CAPÍTULO 3 ENSINO DE MATEMÁTICA E CONHECIMENTO
3.4 O Conhecimento Matemático e a Geometria: A Perspectiva da Teoria
3.4.2 O ensino de geometria: algumas implicações
O século XX foi marcado por mudanças que determinaram o trabalho, dando a ele características de parcelamento e especialização. Na área científica e educacional, foram criadas especializações sucessivas. Lima e Moisés (1998) mostram que com a matemática não foi diferente, os vários campos foram se disseminando, tais como a aritmética, a álgebra, a geometria, a teoria numérica, de modo que a especialização nessas áreas foi desencadeando fragmentação sobre fragmentação no interior dessas matemáticas.
Na geometria, formaram-se sub geometrias: a espacial, a plana, a indutiva, a dedutiva, a não euclidiana, o desenho geométrico, analítica, entre outras, o que os autores denominam geometria fordista.
Lima e Moisés (1998) consideram que a educação fordista transformou-se em uma contra-educação, e que a geometria fordista tem de ser superada por uma geometria unificada de forma que a educação matemática possa superar a contra- educação. Nesse sentido, os autores propõem, portanto, a busca de uma educação geométrica num único movimento de aprendizagem, como podemos observar na figura a seguir:
O tijolo gera as geometrias espacial, plana e analítica e o seu movimento de composição está na base da topologia geométrica.
A roda gera as geometrias da esfera, da
circunferencia, dos movimentos circulares e dos sólidos de rotação.
O relógio gera a geometria dos ângulos e arcos e a trigonometria.
Figura 9 – Geometria unificada.
Fonte: Lima e Moisés, 1998
Desde o nascimento, o ser humano encontra-se em contato com a realidade, com objetos e com o mundo a seu redor, e é a partir dessa relação que vai constituindo seus conhecimentos. Para Vygotsky (1988), as funções psicológicas superiores aparecem duas vezes no desenvolvimento do indivíduo: a primeira nas atividades sociais – como funções interpsíquicas; a segunda, nas atividades individuais, no pensamento do indivíduo – como funções intrapsíquicas.
É na escola que a segunda relação ganha intencionalidade, quando a exploração, experimentação, investigação de situações que problematizem suas relações com objetos de uso diário vão contribuir para a apropriação sistematizada do espaço em que vivemos.
No entanto, quando se fala em ensino de geometria, os professores associam o ensino à nomeação de figuras simples e usuais (quadrado, triangulo, círculo), para, posteriormente, ensinarmos o cálculo da área dessas figuras. Para Miguel e Miorin (1987, p. 68-69), “longe de esgotar o conteúdo geométrico necessário (...) esses tópicos constituem talvez um de seus pontos terminais”.
Geometria descritiva Geometria espacial Geometria plana Geometria analítica Desenho geométrico GEOMETRIA UNIFICADA Unificação Conceitual
Pozebon, Hundertmarck e Fraga (2012) refletem acerca de outra dificuldade encontrada ao pensarmos no ensino da geometria, a qual consiste no fato de o professor não conseguir, em geral, estabelecer relações entre a geometria que é apresentada nos anos iniciais (mais prática) e a abordagem mais axiomática introduzida nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Por isso, para as autoras, os alunos não conseguem relacionar a matemática escolar com as vivências cotidianas, na medida em que termos e figuras geométricas, facilmente identificados na estrutura de arquiteturas construídas pelo homem ou pela natureza, estão pouco presentes nas aulas de matemática.
Para Lanner de Moura e Moura (1994), o objetivo ao se trabalhar geometria na escola, é proporcionar situações em que o estudante possa representar objetos, comunicar essas representações, relacionar suas formas e propriedades, relacionar tamanhos, orientar-se no espaço e apropriar-se gradativamente da linguagem geométrica. Para os autores, esses procedimentos possibilitarão a elaboração de estratégias de resolução de problemas e a formação do pensamento lógico de modo a compreender melhor a realidade em que vivem.
Os autores propõe uma estrutura de trabalho que estabelece relações entre o plano e espaço, a qual buscamos sistematizar na figura 10, abaixo:
Figura 10 – O ensino do espaço ao plano
Fonte: Sistematização do autor.
Dentro dessa abordagem, pode-se partir de situações como passeios, ou visitas a museus, tendo por objetivo observar as formas e também a linguagem
Comparação do plano com o artefato Execução do objeto desenhado
Desenho
Situação desencadeadora a partir de observação de formas na natureza
geométrica presente no espaço social do homem, momentos que podem ser desencadeadores de situações de ensino de geometria.
Na primeira etapa, o estudante desenha o objeto que pensa construir. Na segunda etapa ele executa seu plano, confeccionando o objeto. Na sua representação, necessariamente estará recorrendo ao seu conhecimento de curvas, formas, relação entre retas e outros, que lhe advém da observação e da interação com o meio em que vive. Na terceira etapa, quando compara o objeto pronto com o desenho feito anteriormente, pode aperfeiçoar sua representação, e com a mediação do professor, o aluno pode ir avançando quanto à apropriação dos conhecimentos geométricos. Dessa forma, para Lanner de Moura e Moura (1994, p. 3), o desenvolvimento desse projeto de ensino “poderá estar contribuindo para que a criança compreenda as formas e suas relações como uma maneira de se comunicar com o espaço que vive”.
Para Lima e Moisés (1998), a produção didática pedagógica em geometria tem no movimento do espaço ao papel o seu elemento central e articulador. Segundo os autores, isso se dá devido à criação histórica da geometria, a qual aconteceu em um movimento permanente de decomposição, partindo sempre das três dimensões, para duas, até criar a primeira dimensão para, ao retornar, compor sucessivamente as três dimensões a partir dos seus elementos mais simples.
A compreensão da necessidade de articular a dimensão espacial e plana, presente tanto na proposta de Lanner de Moura e Moura (1994), e de Lima e Moisés (1998, 2002), orientou a organização da atividade sobre geometria que foi desenvolvida pelas professoras, sujeitos dessa pesquisa, conforme descreveremos no capítulo 4.