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4 ESTUDOS DE CASO

4.1 O Estudo de Caso como Opção de Pesquisa Qualitativa

Diante de poucos estudos sobre a adoção de métodos ágeis para o desenvolvimento de software em OP, principalmente no Brasil, começou-se a vislumbrar a possibilidade de aumentar o inventário de casos e sua acessibilidade. Considerando que a pesquisa empreendida quer entender como se desenvolvem softwares no interior de uma organização pública, fica evidenciado que o objeto de estudo está circunscrito no âmbito das ciências humanas e sociais e que uma pesquisa com este caráter direciona para o uso de um método de pesquisa qualitativo, porque o que se procura são respostas que indiquem o estado real do objeto delimitado desvendando como ele ocorre a partir dos próprios sujeitos que o exercitam.

Dentre as várias alternativas de pesquisa qualitativa optou-se pelo estudo de caso porque este se fundamenta, conforme ressalta Yin [Yin10], na identificação de respostas para questões em que o problema de pesquisa consiste em buscar o “como” e o “por que”, bem como, na focalização de eventos contemporâneos complexos com contexto de vida real e no esforço para manter as características universais do contexto estudado.

Ademais, Graham [Gra10] destaca que estudos de caso propiciam uma ferramenta rica para apresentação de problemas na AP, de tal forma que os usuários - estudantes, profissionais ou professores - podem auferir benefícios significativos. Ele reforça que a riqueza da vida organizacional pública não está em suas bases de dados, mas sim nas pessoas, suas histórias e na forma como elas enfrentaram problemas, com maior ou menor êxito. O governo oferece um contexto repleto de complexidades, dramas e ambiguidades. Captar essa combinação de elementos é a vantagem dos estudos de caso, seja para o conhecimento da prática, seja para o estudo.

Do ponto de vista metodológico, o método de estudo de caso se mostrou a opção mais adequada porque, ao mesmo tempo, complementa os interesses da pesquisa e oferece oportunidades de enxergar a realidade entendendo-a e apreendendo-a na sua integralidade. Também é um método que garante a fundamentação nos dados e a facilidade na exploração de nuances, contradições e paradoxos.

4.1.1 A Seleção das Organizações Públicas da Pesquisa

Esta pesquisa iniciou-se com uma amostra diferenciada, com duas OP, incluindo a Embrapa Informática Agropecuária (CNPTIA) e a Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul (PROCERGS) porque se supunha que existissem condições diferentes em contextos de governos diferentes que afetam o desenvolvimento de software em OP. A escolha destas duas OP foi feita a priori por razões meramente organizativas, referindo-se à disponibilidade de recursos financeiros, ao tempo à disposição, a oportunidade de acesso ao objeto de interesse (projetos de software com métodos ágeis) e a possibilidade de recrutar sujeitos para o estudo. Por outro lado, a amostragem de organizações típica de manual teria exigido, ao contrário, iniciar em um contexto e ampliar a amostra apenas quando as ideias que emergiam da análise tivessem exigido isso. Ampliar a priori a amostra não é, em si, um erro metodológico, porém obriga a coletar dados que podem não ser essenciais, perdendo para tanto tempo, energias e recursos [Tar11].

4.1.1.1 A Embrapa Informática Agropecuária

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) conta atualmente com 17 Unidades Centrais localizadas em Brasília, 46 Unidades Descentralizadas em todas as regiões do Brasil, 4 Laboratórios Virtuais no Exterior (EUA, Europa, China e Coréia do Sul) e 3 Escritórios Internacionais na América Latina e África3. Tanto as Unidades Centrais

quanto as Unidades Descentralizadas estão vinculadas a um único modelo institucional, ou seja, a um sistema corporativo de estrutura administrativa e funcional formal e de normas operativas que se complementam, se articulam e se organizam entre si para favorecer a realização da missão institucional da Empresa [Tor08].

Dentre as suas 46 Unidades Descentralizadas encontra-se a Embrapa Informática Agropecuária, localizada na cidade de Campinas, Estado de São Paulo, unidade de pesquisa cuja missão atual é “viabilizar soluções de pesquisa, desenvolvimento e inovação em tecnologia de informação para a sustentabilidade da agricultura, em benefício da sociedade brasileira” [EIA08].

Em 1985, durante a vigência da Reserva de Mercado de Informática, não se visualizava com clareza o futuro da tecnologia no Brasil. Nesse contexto, a Diretoria- Executiva da Embrapa firmou convênio com o Centro Tecnológico para Informática (CTI), vinculado à Secretaria Especial de Informática (SEI) da Presidência da República, com o

objetivo de desenvolver o projeto denominado Fábrica de Software. Foi criado, dessa forma, o Núcleo Tecnológico para Informática Agropecuária (NTIA), funcionando nas instalações do CTI, o atual Centro Nacional de Pesquisas Renato Archer (CenPRA).

O surgimento do NTIA, segundo pondera Seixas Neto et al [SJP07], preencheu uma lacuna existente no País que era a ausência de um organismo institucionalizado que servisse de centro de integração de metodologias, ferramentas e processos avançados de produção de software para possibilitar tanto o aumento da produtividade quanto o de qualidade no desenvolvimento de software, de maneira que pudesse, ao mesmo tempo, disseminar as tecnologias geradas para a indústria e para as empresas brasileiras do setor e automatizar a produção de softwares. Acreditava-se que um órgão com tais características contribuiria para alavancar a independência tecnológica do Brasil no setor [Tor08].

A Embrapa, quando da criação do NTIA, soube adotar a informática como um fator estratégico porque percebeu que esta ferramenta poderia ampliar sua capacidade de gerar novos conhecimentos e de transformá-los em tecnologias de fácil acesso e adoção pela sociedade [Tor08]. Assim ficou consignado que a informática na Embrapa contribuiria tanto para a melhoria e agilidade dos processos de decisão administrativa quanto para avançar pesquisas sobre sensoriamento remoto, processamento digital de imagens, levantamentos agroecológicos e socioeconômicos, produção de cartografias de ocupação de terras, cartas morfopedológicas, perfis descritivos de agricultores, biotecnologia, sequenciamento genético e bioinformática, dentre outros [Tor08]. O desenvolvimento da pesquisa agropecuária “pode beneficiar-se e, até mesmo, ser acelerado através de adequada utilização dos instrumentos de informática” [EMB86].

Em 1993, o Núcleo recebeu status de centro nacional e transformou-se no atual Centro Nacional de Pesquisa Tecnológica em Informática para a Agricultura (CNPTIA). Nesse ano foi celebrado o convênio com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) para a cessão de uso de terreno na Cidade Universitária Zeferino Vaz, onde seria construída a futura sede da Unidade, utilizando recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) por meio do Programa de Modernização Tecnológica da Agropecuária (Promoagro). No início de 1996, a inauguração da sede própria da Unidade representou a consolidação da infraestrutura adequada para o desenvolvimento dos trabalhos de pesquisa. Ainda em 1996, em decorrência da implantação da política de comunicação da Empresa e com o objetivo de fortalecer a marca Embrapa, foram criadas as assinaturas-sínteses das unidades e o CNPTIA passou a ser denominado Embrapa Informática Agropecuária.

Atualmente a Embrapa Informática Agropecuária conta com um quadro de 109 pessoas das quais 74 são dedicadas às atividades de pesquisa e desenvolvimento e os demais às atividades de transferência de tecnologia, comunicação & negócios e suporte à pesquisa, sendo que das 109 pessoas, 20 atuam com o desenvolvimento de software na unidade, 14 atuam mais no gerenciamento de projetos de software e 8 trabalham com infraestrutura de TI. Vale salientar que essas pessoas atuam em processos administrativos e/ou de pesquisa de caráter estratégico, tático e/ou operacional para viabilizar e suportar as ações de pesquisa da unidade.

4.1.1.2 A Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul

A Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul (PROCERGS) é uma empresa de economia mista vinculada à Secretaria da Fazenda, cujo maior acionista é o Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Ela iniciou suas atividades em 28 de Dezembro de 1972 como órgão executor da política de informática do Estado. Hoje, a Empresa busca oferecer soluções em TI e Comunicação para a AP visando aumentar a eficiência e transparência do serviço público e aproximar Governo e Cidadão4.

Ela não era conhecida da população como outras empresas públicas do Rio Grande do Sul (RS), a exemplo da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE). Entretanto, na última década, à medida que a Tecnologia da Informação ganhou força em vários setores, e o setor público não é exceção, a PROCERGS tornou-se uma força importante na AP. Sem ela, os serviços dos departamentos de trânsito, os serviços da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Agronegócio, os serviços de interconexão dos diversos órgãos estaduais e muitos outros serviços da AP do Rio Grande do Sul, cada vez mais dependente de tecnologia, simplesmente não aconteceriam. Ou então, estariam em um estágio não muito desenvolvido. A Empresa extrapola o âmbito do governo ao oferecer alguns serviços à iniciativa privada. É o caso do Via-RS, o primeiro provedor de Internet do Estado do RS, que em 2015 completa 20 anos.

Hoje a PROCERGS conta com um quadro de aproximadamente 1.206 funcionários das quais aproximadamente 960 são dedicadas às atividades de TI, sendo que aproximadamente 600 servidores públicos atuam em projetos de desenvolvimento de software. Além disso, ela é formada por mais 6 Coordenadorias Regionais e 6 Unidades Descentralizadas. Vale salientar que o desenvolvimento de software acontece unicamente de maneira centralizada na Sede da Empresa em Porto Alegre/RS.

4.1.2 A Seleção dos Sujeitos da Pesquisa

A partir de projetos ágeis de desenvolvimento de software executados em OP - como ponto de partida para a identificação de estratégias de coleta de dados - a seleção dos sujeitos que compuseram a pesquisa foi realizada em função de dois focos de atenção definidos nesta pesquisa como dimensão de análises. A dimensão organizacional é a primeira delas. Ela levantou, junto aos gestores, aspectos institucionais relevantes acerca da cultura organizacional. Parte-se do pressuposto que a cultura organizacional influencia, promove, facilita, dificulta, favorece ou e/ou torna a adoção de métodos ágeis com maior ou menor possibilidade de aceitação na organização. Enquanto a dimensão do projeto focou a percepção dos membros sobre como compreendem o trabalho em equipe, o alinhamento com os objetivos de negócio e a execução de processos e práticas de desenvolvimento de software; entretanto, se interessou por conhecer como o desenvolvimento de software acontece e se desenvolve no interior dos projetos. Considerando a definição das dimensões escolhidas e também a experiência profissional dos pesquisadores optou-se pelas quantidades de sujeitos por dimensão de amostras consignadas na Tabela 11.

A questão da quantidade de sujeitos em uma pesquisa qualitativa é controvérsia e se insere no debate sobre a representatividade da amostra. Patton [Pat02] admite que a riqueza de informações do caso analisado é que garante a validade e significância da pesquisa qualitativa e não a quantidade de sujeitos que estão envolvidos na coleta destas informações. Creswell [Cre14] e Yin [Yin10], por outro lado, concordam que o número de sujeitos que devem compor uma amostra na pesquisa qualitativa depende da questão de pesquisa e da visão do pesquisador quanto à robustez dos dados e do grau de saturação qualitativa. Tarozzi [Tar11], por sua vez, aponta que o critério para estabelecer quando se pode interromper o procedimento da amostragem é a saturação teórica, no sentido de que, para qualquer direção que se prossiga na coleta de dados, confirmam-se constantemente os mesmos resultados alcançados anteriormente, enquanto que Minayo [Min98] assegura que a fala de alguns indivíduos de um grupo é representativa de grande parte dos membros deste mesmo grupo.

Tabela 11 - Quantitativo de sujeitos da pesquisa por OP e dimensão. ORG.PÚBLICA DIMENSÃO SUJEITOS

CNPTIA Organizacional 1 Assessor

Projeto (1) 2 Desenvolvedores 1 Gerente de Projeto Projeto (2) 1 Gerente de Projeto

1 Desenvolvedor

Total 6 sujeitos