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O Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL, criado pela Lei Nº 5.379 de 15 de dezembro de 1967, sucedeu às mobilizações anteriores em relação ao problema da educação dos adultos no país.

Com o golpe militar de 1964, os programas de alfabetização e educação popular que se haviam multiplicado, foram vistos como uma grave ameaça à ordem e seus promotores duramente reprimidos. Só foram permitidos programas de alfabetização de adultos assistencialistas e conservadores, vindo o próprio Governo Central a assumir o controle dessa atividade, lançando o MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização) (PAIVA, 1973, p. 283).

Para cuidar da política de alfabetização foi criado o MOBRAL, que só veio a funcionar na década de setenta. Cunha (1991) definiu com precisão seus objetivos, inclusive, o eleitoreiro:

Sua inspiração provinha das inúmeras campanhas e cruzadas que se promoveram para livrar o país da ‘sujeira’ do analfabetismo, como se a falta do conhecimento da leitura e da escrita fosse a causa dos males do nosso povo: a pobreza, a doença, e até mesmo a opressão política (...).O entusiasmo por mais esse movimento de alfabetização provinha, também dos pedagogos da ditadura e dos economistas e militares travestidos de educadores que ignoravam que o analfabetismo só foi superado, historicamente, por dois caminhos: pela expansão das oportunidades de ensino público, gratuito, acompanhada ou precedida por significativas melhorias do padrão de vida das classes populares,; ou, então, de campanhas maciças de educação popular durante ou após uma revolução, como na União Soviética, na China, em Cuba, no Vietnã e, mais recentemente, na Nicarágua. Nenhuma dessas condições estavam presentes no Brasil dos anos 70 (...). Restava a solução das campanhas maciças de educação popular. Mas o MOBRAL não podia fazer isso, pois o objetivo do governo autoritário, anti-revolucionário e anti-reformista, era criar, pela via ‘doce’ da alfabetização, uma base política para novos eleitores (alfabetizados, portanto) para a sustentação política do regime (CUNHA apud SCOCUGLIA, 1986).

Entre os técnicos brasileiros e os integrantes da USAID, houve também uma convergência nos propósitos básicos de enquadrar a educação brasileira nos moldes da política de desenvolvimento econômico em vigor. Foram adotados padrões educacionais de acordo com os interesses da política externa norte-americana, cujo principal alvo era a América Latina, com especial atenção ao caso brasileiro1.

Em relação às implicações dessa conjuntura política, Romanelli (1978, p. 257) diz que:

após 1964, a redefinição do processo político e do modelo econômico criou, em princípio, condições para o agravamento da crise no setor educacional, então desfavorecido de ambos os lados, (do setor político e, até certo ponto, do setor econômico), mas já contando com um certo grau de politização de estudantes e professores.

Até dois anos após o golpe não se deu atenção à educação de adultos. Só a partir de 1966, o governo retoma, através do Ministério da Educação, o problema do analfabetismo sob pressão internacional.

Durante a década de 70, o MOBRAL expandiu-se por todo o território nacional. As novas autoridades entendiam que os movimentos anteriores ao golpe militar

teriam distorcido os propósitos de conscientização levando à politização prematura e mal orientada dos alunos e colocando em risco a formação cristã e democrática do nosso povo. Por isso o movimento fazia restrições ao método Paulo Freire - que deixaria de lado alguns fonemas importantes não encontrados nos vocábulos portadores de idéias-forças escolhidas, bem como a reutilização de todos os fonemas através de textos - e dispunha-se a elaborar novo material didático e aplicar novos métodos com uma tarefa de canalização dos legítimos anseios de promoção social para rumos capazes de assegurar a sua satisfação plena e tão imediata quanto possível, na atual conjuntura sócio-econômica do Brasil (PAIVA, 1973, p. 295).

Uma de suas iniciativas mais importantes foi o Programa de Educação Integrada (PEI), pelo qual nos anos 80, pequenas iniciativas foram se ampliando, construindo canais de troca de experiências, reflexão e articulação, desdobrando-se em turmas de pós-alfabetização.

Nesse movimento de preocupações e iniciativas sobre educação de adultos, tanto no cenário nacional como no internacional, o Brasil participa de um encontro na China (1992), ocasião em que deveria apresentar o Plano Decenal de Educação para Todos, o que não ocorreu. Posteriormente, em Brasília, aconteceu a Semana Nacional de Educação para Todos, e, durante esse evento, foi elaborado o Plano Decenal de

Educação do Brasil em versão preliminar, por exigência da Conferência. Com ênfase maior à educação das crianças, a educação de adultos é mencionada timidamente. Afirma Souza (1998, p. 23-33) que:

A expressão educação básica no texto do Plano Decenal não tem o mesmo significado que adquire na Lei nº 9394/96. Nesta a educação básica passa a ser o mínimo de escolarização (11 a 12 anos) a que terá direito o cidadão e a cidadã brasileira, ainda que a sua fase final ( o ensino médio)... Ao ampliar o alcance da EJA até o final do ensino médio, reduz seu conceito a processos escolares fazendo um recorte na amplitude que vinha adquirindo esse conceito na América Latina (por toda a vida/continuada).

A concepção e finalidade da educação para o MOBRAL é de adaptação, investimento sócio-econômico, preparação de mão-de-obra para o mercado de trabalho. Como esse mercado se transforma, também os quadros de mão-de-obra devem ser atualizados pela educação, daí seu caráter permanente para a reciclagem constante. Subjacente a essa concepção de educação existe uma visão de mundo e de homem bem definida.

O MOBRAL assume o mundo como “acabado”, dentro do Modelo Brasileiro de Desenvolvimento (70 a 75) e que necessita de certo tipo de educação capaz de contribuir para a concretização desse Modelo (JANNUZI, 1983). Assim, constrói sua proposta pedagógica baseada na crença de que a elite é capaz de elaborar projetos, os melhores possíveis, que devem ser executados obedientemente pelo povo.

Também supõe, apoiado em posições teóricas, a manutenção da contradição elite e povo, usando o método antidialógico em sua pedagogia. Para o MOBRAL, alfabetização é aprendizagem do ler, escrever, contar, início, portanto, da preparação de mão-de-obra, onde estas habilidades são elementos importantes, devido à necessidade de informação e treinamento no processo produtivo do modelo sócio-econômico brasileiro.

Essa concepção de educação como adaptação, preparação de mão-de-obra para o mercado de trabalho visa motivar o alfabetizando a ingressar no desenvolvimento, facilita esse ingresso de forma funcional e acelerada, donde o treinamento de habilidades adequadas a ocupar os cargos existentes no mercado de trabalho, começando com a aprendizagem das técnicas de ler, escrever, contar, de forma a permitir que pela educação todos transformem a realidade através da ação executada no sentido desejável pela política desenvolvimentista em vigor no período (JANNUZZI, 1983).

Para o MOBRAL alguns homens são capazes de críticas, cabendo a eles definir as metas que devem ser concretizadas pelos alfabetizadores e alfabetizandos. O mundo está predeterminado, deve chegar ao fim que sua elite dirigente percebe como desejável, e que são os propostos pela política educacional vinculada ao Modelo Brasileiro de desenvolvimento, de caráter acentuadamente econômico. Para isso faz uso do método que é basicamente antidialógico, isto é, parte de objetivos previamente definidos pelo MOBRAL/CENTRAL, discutido nas comunidades apenas os melhores meios de concretizá-los.

As técnicas utilizadas: codificação, decodificação, visam, sobretudo, à aprendizagem do ler, escrever, contar. São sempre análises e sínteses parciais que jamais problematizam a realidade, mas que devem levar a aceitar as metas desenvolvimentistas e o trabalho de sua concretização. São análises e sínteses que mantêm a posição vertical: educador que sabe, educando que ignora, elite que resolve, que elabora planos que o povo executará.

Portanto, se o MOBRAL mantém o antidiálogo, análises e sínteses parciais não desveladoras da realidade, visando sempre à aceitação das metas do desenvolvimento

como ideais a serem atingidos, a educação não será momento de preparação para esse desenvolvimento.

2.2 FUNDAÇÃO EDUCAR: mais um braço de controle