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O movimento em prol do acesso livre ao conhecimento científico e tecnológico

No documento Para+entender+a+ciencia+da+informacao (páginas 139-145)

Os artigos publicados nos periódicos científicos são fontes muito importantes para a pesquisa de todas as áreas. É impos- sível manter um programa de pesquisa em universidade ou instituto de pesquisa sem o apoio de uma boa coleção de peri- ódicos. Como foi visto, essa coleção era inteiramente impres- sa até muito recentemente e as bibliotecas se esforçavam para

manter em dia uma coleção tão completa quanto permitiam os seus orçamentos, pois excelência de coleção era também um fator de prestígio acadêmico.

Os periódicos científicos são produzidos principalmente por editoras comerciais e por instituições ligadas à pesquisa, tais como universidades, sociedades científicas e institutos de pes- quisa. Nem todos os periódicos têm o mesmo status na opi- nião das comunidades científicas, pois existe uma hierarquia baseada em prestígio que os classifica e separa. Para as editoras comerciais, que visam lucro, editar periódicos de alto prestí- gio é um excelente negócio, pois bibliotecas de todo o mundo não podem deixar de assiná-los. Essas editoras, e também as não comerciais, são ainda beneficiadas pela cessão do direito autoral a que os autores são obrigados como condição para terem seus artigos publicados (além, é claro, da aprovação pe- los pares). Isso quer dizer que o próprio autor não pode dis- por de seu artigo como quiser, pois já não é seu dono. É dono, sim, das idéias contidas no artigo, mas não daquele artigo, aquele objeto físico publicado pela editora. Apenas a editora pode au- torizar, por exemplo, a reprodução e distribuição gratuita do artigo aos alunos de um professor/autor, seja por via impressa ou digital. Até aproximadamente a década de 1970, os preços dos principais periódicos internacionais eram razoavelmente acessíveis às grandes e médias bibliotecas universitárias. Por volta de 1970/1980, as editoras comerciais começaram a au- mentar de maneira descabida o preço das assinaturas. Inicial- mente, as bibliotecas se esforçaram para pagar e não desfalcar suas coleções, mas a situação começou a ficar insustentável, e muitas tiveram que desistir de vários títulos por falta de con- dições financeiras. O fenômeno, mundial, ficou conhecido como “a crise dos periódicos”. Foi especialmente ruim para

bibliotecas de países em desenvolvimento como o Brasil, mas atingiu também, e muito, bibliotecas dos países desenvolvi- dos. Esse fato, combinado com o desenvolvimento das tecnologias de informação e acesso cada vez mais fácil ao com- putador e internet, propiciou a emergência de um movimento em prol do acesso livre ao conhecimento científico.

O movimento em prol do acesso livre à literatura científica, entendida essa literatura principalmente como artigos publi- cados em periódicos, propõe que nada seja cobrado dos leito- res ou das bibliotecas. As editoras e sociedades científicas devem buscar em outras fontes os subsídios necessários à publicação. Aqueles que aderem ao movimento, sejam editoras, editores, autores ou agências de fomento, se comprometem a eliminar barreiras financeiras, técnicas e legais que impedem o livre aces- so aos artigos (SUBER, 2002). Naturalmente, há muito de uto- pia nessa proposta. Mas o fato é que a idéia do acesso livre faz muito sentido num mundo em que o acesso ao conhecimento científico é indispensável ao avanço do próprio conhecimento científico e á sobrevivência de indivíduos na sociedade e que, graças à tecnologia, existem meios capazes de tornar isso rea- lidade a um custo perfeitamente possível para as instituições interessadas. A posição das editoras comerciais, e até mesmo algumas institucionais, é claramente contrária, especialmente das grandes empresas como a Elsevier, líder mundial dentre as editoras de informação em ciência, tecnologia e medicina, como ela própria se intitula.

Várias iniciativas globais têm marcado a história do movimen- to em prol do livre acesso ao conhecimento científico, e estão bem descritas na literatura2. As próprias revistas (versões ele-

trônicas) podem deixar livre o acesso aos seus artigos, ou os autores podem por incitativa própria depositar seus trabalhos

(idealmente já avaliados) em repositórios institucionais ou temáticos. “Repositórios institucionais” são bases de dados de textos completos da produção científica, técnica e intelectual, gerada em uma instituição, uma universidade, por exemplo. A instituição se compromete, por meio desse repositório, a pro- mover e assegurar o controle bibliográfico e facilitar o acesso à informação ali depositada, além de responsabilizar-se também pela sua preservação. O repositório de uma universidade irá então armazenar as versões digitais de toda produção intelec- tual gerada na instituição e permitir acesso livre a todos que se interessassem por esses documentos. Embora repositórios não pratiquem avaliação, todos os documentos depositados deve- riam ser previamente avaliados, por exemplo, seriam versões dos artigos publicados em revistas ou livros e capítulos de li- vros, e teses e dissertações já defendidas. A definição de repositórios temáticos é bastante semelhante, com a diferença de que são dedicados a um tema, não importando em que ins- tituição o documento foi produzido. O mais famoso repositório temático é o pioneiro ArXiv, iniciado nos Estados Unidos em 1991 com preprints na área de física, oferecendo hoje acesso livre a 428,640 preprints em Físca, Matemática, Com- putação e Biologia Quantitativa3. Preprints são versões ainda não

publicadas, mas completas ou quase completas, de resultados de pesquisa. Um manuscrito em fase de avaliação por uma revista pode ser considerado um preprint.

Tem havido várias iniciativas, no mundo todo, de declaração de apoio ao acesso livre. O Brasil é um dos países pioneiros e vem mantendo um número relativamente significativo de repositórios (especialmente de teses e dissertações) e de ações em prol deles. No entanto, estudos têm mostrado que, apesar das citações aumentarem muito em relação aos artigos publi-

cados em revistas de acesso exclusivo por assinatura, a adesão dos pesquisadores ao movimento de acesso livre tem sido muito baixa no mundo inteiro.

Apesar da dificuldade de convencer os pesquisadores a aderi- rem ao movimento para o acesso livre e de os repositórios institucionais ainda estarem em fase de formação, essa nova forma de comunicar o conhecimento científico está avançando e revolucionando a comunicação científica. Um exemplo claro é a quantidade de citações que um documento de acesso livre recebe. Ainda não se concretizaram todas as promessas e potencialidades da idéia, mas já é possível imaginar seu impac- to. Essas são questões novas e vibrantes ao estudioso da co- municação científica pela ótica da Ciência da Informação.

Conclusão

A preocupação com a informação científica está na origem da Ciência da Informação e os estudos relacionados com a comu- nicação científica continuam centrais à área. A Ciência da In- formação, como disse Saracevic na frase mencionada acima, está inexoravelmente ligada à tecnologia, esse fato tem sido determinante na comunicação científica. O controle e acesso à informação científica têm implicações sociais, políticas e eco- nômicas que extrapolam o cuidado com as publicações. A Ci- ência da Informação nasceu dessa preocupação e tem, ao longo do tempo, acompanhado a evolução da comunicação científica, contribuindo, com seus estudos e produtos para chegarmos um pouco mais perto da utopia de Otlet. Talvez os repositórios institucionais sejam, hoje, o caminho mais promissor para isso.

Notas

1 BUSH, Vannevar. As we may think. Atlantic Monthly, July, 1945.

2 Veja por exemplo: Suber, P. Uma breve introdução ao acesso livre. Tradução do

texto de Peter Suber por Fernanda Sarmento. edição original em http:// www.earlham.edu/~peters/fos/brief.htm p. 2004.

3 Informação disponível no site do Repositório: arXiv.org. Cornell University

Library. Disponível em http://arxiv.org/. Acesso em 9 de julho de 2007.

Referências

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No documento Para+entender+a+ciencia+da+informacao (páginas 139-145)