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Ó universo, novelo emaranhado, Que paciência de dedos de quem pensa Em outras cousa te põe separado?

(Fernando Pessoa)

Este capítulo constitui-se em uma reflexão sobre o processo de financiamento do Ensino Médio público, no Brasil, por meio de seus documentos, instituições e organismos internacionais, bem como da teoria dos pesquisadores da área, com a finalidade de compreender as políticas e apreender a luta pela consolidação de recursos financeiros necessários.

1 O financiamento do Ensino Médio na legislação brasileira

No Brasil pós-regime militar, os setores políticos, a academia, a Igreja, enfim, a sociedade civil organizada28se movimenta para participar da elaboração de uma nova constituição, promulgada em 1988. A atual política de financiamento da educação brasileira está organizada nessa Constituição Federal de 1988, pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e pelo Plano Nacional de Educação – Lei 10.172 de 2001. Outras fontes do financiamento da educação, além da vinculação de impostos, são as provenientes das contribuições sociais29. A política de vinculação de índices mínimos de impostos30 a

28 Para clarear a participação ver: ADRIÃO, Theresa. Et.tal. A gestão Democrática na Constituição Federal de

1988, p.72, nota 3 e 4, e ressalva na p. 78. In: OLIVEIRA, Romualdo Portela e ADRIÃO, Theresa (Orgs.).

Gestão e financiamento e Direito da educação. São Paulo: Xamã, 2001.

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Outras fontes, para além da vinculação de impostos, são as provenientes das contribuições sociais. Quatro são as mais significativas para a educação: 1) o Salário-Educação: Oliveira, 2001, mostra que é uma contribuição social específica para o Ensino Fundamental, que tem suas raízes em 1934, mas tornou-se efetivo a partir de regulamentação da Lei 4.440/1964 e do Decreto-Lei nº 55.55/65, sofrendo, no tempo, sucessivas modificações 2) a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins: representa 3% sobre o faturamento mensal das empresas, compreendendo a receita bruta mensal das vendas de mercadorias e os serviços de qualquer natureza, excetuando-se as vendas para o exterior e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) já pago.; 3) a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido da Pessoa Jurídica – CSLLPJ: são recursos provenientes do cálculo sobre lucro líquido do exercício, 12% para entidades financeiras e 8% para as demais empresas e 4) Contribuição sobre a Receita de Concursos e Prognósticos: são provenientes do valor global das apostas computadas em cada concurso prognóstico e distribuídos da seguinte maneira: 22,4% vinculados à seguridade social, 9,6% ao crédito educativo e 3% ao Fundo Penitenciário. Os demais recursos como a Renda Líquida da Loteria Federal Instantânea são destinados às premiações e despesas operacionais. Os três últimos recursos são aplicados em

serem aplicados em educação está assegurada pelo Art. 212, da Constituição Federal de 1988, que determina a aplicação mínima de 18% por parte do Governo Federal e 25% pelos estados e municípios para Manutenção e Desenvolvimento do Ensino – MDE. O Capítulo II, Dos Direitos Sociais, Artigo 6º31 determina: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

Oliveira afirma que:

O grande marco na tímida tentativa histórica de construção de um Estado de Bem-Estar Social no Brasil foi a promulgação da Constituição Federal de 1988, chamada de “Constituição Cidadã”. Promulgada num contexto político de retorno à democracia, de acesso das lutas populares e sociais, a Constituição sintetizou as contradições do processo de redemocratização. Ao mesmo tempo em que reconheceu vários direitos sociais, pela primeira vez em nossa história, em muitas outras questões foi aprovado um texto ambíguo ou insuficiente em face das demandas populares, permitindo a Florestan Fernandes utilizar o termo "Constituição Inacabada" para caracterizá-la. (OLIVEIRA, 2006, p. 87).

A afirmativa de Oliveira deriva de que a Constituição amplia os deveres do Estado, não obstante, no cenário brasileiro já se delineie o discurso e as práticas neoliberais, como se verá na seqüência, como impositivas de limites para o Estado benfeitor. Jacobi (1993, p. 23) argumenta que essa ampliação consolida as pressões democratizantes que já se faziam sentir há mais de uma década. No entanto, Gutemberg, em tom de denúncia afirma:

A Constituição foi aprovada em época de euforia pós-regime autoritário, em que tudo parecia possível com a volta da democracia, e apresenta, por isso, um viés assistencialista chegando a assumir, às vezes, caráter utópico. Em virtude dessa ocorrência ela promoveu grande aumento de responsabilidade da União, especialmente na área da educação, ao mesmo tempo, que foram reduzidos substancialmente seus recursos, não só porque o país ficou mais pobre, mas inclusive por terem sido aumentadas as transferências de recitas para estados e municípios. (GUTEMBERG, 1993, p. 86).

Observa-se, então, uma Constituição Federal que reafirma a gratuidade do ensino público em todos os níveis e a obrigatoriedade do ensino fundamental de responsabilidade prioritária dos municípios, complementada pelo Estado. O Ensino Médio teve direito programas suplementares de alimentação, assistência médico-odontológica, farmacêutica e psicológica, e outras formas de assistência social (CASTRO, 2001, p. 15).

30Romualdo Portela Oliveira, 2001, no texto O financiamento da educação, entende que, no contexto das

políticas governamentais oriundas da Constituição Federal de 1988, “a discussão acerca da alíquota a ser vinculada está relacionada com a média histórica da aplicação de recursos em educação” (p. 99). Segundo o autor, observa-se, ao longo da história recente do financiamento, que o aumento de valores tem sido realizado em alíquotas mínimas a cada luta travada.

31 A este artigo foi dada nova redação pela Emenda Constitucional nº 26, de 14/02/2000, a qual acrescenta a

garantido, de forma progressiva, e isso ocorreu pela primeira vez na história das constituições, assim como firmou o direito à creche e à pré-escola. A afirmação de Gutemberg (1993) faz sentido, porque, somente neste século, o ensino fundamental praticamente universalizou-se e, ainda assim, com qualidade muito precária.

Ao discutir os anos noventa e a inflexão neoliberal clássica, Oliveira (2000, p. 79) afirma que o avanço constitucional ocorreu pela metade, mesmo com os ganhos considerados impossíveis de serem cumpridos. Estes estavam distantes das reivindicações de origem. Segundo o autor, em 1993, cinco anos após a promulgação da Constituição, o texto era o mesmo, mas “as correlações de forças nacionais e internacionais mudaram substancialmente” e os conservadores desenvolviam ampla campanha para modificá-la.

Na área da educação, a elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB, cujos primeiros anteprojetos foram apresentados ainda em 1988, mas só aprovada em 1996, reflete essa mudança na correlação de forças. [...] Paulatinamente vão se retirando as formulações mais democráticas e includentes. (OLIVEIRA, 2000, p. 80)

Um exemplo da supressão do texto da LDB, constatada pelo autor, foi o Salário Educação e a organização do Conselho Nacional de Educação. Oliveira chama a atenção para novos rumos como a descentralização de responsabilidades, mais claramente definida na LDB nos artigos 8, 9, 10 e 11, em que os Estados, Distrito Federal e Municípios ficam com a responsabilidade de gerir as diferentes redes de escolas. “Ao mesmo tempo, introduz-se nova concepção de controle, realizado indiretamente pelos resultados obtidos pelos alunos nos testes sistêmicos”. (OLIVEIRA, 2000, p. 84).

A descentralização do financiamento ocorre por meio da Emenda Constitucional 14/96 que, ao alterar o art. 60 das Disposições Transitórias e o art. 211 da Constituição Federal de 1988, retira da União a responsabilidade de aplicar montantes significativos na educação básica. Essa esfera administrativa fica com a função “redistributiva e supletiva”; portanto, em posição secundária em relação às funções de manutenção e desenvolvimento do ensino dos Estados, Distrito Federal e Municípios. Essa mudança, propalada pela mídia com grande “barulho”, camuflou a saída da União do investimento na educação básica, apesar do discurso de que essa era a prioridade do Governo Federal. (OLIVEIRA, 2000, p. 84-87)

O financiamento da educação foi totalmente reorganizado por meio da Emenda Constitucional 14/96, que centrou recursos na universalização do Ensino Fundamental. Esta

modificou os artigos 34, 208, 211 e 21232 e deu nova redação ao art. 60 das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988, priorizando recursos para o Ensino Fundamental, por meio da criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – FUNDEF33.

Para Pinto (2002a, p. 114), a medida de maior impacto da Emenda 14 está contida na modificação do art. 60 do Ato das Disposições Transitórias da CF/1988, que desobriga a União de erradicar o analfabetismo e de assegurar a educação de jovens e adultos. O autor destaca as modificações feitas pelos incisos I e II do art. 208 da CF/88 que desobrigou o poder público de atendimento a todas as pessoas que estão fora do ensino fundamental na idade própria.

Esse Fundo entrou em vigor a partir de 1998 e foi extinto em 2006, quando foi substituído pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, criado em 28/12/2006, a ser analisado, ainda, neste texto.

Pinto (1999) esclareceu que, na política anterior, o montante de recursos do FUNDEF destinado para financiar apenas o Ensino Fundamental, o fez de forma precária. À época de sua análise, as matrículas do Ensino Fundamental brasileiro atingiam 70% de alunos, enquanto os investimentos em educação atingiam 60% dos gastos com o ensino dos estados e municípios e menos de 10% dos gastos da União (p. 90-91).

Dessa forma, o FUNDEF não modificou em essência a organização e a estrutura do financiamento da educação brasileira, assim como não trouxe recursos novos para o ensino

32 Ver SAVIANI, 2007, p. 83-84.

33 O FUNDEF funcionou por meio de uma conta bancária especial, aberta nos Estados e Distrito Federal. A

União repassava os recursos destinados ao ensino fundamental, automaticamente, para a conta, de acordo com os prazos estabelecidos nos incisos I, II, III, § 5º, art. 69 da LDB nº 9394/96. Os recursos que o compõem derivam do percentual mínimo de 25% de impostos próprios e transferidos dos Estados, Distrito Federal e Municípios, prescritos no art. 212 da CF/88. Desse percentual, 15% dos impostos: ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços); FPE (Fundo de Participação Estadual); FPM (Fundo de Participação Municipal; IPI- Exportação e Desoneração de Exportações, de que trata a Lei Complementar nº 87/96 (Lei Kandir).

A distribuição desses recursos entre cada Estado e seus municípios é proporcional ao número de alunos matriculados nas respectivas redes escolares públicas do ensino fundamental, de acordo com um valor mínimo- aluno estipulado anualmente pelo Governo Federal. Tanto a Emenda Constitucional como a Lei nº 9.424/96 estipulam esse valor, como forma de garantir um padrão mínimo de qualidade de ensino e eqüidade na distribuição de recursos. A Emenda Constitucional nº14/96 ainda determina que a União complemente esse valor sempre que o orçamento local não atingir o mínimo definido nacionalmente.

O FUNDEF especificou claramente que a responsabilidade de universalização do ensino fundamental é dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios. À União fica reservada a função redistributiva e supletiva, com o fim de garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade de ensino.

22 Não é objetivo deste trabalho analisar o FUNDEF, mas os seus efeitos sobre o ensino médio. Para

compreendê-lo, ver entre outros, Saviani (1997), Monlevade e Ferreira (1997), Melchior (1997), Pinto (2000, 2001, 2002, 2002a, 2004, 2005) Davies, (1998, 2001, 2002), Dourado, 1999, Pinto, 2000; Oliveira e Adrião, 2001, Marcelino R. Pinto, 2000, 2001, Castro (2001).

fundamental, embora se concretizasse a descentralização de recursos e de poder como mecanismos de democratização, até aos dias atuais.

As pesquisas de vários estudiosos sobre o FUNDEF, estudadas a seguir neste capítulo, constataram os impactos dessa política de valorização do Ensino Fundamental, em detrimento das demais modalidades, Educação Infantil e Ensino Médio.

Conforme referência anterior sobre a escassez de verbas para a educação, mesmo canalizando a maior parte dos recursos financeiros para o Ensino Fundamental, os números denunciam os baixos valores propiciados pelo Fundo. Pinto (2005, p. 76) constatou que, em “21 dos 26 Estados do País, os valores garantidos por aluno estão abaixo do R$100/mês e, em 7 estados, abaixo dos R$50/mês, um valor claramente insuficiente para assegurar um padrão mínimo de qualidade de ensino”.

A prioridade dada ao ensino fundamental se deve ao compromisso assumido pelo Brasil, em 1990, por ocasião da Conferência de Educação para Todos, em Jomtien, na Tailândia, que resultou na Declaração Mundial sobre Educação para Todos, a partir da qual o Brasil elaborou o Plano Decenal de Educação para Todos. Sobre a Conferência, explica Pinto:

[...] teve como co-patrocinador, além da UNESCO e do UNICEF, o Banco Mundial, inaugurando a priorização sistemática do ensino fundamental, em detrimento dos demais níveis de ensino, e de defesa da relativação do dever do Estado com a educação, tendo por base o postulado de que a tarefa de assegurar a educação é de todos os setores da sociedade. (PINTO, 2002a, p. 110).

Depreende-se da análise do autor de que o Estado se exime, em parte, de seu papel de provedor da educação, responsabilizando a sociedade que deverá contribuir com mais recursos, além dos impostos que já paga. Pinto (2002a) afirma que, a partir do Plano Decenal, duas medidas referentes ao financiamento da educação foram tomadas já no Governo de Fernando Henrique Cardoso: a canalização de recursos para o ensino fundamental por meio do FUNDEF e a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Esse deslocamento de recursos, segundo Castro (2001, p, 18), ocasionou efeitos nas regiões do nordeste e do Rio de Janeiro, que ficaram impedidas de ampliar o atendimento educacional nas outras modalidades e etapas da educação básica. Isso ocorreu justamente no momento em que, além da concentração de verbas no Ensino Fundamental, os governos

foram pressionados pela União a realizar ajustes fiscais, conter despesas (Lei Camata)34 e a negociar a dívida estadual.

A pesquisa, em rede nacional, sobre o processo de implantação e impactos do FUNDEF35 (2003) aponta que a valorização do Ensino Fundamental ocorre com a redução do financiamento das demais etapas de ensino e modalidades que ficaram fora dos benefícios do Fundo. Essa pesquisa36 evidenciou os impactos mais fortes e as artimanhas contábeis dos Governos nas prestações de conta. Os estudos comprovam ampliação dos recursos financeiros aplicados no Ensino Fundamental, em detrimento do atendimento da Educação Infantil, Ensino Médio, Educação de Jovens e Adultos.

O fato de a distribuição do FUNDEF ser feita pelo número de alunos matriculados, levou muitos estados a redistribuírem verbas às redes municipais. Foi o caso do Rio de Janeiro que, em 2000, depositou no FUNDEF “um milhão, cento e sessenta e três mil reais” (R$1.163.000,00) e recebeu de volta para investir no Ensino Fundamental apenas metade desses recursos. No mesmo ano, em Mato Grosso do Sul, o retorno significou 26% menos do que o depositado; no estado do Paraná, a redução de verbas foi drástica: o governo investia 28,1% da Receita Total de Impostos e com o FUNDEF passou a investir 12,8% em 2000. No estado da Paraíba, mostra o pesquisador Luiz de Souza Junior (2003), o FUNDEF não resolveu sequer os problemas do Ensino Fundamental, mesmo com uma pequena suplementação de verbas por parte do MEC. O investimento no Ensino Fundamental chegou a consumir 90% da verba educacional, ficando comprometido o atendimento da Educação Infantil nas redes municipais, e do Ensino Médio, na rede estadual.

O investimento no Ensino Fundamental criou outra necessidade conforme atesta Pinto (2004, p. 316). As matrículas no Ensino Médio ampliaram-se em 232% em todo país; o que torna grande o desafio que o poder público tem pela frente para atender a essa demanda

34 Refere-se à Lei Complementar nº 82/1995 que disciplina os limites das despesas com o funcionalismo público,

na forma do art. 169 da Constituição Federal. (Lei Camata), revogada pela LCP nº 96/99, revogada pela Lei nº 10/2000, em vigor, estabelecendo normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências.

35 Trata-se de vários grupos de estudo que formaram a Rede Nacional de Pesquisa do Fundef constituída por

pesquisadores de instituições de ensino e de pesquisa em vários estados brasileiros (BA, PR, SP, RS, MG, RJ, MS, MT, MA, PA, PB, PI,), com projeto intitulado: “Processo de Implantação e Impacto do FUNDEF em Estados e Municípios: casos e comparações com vistas a uma avaliação”, Coordenado por Romualdo Portela Oliveira – USP, concluído em 2003.

36 O Jornal Gestor em Educação nº 4, de maio e junho de 2003, da Associação Nacional de Política e

Administração da Educação – ANPAE – publicou os artigos: Artimanhas contábeis comprometem direito à

educação, de Berta do Valle e outros autores de um grupo de pesquisa do Estado do Rio de Janeiro; FUNDEF no Mato Grosso do Sul: impactos e realizações; de Regina Tereza Cestari de Oliveira e outros pesquisadores

do Estado de Mato Grosso do Sul; e FUNDEF no Paraná: caem investimentos em educação e cultura de Andréia Barbosa Gouveia e outros autores, pesquisadores do Estado do Paraná.

sem financiamento específico. A superação desses desafios, afirma o mesmo autor (2002, p. 24), está em desativar o FUNDEF e substituí-lo pelo FUNDEB e, ainda, criar condições para o cumprimento das metas para o Ensino Médio. O Plano Nacional de Educação sinaliza a necessidade de recursos da ordem de 10% do PIB; no entanto, afirma ser esse um percentual muito elevado e propõe um gasto de 7,5% do PIB nos próximos dez anos, enquanto o potencial atual está em 4,5% do PIB.

Conforme já se mencionou, anteriormente, esgotado o tempo estabelecido para a política de financiamento da educação por meio do FUNDEF, em 19 de dezembro de 2006 é criado, oficialmente, por meio da Emenda CF/88 nº 53 e regulamentado pela Medida Provisória 339, de 29 de dezembro do mesmo ano, o FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação. O propósito é universalizar a Educação Básica, ou seja, a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio; valorizar os profissionais da educação (professores, diretores, pedagogos, funcionários de secretaria, merendeiros e outros) e melhorar a qualidade da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e Médio.

Em relação ao Ensino Médio, contemplado pelo FUNDEB, impõe-se uma retrospectiva à sua condição constitucional, para melhor apreendê-lo em seus fundamentos legais. A Constituição Federal de 1988 entendeu-o como direito do cidadão e dever do Estado, conforme preceitua o seu art. 208. Esse preceito foi reforçado pelo art.211da mesma Constituição Federal e pelo art. 10 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Estabeleceu-se o acesso ao Ensino Médio “como de responsabilidade prioritária dos governos estaduais, cabendo, contudo, à União, a função de assegurar a equalização das oportunidades educacionais entre as diferentes regiões do país e de garantir um padrão mínimo de qualidade mediante assistência técnica e financeira” (PINTO, 2004, p. 318). Ainda segundo esse autor, a Emenda 14/96 minimizou, por meio do artigo 2º, inciso II, o compromisso com a “progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade” (CF/88), ao impor a “progressiva universalização do ensino médio gratuito” para os egressos do Ensino Fundamental. Retira, nesse caso, a obrigatoriedade de se ampliar o atendimento do Ensino Médio.

Essa alteração, na verdade, não anula a hipótese de que essa etapa deverá ser obrigatória a todos os jovens, porque as pessoas interessadas em cursarem-na devem ter o direito ao acesso e a gratuidade garantidos em uma instituição pública. É a primeira vez, na história das constituições, que foi declarada a progressiva gratuidade do Ensino Médio em estabelecimentos oficiais. Nesse sentido, essa gratuidade, expressa na legislação, é

extremamente relevante, já que a trajetória histórica dessa etapa de ensino é marcada pela elitização e seletividade no acesso. Os municípios foram reconhecidos como sistemas municipais de ensino, com autonomia de gestão dos seus recursos destinados à educação, deixando de ser subordinados às agências dos governos estaduais.

Verhine (2000, p. 179) afirma que essa Constituição “[...] delegou às autoridades estaduais e municipais o controle das fontes importantes de receitas previamente gerenciadas pelo governo federal” Todavia, essa descentralização de recursos para os entes federados, significou, dentro do ideário neoliberal, apenas uma das formas de reduzir as responsabilidades da União. Camargo et. al. (2004) explicam que essa medida não fez parte de um real projeto de redistribuição de renda do país, porque:

A democratização dos serviços sociais, entendida como universalização dos direitos sociais (saúde, educação, transporte, alimentação, moradia, lazer, previdência social), só poderá ser efetivada se, de fato, um novo e substantivo aporte de recursos ocorrer, devendo, certamente, parte significativa dos mesmos vir pelo governo federal (CAMARGO, 2004, p. 34).

De qualquer maneira, a criação do FUNDEB, no final do ano de 2006, é um marco histórico para o financiamento do Ensino Médio brasileiro, porque, pela primeira vez, essa etapa da Educação Básica tem uma fatia de recursos garantidos constitucionalmente. A Emenda Constitucional nº 53/2006 estabeleceu o prazo de 14 anos para vigência do Fundo, a partir de sua promulgação. Assim, esse prazo será completado no final do ano de 2020. Esse Fundo vigora a partir de 1º de janeiro de 2007, porém, nos meses de janeiro e fevereiro desse ano foi mantida a repartição de recursos previstas na Lei do FUNDEF (Lei 9.424/96), mediante a utilização dos coeficientes de participação definidos em 2006, sem o pagamento de complementação da União.

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