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2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.3. O envelhecimento e as alterações cognitivas

Diversos estudos apontam que o envelhecimento é muitas vezes acompanhado pelo declínio progressivo das capacidades cognitivas, nomeadamente, verifica-se que os idosos tendem a demorar mais tempo a aprender novos conhecimentos, a manifestar dificuldades na realização de várias tarefas em simultâneo e a apresentar lapsos de memória e de concentração (Nevitt et al., 1989; Petersen et al., 1999; Zimprich, 2002). Este declínio é normalmente progressivo e vai interferindo lentamente com o desempenho quotidiano, o funcionamento social e ocupacional e vai diminuindo a qualidade de vida do indivíduo idoso (Petersen et al., 2001). Só quando a intensidade desta disfunção se torna significativa e é superior ao esperado para a idade do idoso passa a ser indicador de possível demência (Nelson & O'Connor, 2008).

O conceito de Défice Cognitivo Ligeiro (DCL) surgiu assim para denominar os casos patológicos intermédios entre o envelhecimento normal e a demência e, normalmente, os idosos com DCL apresentam um défice cognitivo ligeiro com uma repercussão igualmente ligeira no funcionamento das atividades da vida diária (AVD´s) (Petersen et al., 2013; Petersen et al., 2014). Grande parte dos casos de DCL evolui para demência passado alguns anos. Num estudo longitudinal, Reisberg et al. (1986) verificaram que 16% dos pacientes com DCL apresentavam o diagnóstico de demência ao fim de 3 anos. Mais recentemente, Petersen (2004), verificou que, 10 a 15% dos indivíduos idosos com DCL evoluem para demência, ao final de um ano. Num outro estudo, aproximadamente 80% dos casos de DCL progrediram para a demência num período de 6 anos (Petersen et al., 2001).

Em 2010, cerca de 35,6 milhões de pessoas em todo o mundo tinham demência e, em 2013, esse valor tinha já aumentado consideravelmente para os 44 milhões de pessoas (Prince et al., 2013). As projeções apontam para que

sejam cerca de 115,4 milhões as pessoas com demência em 2050 (Prince et al., 2013). Quando se analisa a relação entre a prevalência de demência e o género, verifica-se que a prevalência de demência é superior nas mulheres do que nos homens, motivo que pode ser justificado em parte pelo facto das mulheres viverem mais anos que os homens (World Health Organization, 2012).

O principal fator de risco para a demência é a idade, uma vez que, 1-5% dos idosos com 65 ou mais anos têm demência, mas este valor aumenta para os 32% quando são referidos os idosos com 85 ou mais anos (Ritchie & Kildea, 1995; Ritchie & Lovestone, 2002). O estado nutricional (Yates et al., 2012), o nível educacional (Beydoun et al., 2014; Xu et al., 2015), a ocupação profissional (Li et al., 1991), o ser fumador (Rusanen et al., 2011) e a ausência de uma prática regular de exercício físico (Buchman et al., 2012) são alguns dos fatores que a curto ou a longo prazo poderão contribuir como fatores de risco para o desenvolvimento de demência. Outras patologias como as doenças vasculares (Iadecola, 2013), a diabetes (Barbagallo & Dominguez, 2014), a hipertensão (Kivipelto et al., 2001) e o colesterol elevado (Kivipelto et al., 2001) parecem predispor ao aparecimento de demências.

De acordo com os critérios da Classificação Internacional de Doença e do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, a demência é uma síndrome, de natureza crónica e progressiva, causada por uma degeneração cerebral, da qual resultam alterações das funções corticais superiores, nomeadamente a memória, o pensamento, a orientação, a compreensão, o cálculo, a capacidade de aprendizagem, a linguagem, a recognição, a capacidade de julgamento, assim como, resulta em alterações do comportamento e da funcionalidade nas AVD´S (American Psychiatric Association, 2000).

Os principais sinais e sintomas das demências são o comprometimento precoce da memória, sobretudo da memória de acontecimentos recentes e a dificuldade de aprendizagem de novas informações (Dubois et al., 2009; Feldman et al., 2008; Neef & Walling, 2006).

À medida que a doença progride, os sintomas manifestam-se como um distúrbio persistente da linguagem e dificuldades em completar as tarefas da vida diária mais complexas (Feldman et al., 2008). No entanto, verifica-se que para além das dificuldades cognitivas que afetam estes indivíduos, são também frequentes distúrbios emocionais e de comportamento que incluem: alterações do humor (depressão, euforia), psicoses (alucinações e delírios), apatia, irritabilidade, desinibição, ansiedade, desorientação, agressividade verbal e física, entre outras (Dubois et al., 2009). Cerca de 25 a 40% dos idosos com demência apresentam um diagnóstico de perturbação afetiva associado e 10 % manifestam sintomas psicóticos (Alzheimer´s Disease International, 2009). O desenvolvimento dos sintomas decorrentes desta síndrome traz diversas limitações importantes na vida diária do seu portador.

Esta progressão nos défices cognitivos está relacionada com a progressão das lesões cerebrais existentes. Na fase inicial da doença, as áreas mais comprometidas pelas alterações neuropatológicas são as regiões do lobo temporal medial (hipocampo e circunvalação parahipocampal), áreas responsáveis pela memória. À medida que a doença evolui ocorrem alterações nas zonas cerebrais responsáveis pelas funções instrumentais, como a linguagem, a práxis e a capacidade espaço-visual (áreas associativas neocorticais) (Braak & Braak, 1991).

Esta síndrome é frequentemente diferenciada em duas categorias, as demências primárias – quando a condição afeta primariamente o cérebro - e as demências secundárias – quando a demência surge como consequência de uma outra patologia (Ritchie & Lovestone, 2002). A doença de Alzheimer é a forma mais comum de demência primária, ocorrendo em 50 a 70% dos casos (Santana et al., 2015). Outros subtipos de demência primária incluem a demência vascular (causada por alterações nos vasos sanguíneos cerebrais), demência de corpos de Lewy e um grupo de doenças que contribuem para a demência frontotemporal. É frequente em doentes com Parkinson, com Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA), após acidentes vasculares, processos infeciosos e/ou traumatismos cranianos ocorrer o desenvolvimento de demência – denominada demência secundária (Ritchie & Lovestone, 2002).

Frequentemente, a fronteira entre os diferentes subtipos de demência não são facilmente distintos e podem inclusive coexistir formas mistas (Alzheimer´s Disease International, 2009).

O aparecimento dos primeiros sintomas antes dos 60 anos de idade é pouco comum e, no caso da doença de Alzheimer, normalmente é indicativo de uma alteração genética (alterações na proteína percursora da amiloide e nas presenilinas 1 e 2). Para os casos do aparecimento mais tardio da doença de Alzheimer, os fatores ambientais (estilo de vida) e genético parecem ser determinantes (Breitner et al., 1995).

Atualmente, as investigações na área da neuroquímica e biologia molecular reconheceram a presença de marcadores específicos da demência, dos quais se destacam as alterações estruturais e as alterações dos biomarcadores do líquido encefaloraquidiano (Dubois et al., 2007). As principais alterações estruturais observáveis são o aumento da deposição de placas de β-amilóide e novelos de neurofilamentos da proteína tau no córtex central e no sistema límbico (Querfurth & LaFerla, 2010). Macroscopicamente, observa-se uma atrofia cerebral que afeta particularmente a região do hipocampo e que resulta da perda progressiva das sinapses entre os neurónios e a sua consequente morte (Lister & Barnes, 2009). Esta atrofia cerebral conduz a um aumento do espaço a ser ocupado pelo líquido cefalorraquidiano. Estas alterações são visíveis através de ressonância magnética e/ou através da tomográfica por emissão de positrões (TEP) (Dubois et al., 2007). A ressonância magnética permite visualizar as imagens morfológicas e funcionais do cérebro de forma não invasiva, enquanto que, a TEP permite observar as alterações na medida de concentração dos radiofármacos nos tecidos (Dubois et al., 2007). A combinação destas duas técnicas é uma mais-valia, pois permite avaliar a estrutura e a anatomia do cérebro, bem como, avaliar as funções dos tecidos cerebrais (Dubois et al., 2007).

A demência é considerada uma doença crónica e uma das principais contribuidoras para a disfunção e dependência entre os idosos (Colantuoni et al., 2010). Grande parte desta dependência resulta de um comprometimento da

capacidade funcional, onde as alterações do equilíbrio e a diminuição da mobilidade funcional são evidentes (Blankevoort et al., 2010; Feldman et al., 2005; Mazoteras Munoz et al., 2010).

2.4. O envelhecimento, a demência e as alterações do