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Embora a relação entre estudante e universidade possa ser presumida uma relação de prestação de serviço, com o aluno no papel de consumidor, muito se discute a respeito desta definição sob os preceitos do marketing.

Analisando o estudante sob o ponto de vista estrito daquele que realiza uma compra, que troca o serviço fornecido pela universidade por dinheiro, ele pode ser visto e deve ser tratado como um consumidor comum, como de qualquer outro tipo de produto ou serviço, com suas obrigações e deveres (Kanji & Tambi, 1999; Bennet, 2003). Eagle e Brennan (2007), entretanto, argumentam que, considerando que o objetivo ao cursar o ensino superior é o de obter uma qualificação, então, tratar estudantes como consumidores no sentido de que os prestadores de serviço devem fornecer o melhor possível dentro daquilo que é importante para seus clientes, de forma a manter a máxima de que “os consumidores têm sempre razão”, pode corroer o processo educacional e, assim, apesar de, de fato estarem adquirindo um serviço fornecido pela universidade, a conceituação do papel de consumidor não é tão simples para o ambiente do ensino superior.

Clayson e Haley (2005) discutem justamente que se os estudantes forem encorajados a se autoperceberem consumidores, podem ser encorajados a culpar o fornecedor do serviço se seu desempenho ficar abaixo das expectativas; logo, “resultados ruins tornam-se culpa do professor” (Clayson & Haley, 2005, p. 3).

Para Svensson e Wood (2007), a relação entre estudantes e universidade se inicia com a concepção de que a universidade é provedora do conhecimento e o estudante, seu receptor; porém, os papéis são intercambiáveis entre os dois entes em alguns momentos, fazendo com que o aluno não possa ser visto como um mero consumidor como ocorreria em outros tipos de serviço ou produtos. Destacam-se, também, como singularidades da relação, a impossibilidade de compra da qualificação em si (Sirvanci, 1996; Emery, Kramer & Tian, 2001) e a avaliação prévia realizada pela universidade das habilidades acadêmicas do potencial aluno, não importando, portanto, apenas a capacidade de pagamento pelo serviço.

Svensson e Wood (2007) defendem, assim, que os estudantes não devem ser vistos como consumidores e sim como cidadãos da comunidade universitária, reforçando o mesmo apontado por Halbesleben, Becker e Buckley (2003), de que ao invés de considerar o estudante como um consumidor faz mais sentido considerá-lo como ente participativo em seu processo educacional.

Entendidas as peculiaridades da educação a distância como serviço e suas implicações, é possível consolidar os tópicos discutidos até então em um modelo relacional, avaliando os efeitos das dimensões levantadas, especialmente no que diz respeito à cocriação de valor, no contexto EaD. É sobre este modelo que trata o próximo capítulo.

4 MODELO TEÓRICO PROPOSTO

Este capítulo apresenta uma integração entre os Capítulos 2 e 3, com a descrição do modelo de estudo proposto.

Em estudo publicado em 1996, Fornell, Johnson, Anderson, Chang e Bryant apresentaram um modelo que sumariza um índice de satisfação do consumidor americano (American

Customer Satisfaction Index – ACSI), com impacto positivo na lealdade do consumidor e

negativo em suas reclamações. Segundo os autores, a satisfação sofre influência da qualidade percebida, valor percebido e expectativa do consumidor. De forma adaptada, diversos autores pautaram seus estudos estendendo e variando as relações obtidas no ACSI, ora acrescentando, ora retirando dimensões, mas utilizando-se como base as relações apontadas por Fornell et al. (1996) para a qualidade, satisfação e lealdade (Mantovani, 2012). Embora, como destacado por Masano (2006), haja linhas de pesquisa que entendem a satisfação como antecedente da qualidade percebida, neste trabalho foi utilizado mesmo conceito defendido por Fornell et al. (1996).

Conforme destacado na Seção 1.1, o presente estudo também busca inter-relacionar as dimensões de qualidade percebida, satisfação e lealdade, levando em consideração o papel da cocriação de valor em contexto maior do que de valor percebido: como valor cocriado. Agregando ao conceito de cocriação de valor as relações que foram apontadas ao longo do Capítulo 3, como, por exemplo, que a cocriação de valor influencia na satisfação que, por sua vez, influencia na lealdade (Taylor & Hunter, 2014) ou que a percepção de valor impacta na lealdade (Ravald & Grönroos, 1996), obtém-se o modelo esquematizado de modo macro pela Figura 6.

É importante notar que, apesar de no modelo ACSI, o valor percebido ser influenciado pela qualidade percebida, entende-se que, ao se tratar de cocriação de valor, faz sentido que a relação ocorra em sentido inverso, uma vez que o consumidor participa da criação do serviço ou produto, sendo, de certa forma, corresponsável pela geração da qualidade final.

As hipóteses primárias das relações entre dimensões no contexto de educação a distância podem ser, então, resumidas como disposto a seguir, conforme objetivos (b), (c) e (d) apresentados na Seção 1.1:

H1) Existe uma relação positiva entre cocriação de valor e qualidade percebida; H2) Existe uma relação positiva entre qualidade percebida e satisfação;

H3) Existe uma relação positiva entre cocriação de valor e satisfação; H4) Existe uma relação positiva entre satisfação e lealdade;

H5) Existe uma relação positiva entre cocriação de valor e lealdade.

Para que haja a avaliação das relações dispostas na Figura 6, é necessário definir a composição de cada construto. Assim como abordado por Cronin Jr. e Taylor (1992), a qualidade percebida é dita um construto de segunda ordem, obtido por meio de cinco outras dimensões. Já a cocriação de valor é, conforme apresentado por Ranjan e Read (2016), um construto de terceira ordem, composto por duas dimensões de segunda ordem, cada qual composta por três dimensões de primeira ordem. Satisfação e Lealdade são construtos de primeira ordem.

Figura 6. Modelo proposto para relacionamento entre cocriação de valor, qualidade

percebida, satisfação e lealdade – visão macro

H2

H1

H3

H4

No Capítulo 6, o modelo ora proposto será confrontado com um modelo alternativo com a inclusão dos construtos Comprometimento e Imagem; detalhes estão na Seção 6.4.

A próxima seção detalha como foram operacionalizadas as dimensões apresentadas, especificamente para a educação a distância. Demais aspectos metodológicos, como amostragem, tipologia da pesquisa aplicada e softwares utilizados estão presentes no próximo capítulo.