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Mapa 6 Delimitação do perímetro com principais elementos analisados em destaque

3 O MERCADO DA ENCRUZILHADA NO SÉCULO XXI

3.2 O MERCADO DA ENCRUZILHADA NA ATUALIDADE

3.2.2 O funcionamento do Mercado da Encruzilhada na atualidade

O Mercado da Encruzilhada na atualidade possui uma dinâmica distinta daquela de seus primeiros anos de funcionamento. Novos usos foram agregados ao longo do tempo. Podemos perceber um encolhimento dos setores antes considerados mais importantes tais como mercearia, hortifrutigranjeiro, peixarias e açougues. Por outro lado, houve a expansão do setor alimentício com novos restaurantes, bares e lanchonetes. Sendo assim, observamos

concomitantemente uma maior abertura do equipamento para os serviços, trazendo consigo o lazer. As praças de alimentação, três no total, são um bom exemplo do estímulo dado ao surgimento de novas especialidades no lugar.

A diversidade de espaços de alimentação nas praças é refletida na multiplicidade de pratos. Os cardápios dos bares e restaurantes da Praça Tradição oferecem desde comidas típicas do Nordeste, como a carne de sol e o chambaril, a pratos encontrados em outras regiões do Brasil como a feijoada. No bar denominado O Bragantino, pertencente a um português, nos deparamos com iguarias típicas do país lusitano, com o bacalhau em distintas formas: caldinho, bolinho, salada etc. A Praça Tradição, a mais antiga de todas, é uma amálgama do popular com o tradicional, onde podemos encontrar frequentadores do mercado há 20 ou 30 anos utilizando o espaço como ponto de encontro.

A praça denominada Arena possui um perfil popular diferente da Praça Tradição. O espaço atende majoritariamente aos trabalhadores do entorno nos horários do café da manhã e do almoço. Os pratos servidos variam de acordo com a disponibilidade do insumo naquele dia, assim estes restaurantes e bares não possuem cardápio fixo. As refeições têm como base o inhame, a macaxeira, o cuscuz ou o arroz com feijão e uma carne de preferência, como a galinha, à cabidela ou guisada, além de costela de vaca, bife, entre outras.

A última praça implementada no equipamento é a denominada Praça Gourmet. O espaço foi inaugurado em 2017. Neste setor encontramos uma padaria, uma pastelaria e um bar. Para além da fabricação de pão, a padaria denominada Meu Muquifo oferece sanduíches, como o recheado com porco, pizzas, croissants etc. A pastelaria batizada de ReiNado possui uma variedade de recheios da massa frita. O bar Beberibe oferta uma diversidade de pratos, incluindo petiscos como os caldinhos e linguiças, pratos executivos, sobremesas e uma carta especializada em cervejas artesanais.

Outros dois setores do mercado complementam a oferta de serviços voltados para a alimentação que são o antigo bar localizado na ala do lado esquerdo do volume três, como pode ser visualizado na planta baixa representada na figura 29, e uma cafeteria localizada no corredor principal. O Café do Bonde da Encruzilhada como é denominado, dispõe em seu cardápio além de cafés e sucos orgânicos, sobremesas como salada de frutas, bolos, tortas, entre outras. Haja vista na atualidade a grande variedade de bares, restaurantes, lanchonetes e café no Mercado da Encruzilhada, verificamos uma oferta satisfatória de cardápios disponíveis no lugar, oportunizando o aumento de seus frequentadores e o surgimento de uma nova clientela.

Acreditamos que para a CSURB os estabelecimentos focados na gastronomia são muito importantes no que se refere à refuncionalização dos mercados onde a atratividade de novos

consumidores é fundamental. Ao nos determos especificamente na Praça Gourmet, pensamos na sua instalação como estratégia para atrair um público considerado novo e de maior poder aquisitivo, um público que procura a novidade e que paradoxalmente encontra nos boxes da Praça Gourmet espaços mais próximos daqueles frequentados por ele fora do mercado. Todavia, não descartamos a responsabilidade dos outros setores gastronômicos como também dos ramos focados na prestação de serviços diante da atratividade de novos públicos.

Apesar da tentativa de atração de novos consumidores, ao realizarmos a aplicação dos formulários ainda observamos, na atualidade, a existência de um perfil sobrepujante aos demais: ele é integrado por pessoas acima de 50 anos e com uma faixa de renda abaixo de um salário mínimo. Quanto ao gênero, percebemos que é bem distribuído entre homens e mulheres (51% de homens versus 49% de mulheres entrevistadas). No entanto, apesar da maior porcentagem estar concentrada na faixa de renda abaixo de um salário (33% dos entrevistados) ao observarmos os resultados dos formulários, representados no gráfico 5, concluímos que existe uma considerável presença de outros perfis socioeconômicos67, fazendo do equipamento um lugar diversificado no que diz respeito aos seus consumidores.

Gráfico 5 - Faixa de renda dos frequentadores do mercado

Fonte: elaborado pela autora, 2019.

Para além de reformas físicas nos antigos boxes e a introdução de novas atividades principalmente do ramo gastronômico, a administração foca na melhoria da gestão e acredita em sua relevância para gerar mercados públicos, considerados por eles, bem-sucedidos. Na entrevista68 concedida por representantes da CSURB foi citado o projeto em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE). A ação foca tanto na

67 Por meio do gráfico concluímos que: 33% recebem até um salário, 23% de dois a três salários, 17% de um a dois salários, 14% acima de cinco salários e 13% de três a cinco salários mínimos.

qualificação dos permissionários para que sejam capazes de criar seus próprios cardápios quanto na introdução do Braille e da língua inglesa na discriminação dos pratos.

Outra ação entre CSURB e SEBRAE foi iniciada em 2014, contudo a intervenção não teve êxito. O projeto denominado Viva o Mercado69 tinha dois objetivos. O primeiro estava focado em qualificar os permissionários por meio de consultorias e capacitações, o segundo estava voltado para a criação de uma identidade visual própria, valorizando as peculiaridades de cada mercado. Na visão das instituições, o incremento destas ações era importante para a melhoria dos equipamentos, e para que eles passassem a ser reconhecidos como espaços de interesse cultural por parte dos antigos e possíveis novos frequentadores atraídos para os espaços devido à realização no Recife da Copa do Mundo de Futebol em 2014. Apesar de sua potencialidade, o Viva o Mercado não foi implementado nos moldes preestabelecidos inicialmente. O que observamos na atualidade é um projeto menos ousado, onde se destacam apresentações de pequenos cantores e bandas locais nos finais de semana.

Salvo os setores gastronômicos encontrados no lugar, a variedade de serviços também engloba outras especialidades, que são: conserto de acessórios como malas, bolsas, sapatos e carteiras; reparo de eletrodomésticos como liquidificadores e ventiladores; restauração e costura de roupas; afiação de facas, alicates e tesouras; chaveiros; barbearias, xerox etc. Algumas das últimas reformas realizadas no mercado são relevantes em termos de introdução de novas categorias focadas na prestação de serviços. A Alameda de Serviços, por exemplo, localizada na parte externa, conta com boxes concentrados na reparação de celulares entre outras especialidades. A loja intitulada Reciclo Bikes foca na reforma e venda de bicicletas e seus utensílios.

No que concerne ao comércio, também verificamos uma grande variedade de boxes especializados na venda de mercadorias muito distintas. No Mercado da Encruzilhada podemos encontrar: floriculturas especializadas em arranjos e buquês; estabelecimentos especializados em artigos de umbanda; lojas de utensílios domésticos tais como filtros de barro, panelas, talheres e outras miudezas; lojas de tecidos e aviamentos; boxes voltados à venda de peixes ornamentais e aquários e outros focados na comercialização de rações e artigos para animais domésticos, sendo esse um dos ramos que mais se expandiu nos últimos anos. Também nos deparamos com estabelecimentos especializados em papelaria; artesanato, ferragens, e pequenas mercearias. Os compartimentos voltados à venda de alimentos também diversificam

os seus produtos, observamos desde a venda de frutas, verduras e legumes em alguns boxes à comercialização de ovos e frios como queijos, polpas de fruta e carnes.

Ao focarmos na finalidade da visita tanto dos antigos frequentadores quanto dos consumidores que vão pela primeira vez ou raramente ao equipamento, visto que durante a aplicação dos formulários também abordamos estas pessoas, por meio do gráfico 6 observamos que, em sua maioria, seu principal objetivo são as compras. Em ordem de relevância, em seguida, vêm o lazer e posteriormente os serviços, contudo, este fato não significa que os usuários têm apenas um objetivo durante sua visita ao mercado. Muitos, por exemplo, podem ir ao mercado no intuito de comprar um produto e na mesma visita almoçar com os amigos, agregando dois objetivos distintos em uma mesma ida.

Gráfico 6 - Objetivo da visita dos frequentadores do mercado

Fonte: elaborado pela autora, 2019.

O regular funcionamento dos mercados e de muitas feiras da cidade é de responsabilidade da CSURB, criada em 1995. Desde 2010, a Companhia segue as normas do decreto nº 25.210 pelo qual são discriminados detalhadamente as regras que devem ser seguidas pela administração e permissionários, quando no interior dos mercados públicos, centros comerciais e equipamentos especiais de comercialização do Recife. Neste decreto estão detalhados os direitos e deveres dos permissionários, bem como dos técnicos.

De acordo com a ordem vigente, para o efetivo gerenciamento dos equipamentos de comércio, a Companhia deve subdividir sua administração de acordo com as seis RPAs do Recife. Assim, seis equipes de técnicos são distribuídas por localidade. Cada Região Político Administrativa possui um gerente, encarregado de responder pessoal e diretamente pelas condições normais de funcionamento dos equipamentos, um ou dois administradores,

responsáveis pelo controle interno, além de técnicos encarregados da fiscalização e ordenamento.

Realizamos uma entrevista70 com a administradora do Mercado da Encruzilhada objetivando adquirir um maior conhecimento a respeito de seu funcionamento. Ressaltamos que grande parte dos quesitos voltados a uma regular atividade do equipamento é de inteira responsabilidade da CSURB. De forma geral, o mercado funciona de segunda a sábado, das 6h às 18h e no domingo das 6h às 12h com mais uma hora para saída. No entanto existem autorizações especiais para setores interessados em estender seus horários. É o caso dos permissionários da Praça Gourmet que promovem eventos em dias distintos da semana, assim, nas sextas feiras estão ampliando suas atividades para as 20h, nos sábados para as 22h e nos domingos para as 17h. Os eventos envolvem temas musicais diversos como samba, chorinho e MPB, desta forma, o público é diferenciado a depender do dia. O mesmo caso se estende para a loja Reciclo Bikes, promotora de um evento que ocorre quinzenalmente. De acordo com a administradora, todas as prorrogações de horários devem ser previamente solicitadas, acordadas com os outros permissionários e aprovadas pela CSURB.

No tocante às adversidades relacionadas às extensões de horários e a vizinhança, a entrevistada comentou sobre uma pesquisa realizada com os moradores do entorno onde se concluiu que muitos aprovam os eventos pelo fato de criarem certa dinamicidade nas ruas nos horários noturnos. Acerca da segurança no dia a dia do mercado, foi comentado sobre a existência de uma equipe de portaria não armada responsável pelo serviço. No exterior do equipamento, a segurança é feita pela Polícia Militar por meio de rondas. Entretanto, no caso da necessidade de um suporte, o mercado tem o apoio da Guarda Municipal.

Segundo a entrevistada, a fiscalização do equipamento ocorre em dois níveis. O primeiro é realizado em nível estadual e municipal, de forma autônoma, incluindo-se nesta categoria a Vigilância Sanitária e o Programa de Orientação e Proteção ao Consumidor (PROCON). Mesmo atuando de maneira independente e possuindo planejamentos próprios, é necessário o estabelecimento de uma comunicação entre os vários órgãos de fiscalização. Desta forma, ambos têm contato com a CSURB, responsável pelo segundo nível de fiscalização. A empresa possui uma equipe encarregada da manutenção da área comum e pela boa convivência entre os permissionários e outra é focada nas questões estruturais e arquitetônicas.

Os custos para quem tem permissão de utilizar um box mudam de mercado para mercado. De acordo com a administradora existe uma escala de taxa variável a depender da

localização dele na cidade. O equipamento em estudo está localizado na área um, considerada a área mais cara, assim, seus permissionários pagam R$ 14,00 pelo metro quadrado, sendo então considerado um valor simbólico. Vale ressaltar que o valor desta taxa é imposto igualmente para todos os permissionários independentemente do tempo de atuação no equipamento ou tipo de atividade com que trabalha. Outras duas contas são adicionadas aos custos dos trabalhadores, são elas energia e água.

No caso da conta de água, a entrevistada comenta a existência de um rateio realizado de forma proporcional entre os permissionários dos boxes. Cada box possui um peso, a depender da atividade realizada, o permissionário paga um valor mais ou menos elevado. Um restaurante paga cota quatro, enquanto um armarinho paga cota um, por exemplo. A conta de energia é individualizada. No caso de um ou de um grupo de permissionários decidirem intervir no espaço por meio de instalações de ar condicionados, ventiladores ou splits, é necessário elaborar um documento discriminando quais as modificações que pretendem realizar. Após a entrega deste documento para a CSURB, será avaliado e decidido sobre a sua autorização.

Relativamente à carga e descarga de insumos não existe restrições de dia da semana e os horários podem ser negociados. Entretanto, de acordo com a administradora, o horário mais frequente de sua ocorrência é pela manhã, devido ao fornecimento dos peixes e crustáceos. Já a coleta de lixo é de responsabilidade da EMLURB. Os resíduos são jogados em um compartimento voltado para a parte externa do equipamento, onde a empresa realiza o seu recolhimento. O caminhão passa duas vezes por dia, de segunda a sábado. Apesar do funcionamento da coleta de lixo, em nossas visitas ao mercado percebemos, principalmente onde está localizado o compartimento externo, lixo espalhado pela calçada e rua. Tanto os permissionários que têm seus boxes localizados próximos ao lixo quanto os usuários, reclamam constantemente do mau cheio do setor. Ademais, este lixo pode ser um atrativo para diferentes animais indesejados, fazendo com que a salubridade do lugar se torne limitada.

Não foi relatada a realização de coleta seletiva nos mercados, incluindo o da Encruzilhada, contudo, segundo técnicos da CSURB, um dos planos da Companhia é capacitar os permissionários para primeiramente realizarem a separação entre secos e molhados e posteriormente uma separação entre as categorias de materiais que são recicláveis. A técnica da reciclagem, se realizada de maneira eficiente e organizada pode ser uma solução tanto para um aperfeiçoamento do compartimento do lixo voltado para a rua quanto para a melhoria da qualidade do ambiente para permissionários e usuários.

Diante das últimas intervenções proporcionadas pela CSURB no interior do Mercado da Encruzilhada, sendo estas tanto focadas na parte física, com reformas na infraestrutura e

introdução de novos setores como a Praça Gourmet, quanto voltadas para a promoção de uma melhor qualificação do atendimento dos permissionários, percebemos que o equipamento vem se transformando e mesmo que ainda seja incipiente a vinda de outros frequentadores, é possível que em um breve futuro o perfil sobrepujante desses consumidores encontrados no equipamento se modifique.

4 UMA ANÁLISE DAS TRANSFORMAÇÕES E PERMANÊNCIAS NA