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3.4 Os métodos na pesquisa qualitativa

3.4.1 O estudo de caso

O estudo de caso é apenas uma das várias maneiras de realizar pesquisa nas ciências sócias. Assim como os outros métodos, apresenta vantagens e desvantagens, cabendo ao pesquisador ponderar sobre sua utilização.

67 A análise terá como referência a obra de Robert K. Yin, a qual se insere, atualmente, como referência em estudo de caso, sendo o objetivo da presente seção apresentar as principais características do método, incluindo as contribuições de outros autores (GODOY, 2006; MERRIAN, 1988; EISENHARDT, 1989; STRAUSS; CORBIN, 2008).

Segundo Yin (2010), o estudo de caso é o método de pesquisa indicado

investigador tem pouco controle sobre os eventos; c) o enfoque está sobre um fenômeno contemporâneo inserido no contexto da vida real.

Portanto, essas três situações orientam o pesquisador a optar pelo estudo de caso, em detrimento de outros métodos de pesquisa aplicados às ciências sociais. Apesar disso, todos os métodos se sobrepõem de várias maneiras, sem apresentarem limites rígidos (YIN, 2010).

Nos estudos de caso, tendo em vista a riqueza do fenômeno e a extensão do contexto da vida real, existirão muito mais variáveis de interesse do que pontos de dados, fato que demandará o uso de múltiplas fontes de evidência, fazendo com que os dados convirjam de modo triangular (YIN, 2010).

O uso do estudo de caso com a finalidade de pesquisa permanece um dos empreendimentos mais desafiadores das ciências sociais (YIN, 2010). O método pode contribuir para as pesquisas que envolvem fenômenos individuais, grupais, organizacionais, sociais e políticos, sendo um método de pesquisa comum na psicologia, sociologia, antropologia, ciência política, administração, dentre outros.

Para Yin (2010), o método do estudo de caso permite que os investigadores retenham as características holísticas e significativas dos eventos da vida real, tais como os ciclos da vida, o comportamento dos grupos, os processos organizacionais e administrativos, as relações internacionais, etc.

A versatilidade do estudo de caso é um dos fatores que tem contribuído para sua ampla utilização nos estudos organizacionais no Brasil (GODOY, 2006). Contudo, os pesquisadores não têm utilizado o estudo de caso da forma metodologicamente correta, fato que tem gerado críticas quanto ao rigor científico desse método de pesquisa, além de refletir negativamente na qualidade dos trabalhos acadêmicos (GODOY, 2006).

68 É importante destacar que grande parte dos estudos classificados como

básic

características da metodologia qualitativa, mas não possui todos os requisitos para ser tratada como um estudo de caso intensivo por meio do qual se visa aprofundar uma unidade de análise claramente especificada (GODOY, 2006).

Para Stake (1994) quando se fala em estudo de caso, não há referência a uma escolha metodológica, mas, fundamentalmente, à escolha de um determinado objeto a ser estudado, que pode ser uma pessoa, um programa, uma instituição, uma empresa ou um determinado grupo de pessoas que compartilham o mesmo ambiente e a mesma experiência.

Yin (2010) afirma que é errônea a concepção de que os métodos de pesquisa devem ser dispostos hierarquicamente. Segundo o autor, a visão mais apropriada é aquela que concebe cada método de pesquisa sendo usado para as três finalidades da pesquisa científica: exploratória, descritiva e explanatória. Dessa forma, mesmo que cada método apresente características distintas, existem grandes sobreposições entre eles, devendo o pesquisador evitar desajustes grosseiros.

Com esta distinção, o autor rebate as críticas de que o estudo de caso somente deveria ser utilizado na fase exploratória da pesquisa científica, podendo, portanto, ser utilizado em todo o processo de investigação.

Para Yin (2010), a questão de pesquisa é fundamental para a opção do estudo de caso como o método a ser utilizado. A sua definição é, provavelmente, o passo mais importante a ser dado na caminhada da pesquisa científica (YIN, 2010). As

de caso, tendo em vista que as mesmas lidam com vínculos operacionais que necessitam ser traçados ao longo do tempo, mais do que as meras freqüências ou incidências (YIN, 2010).

Além disso, o estudo de caso é o método preferido no exame dos eventos contemporâneos, mas quando os comportamentos relevantes não podem ser manipulados. Para atingir a finalidade da pesquisa, o estudo de caso adiciona a suas fontes de evidência a observação direta dos eventos estudados e as entrevistas com pessoas as envolvidas (YIN, 2010).

69 Por fim, o uso do método em questão revela-se mais indicado quando o escopo do estudo recair sobre eventos contemporâneos, em oposição aos históricos (YIN, 2010).

Yin (2010) aponta quatro críticas recorrentes para o uso do estudo de caso como método de pesquisa: a) a possível falta de rigor da pesquisa envolvendo o estudo de caso; b) o fato do método fornecer pouca base para a generalização científica; c) a longa duração e a produção de documentos volumosos; d) a impossibilidade dos estudos de caso em abordar, diretamente, as relações causais entre os fenômenos.

No primeiro caso, este preconceito advém da negligência com que muitos pesquisadores do estudo de caso conduziram suas pesquisas, permitindo que se adotassem procedimentos sistemáticos ou aceitando o uso de evidências equivocadas. Além disso, muitos pesquisadores se deixaram levar por visões parciais, as quais influenciaram a direção dos achados e suas conclusões, fato que gerou críticas da comunidade acadêmica quanto à utilização do método (YIN, 2010).

Já no tocante à generalização, Yin (2010) afirma que os estudos de caso são generalizáveis às proposições teóricas e não às populações ou aos universos. O estudo de caso não representa uma amostragem. Sua meta é expandir e generalizar teorias, tratando, portanto, de uma generalização analítica.

No que tange à terceira crítica sobre o método em questão, Yin (2010) afirma que a mesma pode ser apropriada devido à maneira como os estudos de caso eram realizados no passado, a qual não condiz com as diretrizes atuais deste tipo de pesquisa científica.

Por fim, a quarta objeção também é rebatida por Yin (2010), pois os estudos de caso podem oferecer evidências importantes para complementar os experimentos,

O estudo de caso apresenta uma dupla definição, fato que demonstra como o método é abrangente, cobrindo a lógica do projeto, as técnicas de coleta de dados e as abordagens específicas à análise de dados (YIN, 2010).

A primeira delas define o estudo de caso a partir de seu escopo, sendo o ontemporâneo em profundidade e em seu contexto de vida real, especialmente quando os limites entre o

70 Já a segunda definição é orientada pela coleta e estratégias de análise de dados, sendo o estudo de caso a investigação que:

enfrenta a situação tecnicamente diferenciada em que existirão muito mais variáveis de interesse do que pontos de dados, e, como resultado

conta com múltiplas fontes de evidência, com os dados precisando convergir de maneira triangular, e como outro resultado

beneficia-se do desenvolvimento anterior das proposições teóricas para orientar a coleta e análise dos dados (YIN, 2010, p. 40).

O estudo de caso pode incluir tanto estudos de caso único, quanto de casos múltiplos, sendo os mesmos apenas variantes dos projetos de estudos de caso (YIN, 2010).

Apesar de ser reconhecido como uma variedade da pesquisa qualitativa, os estudos de caso podem apresentar uma abordagem mista, utilizando-se de evidências qualitativas e quantitativas (YIN, 2010; EISENHARDT, 1989; STRAUSS; CORBIN, 2008). Contudo, quando houver esta conjugação de dados qualitativos com quantitativos, a análise será fundamentalmente interpretativa e as análises estatísticas serão elementares.

O uso do estudo de caso como método de pesquisa denota que o interesse do pesquisador está mais voltado à compreensão dos processos sociais que ocorrem num determinado contexto do que às relações estabelecidas entre variáveis. Tem sido escolhido por pesquisadores especialmente interessados no insight, na descoberta, na interpretação, mais do que na verificação de hipóteses (YIN, 2010; GODOY, 2006).

Segundo Merriam (1988) o estudo de caso qualitativo tem como características seu caráter particularista, descritivo, heurístico e indutivo. Assim, o caso deve estar centrado em uma situação ou evento particular cuja importância vem do que ele revela sobre o fenômeno objeto de investigação.

Para Godoy (2006), o estudo de caso qualitativo busca descrever e analisar, de forma holística e intensiva, uma simples entidade, um fenômeno ou uma unidade social. Dessa forma, são particularistas, descritivos e heurísticos, apoiando-se no raciocínio indutivo a partir do manuseio de múltiplas fontes de dados (GODOY, 2006).

A opção pelo estudo de caso depende do problema de pesquisa que orienta o processo investigativo, os quais também podem ser motivados por questões de natureza conceitual, que surgem de teorias previamente estabelecidas, ou que se propõe a elaborar uma teoria a partir de um ou mais casos analisados (GODOY, 2006).

71 Hartley (1995) afirma que os estudos de caso são especialmente úteis quando o pesquisador deseja compreender os processos e interações sociais que se desenvolvem nas organizações, situando-os no contexto histórico atual e/ou passado no qual estão imersos. Também possibilitam uma análise processual, contextual e, em algumas situações, longitudinal das várias ações que ocorrem no interior das organizações e dos significados a elas atribuídos.

Constituem-se, portanto, numa modalidade de pesquisa, especialmente indicada, quando se deseja capturar e entender a dinâmica da vida organizacional, tanto no que diz respeito às atividades e ações formalmente estabelecidas, quanto àquelas que são informais, secretas ou até mesmo ilícitas.

Os estudos de caso são especialmente indicados na exploração de processos e comportamentos dos quais se tem uma compreensão limitada. Nesse sentido, desempenham um importante papel por possibilitar a geração de hipóteses explicativas e a elaboração de teorias (GODOY, 2006)

Assim, os vários fenômenos revelados e analisados durante o trabalho de campo devem ser incorporados num relato que expresse a relevância teórica do que foi estudado.

Com o resultado final é possível construir um modelo que forneça as respostas para as questões teóricas do estudo e a contribuição de cada conjunto de dados, categorias encontradas e conceitos elaborados para a explicação do fenômeno em questão.

Os estudos de caso também têm como objetivo a construção de teoria usando, fundamentalmente, o raciocínio indutivo no exame do problema a ser investigado e durante o processo de coleta e análise dos dados.

A partir do seu interesse por um fenômeno em particular e de algumas idéias acerca do que poderá encontrar, o pesquisador procurará imergir no caso, procurando, por meio de uma coleta cuidadosa de dados, compreender seu significado. É possível dizer que, a partir da formulação inicial de um problema até a interpretação dos resultados, existe uma permanente e flexível interação entre os dados e a teoria.

Por fim, o relatório final no estudo de caso deve apresentar uma narrativa densa, tendo em vista que o mesmo adota um enfoque indutivo no processo de coleta e análise dos dados (GODOY, 2006; FLICK 2004; GIBBS, 2009). Assim, o processo de análise dos dados deve ser criativo e intuitivo, sendo importante que o pesquisador seja

72 sensível ao aparecimento de pressupostos não estabelecidos e significados ainda não articulados.

3.4.1.1 Tipos de estudo de caso

Yin (2010) trabalha com quatro tipos de projetos de estudos de caso semelhantes: a) projetos de caso único (holístico); b) projeto de caso único (integrados); c) projetos de casos múltiplos (holísticos); d) projetos de casos múltiplos (integrados).

Os projetos de caso único são justificáveis quando o caso apresentar: a) um teste crítico da teoria existente; b) uma circunstância rara ou exclusiva; c) um caso representativo ou típico; d) uma proposta reveladora; e) uma proposta longitudinal (YIN, 2010).

Segundo Yin (2010), um passo importante no projeto e na condução de um caso único é a definição da unidade de análise (ou o próprio caso). No caso único ainda podem ser integradas subunidades de análise, para que seja desenvolvido um projeto mais complexo ou integrado. As subunidades podem acrescentar, muitas vezes, oportunidades significativas para a análise extensiva, favorecendo os insights ao caso único (YIN, 2010). No entanto, adverte Yin (2010), se for dada demasiada atenção a essas subunidades e se os aspectos holísticos maiores do caso começarem a ser ignorados, o próprio estudo de caso terá mudado sua orientação e modificado sua natureza. Se a mudança for justificável, é preciso abordá-la explicitamente e indicar sua relação com a investigação original.

O mesmo estudo pode conter mais do que um único caso. Quando isso ocorrer, o estudo usou um projeto de casos múltiplos e seu uso pode ser justificado quando os projetos derivarem, diretamente, de seu entendimento das replicações literais e teóricas.

Qualquer uso dos projetos de casos múltiplos deve seguir uma replicação, não uma lógica de amostragem, e o pesquisador deve escolher cada caso cuidadosamente. Os casos devem servir de maneira similar aos experimentos múltiplos, com resultados similares (replicação literal) ou resultados contrastantes (replicação teórica) previstos explicitamente no início da investigação.

Os casos individuais em um projeto de estudo de casos múltiplos podem ser holísticos ou integrados. Quando um projeto integrado é usado, cada estudo de caso

73 individual pode de fato incluir a coleta e a análise de dados quantitativos, incluindo o uso de levantamentos em cada caso.

Através de outro ponto de vista, Merriam (1988) classifica os estudos de caso, considerando a natureza de seus objetivos, em descritivo, interpretativo e avaliativo. Para chegar a esta classificação, o pesquisador deve se pautar em quatro questionamentos básicos: a) o trabalho é marcadamente descritivo?; b) apresenta interpretação dos dados?; c) elabora algum tipo de teoria?; d) avalia (ou julga) algum tipo de programa?

Em suma, tendo em vista a unidade de análise investigada, o estudo caso pode ser: a) de caso único (holístico); b) de caso único (integrados); c) de casos múltiplos (holísticos); d) de casos múltiplos (integrados). Já quanto à natureza de seus objetivos, o estudo de caso pode ser: a) descritivo; b) interpretativo; c) avaliativo.

3.4.1.2 A qualidade no estudo de caso

A fim de evitar as críticas quanto ao rigor científico desse método de pesquisa, os projetos de estudo de caso precisam maximizar sua qualidade por meio de quatro condições, as quais são aplicadas a todos os métodos das ciências sociais: a) a validade do constructo; b) a validade interna; c) a validade externa; d) a confiabilidade (YIN, 2010).

A validade do constructo na investigação científica pode ser garantida se o pesquisador seguir dois passos essenciais: a) definir a mudança em termos de conceitos específicos (e relacioná-los aos objetivos originais do estudo) e; b) identificar as medidas operacionais que combinam os conceitos (preferencialmente citando os estudos publicados que fazem as mesmas combinações).

Yin (2010) indica três táticas para garantir a validade do constructo: a) a utilização de múltiplas fontes de evidência; b) o encadeamento das evidências; c) a utilização de informantes-chave para a revisão do rascunho do relatório do estudo de caso.

No tocante à validade interna, o problema para as pesquisas que utilizam o método de estudo de caso estende-se a realização de inferências. Basicamente, um estudo de caso envolve uma inferência cada vez que um evento não pode ser diretamente observado. Dessa forma, o investigador fará uma inferência de que um

74 determinado evento resultou de alguma ocorrência anterior, baseado na entrevista e na evidência documental coletada como parte do estudo de caso.

As táticas indicadas por Yin (2010) para o teste da validade interna são: a) a realização de combinação de padrão; b) a realização da construção da explanação; c) a abordagem das explanações rivais; d) a utilização de modelos lógicos.

O terceiro teste trata do problema de saber se as descobertas do estudo são generalizáveis além do estudo de caso imediato. Para realizar este teste, Yin (2010) indica duas táticas: a) a utilização de teoria nos estudos de caso únicos; b) a utilização da lógica da replicação nos estudos de casos múltiplos.

Por fim, a confiabilidade tem como objetivo garantir que outro pesquisador, ao realizar o mesmo procedimento, encontre os mesmos achados e conclusões. Um pré- requisito para permitir que este outro pesquisador repita um estudo de caso anterior é a necessidade de documentação dos procedimentos seguidos no primeiro caso.

Yin (2010) indica duas táticas específicas para tornar as etapas do processo as mais operacionais possíveis: a) o uso de um protocolo de estudo de caso para tratar do problema da documentação em detalhes; b) o desenvolvimento de uma base de dados do estudo de caso.