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O M ODELO DE P ERSONALIDADE DE E YSENCK E O D ESEMPENHO

PARTE I – ESTUDO TEÓRICO

CAPÍTULO 2 – PERSONALIDADE E EXCELÊNCIA ACADÉMICA

2.3. P ERSONALIDADE E E XCELÊNCIA A CADÉMICA

2.3.2. O M ODELO DE P ERSONALIDADE DE E YSENCK E O D ESEMPENHO

O desenvolvimento deste modelo distingue-se em certa parte do Modelo dos Cinco Factores, porque Eysenck levou a cabo um trabalho de investigação e de pesquisa, de forma a criar um modelo que tem por base uma fundamentação teórica coesa e completa, não sendo então um modelo baseado em análise empírica e factorial. A sua primeira análise foi realizada com pacientes psiquiátricos, resultando daí as duas primeiras dimensões: Extroversão e Neuroticismo, que muito se parecem com os domínios do Modelo dos Cinco Factores com a mesma designação. Posteriormente foi introduzida a escala da Mentira, muitas vezes referida como Conformismo Social, que muito se relaciona com a Desejabilidade Social (e.g. Barrett, 1999, cit. por Poropat, 2011). A escala a ser introduzida por último no modelo de Eysenck foi a de Psicoticismo (Eysenck & Eysenck, 1975, cit. por Poropat, 2011), que definia comportamentos como hostilidade, agressividade, depressividade e criminalidade (Eysenck, 1992, cit. por Poropat, 2011).

O Neuroticismo, também nesta abordagem, aparece relacionado com o desempenho académico, de forma que o prejudica, pois afecta as habilidades do estudante ao direccionar a sua atenção, não para o estudo, mas sim para as suas emoções ansiosas (De Raad & Schouwenburg, 1996). No entanto esta relação parece perder tanto significado quanto mais inteligente é o aluno (Perkins & Corr, 2006; Spielberger, 1962, cit. por Poropat, 2011) esperando-se que os alunos mais inteligentes tenham menos problemas com os efeitos do Neuroticismo no seu estudo. Este modelo defende, por último, que será expectável que o “Neuroticismo esteja negativamente correlacionado com o desempenho académico, mas de tal forma que esta correlação diminua com o aumentar do nível académico” em que o indivíduo se encontra (Poropat, 2011, p. 11).

A Extroversão tem sido também, em várias investigações, referida como positivamente correlacionada com o desempenho académico. Eysenck e Cookson (1969, cit. por Poropat, 2011), à semelhança dos resultados relativos ao Modelo dos Cinco Factores, sugeriram que os sujeitos extroversivos teriam maior sucesso em contextos académicos mais precoces, pois o seu entusiasmo facilitaria a aprendizagem. Por outro lado, os introversivos teriam maior sucesso em fases académicas posteriores, pois os seus níveis de concentração, empenho e dedicação ao trabalho funcionariam como facilitadores do seu sucesso académico (De Raad & Schouwenburg, 1996). À semelhança do Neuroticismo, também a Extroversão está

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positivamente correlacionada com o desempenho académico, mas esta associação diminuirá com a idade e nível académico (Poropat, 2011).

Sendo que a escala de Mentira pode ser considerada como medida de conformidade social (Francis et al., 1991, cit. por Poropat, 2011), poderá ser associada a uma complacência em contextos socialmente impostos, tais como ambientes escolares (Poropat, 2011). Neste sentido, os resultados desta escala podem estar relacionados com comportamentos de inquietação, desobediência, agitação e distracção (Slobodskaya, Safronova, & Windle, 2005, cit. por Poropat, 2011) que, a par da ausência de actividades escolares, tem um efeito nefasto no desempenho académico (Farsides & Woodfield, 2003, cit. por Poropat, 2011). Scores elevados na escala da Mentira estão relacionados com atitudes positivas, por parte dos alunos, face às actividades escolares propostas e face às matérias leccionadas (Francis & Montgomery, 1993, cit. por Poropat, 2011). Por estas, e outras, razões, é expectável encontrar relação entre esta escala e desempenho académico.

Por último, o Psicoticismo aparece associado às dimensões Amabilidade e Conscienciosidade, do Modelo dos Cinco Factores. Sendo que o domínio da Conscienciosidade apresenta um nível de correlação com desempenho académico, que rivaliza com a correlação entre este último e inteligência (Poropat, 2009; 2011), o facto de o Psicoticismo ter, por sua vez, também uma elevada correlação com o domínio da Conscienciosidade, poder-se-á depreender que ambos os factores partilham de associações com o desempenho académico (Poropat, 2011). Para mais, elevados resultados na escala Psicoticismo mostram um estudante que releva a ociosidade, atitudes negativas face à escola e ao que esta representa (Francis & A. Montgomery, 1993, cit. por Poropat, 2011), apresentando mais dificuldades na escola (Sloboskaya, et al., 1995, cit. por Poropat, 2011).

Por outro lado, como já referimos, as características motivacionais do indivíduo, tais como a motivação para o sucesso, são um factor de extrema importância na relação entre traços de personalidade (e.g. Conscienciosidade) e excelência académica e parecem desempenhar um importante papel na forma como a excelência se desenvolve e evolui. Atkinson (1964, cit. por De Raad e Schouwenburg, 1996) defende que o desempenho académico dependerá de um conflito emocional:

esperança no sucesso v.s. medo de falhar, que definirá a sua motivação para o

sucesso. Neste sentido, Covington e Omelich (1991, cit. por De Raad e Schouwenburg, 1996) definem que os alunos poderão ser agrupados segundo quatro tipos de resultados do referido conflito: i) estudantes orientados para o sucesso, que

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apresentam elevada esperança no sucesso e fraco medo de falhar; ii) estudantes orientados para falhar, que, contrariamente, apresentam pouca esperança no sucesso e um elevado medo de falhar; iii) estudantes em constante conflito, que apresentam elevada esperança no futuro, mas também um elevado medo de falhar, e, por último, iv) alunos que aceitam o falhar, pois apresentam baixa esperança no sucesso e pouco medo de falhar. Scouwenburg (1995, cit. por De Raad e Schouwenburg, 1996) identificou os tipos motivacionais constituintes deste conflito com os traços do Modelo dos Cinco Factores, concluindo que a esperança para o sucesso se identificaria com a Conscienciosidade e, por sua vez, o medo de falhar identificar-se-ia com o Neuroticismo.

Por outro lado, a teoria de orientação para o objectivo (e.g. Elliot & Harackiewicz, 1996, cit. por Steinmayr & Spinath, 2008) define as representações cognitivas que dirigem os indivíduos para objectivos específicos. Estes objectivos podem ser relativos à aprendizagem, que dizem respeito ao desejo de desenvolver competências, e relativas ao desempenho, tanto à procura como ao evitamento do mesmo, que dizem respeito à necessidade de mostrar um desempenho excelente ou de não mostrar um desempenho menos positivo, respectivamente.

Surge, por último, uma outra teoria acerca da motivação para o sucesso que refere-se ao valor esperado (Eccles et al., 1983, cit. por Steinmayr & Spinath, 2008), que se relaciona com as expectativas que o sujeito tem acerca do seu futuro sucesso e dos valores pessoais que potenciarão tal sucesso. Estas expectativas, por sua vez, são construídas com base nas crenças que cada um tem acerca das suas próprias habilidades (Steinmayr & Spinath, 2008).

Existem, por último, outras características de personalidade que aparecem associadas à excelência: a) elevados níveis de motivação intrínseca e grande capacidade de dirigir a sua atenção, atenção selectiva, a determinados domínios ou actividades; b) desejo explícito e a necessidade de atingir sucesso, acompanhado de elevados níveis de dedicação, perseverança e ética de trabalho; c) grande curiosidade intelectual e capacidade para pensar de forma não convencional (“outside the box”); d) alta tolerância e preferência pelo desconhecido, pelo ambíguo, pelo contraditório; e, e) elevados padrões pessoais, desejo de sucesso e necessidade de desafios (Bogoyavlenskaya & Schadrikov, 2000, cit. por Jeltova & Grigorenko, 2005). Para mais, Gerberich (s.d., cit. por De Raad & Schouwenburg, 1996) defende que os alunos excelentes apresentam comportamentos de persistência, mais tempo dedicado ao estudo, entrega de trabalhos no prazo previsto, entre outras. Romine e Crowell (1981,

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cit. por De Raad & Schouwenburg, 1996), por sua vez, defendem que os alunos excelentes são sérios, trabalhadores, consistentes e autónomos, com uma necessidade de ser excelentes do ponto de vista académico. Planificam, são organizados, são responsáveis ao ponto de não procrastinar, ou seja, são persistentes. Será a relação e interacção destas características que culminará na elevada performance de um indivíduo.

Estas características são, no entanto, distintas quando analisamos os alunos considerados excelentes do ponto de vista do género a que pertencem, sendo que consistentemente surgem indícios de que as mulheres apresentam melhores resultados académicos que os homens, independentemente da igualdade de capacidades intelectuais que apresentem (Steinmayr & Spinath, 2008).

Em vários países da Europa, existem 60% de raparigas ou mulheres a estudar nas universidades, o que não significa que sejam mais inteligentes que os rapazes ou homens, pois, em última análise, estes últimos são melhores em vários testes de habilidades e de desempenho. As mulheres apresentam melhores resultados porque a universidade simplesmente lhes ‘assenta’ melhor, não sendo, por isto, uma questão de capacidade ou habilidade. Existe, no entanto, algo que faz com que os homens abandonem ou desinteressarem-se em maior grau no nível de ensino mais avançado, do que as mulheres (Johnson, 2008).

Bachtold (1969, cit. por Olszewski-Kubilius & Kulieke, 1989) encontrou evidências de que alunos, masculinos, excelentes, entre os 12 e os 14 anos não valorizavam apoio, benevolência e uma liderança de valor, quando comparados com as suas colegas. No entanto, os grupos não diferiam em questões como conformidade, necessidade de reconhecimento ou independência. Karnes, Chauvin e Trent (1984, cit. por Olszewski-Kubilius & Kulieke, 1989), através do uso High School

Personality Questionnaire (HSPQ) encontraram algumas diferenças entre alunos e

alunas do ensino secundário. Os alunos excelentes eram mais sensíveis e protectores do que as colegas. As alunas excelentes, por sua vez, eram mais entusiastas, impacientes e libertas que os seus colegas. Fox (1976, cit. por Olszewski-Kubilius & Kulieke, 1989), através do uso do Allport-Lindzey Study of Values, mostrou que as alunas excelentes apresentavam resultados mais elevados na escala estética, social e religiosa, ao contrário dos colegas, enquanto que os alunos excelentes apresentavam scores mais elevados na escala teórica, económica e política, ao invés das colegas.

No que respeita aos alunos universitários, Tomlinson-Keasey e Smith-Winberry (1983, cit. por Olszewski-Kubilius & Kulieke, 1989) encontraram evidências de que os

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alunos universitários excelentes, masculinos, poderiam ser caracterizados como mais activos, ambiciosos, energéticos, com mais recursos, versáteis, espertos, imaginativos, divertidos e rebeldes, quando comparados com as suas colegas. Por sua vez, as alunas universitárias excelentes poderiam ser caracterizadas como mais honestas, trabalhadoras, obedientes, sinceras, modestas, estáveis, conscientes, apreciativas, pacientes, prontas a ajudar, gentis, respeitadoras e aceitam mais os outros, quando comparadas com os seus colegas.

Após a análise de estudantes de vários países da Europa, Oceania e América do Norte, puderam retirar-se algumas conclusões acerca das diferenças entre géneros, no que respeita ao desempenho académico (Bélgica, De Fruyt, Van Leeuwen, De Bolle & De Clerq, s.d.; Alemanha, Steinmayr & Spinath, s.d.; Grã-Bretanha, Spinath, Spinath & Plomin, s.d.; Áustria, Freudenthaler, Spinath & Neubauer, s.d.; e Estados Unidos da América, Hicks, Johnson, Iacono & McGue, s.d., cit. por Johnson, 2008). Assim, de um modo geral, as raparigas alemãs atingiram melhores resultados que os rapazes da mesma nacionalidade, mas estes mostraram maiores níveis de sucesso quando a capacidade cognitiva era controlada. Na amostra britânica, os resultados corroboraram o que a maior parte da literatura referente ao tema defende: as raparigas atingiram melhores resultados em Inglês (língua materna) e os rapazes em matemática. Tanto nos Estados Unidos da América como na Áustria, as raparigas atingiram melhores resultados gerais (Johnson, 2008).

Deste modo, todos os resultados encontrados, dos diferentes contextos estudados, consideram que os efeitos de variáveis de personalidade, para além da importância da conscienciosidade e motivacionais são relevantes. As suas principais conclusões são que 1) a relação entre inteligência e desempenho académico é forte em vários contextos e condições e 2) todas as variáveis nas quais os indivíduos diferem (e.g. traços de personalidade e motivação), a par das diferenças de género, são também preponderantes no desempenho académico que apresentam. Concluiu- se ainda que os tipos de escola e a consistência de notas obtidas influem em outras características individuais que definem as diferenças de sexo verificadas no desempenho académico (Johnson, 2008).

Por último, importa fazer referência aos processos que parecem correlacionar personalidade e sucesso académico propostos por Caspi, Roberts e Shiner (2005, cit. por Steinmayr & Spinath, 2008). Os autores listam diferentes processos que explicam esta relação: 1) as associações entre sucesso académico e personalidade podem reflectir um efeito de atracção, pois os indivíduos escolhem ambientes concordantes

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com a sua personalidade; 2) a personalidade poderá envolver processos de

recrutamento, pois as matérias ou assuntos a desenvolver são escolhidas de acordo

com situações de sucesso baseadas na personalidade; 3) a relação entre personalidade e sucesso académico poderá surgir através de um processo de atrito onde as matérias ou assuntos a desenvolver são retirados de situações de sucesso devido a alguma incompatibilidade pessoa com a referida situação; e, por último, 4) a personalidade e o sucesso podem estar directamente relacionadas quando os critérios para atingir esse sucesso se sobrepõem a características de personalidade, isto é, quando determinado comportamento dependente de certo traço ou tipo de personalidade é parte integrante do sucesso atingido (p. 186).

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CAPÍTULO 3 – AUTO-CONCEITO DE COMPETÊNCIA E EXCELÊNCIA

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