• Nenhum resultado encontrado

2. A questão energética brasileira

2.1 O setor elétrico brasileiro

2.1.3 O modelo estatal das grandes hidrelétricas

privado, e em 1946 foi lançado o primeiro Plano Nacional de Eletrificação, que privilegiava a criação de setores interligados regionais e a apontava para a atuação do Estado, que deveria agir supletivamente a iniciativa privada(Centro de Memória da Eletricidade).

No decorrer da décade de 1950, os governos estaduais foram constituindo suas empresas num contexto de discussões sobre os rumos do setor de energia elétrica. Com a volta de Getúlio Vargas ao poder houve a retomada do Estado desenvolvimentista, interventor e planificador, com uma economia baseada na industrialização nacional. Na tentativa de equacionar a crise de energia elétrica foi criado, em 1954, o Fundo Federal de Eletrificação (FFE) e o Plano Nacional de Eletrificação (PNE) que propunha uma reestrutração do setor, cabendo ao Estado a produção e transmissão de energia e a distribuição poderia ser da iniciativa privada. (FUSP: 2011)

No governo de Juscelino Kubitschek o crescimento da economia brasileira foi pautada pela estratégia desenvolvimentista, e teve no capital externo a base do financiamento da industrialização. Em relação a política referente ao setor de energia, “Juscelino privilegiou a criação de empresas públicas federais e estaduais para organizarem a expansão da geração de energia elétrica, mas deixou espaço para investimentos privados na distribuição da mesma” (FOSCHIERA, 2009:99).

O MAB (Caderno nº6, s/d:9) observa que no final dos anos 1950 os cortes e o racionamento de energia atingiu os principais centros urbanos do país e passou a fazer parte do cotidiano da população. Dentro desse contexto, foi criada a Central Elétrica de Furnas com o objetivo de abastecer a região Sudeste que vivia um processo rápido de industrialização e urbanização (FUSP:2011). Outra ação foi a criação, em 1960, do Ministério de Minas e Energia e em 1962, a constituição das Centrais Elétricas Brasileira – Eletrobrás, empresa pública responsável pelo planejamento, execução e operação dos empreendimentos do setor de energia elétrica, criando assim as condições para a estatização do setor elétrico, concretizada durante a ditadura militar.

2.1.3 O modelo estatal das grandes hidrelétricas (1961-1990)

Com a formação da Eletrobrás houve uma mudança na estrutura de organização e produção de energia elétrica, que passou de uma produção regionalizada para

um modelo com característica nacional e sistematizada. Assim, a Eletrobrás passou a atuar como empresa holding20 das concessionárias públicas de energia elétrica do governo federal. Essa nova organização procurou cobrir todas as regiões do país e se constituiu num sistema elétrico monopolista, também chamado de vertical, sob o controle do setor público (nacional, estadual, municipal) tanto a geração, como a transmissão e a distribuição de energia.

O MAB (Caderno nº 6, s/d) destaca que o modelo estatal de grandes hidrelétricas teve como fundamento os estudos realizados por técnicos e especialistas do consórcio Canambra,21 contratado pela Eletrobrás, que concluíram pela construção de uma série de hidrelétricas para atender o crescimento do mercado. O MAB destaca ainda, que o planejamento e a implantação de grandes projetos hidrelétricos das décadas seguintes se apoiaram no inventário de potencial realizado nesse estudo, completado, na Amazônia e na região Nordeste com a participação da Eletrobrás.

No contexto da política de nacionalização e estatização do setor de energia elétrica, em 1964 a Eletrobrás adquiriu as empresas do grupo AMFORP, criou em 1968 a Centrais Elétricas do Sul do Brasil (Eletrosul), e em 1973 a Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. (Eletronorte), consolidando a estrutura básica do sistema Eletrobrás, que já tinha Chesf (1945) e Furnas (1957).

Com a crise do petróleo, em 1973, ocorreu a substituição do uso de combustíveis fósseis pela eletricidade nas indústrias eletrointensivas22. Em relação a esse momento,

[...] com a elevação dos preços os países centrais passam a transferir para países periféricos, dependentes e ricos em potencial energético, como o Brasil, uma série de indústrias que consomem muita energia. Assim, o Brasil se transformava, progressivamente [...] em um exportador de produtos eletrointensivos (MAB Caderno nº 6, s/d:9).

Foschiera (2009:106) ao resgatar esse período da crise do petróleo aponta para o fato de que com ela houve uma alteração no nível de autonomia das empresas energéticas estatais, no caso a Petrobrás e a Eletrobrás. E assim, a questão da energia passou a ser

20 Agrupava empresas de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica. Incialmente com quatro

subsidiárias (Chesf, Furnas, Companhia Hidrelétrica do Vale Paraíba (Chevap) e a Termelétrica de Charqueadas, no Rio Grande do Sul) e dez concessionárias estaduais.

21 Canambra Engineering Consultants Limited, consórcio realizado em 1962 por firmas do Canadá, Estados

Unidos e Brasil. (ELETROBRÁS, 2011).

22

considerado caso de segurança nacional, sendo conduzida pelo gabinete da Presidência e pelo Conselho de Segurança Nacional.

Dessa forma, os anos de 1970 presenciaram a construção de grandes usinas hidrelétricas, onde os grandes projetos ganharam sustentação estrutural dentro da doutrina geopolítica do regime militar e financiamento através de uma política de atração de capitais externos.

Nesse contexto empresas de estudos e projetos para a construção de usinas hidrelétricas tiveram enorme crescimento no mercado, assim como as empresas voltadas à construção das hidrelétricas. Com respeito a esse aspecto Gonçalves Jr. (2002:130) afirmou:

Neste cenário, os grandes capitais (nacionais e internacionais) passam a intensificar sua participação no setor elétrico brasileiro, na oferta de mercadorias e nos negócios que proporcionam sua maior valorização. Participando da venda de serviços para os estudos de projeto; ofertando financiamentos a elevadas taxas de juro; vendendo uma série de serviços nas construções; projetando e vendendo máquinas e equipamentos, dentre outras atividades lucrativas. Ademais, são também os grandes beneficiários pela implantação desses empreendimentos, através das tarifas de energia elétrica subsidiadas ao parque industrial.

Foi nesse contexto que os projetos de construção da Usina Hidrelétrica Tucuruí, pela Eletronorte, e a Usina Hidrelétrica Itaipu, executada pelos governos do Brasil e do Paraguai (Itaipu Binacional) foram implementados. Conforme Foschiera (2009), até a década de 1980 o sistema elétrico brasileiro organizado pelo Estado era reconhecido internacionalmente pela sua eficiência na construção das grandes obras nas usinas hidrelétricas, por meio da interconexão dos sistemas, pela sua autonomia e pela sua capacidade de intervir no território.

O MAB destaca que “o povo brasileiro fica com a dívida externa, as florestas destruídas, os férteis vales inundados e as populações expulsas (...) tratadas como gado, tangidas com violência e total desrespeito aos seus direitos” (MAB Caderno nº 6, s/d:9). Nesse sentido Bermann (2007) nos diz que no relacionamento das empresas do setor elétrico brasileiro com as populações ribeirinhas atingidas pelas obras

[...] prevaleceu a estratégia do “fato consumado” praticamente em todos os empreendimentos. Enquanto a alternativa hidrelétrica era sempre apresentada como uma fonte energética “limpa, renovável e barata”, e cada projeto era justificado em nome do interesse público e do progresso, o fato é que as populações ribeirinhas tiveram violentadas as suas bases materiais e culturais de existência. As obras

promoveram o deslocamento forçado dessas populações, acompanhado por compensações financeiras irrisórias ou inexistentes; o processo de reassentamento, quando houve, não assegurou a manutenção das condições de vida anteriormente existente (BERMANN, 2007:142, grifo do autor).

A partir dos anos de 1980 o setor elétrico foi afetado por uma crise financeira que se instaurou em nível mundial, provocando uma reversão nas políticas adotadas até então, levando o modelo a mostrar suas deficiências, o que repercutiu na situação eocnômico- financeira das concessionárias provocando um desequilíbrio financeiro no setor elétrico estatal, o que serviu de justificativa para a privatização do setor elétrico brasileiro.(FOSCHIERA, 2009).

Documentos relacionados