realizar novas descobertas.

Deste modo, a autora defende que os docentes devem munir-se de conhecimentos científicos que lhes permitam entender como se desenvolve uma teoria. É transmitindo esses conhecimentos aos alunos que estes obterão as características necessárias para desenvolver a atividade profissional, dando respostas satisfatórias aos desafios profissionais com que se depararão (Sacramento, 1998).

Portanto, a mudança e o trabalho que é necessário realizar tem de começar nos professores de contabilidade, para que possam depois transmitir esse conhecimento aos alunos. Esta opinião é, aliás, partilhada por Salgueiro (2000), acrescentando que os professores do ensino superior deverão ter conhecimento dos métodos e técnicas de pesquisa utilizados na nossa disciplina. Na mesma linha L. L. Rodrigues (2009, p. 7) afirma que “todos os professores de contabilidade deveriam ter idealmente conhecimentos de história e teoria da Contabilidade”, considerando necessário que se faça “formação nestas áreas ao nível do mestrado ou do doutoramento”. A este propósito, Donoso Anes (2005) dá-nos conta, num estudo por si realizado, que muitos professores de contabilidade não conhecem a história da contabilidade.

O segundo estudo que apresentamos sobre o ensino da teoria da contabilidade, foi realizado nos EUA, por Cluskey, Ehlen e Rivers (2007), no qual analisaram os conteúdos programáticos de 88 programas de doutoramento na área da contabilidade nos EUA. No que respeita à lecionação da teoria da contabilidade apuraram que, apesar de este tópico constar na generalidade dos programas, existe uma grande diversidade de entendimentos sobre o que é, e como se deve abordar, a teoria da contabilidade. Concluíram, ainda, que uma boa parte das universidades parece limitar o ensino da contabilidade aos conceitos e fundamentos prescritos pelo FASB, tal como parece

verificar-se em grande parte das universidades portuguesas, ainda que em relação ao SNC e às normas do IASB.

Os autores exemplificam esta situação com a bibliografia que é recomendada naqueles programas: está baseada essencialmente em artigos sobre relato financeiro e normalização e não em livros, que é onde geralmente se documentam os grandes estudos e desenvolvimentos sobre teoria da contabilidade. As conclusões deste estudo são bem ilustrativas da visão redutora da teoria da contabilidade, mesmo em programas de doutoramento.

Diante das conclusões dos estudos apontados, consideramos oportuno referir o entendimento de Sá (1996), com o qual concordamos, que considera que, em contabilidade, não há qualidade de ensino sem que exista a teoria a anteceder a própria indicação dos caminhos práticos.

Em suma, e como também se pode concluir pelos estudos aqui apresentados, atualmente o ensino da contabilidade em Portugal encontra-se direcionado, essencialmente, para os aspetos práticos da contabilidade e muito centrado no ensino dos normativos contabilísticos. A teoria da contabilidade na sua ampla abrangência é pouco abordada e desperta pouco interesse, o que poderá ser prejudicial para a prática da contabilidade. Denota-se a existência de uma visão redutora da teoria da contabilidade mesmo ao nível do ensino superior.