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A generalização da dimensão introduzida anteriormente parece a mais geral que podemos fazer. Isso seria verdade se não existissem vários tipos de in…nito, também chamado de cardinalidade. Este é um assunto bastante complicado da teoria dos conjuntos. Na verdade, a cardinalidade mede o “tamanho” de um conjunto. Mas, como vimos, a dimensão de um espaço está diretamente relacionada com o tamanho (ou o número de elementos) da base.

Para um conjunto qualquer podemos considerar duas noções: tamanho do conjunto e o número de elementos deste conjunto. Para qualquer conjunto com um número …nito de elementos estas noções coincidem. Um con- junto com três elementos tem um tamanho, ou cardinalidade, três. Além disso, para conjuntos …nitos, sempre que pegamos uma parte deste conjunto (um sub- conjunto) este tem um tamanho menor que o original. A comparação entre os tamanhos dos conjuntos está ligada com a idéia de bijeção entre os elementos destes conjuntos.

Remark 19 Se podemos criar uma bijeção entre dois conjuntos, então estes conjuntos tem o mesmo tamanho.

Assim, o conjunto de 3 frutas tem o mesmo tamanho do conjunto de 3 animais. Esta idéia também é válida para conjuntos com in…nitos termos. Mas, neste caso, a noção de cardinalidade e número de elementos não é mais a mesma. Por exemplo, tomemos o conjunto dos naturais N e o conjunto dos números pares P . Certamente estes conjuntos não têm os mesmos elementos. Em especial o número 1 está no primeiro conjunto e não está no segundo. Mais ainda, qual- quer elemento do segundo conjunto está no primeiro,mas o contrário não é verdade.

Problem 20 Qual destes conjuntos é maior?

Poderíamos então imaginar que o conjunto dos naturais é maior que o con- junto dos números pares. Entretanto, é possível estabelecer uma bijeção entre os naturais e os números pares. Obviamente, dado um número natural n, podemos fácilmente associar a ele o número par

p = 2n

Mas, além disso, dado um número par p 2 P associamos a ele (de forma unívoca) o natural

n = p 2

Ou seja, a cada número inteiro temos um (único) número par associado e vice-versa. Isto mostra que os dois conjuntos têm o mesmo tamanho, ou a mesma cardinalidade.

Assim, para conjuntos in…nitos, podemos pegar apenas uma parte deste conjunto e obter um conjunto com o mesmo tamanho.

Vejamos um exemplo um pouco mais complicado. Recapitulando, um dos resultados da teoria dos conjuntos é que sempre que for possível estabelecer uma bijeção entre dois conjuntos estes conjuntos têm a mesma cardinalidade. Peguemos, por exemplo, o conjunto dos naturais N, i.e., a seqüência

0 B B B @ 1 2 3 .. . 1 C C C A

e a seqüência de um par ordenado de naturais, o produto N N, i.e., as seqüências 0 B B @ 1; 1 1; 2 2; 1 2; 1 ... .. . . .. 1 C C A Problem 21 Qual destes conjuntos é maior?

Aparentemente o segundo conjunto tem mais elementos que o primeiro. En- tretanto, estes dois conjuntos podem ser mapeados (um-pra-um) através do diagrama de Cantor

identi…cando n ! (x; y) ou seja

0 ! (0; 0) ; 1 ! (1; 0) ; 2 ! (0; 1) ; 3 ! (2; 0) ; 4 ! (1; 1) ; 5 ! (0; 2) ; 6 ! (3; 0) ::: Desta forma, o par ordenado N N tem a mesma cardinalidade de N, ou

seja, são do mesmo tamanho e tem o mesmo tipo de in…nito. Como resultado disso, os números racionais Q, que podem ser escritos como a=b, com a; b 2 N e b > 0 tem a mesma cardinalidade dos naturais.

Figure 10: Figura da Wikipedia

Mais ainda, com argumentos semelhantes é possível mostrar que qualquer seqüência …nita de números naturais N N ::: N pode ser mapeado nos naturais N e conseqüentemente, tem a mesma cardinalidade. Esta cardinalidade é chamada de in…nito (pois N é in…nito) contável. Também chamado de @0

(aleph-0).

Remark 22 Assim, se os elementos que formam a base de um conjunto tem uma cardinalidade contável (possui uma bijeção com N) dizermos que a dimen- são do espaço é contável.

Talvez você imagine com isso que todos os conjuntos in…nitos têm a mesma cardinalidade, mas isso não é verdade.

Agora, se você considerar o conjunto dos reais, é impossível estabelecer uma relação um-pra-um entre este conjunto e os naturais. Mais precisamente, é possível estabelecer a relação

N ! R ; mas a inversa não

R 9 N :

Podemos dizer que, apesar de ambos serem in…nitos, o conjunto dos reais é maior que o dos naturais. Mais ainda, qualquer intervalo …nito da reta real, e.g. [0; 1], tem mais elemento que qualquer seqüência …nita de todos os naturais.

Assim, se você …zer um HD de computador capaz de armazenar todos os naturais, este HD pode encher e não registrar os reais (ou mesmo um internalo dos reais).

Com isso, os reais são de uma cardinalidade diferente (maior) que os naturais. Dizemos que o conjunto dos reais é um in…nito incontável. Também chamado de @1(aleph-1).

Remark 23 Assim, se não for possível estabelecer uma bijeção entre os ele- mentos da base e N, mas for possível estabelecer entre R, os elementos que formam a base de um conjunto tem uma cardinalidade incontável dizermos que a dimensão do espaço é incontável.

Remark 24 Vemos então que todo o desenvolvimento apresentado na seção anterior sobre o espaço de Hilbert diz respeito, na verdade, apena a in…nitos contáveis.

Do que foi dito acima, vemos que o nosso espaço H, de…nido anteriormente, tem dimensão in…nita, mas contável. Pois possui uma base com um in…nito contável de elementos fjekig. A existência de diferentes tipos de in…nito nos leva

a crer (o que é verdade) que possam existir também espaços com uma dimensão (e consequentemente uma base) in…nita incontável.

Considere agora uma função f (x) sobre os reais num intervalo x 2 [a; b]. Esta função pode ser considerada uma seqüência

0 B B B B B @ f (x1) f (x2) f (x3) .. . f (xn) 1 C C C C C A

entretanto, neste caso o índice da nossa seqüência (x) não é um número naturalN, mas um número real R. Pois podemos fazer x2 x1< " para qual

valor de ". Assim, entre quaisquer dois elementos existem in…nitos elemento: 0 B B B B B B B B B B B @ f (x1) .. . f (x1;0001) .. . f (x2) .. . f (xn) 1 C C C C C C C C C C C A (44)

Este tipo de seqüência é, certamente, diferente da de…nida anteriormente. Mais precisamente, a nossa seqüência, assim como a anterior, possui in…nitos termos, mas esta seqüência possui um in…nito incontável de termos.

Assim, aquele HD hipotético capaz de registrar uma seqüência in…nita (xk),

não seria capaz de registrar a função acima.Certamente o procedimento anterior para a construção de uma base canônica falha neste caso.

Com isso, não há nenhuma razão para crer que os resultados desenvolvidos na seção anterior sejam válidos para funções sobre os reais.

Vamos então tentar construir um espaço vetorial para as nossas funções f . Como uma extensão natural da notação anterior, se queremos um vetor que represente a nossa função f (x) ; x 2 [a; b], podemos chamá-lo de jfi. Ou seja, jfi é a coleção ordenada de todos os valores da função num certo intervalo (a “seqüência” simbólica (44)). Observe que jfi não é a função calculada num ponto, mas uma quantidade abstrata que representa uma coleção in…nita de termos.

A soma destas quantidades pode ser de…nido de forma análoga a anterior. Ou seja, a “seqüência” simbólica

jwi = jfi + jgi ; ; 2 C

é de…nida como a coleção ordenada de todos os pontos w (x) = f (x) + g (x) ; x 2 [a; b].

Na construção do nosso espaço, assim como …zemos anteriormente, o primeiro ponto é a construção de um produto interno. Podemos fazer isso apenas gener- alizando a expressão anterior para o caso de duas “seqüências contínuas” jfi e jgi (todas de…nidas, sempre, no mesmo intervalo)

h j i = n X i=0 i i ! hfj gi = Z b a f (x) g (x) dx : Com isso, novamente, garantimos a positividade do produto

hfj fi 0 ; hfj fi = 0 =) jfi = 0 ; onde a última igualdade signi…ca f (x) = 0 para x 2 [a; b].

Novamente, para que o nosso produto faça sentido, devemos exigir que hfj fi =

Z b a jf (x)j

2

dx < 1 : (45) Ou seja, o nosso espaço é o espaço das funções de quadrado integrável no inter- valo [a; b], também chamado L2(a; b).

O fato de que a soma (de…nida acima) de duas funções de quadrado integrável é também ser de quadrado integrável, garante que L2(a; b) é um espaço vetorial

(assim como as nossas seqüências em H).

O ponto (e toda a di…culdade do trabalho) é estudar a dimensão deste espaço. Para isso, podemos invocar aqui o resultado de Fourie. Para qualquer função (bem comportada) que respeite (45), de…nida no intervalo [ ; ] existe uma correspondência unívoca entre esta função e a seqüência (contável)

f (x) =

1

X

k= 1

onde xj = 1 p 2 Z b a f (x) exp ( ikx) dx (47) Ou seja, registrar a seqüência contável xj é equivalente a registrar a função

(de…nida num intervalo incontável) f (x).

Assim, apesar do HD hipotético não poder registrar o valor da função em todos os pontos, ele pode registrar a seqüência fxkg e, com isso, reconstruir a

função (exatamente) em todos os pontos. Ou ainda, mesmo estando a função de…nida num contínuo de pontos, não precisamos de um conjunto incontável para especi…car a função. O fato de esta ser de quadrado integrável cria uma relação entre estes pontos, de sorte que eles possam ser especi…cados pelo con- junto menor formado por uma seqüência contável de pontos.

Mais ainda, existe uma relação unívoca entre o espaço das funções em L2(a; b) e o espaço das seqüências contáveis in…nitas. O que mostra que estes dois espaços têm a mesma dimensão. Ou seja, se existir uma base contável para a seqüência fxkg existirá também uma base contável para L2. Observe que

ainda não falamos nada sobre as sequencias acima (em especial, não sabemos se estas seqüências pertencem a um espaço de Hilbert).

Ou ainda, existe uma base contável para o espaço L2(a; b).

Além disso, existe um resultado, devido a Parseval, que a…rma Z jf (x)j2 dx = 1 X j= 1 x2j

Ou seja, se a seqüência xj pertence ao nosso espaço de Hilbert H se

f 2 L2. Ou seja, para toda sequencia xk 2 H existe uma função

f (x) =

1

X

k= 1

xkexp (ikx) ; f 2 L2

e para toda a função f 2 L2 existe uma seqüências

xj = 1 p 2 Z b a f (x) exp ( ikx) dx ; fx kg 2 H :

Podemos assim considerar L2(a; b) como um espaço de Hilbert H. E dizer

que a função f (x) pertence ao espaço de Hilbert L2. Observe que as próprias funções

1 p

2 exp ( ikx)

pertencem a L2( ; ). Assim, se chamarmos estas funções de je

ki (ou seja,

jeki é a coleção de todos os valores da função exp ( ikx) =

p

2 no intervalo ( ; )), podemos escrever (46) como

jfi =

1

X

k= 1

Observe que hekj eji = 1 2 Z exp ( i (k j) x) dx = kj :

Ou seja, fjekig é uma base (contável) para o nosso espaço L2( ; ) e esta

base é ortonormal. Além disso, xk são as componentes de jfi nesta base.

Sendo nossa base ortonormal, as componentes de f nesta base são simplesmente a projeção: xk = hekj fi = 1 p 2 Z b a f (x) exp ( ikx) dx ; (48) que são as componentes xk da série de Fourie (47).

Estas funções fjekig são um exemplo de funções ortogonais.

Assim, dado um vetor jfi 2 L2 podemos trabalhar com as componentes

deste vetor f (x), ou com as componentes xk deste vetor na base fjekig.

Vemos então que todo o ferramental desenvolvido para seqüência de quadrado somável é válido para funções de quadrado integrável. Além disso, as noções de norma

jfj =phfj fi e ortogonalidade

hfj gi = 0 podem agora ser estendida para estas funções.

Mais ainda, quando valamos agora sobre um vetor j i, podemos estar fa- lando de uma matriz coluna, de uma seqüência in…nita, ou mesmo de uma função. Toda as manipulações formais com j i são idênticas e, apenas quando precisarmos calcular alguma quantidade explicitamente, precisamos especi…car qual dos espaços de Hilbert estamos falando.

No documento Mecânica Quântica. June 24, 2013 (páginas 72-78)

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