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CAPÍTULO 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.2. O estudo de microfácies carbonáticas

O conceito original de microfácies proposto por Brown (1943) e posteriormente por Cuvillier (1952) refere-se ao estudo petrográfico baseado em critérios exclusivamente petrográficos e paleontológicos, em lâminas delgadas. Flügel (2004, p. 1) admite que atualmente o termo microfácies se refira ao “total de dados sedimentológicos e paleontológicos que podem ser descritos e classificados a partir de seções delgadas, peels, seções polidas ou amostras de rocha”. No presente estudo, o termo microfácies será utilizado de forma similar ao proposto originalmente, a partir da análise das feições petrográficas e micropaleontológicas em seções delgadas, especialmente por se tratar de rochas carbonáticas de granulometria fina, em sua maioria.

Wilson (1986) apresentou 24 tipos de microfácies carbonáticas, designadas como “microfácies-padrão” (Standard Microfacies – SMF). O autor assume que limitar o número de classes de microfácies é uma simplificação, podendo conter inconsistências e omitir algumas variações, dado o número de parâmetros que controlam a deposição carbonática (profundidade, latitude, salinidade, penetração da luz, entre outros). Porém, defende que este agrupamento é aplicável a suficientes fácies conhecidas, demonstrando sua acuidade e utilidade na redução a uma limitada quantidade de tipos microfaciológicos. Outra observação é que esse sistema de microfácies-padrão não emprega aspectos de fauna e flora específicos, de modo que seja empregado em rochas de diversas idades. Por outro lado, o sistema carbonático é fortemente influenciado por mudanças biológicas, o que pode gerar dúvidas em sua aplicação.

Dadas às peculiaridades da seção estudada por este trabalho, foi utilizada a classificação de microfácies carbonáticas proposta por Dias-Brito (1995), com pequenas adaptações, como detalhado adiante no item 4.1.

3.2.1. Técnicas empregadas no estudo microfaciológico

Ainda que a microscopia óptica seja a base do estudo de microfácies carbonáticas, devido a sua maior difusão e baixo custo, existem algumas técnicas adicionais que promovem um avanço na análise microfaciológica, como a catodoluminescência óptica e Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) com análises por espectrometria de raios-X por dispersão de energia integradas (Energy Dispersive X-Ray Spectrometry – EDS) (BOGGS Jr; KRINSLEY,

2006; FLÜGEL, 2004; SCHOLLE; ULMER-SCHOLLE, 2003). Estas técnicas fornecem informações diretas e indiretas sobre a composição química das rochas em escalas reduzidas, por meio de análises in situ em seções delgadas ou amostras de mão, permitindo a identificação da distribuição dos elementos nas diferentes fases minerais. Desta forma, são técnicas essenciais para a integração do estudo geoquímico com a petrografia, buscando avanços na definição da história deposicional e diagenética das rochas carbonáticas.

Microscopia óptica e classificação de rochas carbonáticas

O estudo de microfácies carbonáticas se fundamenta nas descrições feitas ao microscópio petrográfico convencional (óptico), com a identificação dos grãos constituintes biogênicos, bioquímicos e/ou químicos, matriz, textura e fábrica, permitindo a classificação das rochas carbonáticas, além do estudo dos processos diagenéticos. A classificação utilizada por este trabalho segue a proposta por Dunham (1962).

Catodoluminescência óptica (CL)

A catodoluminescência é o fenômeno de emissão de fótons a partir do bombardeamento de um material por um feixe de elétrons (BOGGS Jr; KRINSLEY, 2006). A emissão de catodoluminescência se deve à presença de “armadilhas” na estrutura mineral, denominadas centros de luminescência, e podem ser de dois tipos: centros intrínsecos, causados por imperfeições na estrutura cristalina; ou centros extrínsecos, causados por impurezas incorporadas pelo mineral durante sua cristalização. O segundo tipo é o que emite a catodoluminescência de interesse ao estudo de carbonatos, podendo-se inferir a composição de fluidos responsáveis pela cristalização destes minerais. Desta forma, a catodoluminescência é utilizada nos estudos de rochas carbonáticas sobre aspectos sedimentológicos e diagenéticos, principalmente.

Nos carbonatos, a luminescência extrínseca é controlada principalmente pela abundância relativa dos íons Mn2+ e Fe2+, também podendo ser afetada por alguns Elementos Terras Raras (ETR). Os íons Mn2+ e alguns ETR trivalentes são os principais ativadores de luminescência em carbonatos, enquanto o Fe2+ é o principal inibidor (MACHEL, 2000; RICHTER et al., 2003). As cores mais comuns de luminescência extrínseca em carbonatos são amarelo-alaranjado, laranja amarelado e laranja (HABERMANN et al., 2000).

A relação entre a concentração dos íons ativadores e inibidores com a emissão de catodoluminescência ainda não foi completamente esclarecida, sendo uma função complexa

entre as concentrações de Mn2+ e Fe2+ nos carbonatos (BOGGS Jr; KRINSLEY, 2006). A questão é se a luminescência depende da relação entre as concentrações Fe/Mn, representando a abundância relativa, ou se é controlada pela concentração absoluta destes íons. Marshall (1988) defende a primeira das opções, enquanto Habermann et al. (1998; 2000) e Budd et al. (2000) sugerem que a catodoluminescência seria controlada apenas pelo conteúdo de Mn2+, dentro um limite máximo de Fe2+. As concentrações de Mn2+ e Fe2+ necessárias para ativação e inibição, respectivamente, variam consideravelmente entre estes trabalhos. Haberman et al. (2000) ainda apontam para uma auto-inibição quando os teores de Mn2+ são muito altos (> 1000 ppm).

De qualquer forma, a importância está no fato da emissão de catodoluminescência em carbonatos depender da presença dos íons Mn2+ e Fe2+, principalmente, o que torna esta ferramenta útil ao estudo das condições físico-químicas durante a cristalização desses minerais. Vários processos influenciam a presença desses íons nos carbonatos, como coeficientes de atividade dos íons, atividade do cálcio, espécies químicas em solução, temperatura, estrutura cristalina, taxa de cristalização, pH, reações de oxirredução, entre outros. São quatro os grupos principais: (i) mudanças no potencial redox, de difícil avaliação; (ii) partição elementar em sistema fechado, sendo que variações de elementos traço em fluidos diagenéticos são governados pelo grau de abertura do sistema; (iii) maturação de matéria orgânica e (iv) diagênese de argilominerais, como fontes de ativadores (Mn2+ e ETR trivalentes; MACHEL, 2000).

A principal aplicação da técnica de catodoluminescência em rochas sedimentares carbonáticas está no estudo de diagênese, envolvendo processos biológicos (e.g. boring e bioerosão), físicos (compactação mecânica) e químicos (dissolução, cimentação, neomorfismo, etc). Tais processos se dão em diferentes tempos (eo-, meso- e telodiagênese), a diferentes profundidades, ou seja, em diferentes condições físico-químicas, justificando a necessidade de caracterização dos fluidos diagenéticos. A utilização desta técnica na diagênese se faz em grande parte associado à investigação de processos químicos, em especial a cimentação, em um tipo específico de estudo denominado cement stratigraphy (EVAMY, 1969; MEYERS, 1974; 1991). Trata-se da identificação das diferentes fases de cimentação por meio da diferença de catodoluminescência emitida por elas, permitindo a caracterização da evolução do fluido, de diferentes fases de diagênese e até mesmo correlação de superfícies diagenéticas, aplicado principalmente ao estudo de reservatórios de hidrocarbonetos.

Uma aplicação secundária da técnica às rochas carbonáticas, porém de interesse principal ao presente estudo, se faz na petrografia carbonática, auxiliando no reconhecimento de feições reveladas de forma mais clara quando comparadas às imagens do microscópio óptico de luz transmitida (e.g. FLÜGEL, 2004, RICHTER et al., 2003, SCHOLLE; ULMER- SCHOLLE, 2003).

Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV)

O estudo ao MEV permite a visualização de aspectos morfológicos em altas magnificações (dezenas de milhares de vezes), com diversas aplicações no estudo de microfácies carbonáticas, como análises de matriz, especialmente em calcários finos; composição e estrutura de microfósseis e de grãos não-biogênicos; estudo de nanofósseis; distribuição e geometria de microporos; mineralogia, morfologia e relações espaciais de cimentos; estágios de dolomitização, entre outros (FLÜGEL, 2004). Adicionalmente, a análise integrada de EDS permite análises geoquímicas qualitativas a semi-quantitativas. O mapeamento elementar ilustra a distribuição elementar ao longo das diferentes fases minerais, entre cimento e grãos, por exemplo.

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