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Mapa 3: Eixos estruturantes de Marabá

3 FRENTES DE EXPANSÃO E A FORMAÇÃO DAS CIDADES NA

3.1 O EXTRATIVISMO E A REDE DE CIDADES NA AMAZÔNIA (1850/1920)

As duas primeiras décadas do século XX configurou momento de intensas transformações no âmbito do processo de produção do espaço regional amazônico, face às novas dinâmicas econômicas empreendidas pelo modo de produção capitalista. Nesse sentido, a expansão da demanda internacional pela borracha (hevea Brasiliensis) contribuiu decisivamente para o dinamismo econômico e demográfico de algumas cidades amazônicas e particularmente da metrópole primaz (Belém).

O “boom” da demanda por borracha nos mercados internacionais, o elevado preço que este produto alcançou nos mesmos mercados, associado à relativa abundância de borracha em áreas do território amazônico, são fatores que contribuíram para a dinamização das atividades de extração e comercialização da borracha, em que pese os problemas de escassez de transporte e de mão de obra, além da reduzida oferta de capitais para o financiamento da produção nas décadas de 1850 e 1860 (MACHADO, 1987).

Tabela 1: Evolução da produção da borracha na Amazônia Anos Quantidade em Toneladas

1841-1850 4.600 1851-1860 19.000 1861-1870 37.000 1871-1880 60.000 1881-1890 110.000 1891-1900 210.000 1901-1910 350.000 Fonte: FURTADO (1967)

A tabela 1 demonstra um crescimento da produção de borracha na Amazônia entre as décadas de 1840 e 1910. Nesse sentido, o aumento da produção de borracha da ordem de 13.400 toneladas, entre as décadas de 1840-50 e 1850-60, significou um crescimento percentual de cerca de 410%. Os dados revelam o grau de importância econômica que este produto extrativo passou a exercer no âmbito da produção regional.

As novas dinâmicas de produção do espaço regional decorrente, em parte, do crescente mercado da borracha, repercutiram em mudanças como resultado do “revigoramento” econômico e demográfico das cidades já existentes, além de uma intensificação das relações entre núcleos de povoamento (CORRÊA, 1987). No que tange às relações de trabalho que se estabeleceram no âmbito desse período de valorização da atividade da borracha, convém ressaltar a prática do “aviamento”, cujas bases se amparavam na exploração da mão de obra de coletores de borracha.

É nesse contexto de modificações e de inserção de novos territórios do Estado do Pará, num contexto de divisão territorial do trabalho, que surgiram povoados, mais tarde transformados em cidades, como Marabá, em 1898; São João do Araguaia, em 1901. Por sua vez, os então povoados como os de São Vicente do Araguaia, (atual Araguatins), fundado em 1872; Vila Nova de Imperatriz, com fundação em 1856; e cidade de Carolina, fundada em 1859, constituíram-se cidades importantes no contexto de produção territorial da fronteira entre os Estados do Pará, Maranhão e Goiás (figura 1).

Em relação ao sudeste paraense, como já ressaltado anteriormente, o processo de produção e comercialização do látex influenciou decisivamente na formação e consolidação de vilas e cidades no Estado do Pará, nos primeiros anos do século XIX. Quando se considera o Sul e Sudeste paraense, a cidade de Marabá, nos primeiros momentos de sua formação socioespacial, apresentou uma dinâmica econômica relacionada, primordialmente, à atividade

do caucho, passando a exercer função importante como entreposto comercial que demandou produtos, mão de obra e serviços de outros povoados, vilas e cidades que surgiram às margens do curso médio e alto do rio Tocantins, e que sofreram processo de mudança, em função do papel complementar que tais assentamentos humanos passaram a exercer no âmbito da divisão territorial do trabalho (VELHO, 1981).

Dentro dessas circunstâncias, localidades como Alcobaça (atual Tucuruí), Lago Vermelho (atual Itupiranga), São João do Araguaia, Araguatins (no rio Araguaia, limite entre os Estados do Pará, Maranhão e Goiás), Imperatriz e Carolina, que se constituíam pequenos núcleos populacionais “decadentes” durante o século XIX, passaram a se “soerguer” a partir do início do século XX, em função da nova dinâmica de estruturação das atividades extrativas do caucho, que tiveram Marabá como base logística para a expansão das relações comerciais no sudeste paraense (VELHO, 1981).

O processo de articulação entre os respectivos núcleos populacionais se constituiu elemento central para a reprodução socioespacial de vilas e cidades no sul e sudeste paraense, além de induzir novas dinâmicas econômicas em outros núcleos populacionais fronteiriços como Imperatriz, Carolina, Porto Real, nos Estados do Maranhão e Goiás, outrora considerados “decadentes” (VELHO, 1981).

Em que pese o crescimento da importância do núcleo populacional de Marabá, como espaço de comercialização de caucho e de outros produtos de consumo local, no início do século XX (ARQUIVO PÚBLICO DO PARÁ, 1916), destaca-se o aumento da importância e do papel de cidades como Santarém, Cametá, Bragança e, particularmente, Belém.

Figura 1: Situação de Marabá no contexto paraense até os anos de 1950. Fonte: VELHO (1981)

A figura 1 permite que se evidencie não apenas a localização de algumas cidades, como também a lógica de organização das mesmas às margens dos rios. Levando em consideração a situação geográfica de Marabá às margens do Tocantins e Itacaiunas, esse instrumento cartográfico permite evidenciar a inserção de algumas cidades do sul e sudeste

paraense dentro do padrão de organização relacionado às redes de rios, que ditavam o tempo das atividades produtivas, o modo de vida, as relações de compra e venda de produtos e serviços. Nesse sentido, a dinâmica econômica inerente ao comércio do caucho, no início do século XX, transformou paulatinamente a cidade de Marabá em

[...] centro de polarização para uma vasta zona, tanto em termos de atração de contingentes populacionais, quanto em face das exigências de abastecimento, dadas as características exclusivistas da atividade extrativa (VELHO, 1981, p.43).

Tais dinâmicas econômicas tiveram reflexo na indução de contingentes demográficos, que passaram a se deslocar para trabalhar na atividade extrativa, repercutindo em aumento considerável no volume de trocas comerciais, quando considerados os padrões amazônicos. A esse respeito, Velho (1981) assim discorre acerca da cidade de Marabá nas duas primeiras décadas do século XX:

Desde o Piauhi, todo sertão exportou viveres, carne de boi e de porco; toucinho, farinha seca e de [sic], assucar, rapadura, cachaça, tabaco, doces, queijos, gallinhas, ovos bois vivos, porcos e vacas paridas, até as laranjas, abóboras e inhames para a phantastica e maravilhosa Marabá, surgida de repente como obra da magia na foz do escuro rio Tacai-una (CARVALHO apud VELHO, 1981, p.43).

A condição assumida pela cidade de Marabá, no início do século XX, como o mais importante centro comercial do sul e sudeste paraense, contribuiu para induzir fluxos migratórios de outras áreas para esta cidade, estimulou a estruturação de uma rede de relações comerciais entre Marabá e outras cidades paraenses, que foram fundadas ao longo do rio Tocantins, como Cametá, Baião, Alcobaça, Lago Vermelho, São João do Araguaia (na confluência entre os Rios Tocantins e Araguaia), além de cidades maranhenses (Imperatriz, Carolina) e Goianas (Araguatins, Porto Real, Boa Vista), cujo caráter de complementaridade comercial se fez elemento importante para a manutenção da importância e do papel exercido pela cidade de Marabá naquele momento histórico-geográfico. Estas reflexões serão retomadas a seguir.