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1.2. Pertinência do estudo

2.2.3. O erro de conceitos algébricos

Esta parte do trabalho destina-se aos erros que os alunos cometem em Álgebra, de um modo geral, e no estudo da derivada de uma função, em particular. A Álgebra quando surgiu apenas estava associada ao estudo dos métodos de resolver equações (NCTM, 2007). Atualmente, a Álgebra é muito mais que a manipulação de símbolos, as ideias algébricas estão presentes em muitas áreas do conhecimento. Segundo o NCTM (2007), a competência algébrica é tão importante na vida adulta, no trabalho e na preparação para o ensino superior que todos os alunos deveriam aprender Álgebra.

Embora a Álgebra não seja referida de forma explícita nos currículos antes do 3.º ciclo do ensino básico, ela está contida na matemática desde os primeiros anos de escolaridade, por isso compete aos professores “ajudar os alunos a construir uma base sólida baseada na compreensão e nas suas experiências como preparação para um trabalho algébrico mais aprofundado no 3.º ciclo e no secundário” (NCTM, 2007, p. 39). Sem esta preparação, o estudo da Álgebra tende a ser um fracasso. Kaput (1996) considera que o fracasso neste campo deve- se à formalização precoce da linguagem algébrica, pois existem muitas atividades matemáticas que têm como características intrínsecas a generalização e a formalização. Esta falha, na aprendizagem da Álgebra, deve-se à falta de experiências de aprendizagem promotoras de construção de significados de regras. Quando se aprende algum conceito, se este não tem sentido, esse sentimento mantém-se ao longo do tempo (Kaput, 1996). Numa perspetiva mais ampla, Mason (1996) pondera que o mundo dos problemas da matemática se situa entre a Aritmética e a Álgebra. Esses problemas na Álgebra aparecem quando é necessário encontrar valores desconhecidos mediante: (i) a manipulação de símbolos; (ii) a manipulação de expressões simbólicas, por exemplo, os polinómios; (iii) a utilização das fórmulas; e (iv) o estudo da estrutura matemática abstrata.

Ao analisar possíveis causas do erro em Álgebra, Ruano, Socas e Palarca (2003) defendem que alguns desses erros surgem na introdução de conceitos. Para que o aluno aprenda um novo conceito este deve ter significado para ele próprio, deve-se, para isso, acrescentar um novo conhecimento utilizando os conhecimentos prévios. Já para MacGregor (1996), uma das possíveis causas para os alunos errarem no campo da Álgebra é o deficiente conhecimento da Aritmética. Para este autor, os alunos não aprendem as propriedades operatórias dos números, nem reconhecem relações e procedimentos gerais. Para Hall (citado por Vale, 2010) a terminologia é uma das causas para ao alunos errarem neste campo. Existem erros que mostram, por exemplo, que os alunos não fazem distinção entre os significados de expressão e de equação. Estas diferentes causas podem originar em: (i) erros por eliminação, por exemplo, simplificar 40x3 como 37x ou 2xy2x como y; (ii) erros por troca de

membros, por exemplo, considerar a equivalência x38150 x 38 150 verdadeira; (iii)

erros por redistribuição, os alunos ao considerar, por exemplo, a equação x1025 subtraem 10 ao primeiro membro e adicionam 10 ao segundo, obtendo x10 10 25 10 ; (iv) erros por

transposição, um exemplo deste erro é apresentado na equivalência 3 2 3 4 2

erro ocorre porque os alunos tendem a generalizar a regra eficaz em equações simples, tal como

2 4

2

x

x

   ; (v) erros de exaustão, são erros que ocorrem com mais frequência próximo do fim de uma resolução. Como exemplo, Hall apresenta a seguinte resolução

2 2 6 ( 2)( 3) 2 2 1 ( 4)( 3) 4 4 2 12 x x x x x x x x x x        

  . Nesta resolução, o aluno poderia ter cometido o erro

logo no início da expressão, ter feito logo o ‘corte’ na expressão inicial (cortando o 2

x ) em vez de

efetuar o ‘corte’ do x no final; e, por último, (vi) a ausência de uma estrutura, é quando ocorre uma confusão estrutural (por exemplo, no uso de um sinal de igual ou na aplicação de algoritmos).

No que diz respeito ao tema de derivada de uma função, os erros que os alunos cometem nesta temática despertaram a atenção de investigadores em estudar as suas razões, como são exemplo os estudos realizados por Cardoso (1995), com alunos do 11.º ano, por Orton (1983), com 110 alunos com, pelo menos um ano de Cálculo, por Vinner (1992), com 119 alunos universitários e por Viseu (2000), com futuros professores de matemática.

Cardoso (1995) realizou um estudo, em que parte envolveu o ensino-aprendizagem do tópico derivada de uma função, com uma turma do 11.º ano de escolaridade que revelava dificuldades não só em Matemática mas em todas as disciplinas. A turma era da área vocacional de desporto e era composta, no início da experiência, por 14 alunos, com idades compreendidas entre os 16 e os 21 anos. O objetivo deste estudo consistiu em estudar formas de ensino de conceitos de Análise Matemática que valorizem aspetos de visualização gráfica, raciocínio intuitivo, experimentação, indução e formulação de leis, num ambiente de trabalho de cooperação e com a utilização de calculadoras gráficas. A autora conclui que as dificuldades de aprendizagem de derivadas estão relacionadas com: (i) a compreensão do papel das variáveis, os alunos ao fazerem o gráfico de uma função à mão não sabiam distinguir a variável independente e a variável dependente; (ii) hesitações na escolha da unidade na representação gráfica, os alunos demonstravam demasiado tempo a decidir as unidades a colocar nos eixos ordenados; (iii) tentativa e erro não organizada, isto verificava-se com maior frequência quando os alunos não sabiam que janela de visualização utilizar na calculadora, eles experimentavam valores até lhes aparecer um gráfico aceitável; (iv) a influência de estruturas concetuais muito arreigadas, os alunos ficam ligados a certos conceitos e que quando se aprende um novo é difícil ‘desligar-se’ do antigo; (v) raciocínios incompletos, notou-se muitas vezes que os alunos não concluíam as resoluções; e (vi) o código linguístico restrito, os alunos apresentavam uma

competência linguística muito pobre, a falta desta competência provoca dificuldades de comunicação dos alunos. Relativamente ao tema da derivada, Cardoso (1995) refere que a complexidade dos conceitos matemáticos neste tema exige um empenhamento pessoal fora da aula por parte dos alunos. No entanto, no seu estudo, houve vários alunos que não o faziam regularmente, não produzindo a fase de assimilação nesses alunos.

Um outro estudo sobre derivadas foi realizado por Orton (1983) com 110 alunos ingleses, entre os 16 e os 22 anos, com pelo menos um ano de Cálculo. Com este estudo, o autor constatou que os alunos apresentavam um bom domínio nos algoritmos de cálculo de derivadas, pelo menos para funções simples, mas apresentavam dificuldades sobre a conceptualização geométrica de limite, que está na base da noção de derivada. Por exemplo, quando questionados sobre o que acontece às secantes PQn, quando o ponto Qn se move

sobre a curva aproximando-se do ponto fixo P (Figura 5), cerca de 40% dos alunos não foram capazes, mesmo quando fortemente induzidos, de concluir que o processo conduzia à reta tangente à curva no ponto P.

Figura 5. Figura do estudo de Orton (1983, p. 245).

Outra dificuldade observada foi no uso de representações gráficas. Os alunos participantes no estudo mostraram-se capazes de responder corretamente a perguntas do tipo “calcule o declive da reta tangente a uma dada curva num dado ponto” mas, cerca de 90% revelaram dificuldades quando confrontados com a obtenção da mesma velocidade de crescimento através do gráfico. O autor notou também dificuldades na atribuição de significado correto dos símbolos usados. Por exemplo, quando se lhes pedia para explicar o significado de

dy

dx, cerca de 65% dão respostas incorretas do tipo

var

" "

var

velocidade de iação de y

velocidade de iação de x ,

A valorização que o conceito imagem tem na formação dos conceitos matemáticos despertou a atenção de Vinner (1992). Com a preocupação de averiguar o que permanece nas “mentes” dos alunos depois de terem terminado o ensino secundário, o autor efetuou um estudo com 119 alunos universitários no início de um curso de Cálculo, esperando que os mesmos se relembrassem de conceitos básicos, escolhendo como exemplo o conceito de função. Considerando que o conceito de função possui várias configurações, Vinner optou por fazer perguntas sobre tópicos de derivada de uma função, como é exemplo a seguinte questão: “o que é uma derivada”? As respostas a esta questão foram classificadas pelo autor nas seguintes categorias:

I. “uma conceção correta de derivada como um limite (6%). Nesta categoria foram incluídas respostas do tipo:

0 ( ) ( ) lim h f x h f x h    ;

II. uma conceção correta de derivada segundo uma interpretação visual (25%). Nesta categoria foram incluídas respostas do tipo: a derivada é uma função que indica o declive da função original em cada ponto; a derivada é o declive da parte crescente ou decrescente de uma função num certo momento; III. uma conceção instrumental de derivada, que relaciona com os métodos de a

obter ou com as suas aplicações, mas que ignora o seu significado (23%). Exemplos: a derivada é uma função obtida de uma dada função através de regras matemáticas fixas; a derivada é uma subfunção de uma função original, por exemplo: 3 2

2 3 , ' 6 3

yxx yx  ; uma derivada é um meio de investigar os domínios de crescimento ou de decrescimento de uma dada função; é uma fórmula matemática;

IV. uma referência vaga e inaceitável ao conceito de limite (8%). Exemplos: é uma função que tende para infinito; é o lim ( ) /f x dx , quando dx ; 0 V. uma referência vaga e inaceitável ao aspeto visual de derivada (26%).

Exemplos: é uma função que é tangente a outra função; é a equação da tangente a uma determinada função; a derivada é uma função cuja representação gráfica é uma tangente; o ângulo que a função forma com o eixo dos x;

VI. respostas totalmente irrelevantes ou não respondidas (12%)”. (pp. 210-211)

As respostas incluídas nas categorias 4, 5 e 6 (46%) foram as que mais preocuparam Vinner por serem formuladas de uma forma vaga, imprecisa e sem sentido. Os alunos recordavam palavras, símbolos e gráficos relacionados com derivadas, mas não possuíam uma ideia com significado.

Relativamente às categorias 1 e 2, o autor afirma que os alunos se lembravam melhor dos aspetos visuais do conceito de derivada do que dos seus aspetos analíticos. No entanto, os aspetos analíticos são importantes para a aplicação das derivadas nos diferentes ramos da ciência.

Referindo-se à categoria 3, Vinner acredita que as respostas dadas realçam uma tendência comum na aprendizagem da Matemática. Quando um conceito é usado como uma ferramenta, o seu significado original é esquecido. Assim, os aspetos instrumentais do conceito ocupam o lugar do próprio conceito. Vinner acrescenta que há uma tendência para a compreensão instrumental predominar mas que os conceitos são melhor recordados no modo relacional. Isto é suportado pelo facto de as categorias 1 e 2, juntas, terem uma percentagem superior à da categoria 3, a categoria instrumental.

Num outro estudo, realizado por Viseu (2000) com 19 professores estagiários, procurou- se identificar as conceções sobre representações gráficas da derivada de uma função. A maior parte dos futuros professores manifestou dificuldades em aplicar os conhecimentos analíticos que adquiriram na sua formação, desde os seus estudos no ensino secundário, em situações gráficas que não lhes fornecia dados que lhes permitisse recorrer a processos analíticos. O autor conclui que as principais dificuldades que esses futuros professores revelaram foram: (i) identificar e justificar se uma dada reta é tangente a uma curva num ponto; (ii) fazer a transposição da informação do gráfico de uma dada função para um possível esboço da sua derivada e vice-versa; e (iii) relacionar o sinal da segunda derivada de uma dada função com a variação da primeira derivada dessa função e, consequentemente, fazer a ligação entre os zeros da segunda derivada e os extremos da primeira derivada. Para o autor, estas dificuldades devem-se a estratégias de ensino e de aprendizagem que não potenciam a conexão entre as diferentes representações dos conceitos estudados no tema de derivada de uma função.

Em suma, a análise do erro pode contribuir para a aprendizagem dos alunos, para isso o professor deve incentivar a análise das suas próprias resoluções. Com isto, os alunos terão oportunidade de identificar e compreender os seus erros, podendo assim desenvolver processos de verificação e autocorreção que os ajudem a refazer o ‘caminho’ (Hadji, 1994).