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2.2 Desempenho humano no trabalho

2.2.1 O modelo adotado para o estudo do desempenho humano no trabalho

Conforme Coelho Jr et al. (2010) e Bendassolli e Malvezzi (2013), a literatura dos campos da Psicologia Organizacional e do Comportamento Organizacional tem enfatizado sua pesquisa do desempenho humano no trabalho pela ótica da avaliação de desempenho, propondo variadas medidas de desempenho. Algumas destas pesquisas apresentam uma ênfase eminentemente quantitativa, utilizando indicadores numéricos ou objetivos do próprio negócio (lucratividade, rentabilidade e outros), enfatizando o desempenho sob a ótica dos resultados, e outras, mais subjetivas, que se baseiam na percepção dos atores sociais implicados no processo de desempenho no trabalho, enfatizando o construto sob a ótica dos comportamentos e ações do trabalhador.

No intuito de atender à lacuna da literatura no que tange à concepção de uma estrutura multidimensional e de uma medida de avaliação do desempenho validada cientificamente no contexto brasileiro, Coelho Jr., Borges-Andrade, Seidl e Pereira (2010) propuseram uma medida de avaliação de desempenho humano no trabalho baseada no autorrelato. A medida obteve propriedades psicométricas válidas para retratar a percepção do indivíduo quanto à sua própria performance no trabalho, tendo sido aplicada em uma amostra de 257 trabalhadores da área de segurança pública do Distrito Federal.

Os autores (Ibid., p. 2) justificam a utilização de uma abordagem de autorrelato partindo da própria reflexão sobre o processo de avaliação do desempenho:

[...] avaliar desempenho não se refere apenas a que tipo de critério ou medida utilizar. Envolve, para além disto, um processo de construção interdependente entre avaliadores e avaliados, de modo que se deve considerar a influência do contexto sócio histórico bem como a interação social entre eles e a comunicação, características fundamentais neste processo.

Esta concepção reforça a compreensão de que trata-se de um processo que reúne diversas dimensões psicossociais (como afeto e cognição), não restringindo-se, portanto, aos próprios resultados do trabalho. Assim, situam a escala proposta dentre o grupo de medidas que se baseiam na percepção dos atores sociais envolvidos na ação de desempenhar o trabalho, enquanto um comportamento avaliado e julgado sob um conjunto de parâmetros construídos em um contexto social.

Segundo Coelho Jr. et al. (2010), as medidas perceptuais de desempenho humano no trabalho são de natureza auto (o próprio trabalhador se avalia) ou heterorrelatada (o indivíduo avalia colegas, pares, subordinados, chefias, dentre outros). A despeito da provável parcialidade decorrente dos fenômenos humanos sociais, defendem que podem ser amplamente utilizadas em pesquisas empíricas e afirmam que vêm satisfatoriamente apresentando correlações significativas com medidas objetivas de desempenho (FONSECA, 2001; HANDEL, 2005; LUCENA, 1992; RAINEY; STENBAUER, 1999 apud COELHO JR. et al., 2010).

Os autores enfatizam ainda a relevância do uso de medidas perceptuais de desempenho uma vez que oferece um importante indicador acerca da percepção do trabalhador sobre o seu próprio desempenho, bem como dos demais atores sociais. Enquanto baseada no autorrelato, a escala proposta traduz-se em uma medida psicométrica acerca de quanto o desempenho do trabalhador está sendo bem avaliado sob sua própria percepção. Os autores defendem também a sistematização e objetividade na elaboração da escala, a qual buscou parâmetros específicos de validação, fugindo tanto do subjetivismo acrítico quanto do reducionismo dos resultados enquanto referências de avaliação do desempenho humano no trabalho.

A escala proposta foi elaborada após uma extensa análise do estado da arte da avaliação do desempenho humano no trabalho, bem como das principais categorias e dimensões de desempenho comumente descritas. Em sua primeira versão, era composta por 31 itens que traduziam a percepção do indivíduo quanto ao seu próprio desempenho no trabalho, com avaliação de tarefas de natureza técnica, administrativa e operacional. Os itens retratavam comportamentos associados a custos, cumprimento de prazos, planejamento da ação, otimização do tempo e visão sistêmica,bem como avaliam a postura profissional do indivíduo, sua busca por novas formas de executar o trabalho e o grau de esforço necessário para execução da ação. A matriz de correlações do instrumento de desempenho mostrou-se favorável, com KMO=0,96, obtendo uma estrutura do construto desempenho humano no trabalho por meio de 5 fatores (Quadro 03): Restrição ao Desempenho; Grau de Esforço e Conhecimento da Tarefa; Execução,

Monitoramento e Revisão do Desempenho; Regulação do Desempenho, e Autogerenciamento do Desempenho.

Hollanda (2014), ao ampliar a aplicação da referida escala a uma amostra de 1294 trabalhadores de uma organização da área de segurança pública distribuídos em todos os estados do país, propõe adequações ao modelo fatorial e ao instrumento inicialmente proposto. A nova escala resultou em propriedades psicométricas mais adequadas do que a primeira e é composta por 30 itens distribuídos em 4 fatores: Autogerenciamento do Desempenho, Execução e Avaliação das Tarefas, Alinhamento Estratégico do Desempenho e Restrição ao Desempenho.

O Quadro 4 traz uma consolidação das propriedades psicométricas, bem como nomenclaturas utilizadas nos dois estudos supracitados, evidenciando sua reorganização na quantidade de itens, alteração na nomenclatura dos fatores e consequente melhoria nos índices de consistência interna (Alpha de Cronbach).

Quadro 4 – Índices psicométricos da escala de Desempenho Humano no Trabalho Coelho Jr. et al. (2010)

N=257

Hollanda (2014) N=1294

Fator Itens Alpha de Cronbach Itens Alpha de Cronbach

Restrição ao Desempenho 3 0,60 3 0,88

Alinhamento Estratégico do

Desempenho --- --- 5 0,88

Execução e Avaliação das

Tarefas --- --- 9 0,89

Autogerenciamento do

Desempenho 8 0,90 13 0,93

Grau de Esforço e

Conhecimento das Tarefas 3 0,60 --- ---

Execução, Monitoramento e

Revisão do Desempenho 4 0,66 --- ---

Regulação do Desempenho 12 0,91 --- ----

Fonte: Elaboração do autor.

O primeiro fator, “Restrição ao desempenho”, retrata o quanto o indivíduo percebe falta de apoio e obstáculos ao seu desempenho, especialmente no que tange à relação entre a demanda de tarefas do dia-a-dia, o prazo estabelecido para sua realização e seus impactos sobre a qualidade do trabalho. Este fator permaneceu inalterado tanto no conteúdo dos itens que o compõem quanto na nomenclatura utilizada nos dois estudos. Contudo, observa-se que no estudo de Hollanda (2014), com uma amostra maior (N=1294), o índice de consistência interna Alpha

de Cronbach obtido mostrou-se mais satisfatório (0,88), se comparado com o seu estudo de validação (0,60) de Coelho Jr. et al. (2010).

O segundo fator identificado, trata do grau de alinhamento entre o comportamento e ações individuais do trabalhador e os objetivos organizacionais, ou seja, o quanto o indivíduo percebe a contribuição do seu trabalho para o desempenho geral da organização e sua predisposição a reorienta-lo em função de novos direcionamentos da organização. Este fator foi intitulado “Alinhamento Estratégico do Desempenho” e surgiu a partir do reagrupamento de cinco itens do fator inicialmente nomeado “Regulação do Desempenho” por Coelho Jr. et al. (2010), o qual também apresentou bom índice de consistência interna (0,88).

O terceiro fator “Execução e Avaliação das Tarefas” busca abordar os conhecimentos necessários para a execução das tarefas, percepções sobre como se dá a execução das tarefas e a avaliação das mesmas pelo trabalhador. Este fator foi proposto no estudo de Hollanda (2014), com índice de consistência satisfatório (0,88), através da junção de dois fatores da escala original: “Execução, Monitoramento e Revisão do Desempenho” e “Grau de Esforço e Conhecimento das Tarefas”. Além dos itens destes fatores, também englobou-se dois itens de outros dois fatores da escala original.

O quarto fator identificado reflete a capacidade do indivíduo de administrar a execução e tarefas do próprio trabalho. O fator teve a nomenclatura mantida “Autogerenciamento do desempenho”, embora com a exclusão de um item que fora melhor agrupado no fator “Execução e Avaliação das Tarefas” e a inclusão de seis itens do fator “Regulação do Desempenho”. Com tais alterações na composição do fator, o mesmo apresentou uma evolução no índice de consistência interna de 0,90 (COELHO JR. et al., 2010) para 0,93 (HOLLANDA, 2014).