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O historiador da medicina, o professor e o cientista médico

Foto 1: Posse de Pedro Nava na Academia Brasileira de Medicina (1957) (PENIDO, 2003, p.

2.1.2 O historiador da medicina, o professor e o cientista médico

Para alguns intérpretes de Pedro Nava, entre os quais Villaça (2007) e Vale (2009), história, docência e ciência são aportes sobre os quais o Narrador se debruçou por toda a vida. Então vejamos:

As navegações, as descobertas, a vida dos índios conhecida na Europa através da obra dos cronistas e dos viajantes (e isso foi minuciosamente provado por Afonso Arinos de Melo Franco) vão influir poderosamente no pensamento de Rousseau, que inspira por sua vez novos moldes na educação dos meninos e vai agir, indiretamente, no próprio terreno da puericultura.[...]. As informações da Geografia Médica, comparadas às da História Geral, vão nos mostrar a rota das doenças, o caminho das contaminações e a expansão das pestilências – seguindo estradas abertas pelo homem nas suas transações de negócio pacífico, nos seus movimentos de guerra e no sentido das grandes migrações. [...]. A literatura por sua vez, na prosa dos ficcionistas, na inspiração dos poetas, na invenção da vida transposta ao teatro, é um mundo inexaurível de documentos que podem servir ao médico historiador. (NAVA, 2003c, p. 14).

O trecho acima é ilustrativo do título e, assim, assentimos que Nava aglutinava vários saberes de forma concomitante e de maneira amplificada uni/ multidimensionalmente em seu fazer literário e histórico. Os principais investimentos de Nava como historiador da medicina encontram-se no livro ―Território de Epidauro: crônica e histórias da História da Medicina (NAVA, 2003d),‖ publicado em primeira edição em 1947, e no subsequente ―Capítulos da História da Medicina no Brasil (NAVA, 2003c),‖ publicado inicialmente na separata da revista ―Brasil Médico Cirúrgico‖ em 1948. Estes dois livros são alimentados em fontes diversas que, vão de crônicas de viajantes a registros manuscritos, e passam pela História Geral e pela literatura, os quais comentamos adiante. E por que não dizer que estes se encontram nas Memórias, onde suas lições profissionais são presenças permanentes e indeléveis.

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a biografia dos grandes médicos não tem interesse de data ou de anedota. O que nelas interessa é o exemplo dado pelos que reúnem ciência à consciência, porque sua separação, como dizia Rabelais, significa apenas ruína da alma – ―[...] science sans conscience, n’est que ruine de l’âme.” (NAVA, 2003c, p.11, grifo do autor).

Há também ―A medicina de Os Lusíadas (NAVA, 2004)‖ e a ―Biografia de Doutor Torres Homem (inacabado e não publicado)‖.

Em “Território de Epidauro‖ (NAVA, 2003d), o autor apresenta e discute as origens da medicina brasileira, passando pela cirurgia vascular e a medicina interna com suas origens francesas, bem como pela medicina popular, sem descurar do livro antigo de medicina.

Sobre a medicina popular, o cientista/médico articulado ao historiador faz uma análise documental de um manuscrito, usando um modus operandi, em menor escala, parecido com o utilizado por Ginzburg (1987) em ―O queijo e os vermes.‖ O manuscrito analisado por Nava é datado de 1809 e ele o reconhece como importante documento da história da medicina popular brasileira do fim do Século XVIII e princípios do XIX. Neste documento estão registradas 44 receitas recomendadas para cura de males que acometiam a população. Dentre os males, Nava destaca a receita para o mal de engasgo e mostra a possível relação deste com a moléstia de Chagas existente no Brasil, que pode ser transmitida por um mosquito. Com audaz imaginação e criatividade, Nava analisa o manuscrito e o situa sócio-historicamente no espaço da medicina de nosso país; é curioso que ele expõe no livro as 44 receitas encontradas no manuscrito, tornando possível outras análises e interpretações. (NAVA, 2003d).

São contempladas ainda as especializações médicas e seus exageros e o uso da medicina como arma de troca movida por interesses diversos em cada classe social que assume o poder. O livro é composto por pequenos artigos/teses que em síntese trazem os ideais históricos e médicos do autor que reage de forma contrária à utilização da medicina motivada apenas por interesses econômicos, reafirmando-a como necessidade fundamental das sociedades, que devem aplicá-la com compreensão social nos moldes científicos e de forma contextualizada e ética.

Trata, portanto, dos meandros da medicina no Brasil alicerçado em fatos e documentos ligados à história da medicina no país, nos usos populares trazidos pelo

66 colonizador para a medicina moderna, como atividade científica no Século XIX, sob a influência da França.

Em ―Capítulos da História da Medicina no Brasil‖ (NAVA, 2003c), o historiador da medicina legou para a área a compreensão de que a medicina popular brasileira apresenta características de uma mistura homogênea de humanidade e de divindade, alertando para as questões não apenas humanas, mas humanizantes de sua prática. Assente que, em seus primórdios, a medicina brasileira era uma medicina formada por componentes mágicos e empíricos condutores do social/cultural para a cura das doenças que acometiam o povo brasileiro no período colonial, encontrados ainda no Século XX, em sua prática, como médico no interior do país.

Nava (2003c) fez observações, neste livro, sobre medicina popular no Século XVII, sobre práticas religiosas e práticas populares de cura, corroborando a interpretação sobre práticas de cura no Brasil ao trazer fundamentos documentados de que no Brasil, do Século XVIII, a medicina popular e a religiosidade em suas práticas e circulação de saberes eram indissociáveis. Estas observações vão ser também visualizadas por ele, na primeira metade do Século XX, quando de sua experiência como médico no interior de São Paulo, conforme relatos nas Memórias.

Neste livro aponta ainda as influências da medicina francesa no Brasil e as dificuldades da medicina científica para se instaurar no país. Traz também algumas lições para o ensino médico e para a prática de pesquisa em história da medicina, sugerindo que entre as diversas fontes para se pesquisar sobre a história da medicina no Brasil não se deve desprezar a literatura de ficção.

Essa não existia no início de nossa história, mas, quando começa a aparecer, logo nas suas páginas surgem informações sobre doenças, doentes, procedimentos com os mortos, indicação de instituições que representam elemento informativo muitas vezes útil na compreensão de nossa medicina do fim do século XVIII, início e transcurso do século XIX. Manoel Antônio de Almeida, Joaquim Manoel de Macedo, José de Alencar, Machado de Assis e Raul Pompéia estão cheios de descrições [...]. (NAVA, 2003c, p. 224).

Vemos, assim, que Literatura e Medicina para o Narrador são saberes complementares para a prática do historiador.

67 ―A medicina de Os Lusíadas‖ (NAVA, 2004b) é também o título de uma conferência proferida por Pedro Nava em 1961, no Real Gabinete Português de Leitura, incluída no livro de mesmo título no qual o autor faz uma rica articulação entre o poema de Camões, grande poeta português, ―Os Lusíadas‖ e a Medicina.

Nesta conferência Nava demonstrou ser capaz de religar saberes, transformando-os em conhecimentos que unem a arte poética à arte médica, mostrando-se aqui como poeta e médico sem descuidar do pesquisador e historiador. Nessa direção, o Narrador revela:

Não foi por um pouco de ouro e um pouco de pimenta – mas para dar ao Mundo outros mundos que os lusíadas se atiraram aos mares do quadrante. Fizeram isto numa época de integração nacional em que a crença em Deus e a concepção da Pátria eram a mesma no Rei e no último vilão. Luís Vaz de Camões foi seu índice e seu resumo e, na América, na Ásia e na África – onde quer que haja gota de sangue português – seu canto será sempre um rebate a nos chamar à cruzada daqueles barões que cimentaram, em várias terras, com sua carne e suas ossadas, os vínculos que nos unem em tradições, interesses e aspirações comuns. Estamos vendo suas velas que o vento enfuna, seus peitos que o coração dilata, sentimos o tumulto eterno e seu tropel, a estes capitães, missionários, marinheiros, governadores, donatários e vizo-reis, (X,147). (NAVA, 2004d, p. 50).

Este livro reúne ainda dois discursos. O primeiro intitulado: ―Medicina e Humanismo,‖ no qual recepciona o professor Aloysio de Castro no Instituto Brasileiro de História da Medicina, e o segundo com o título: ―Aloysio de Castro, o Gentil- homem da Medicina Brasileira,‖ onde faz uma homenagem à memória deste médico, na Academia Nacional de Medicina, em 1959.

O cientista médico acompanha o especialista e o historiador quando

escreve, em 1937, o artigo ―Esboço dos Fundamentos Históricos das

Especializações no Terreno da Medicina Interna‖ publicado em Território de Epidauro, em primeira edição em 1947.

Em 1948, começa a publicar mais assiduamente artigos científicos; não queremos dizer com isto que a postura científica não tenha acompanhado a formação e o serviço do médico clínico. Apontamos esse período muito mais como o de surgimento de sua produção em divulgações científicas mais pontuais e ligadas à sua área de especialização.

68 Como cientista médico, muitos de seus trabalhos se encontram reunidos nas ―Atas reumatológicas (comunicações em dois volumes),‖ as quais não serão comentadas aqui por pura falta de conhecimento sobre os temas ali tratados.

Destacamos que, em 1955, Nava já se tornara bastante conhecido em sua área de atuação médica e representou o Brasil como membro do Conselho Nacional de Pesquisa Brasileira na Exposição do Palais de la Découverte, em Paris. Ele acreditava em uma ciência que poderia ser produzida no Brasil através de uma política científica nacional e em sua trajetória percebemos essa militância ao se envolver pari e passu em atividades nas associações e sociedades científicas nacionais e internacionais. Assim, reunia esforços para a formação institucionalizada do que convencionamos chamar de uma intelligentsia brasileira, capaz de se comprometer com os problemas sociais internos do país, dialogando com as demais instâncias científicas do continente sul-americano, particularmente, e mundiais, especialmente as francesas as quais ele tanto admirava.

Como cientista médico pertenceu a várias sociedades e academias médicas e foi um dos fundadores da Sociedade Brasileira de Reumatologia, da qual foi também presidente. Participou da organização de vários congressos de reumatologia no Brasil e em alguns países sul-americanos. De acordo com Souza (2004, p. 106), Nava ―notabilizou-se como pesquisador na área de Reumatologia, publicando mais de trezentos trabalhos.‖ Assim, o já professor de medicina atuava como um intelectual engajado, que produzia, organizava e fazia circular conhecimentos no país e fora deste.

Como professor de medicina, Nava era dedicado e orgulhava-se disto, pois, para ele, ensinar fazia parte do seu futuro como médico; sobre isto diz: ―O futuro me reservava à docência, o professorado interino, a cátedra, o grau emérito que hoje tenho.‖ (NAVA, 2003a, p. 22).

É interessante registrar que o professor começou a se manifestar ainda em Belo Horizonte no início da década de 1930, na enfermaria dirigida por seu professor Ari Ferreira, na qual Nava atuou como voluntário lecionando Semiologia.

Em 1937, já no Rio de Janeiro, o professor Nava ingressa como livre- docente de Clínica Médica na Faculdade de Medicina, na época, agregada à Universidade do Brasil. Era também catedrático e professor emérito do Centro de Ciências Biológicas da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

69 Nava, juntamente com o professor Pasteur Valéry-Radot, funda e se torna diretor da Sociedade Franco-Brasileira de Medicina, em 1946.

Em 1952 é um dos professores catedráticos interino de Clínica Médica da Faculdade de Ciências Médicas e professor titular da Escola de Aperfeiçoamento Médico da Policlínica Geral do Rio de Janeiro. Foi também catedrático de Reumatologia da Escola de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, já com o título de professor ―Honoris causa” da Faculdade de Medicina de Barbacena, em Minas Gerais.

No anfiteatro da Policlínica realizou, o que vimos no decorrer de suas Memórias, o ideal de bem formar o médico através de uma formação continuada de boa qualidade. No anfiteatro eram discutidos casos médicos entre autoridades sobre o assunto e destas discussões participavam também seus alunos e médicos de outras instituições que assim o desejassem. Ali, nos parece, ele se realizava como mestre da Medicina.

Em seu livro inacabado ―Cera das Almas‖ (NAVA, 2006), a tristeza, por ter sido praticamente expulso do seu lugar ideal de ensino, se manifesta de forma nefasta, cruel, quase filípica, contra aqueles que para ele lhe tiraram a mais sublime ação de um mestre – ensinar, formar discípulos, pois para Nava há uma diferença marcante entre ser professor e ser mestre.

Segundo Geraldo Guimarães Gama (um de seus alunos), como professor de reumatologia Nava se destacava por proferir palestras ―nas quais a clareza das

exposições e o domínio dos temas era paralelo à elegância da linguagem.‖ (NAVA,

2003d, p. 17).

Para finalizar, em ―Beira-mar‖ (NAVA, 2003a) informa que o período de sua atividade didática formal desenvolveu-se em três faculdades de 1936 a 1975, e em seguida afirma: ―examinei sem-número de alunos, vários concursos para cátedra e docência e jamais reprovei ninguém. Minhas notas sempre foram de oito a dez para, apenas, não roubar os bons, os melhores.‖ (NAVA, 2003a, p. 26). Assim, suas lições como mestre da medicina se encontram distribuídas nas Memórias e em seus livros de história da medicina e nos inúmeros artigos científicos que publicou. Estas vão dos ensinamentos sobre conteúdos anatômicos à forma de atendimento ao paciente.

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2.1.3 O poeta

Ideamos por algumas informações recolhidas que Nava, como poeta, constituiu-se conscientemente em 1922, no período em que cursava medicina, em Belo Horizonte, onde conheceu, dentre outros, os também poetas Carlos Drummond de Andrade e Mário de Andrade. No entanto, informamos que sua onda de poesia brotou no Internato do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, como ele informa em ―Chão de ferro‖ (NAVA, 2001). A poesia de Pedro Nava é bissexta, isto é, esporádica, concentrando-se entre os anos 1925/1944, quando se corresponde com Mário de Andrade. Bissexta é a expressão cunhada por Manuel Bandeira para designar aqueles poetas que de quatro em quatro anos (o seu 29 de fevereiro) escrevem um belo poema.

Seus primeiros poemas publicados durante o curso médico foram ―Tejuco,‖ com trecho contendo ―Música‖ e ―Diamantina‖, em ―A Revista‖20

, em 1925; ―Aterrissage,‖ poema comentado por Mário de Andrade em carta a Nava, datada de 1925, sobre o qual afirma Mário: ―O Aterissage é positIvamente esplêndido.‖ (ANDRADE, 1982, p. 41).

O poema ―Alegria‖ foi publicado em 1926, no terceiro número de ―A Revista‖, ano em que foi publicado ainda o poema ―Se eu soubesse brincar,‖ no Diário de Minas, poema republicado em ―O Jornal‖, com ilustração de Di Cavalcante.

SE EU SOUBESSE BRINCAR Si eu tivesse seis anos si soubesse brincar

pedia ao Menino Jesus que viesse me dar seus brinquedos coloridos

E ele dava mesmo dava tudo dava brinquedos variados de todas as cores

brinquedos sortidos

dava bolas lustrosas pra mim soltar de noite e mandar todas pro céu com minha reza Dava bolas dava quitanda dava balas e havia de ficar melado, todo doce de minha baba.

20

Órgão divulgador da Revolução Literária de 1922, em Minas Gerais e faz parte do conjunto das ações modernistas ali realizadas. (SOUZA, 2004).

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E dava homenzinhos, arvinhas, bichinhos, casinhas e em minhas mãos ingênuas eu tirava o mundo novinho,

cheiroso de cola e verniz, das caixas nurembergue pra recomeçar deslumbrando a brincadeira da

vida

O Menino Jesus dava tudo si eu fosse menino si soubesse brincar pra brincar com ele.

(NAVA, 1982)21.

Em 1926, escreve ―Ventania,‖ poema também comentado por Mário de Andrade em carta a Pedro Nava (ANDRADE, 1982, p. 41). Em 1928, ficam conhecidos ―Toadas para meu irmão,‖ ―Reflexos‖, ―Noturno de Chopin‖ e ―Noite de São João,‖ este último dedicado a Mário de Andrade.

Em 1932, em Monte Aprazível, produz o poema ―Mestre Aurélio entre as rosas,‖ (SOUZA, 2005) é uma homenagem ao seu professor da Faculdade de Medicina, Aurélio Pires, o qual é dedicado ao seu grande amigo, também médico, Joaquim Cavalcanti. Em 1933, escreve ―Poema para Rodrigo Melo Franco de Andrade.‖ Após cinco anos, em 1938, vem ao conhecimento do público os poemas ―O possesso,‖ ―O peixe‖ e, o mais conhecido, ―O defunto‖ que, em 1956, foi

publicado na ―Antologia de poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos,‖

organizada por Manuel Bandeira (1965); neste foi publicado também ―Episódio Sentimental.‖

O DEFUNTO

Quando morto estiver meu corpo, Evitem os inúteis disfarces, Os disfarces com que os vivos,

Só por piedade consigo, Procuram apagar no Morto O grande castigo da Morte. Não quero caixão de verniz Nem os ramalhetes distintos,

Os superfinos candelabros E as discretas decorações. Quero a morte com mau-gosto!

21

NAVA, Pedro. in: ANDRADE, Mario de. Correspondente contumaz: cartas a Pedro Nava, 1925- 1944. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982. (Edição preparada por Fernando Rocha Peres).

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Dêem-me coroas de pano. Dêem-me as flores de roxo pano,

Angustiosas flores de pano, Enormes coroas maciças, Como enormes salva-vidas, Com fitas negras pendentes. E descubram bem minha cara:

Que a vejam bem os amigos. Que não a esqueçam os amigos. Que ela ponha nos seus espíritos A incerteza, o pavor, o pasmo.

E a cada um leve bem nítida A idéia da própria morte. Descubram bem esta cara! Descubram bem estas mãos. Não se esqueçam destas mãos!

Meus amigos, olhem as mãos! Onde andaram, que fizeram,

Em que sexos demoraram Seus sabidos quirodáctilos?

Foram nelas esboçados Todos os gestos malditos:

Até os furtos fracassados E interrompidos assassinatos. — Meus amigos! olhem as mãos Que mentiram às vossas mãos... Não se esqueçam! Elas fugiram

Da suprema purificação Dos possíveis suicídios. — Meus amigos, olhem as mãos!

As minhas e as vossas mãos! [...]

(NAVA, 2005)22

Em 1940, escreve ―Canto à rainha do mar‖ e ―Canto do afogado,‖ no qual o autor se interroga “Ai, em vós, amigos meus! Porque onde estais, que não me ouvis?‖. Um ano depois aparece ―Poema para meu amigo Mário Braga,‖ ―Alcazar,‖ dedicado a Raquel de Queiroz, ―Nameless here for evermore”, ―Poema inglês‖ e ―Poema das quatro horas.‖ Nesta década, escreve ainda, em 1943, ―Toada do usurpador,‖ ―Conto do usurpador‖ e ―O canto do vingador.‖ (LE MOING, 1996).

22

NAVA, Pedro. O defunto. SOUZA, Eneida Maria de. Pedro Nava 1903-1984: Trechos escolhidos. Rio de Janeiro, 2005, p. 115-118.

73 Em 1945 dedica, ―Antonaïr,23‖ um belíssimo poema, à sua esposa Antonieta

Penido (Nieta). Este poema se encerra com os seguintes versos: ―Em silêncio sobre o mundo, Altaïr. Sobre mim e sobre Antonieta, Altaïr. Sobre nós, eternamente em tua luz, Altaïr / eternamente, Altaïr. Em silêncio, Altaïr. E-ter-na-men-te.‖ (PENIDO, 2003, p. 186-193).

―Palíndromo do amigo‖ é um poema dedicado ao amigo Afonso Arinos de Melo Franco quando da publicação do livro ―Amor a Roma,‖ cujo título forma um palíndromo.

Estes são alguns dos títulos e versos dos poemas do poeta Nava, que tem também sua expressão poética registrada em sua prosa memorial e nos trabalhos de história da medicina aliada aos conhecimentos médicos. Todavia, é imprescindível lembrar que Nava em sua vida e após sua morte despertou vários poetas a poemizarem sobre ele e sobre sua obra memorial, dentre os quais grandes nomes da poesia brasileira como Carlos Drummond de Andrade e Vinícius de Moraes. Contudo, não existe ainda no Brasil uma publicação que reúna todos os poemas de Pedro Nava; estes se encontram publicados em livros, revistas, jornais,

sites e constam de arquivos, como o de Mário de Andrade no Instituto de Estudos

Brasileiros da Universidade de São Paulo.

A maioria de seus poemas traduz uma poética de cunho sociável com alguns indícios ao modo, talvez, da literatura arcaica, pois são vários os que homenageiam ou são dedicados a amigos e à produção literária dos amigos e às amadas, sobre os quais não temos conhecimento suficiente para discutir com a profundidade que merecem, por isto apenas os citamos e fazemos algumas inferências comprovadamente leigas, mescladas a sentimentos despertados pela poética que emana dos versos. Para Bueno (1997), referindo-se a Nava, ―o memorialista sabe que a palavra poética pode não ter nada a dizer, mas de alguma maneira misteriosa significa, ao dizer-se a si própria.‖ (BUENO, 1997, p. 136, grifo do autor).

Há, por outro lado, os poemas de amor, dor e morte e aqueles que procuram registrar instantes da vida, da cultura através da poética, além de versos que enfocam a fé cristã, apesar de se dizer alheio às religiões24 e de vê-las como modos

23

Palavra formada por aglutinação de Anton de Antonieta e aïr de Altair nome de uma estrela.