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Em Agosto de 1568, a Sereníssima Infanta D. Maria recebe do papa Pio V um breve pelo qual obtem uma vasta superfície de terra desanexada da freguesia de Santo Estevão de Alfama. A Infanta crisma o novo bairro paroquial de Santa Engrácia, princesa mártir de múltiplas virtudes à qual cola a sua imagem e ambição, idealizando uma cidade sua, extra- muros e fora da influência da Ribeira, sob a sombra protectora de Chelas, Xabregas e de sua tia D. Leonor. D. Maria teria intenção de criar uma “nova cidade”, agora que se encontrava arredada — mas não inoperante — das disputas em torno da sucessão dinástica, geradas pela morte prematura de D. João III, e que o irmão Henrique conseguira estabilizar — afastando a rainha viúva D. Catarina — e gerindo o reino em nome do sobrinho-neto Sebastião. As tensões políticas e financeiras existentes entre D. Maria e D. Henrique agudizam-se com o episódio dos Jerónimos, levando a Infanta a responder com o patrocínio firme e abastado da Ordem de Cristo, como adiante veremos.

O percurso de D. Maria até esta data, rege-se sempre pela possibilidade de casar e com isso abandonar Portugal. Aliás, a Infanta tem plena consciência do papel da arquitectura283 num quadro de afirmação do poder político e económico, e prova-o quando empreende os seus planos de edificação, nomeadamente no Campo de Santa Clara e na Luz. As linhas mestras para o entendimento do mecenato arquitectónico da Infanta fundamentam- se em duas atitudes distintas: por um lado, o patrocínio ocasional, por outro, a intencionalidade construtiva. Todavia, ambas contribuem para um mesmo sólido plano ideológico de edificações quando a Infanta decide que — ou não pode mais — sair de Portugal.

A primeira notícia de uma intervenção directa da Infanta num edificado é de 1561, quando a vila de Torres Vedras se queixa do estado de degradação em que se encontrava o Chafariz dos Canos — construído no reinado de D. Afonso III284 — que fornecia água a toda a população. Uma placa com inscrição — colocada na face central do chafariz e envolta

283 Já no início da década de 40 do século XVI, João de Barros referia no Panegírico que escreveu, o

interesse de D. Maria pela arquitectura. Barros, 1943, p. 182. A Infanta volta a manifestar este interesse e, também, conhecimento no testamento, designadamente nos artº 7, 15, 34 e 37 (ver Anexo Documental nº 68).

284 Alguns autores, baseados em Leal, 1762-1763, vol. IX, p. 649, transmitiram a lenda que fazia da Infanta a

primitiva construtora do chafariz. Todavia, as formas góticas e a existência de um documento em pergaminho no cartório da igreja de São Pedro de c. 1331 sobre a compra de umas casas junto à fonte dos Canos, testemunham a sua antiguidade. Torres, 1861, p. 64.

numa cartela simples de memória flamenga — assinala o reparo do tanque e da bica mandado fazer pela Infanta:

Erectum est hoc opus per Licenciattum Duardum Velho Judicem jussu Infantis Domine Nostre. Anno 1561285 Esta acção não é inócua. D. Maria era senhora de Torres Vedras e de Viseu — vilas que pertenciam à Casa da Rainha e que a Infanta tinha herdado depois do casamento de sua irmã Isabel com Carlos V — tendo autonomia na jurisdição e justiça da vila. Era a ela que os oficiais e juízes respondiam em casos de finança e de crime286 (excepto quando se tratasse de crimes puníveis com pena capital); era ela a responsável pelo bem estar e harmonia dos seus rendeiros e trabalhadores. Assim, a resposta a este pedido das gentes da vila tem de ser vista, também, dentro de um quadro de poder paralelo, simbolizado pela presença de uma personagem real que está atenta e empenhada em resolver as necessidades dos seus súbditos287. Tanto assim é que, não sendo Torres Vedras uma das vilas preferidas para poiso da corte portuguesa, é a única — à excepção de Lisboa — escolhida pela Infanta para a construção de um palácio288.

Torres Vedras fôra eleita como morada pela rainha D. Leonor, tia da Infanta, e por D. Manuel, que habitaram algum tempo nos chamados Paços Velhos, situados no bairro de Carcavelos, perto do Castelo. É natural que tenha sido o próprio D. Manuel a começar a obra de substituição dos antigos pelos novos paços, mas a memória mais remota — infelizmente escassa — coloca a Infanta como primitiva habitante. De qualquer forma, incentivadora ou não da construção do novo palácio, D. Maria, recupera o empenho das populações na (con)vivência real, apropriando simbolicamente as duas personagens que são essenciais no seu percurso pessoal.

Quase dez anos mais tarde, em 1570, voltamos a encontrar referências à Infanta na região de Torres Vedras, agora como fundadora de um convento de frades arrábidos — sob a invocação de Nossa Senhora dos Anjos, em memória da ermida de Nossa Senhora dos Anjos

285 "Esta obra foi levantada debaixo da inspecção do Licenciado Duarte Velho, Juiz, por mandado da Infanta Nossa Nossa Senhora no anno de 1561" Torres, 1861, pág. 65.

286 Chancelaria de D. João III, Lº 43, fº 9vº.

287 A confirmá-lo está a instituição, pela Infanta, de uns açougues privados em 1563 obrigando a que as

pessoas honradas não fossem ali buscar peixe ou carne, mas que o fizessem por intermédio dos escravos ou criados, para se evitarem incovenientes. Vieira, 1926, pág. 205, segundo um documento do Arquivo da

Câmara, Lº 18-A, fº 43 vº. Hoje não há vestígios desta construção, bem como do Palácio.

288 "Infanta D. Maria, [...], teve seu Palacio nesta Villa, aonde hoje estaõ os tres açougues, dos Nobres, Clerigos, & officiaes." Costa, 1868-1869, tratado I, cap. I, pág. 16. Infelizmente, a memória e os vestígios físicos deste palácio já não visíveis.

da Porciúncula 289— no lugar do Barro à saída sul da vila. O convento era no século XIX descrito como:

Construido segundo o gosto moderno de architectura, mas sem graça nem belleza, quer na egreja, quer no edificio do convento, somente atrahe a attenção pela frondosa matta e pela sua situação pittoresca290.

A construção do edifício é acidentada e a total descaracterização que sofreu ao longo dos anos não nos deixa imaginar muito do que foi291.

A Infanta não se limita a construir o convento para os arrábidos, oferecendo-lhes: todas as alfayas, que lhes eraõ necessarias para o uso dos seus ministerios, conformando-se sempre com a nossa pobreza; e prevendo os seus apertos, naõ poz em execuçaõ o desejo, que tinha de ornar os Altares com frontaes de preciosa tèla, e sómente por suas maõs fez hum de rede com muita curiosidade, e perfeiçaõ para o

289 “Jà disse, que a eleiçaõ do sitio naõ deixaria de ser por superior inspiraçaõ, porque a este conceito daõ fundamento os maravilhosos finaes, que procederaõ neste lugar à fundaçaõ do Convento, e os que ao depois se notaraõ. Os que precederaõ, publicava Joaõ Alvares do Casal, como testemunha de vista, e os referia muitas vezes o Padre Bernardo Gorjaõ, morador no Lugar do Trucifal, por lhos ouvir dizer. Era este homem Lavrador, e lhe chamavaõ do Casal, por morar em hum solitario, em bastante distancia do sitio do Convento. Muito tempo antes que se fundasse, levantando-se de noite a deitar palha aos seus boys, notou naõ sem admiraçaõ, que deste lugar se levantava huma grande columna de fogo, no qual existia, dando huma notavel claridade; outras vezes a via sobir para o Ceo em fórma pyramidal, e outras baixar do Ceo ao mesmo lugar. Algumas vezes attrahido dos resplandores que despedia, pretendeo examinar o que era, e chegando ao dito sitio, não achava fogo, nem effeito algum, que fizesse. Reparou para mayor assombro, que depois de se fundar o Convento, naõ vira mais, nem lhe apparecera a dita columna, e communicando tudo o que lhe havia succedido a algumas pessoas doutas, e virtuosas, todas avaliaraõ o prodigio por presagio do quanto se havia de atear o fogo do amor Divino nos coraçoens dos seus moradores, e a quem, como verdadeiros Israelitas, favorecia o mesmo Deos, guiando-os pelo deserto deste Mundo, para a melhor terra da Promissaõ, que he a gloria. Este testemunho leu authenticado Fr. Francisco Fortes, sendo Guardiaõ do Convento, no anno de 1658. em hum dos papeis pertencentes ao Cartorio da Camera da dita Villa. Approvou

tambem a eleiçaõ do sitio, e fundaçaõ do Convento a mesma Rainha dos Anjos, a quem era dedicado. [...]; e sentindo em seus coraçoens extremosos jubilos, com os mesmos receberaõ a Soberana Imagem, cantando o Te Deum laudamus, e a collocaraõ no Altar môr, e no mesmo em Tribuna levantada se venera hoje” Piedade, 1728, pp. 482-483.

290 Almeida, 1866, vol. III, p. 124.

291 “...seu primitivo assento, foi em uma baixa, junto á ribeira de Mata Cães, ao Este, do sitio actual, mas como o logar era pantanoso, os frades padeciam muitas doenças, e em 1579, houve aqui tal epidemia, que os frades morreram quasi todos, pelo que, os que escaparam, resolveram mudar de sitio, o que levaram a effeito em 1595, transferindo o mosteiro para a encosta do monte que fica ao Oeste.” Leal, 1762-1763, vol. IX, p. 654. Não podemos deixar de concluir que as obras de edificação decorriam ainda em finais do século XVI e, muito provavelmente, a ritmo lento. Conclui-se, também, que a igreja foi reconstruída — “com

dimensões mais avantajadas em comprimento e largura” Cordeiro, 1910, pág. 1 — ao contrário do que sugerem alguns autores que a apontam como único vestígio da construção infantina. As lápides sepulcrais existentes no chão da capela foram reutilizadas e embutidas nas paredes, destacando-se a que se encontra do lado do Evangelho, pertencente a João de Teive, contador-mór do reino e fidalgo dos reis D. João III e D. Sebastião. Em 1782 decorriam obras de construção de dependências do convento, nomeadamente da enfermaria. Ver ANTT — Convento de Nossa Senhora dos Anjos do Barro, maço 1, doc. 26. Em 1871 dá-se um violento incêndio, descaracterizando algum traço de originalidade que ainda pudesse conter. Para mais informações ver Cordeiro, 1910, pp. 16-28 e ANTT — AHMF - Convento de Nossa Senhora dos Anjos, cx 2 256 (ver Anexo Documental nº 8).

Altar môr, que servia nas principaes festas; e tambem da mesma fabrica hum pavilhaõ, para cobrir o cofre, em que se guarda o Santissimo Sacramento292.

Se a intervenção de D. Maria em Torres Vedras se pode entender num quadro alargado de responsabilidade administrativa293 — que não encontra paralelo em Viseu, cidade de que era Senhora — proporcionada pelas estadas na antiga vila, já as fundações em Coimbra e Santarém de um colégio franciscano e um convento beneditino, respectivamente, ficam-se a dever a visitas efectuadas em períodos diferentes. A primeira data de 1550, quando a família real se desloca a Coimbra e à sua universidade:

Com la ocasion desta asistencia en Coimbra supo la señora Infanta los Colegios, que hauia de diuersas

religiones, y tubo noticia que faltaua a los de San Francisco, de quien era singularmente deuota, suficiente comodidad para sus estudios, [...] resoluio labrarle luego vn Colegio de trinta Colegiales; y asi ordeno que de su hazienda se diesse lo necessario para la obra, y renda fixa para los que hauian de viuir la294.

Apesar da rapidez com que D. Maria tratou de instituir a verba necessária para a construção do novo colégio, só em 1597 se compraram as primeiras "casas" para erguer o edifício, cujo processo de construção se arrastou pelo século XVII adentro — a primeira pedra foi colocada em 1631 para só terminar em 1638 — conferindo à casa um pendor muito “jesuítico” nas suas formas, que conhecemos por gravuras anteriores à sua demolição295.

A segunda visita, a Santarém, data de 1561 levando a Infanta junto da imagem milagrosa de Cristo Crucificado, sob a proteção dos Apóstolos, que estava numa pequena

292 Piedade, 1728, pp. 483-484.

293 Que não encontra paralelo em Viseu, cidade da qual também era Senhora. Refira-se que a rainha D.

Catarina, logo após o casamento (1525), tinha promovido em Torres Vedras a reconstrução da paroquial de São Pedro, cujo pórtico manuelino ostenta as suas armas. A acção de D. Maria pode explicar-se, assim, pela continuidade dessa herança.

294 Pacheco, 1675, p. 103vº e Baião, 1737, p. 473.

295 A atribulada história deste colégio começa na fundação e, designadamente, na confusão gerada em torno

do nome e da ordem que o geria. Com feito, a Infanta queria que o colégio fosse de franciscanos, sob a invocação de São João Evangelista (veja-se o parágrafo 17 do seu testamento em Anexo Documental nº 68). Contudo as vissicitudes várias que impediram, em grande parte, o cumprimento das suas vontades testadas, têm aqui, também , reflexo, nomedamente devido à entrega do colégio aos frades lóios e não aos franciscanos. A presença dos Lóios na cidade de Coimbra vinha do reinado de D. Manuel, quando o rei decidira fundar um novo instituto, o Hospital Real de Nossa Senhora da Conceição (1503), com o propósito de gerir eficazmente as várias instituições de assistência da cidade. Alguns anos mais tarde, em 1548, instalaram-se os primeiros estudantes junto à igreja de S. Bartolomeu. Maria, 1679, p. 517.Todavia, a Universidade já estava instalada na zona mais alta da cidade e desde então que os estudantes dos lóios ansiavam poder mudar-se para junto da escola. Assim, pegando na verba deixada por D. Maria e atendendo à invocação que deixara expressa, os seus testamenteiros limitaram-se a entregar a construção do novo edifício à ordem dos Lóios, sendo a primeira pedra colocada a 6 de Maio (dia da festa secundária do patrono São João Evangelista). O colégio foi extinto em 1834 e depois foi ocupado pelo Estado para repartições públicas; nos anos 40 foi arrasado devido às obras da nova cidade universitária. Para o desenvolvimento deste tema ver Maria, 1679; Vasconcelos, 1938 e ANTT — AHMF - Colégio de São João Evangelista, cx 2 207.

ermida acima do Tejo. O estado de ruína da capela e a imagem milagrosa provocaram uma tal impressão na Infanta que tratou de mandar erguer uma nova ermida e obter, junto da colegiada de Nossa Senhora da Alcáçova, o direito a “separar e dismembrar imperpetuum ha dita jrmida”296, conseguindo-o num documento datado de 15 de Maio de 1564, assinado por D. Henrique. Alguns meses mais tarde — 19 Março de 1565 — a própria Infanta assina um alvará de tomada de posse da ermida297. O documento de 1564 dá-nos a descrição do estado em que D. Maria achou a capela e como a nobilitou, com a invocação de Convento do Senhor Santo Cristo do Milagre ou dos Apóstolos298:

[a] irmida estaua muito pobre de ediffiçios e ornamentos necessarios E hera huua muito pobre casa e muito

maL repairada seruida per hum jrmitão posto pellos conegos e cabido da dita egreia, E remdia em cada huum anno atee dous mil reis pouco mais ou menos, [...] que ella jmpetrante mandara reedifficar a dita jrmida da jnuocação dos appostolos que esta iundo da dita villa de sanctarem a dita jrmida era muito velha E estaua Ruinosa pera cair E era de telha vãa E que as imagens dos appostollos que estauão nas paredes della pintadas estauão Jaa apagadas e não tinha mais que huum altar E que ella jmpetrante mandara derribar as paredes velhas e tecto da dita jrmida E de nouo des os alicerses a mandara ediffiquar em muito maior e mais ampla forma de paredes muito fortes de pedra e cal E o tecto d abobeda E huua saacrestia E mandara nella fazer tres altares e todos os ornamentara de Riquos ornamentos E do mais necessario pera ho cultu diuino e com as alampadas necessarias pera ho seruiço da hirmida E com caliçes ect E Que assi mamdara fazer e

pintar em frandes Muito Riquos retauolos de singular e custosa pintura que mandara trazer e poer na dita jrmida onde ora estauão muito nobres e deuotos E de singular artifitio tudo pera onrra do cultu diuino e seruiço de nosso senhor299.

Mas só em 1571 a ordem de São Bento toma posse da sua nova casa, numa reunião na igreja dos Apóstolos em que estão presentes o desembargador da vila, António Dias, D. Jorge de Almeida e Frei Plácido de Vilalobo300. A oferta do convento aos beneditinos — para doze

296 O documento é mais explícito: “separar e dismembrar imperpetuum ha dita jrmida, da dita egreia de nossa senhora d alcaçoua com suas pertenças E que hos conegos e capitulo della se não podessem mais

intrometer no colhimento das offertas esmolas Remdas e fructos della nem em sua guouernança per uia alguua que fosse E que ella dita senhora fosse padroeira della em sua vida e depois seus sobcessores” ANTT — Convento de São Bento dos Apóstolos - Santarém, maço 1, doc. 1. (ver Anexo Documental nº 1).

297 ANTT — Convento de São Bento dos Apóstolos - Santarém, maço 1, doc. 35. (ver Anexo Documental nº

2).

298 “...Sancto Christo del milagros, o de los Apostolos, por el quadro que tiene de los doze, quando vino el Spiritu Sancto en figura de lengua de fuego,...” Pacheco, 1675, pp. 104vº-105.

299 ANTT — Convento de São Bento dos Apóstolos - Santarém, maço 1, doc. 1 (ver Anexo Documental nº 1). 300 " huã carta de doaçam da serenissima senhora Iffamte dona maria assinada por sua alteza e asellada do sello de sua chancelaria [...] doaçom da Iffamte dona maria Iffamte de portugal e dos algarues etc. a quantos esta minha carta virem faço saber que pella muyta deuoçaõ que tenho ao bem aventurado e glorioso sam bento ey por bem e me praz de dar e trespassare aos monges e Religiosos da sua ordem deste reino a

monges e um abade —foi acompanhada pelo dote de um olival contíguo, que suscitou, mais tarde, uma acesa disputa301.

Uma crónica setecentista (1738) faz-nos uma descrição resumida do que seria a igreja doada aos beneditinos:

He redonda, e pequena, formada sobre quatro arcos, trez ~q lhe servem de Capellas, e outro, em que esta a porta para a rua. A Capella mor he dedicada ao Sancto Crucifixo, a da parte da Epistola aos doze Apostolos, e esta foy a invocação e orago, com que se fundou, e a da parte do Evangelho ao Espirito Sancto, nestas duas se conservaõ ainda os retabolos, ~q a mesma Senhora lhe mandou vir de Flandres, e na Capella mor, tem huma tribuna de talha por dourar. Entre esta e as duas, tem à face duas capelinhas com seus retabolos dourados, a da parte do Evangelho do Patriarca S. Bento, e a da Epistola de S. Amaro.302

A documentação e as crónicas não nos fornecem muitos dados para o conhecimento da arquitectura do edifício do convento. Sabemos que no dia 1 de Novembro de 1755:

cahio todo o zimborio da Igreja, que arruinou as Capellas, exceptuada a mayor em que esta a Imagem milagrosa do Senhor Jesus da pastorinha303.

A extinção das ordens religiosas em 1834 desferia o golpe final na história do convento, que foi totalmente destruído pouco tempo depois304.

casa dos appstolos sita fora dos muros da villa de santarem que eu reedefiquey Deporey e ornamentey con todas as rendas fenitos proueitos e beneses que nella ora aja ou ao diante possa aver assi e da maneyra que eu tenho e possuo peraque nella se edifique monomento huã casa dedicada em honra e louvor do mesmo samto, e por esta somente sem outro aluara [...] tomem posse della e por elles se De ja guoverne e administre d oje por diamte pera o que mandey emtregar ao padre frei placido de vilha lobos abbade de sancto amdre de Rendufe procurador geral da dita ordem todos os papeis breues sentenças porque me pertemce conforme aos quaes lhe mandarey comprar seis mil reis de renda em beens de raiz que uendam

pera a dita casa, dada em lisboa sob meu sinal e sello aos vinte hum de mayo [1571]" ANTT — Convento de

São Bento dos Apóstolos - Santarém, maço 1, doc. 30; os documentos nº 12; 28 e 29 tratam do mesmo assunto.

301 ANTT — Convento de São Bento dos Apóstolos - Santarém, maço 1, doc. 6 [doc. datado de 1578]. A

morte da Infanta provocou o atraso nas obras; só em 1583 se completou a 1ª capela da igreja, onde ficou sepultada D. Jerónima de Villalobos. ANTT — Convento de São Bento dos Apóstolos - Santarém, maço 1, doc. 26 (ver Anexo Documental nº 7). A Infanta dotou, ainda, o convento com uma parte da relíquia de São Bento enviada de Roma pelo Papa Pio V a pedido expresso de D. Maria.

302 BPE — Cod. III 2-4, pp.316-317. O Dicionário de História da Igreja em Portugal, 1983, vol. II, p. 396

existe outra descrição da igreja: “De posse da ermida, a piedosa infanta ampliou-a com uma espécie de

transepto, tendo no topo o quadro de Cristo Ressuscitado, no acto de aparecer a Tomé rodeado dos outros Apóstolos, e no outro topo a descida do Espírito Santo sobre o colégio apostólico.” O autor não nos fornece a data desta “descrição”; contudo, julgamos que se trata de uma confusão entre a intervenção da Infanta e a pré-existência. Por um lado, porque mesmo quando modestos, os programas construtivos de D. Maria ultrapassam a mera edificação de um transepto, por outro, porque omite a encomenda dos retábulos vindos da Flandres e a existência de várias capelas.

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