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O nazismo como uma forma de barbárie: consciência coisificada

3 CONCEITO DE EMANCIPAÇÃO EM ADORNO

3.1 O nazismo como uma forma de barbárie: consciência coisificada

Adorno (1985) menciona o nazismo como uma forma de barbárie, pois a violência se tornou algo banal pelo fato de acontecer constantemente. Com isso, as pessoas passaram a identificar-se com ela, mesmo sabendo que a violência está desvinculada de objetivos racionais, o que facilmente pode ser relacionado aos dias atuais a partir de frases típicas como “bandido bom é bandido morto” ou “morreu, mas ele já era envolvido no crime” ou, ainda, “se apanhou é porque algo fez de errado”, entre tantas outras ouvidas e/ou lidas no cotidiano social.

O fato é que o nazismo (ou algo semelhante a ele) sobrevive e ainda continua presente nos homens e nas condições que o cercam. Este que insuflou o narcisismo coletivo, denominado de orgulho nacional, inflando os impulsos dos indivíduos (ADORNO, 1985). Para Adorno, a dimensão humana do homem, a sua emancipação e autonomia, o seu poder de crítica e criatividade tornam-se ameaçados pelo sistema da civilização industrial.

O processo de civilização pelo qual ele passa no decorrer do tempo provoca uma pressão, um sentimento de confinamento que é exacerbado em um mundo administrado, sendo enclausurado em uma situação cada vez mais socializada, como uma rede densamente interconectada. Para Adorno (1985), quanto mais densa for essa rede, mais o indivíduo busca escapar, sair da mesma, que, devido à sua densidade, o impede, fazendo surgir uma raiva contra a civilização, o que tornará o mesmo alvo de uma rebelião violenta e irracional.

Assim, a civilização gera, simultaneamente, um processo de integração e desintegração, nas palavras de Adorno, gera a desagregação. Na opinião do autor, confirma- se, na história das perseguições, que a violência se volta contra os fracos, dirigindo-se, principalmente, aos que são considerados socialmente fracos e, ao mesmo tempo, felizes, independente de ser verdade ou não. O autor salienta que:

Se fosse obrigado a resumir em uma fórmula esse tipo de caráter manipulador ¾ o que talvez seja equivocado embora útil à compreensão ¾ eu o denominaria de o tipo da consciência coisificada. No começo as pessoas deste tipo se tornam por assim dizer iguais a coisas. Em seguida, na medida em que o conseguem, tornam os outros iguais a coisas. (ADORNO, 1995, p. 130).

Adorno fala de uma consciência coisificada e a exemplifica com o que chama de “fetichismo da técnica”, o qual define por uma idolatria por coisas e máquinas, criando uma relação do homem com elas, com um exagero irracional, patogênico. Para ele, a única explicação para isso é a incapacidade de amar, a qual atinge a todos, apenas com diferença no grau.

A consciência coisificada é um comportamento livre em relação a qualquer assunto, colocando a ciência como procedimento entre si e a experiência viva. Uma das experiências da consciência coisificada é se manter restrita a si mesma, justificando-se a qualquer custo. Sobretudo, é uma consciência que defende a relação do vir a ser, impondo como absoluto o que existe de um determinado modo (ADORNO, 1985).

Adorno (1985) questiona-se de que maneira as heranças histórico-culturais podem contribuir para que se possa escolher de maneira equilibrada as condutas sociais, políticas e éticas de maneira que estas apontem para uma ampliação e defesa da democracia, o que aproxima seus pensamentos da autonomia de Kant, também acreditando que a educação é o caminho para alcance da emancipação. No entanto, é peculiar que a emancipação esteja efetivamente centrada no complexo pedagógico (ADORNO, 1985). Assim, não é suficiente para a educação somente buscar a autonomia do indivíduo, já que vai de encontro ao que aceita a sociedade repressiva. Sobre este aspecto Adorno (1995, p. 121) explica:

Como hoje em dia é extremamente limitada a possibilidade de mudar os pressupostos objetivos, isto é, sociais e políticos que geram tais acontecimentos, as tentativas de se contrapor à repetição de Auschwitz são impelidas necessariamente para o lado subjetivo. Com isto refiro-me, sobretudo também à psicologia das pessoas que fazem coisas desse tipo. Não acredito que adianta muito apelar a valores eternos, acerca dos quais justamente os responsáveis por tais atos reagiriam com menosprezo; também não acredito que o esclarecimento acerca das qualidades positivas das minorias reprimidas seja de muita valia. É preciso buscar as raízes nos perseguidores e não nas vítimas, assassinadas sob os pretextos mais mesquinhos. Torna-se necessário o que a esse respeito uma vez denominei de inflexão em direção ao sujeito. É preciso reconhecer os mecanismos que tornam as pessoas capazes de cometer tais atos, é preciso revelar tais mecanismos a eles próprios, procurando impedir que se tornem novamente capazes de tais atos, na medida em que se desperta uma consciência geral acerca desses mecanismos. Os culpados não são os assassinados, nem mesmo naquele sentido caricato e sofista que ainda hoje seria do agrado de alguns. Culpados são unicamente os que, desprovidos de consciência, voltaram contra aqueles seu ódio e sua fúria agressiva.

Adorno (1995, p. 135) completa esse pensamento ao afirmar: “Um dos grandes impulsos do cristianismo, a não ser confundido com o dogma, foi apagar a frieza que tudo penetra. Mas, esta tentativa fracassou; possivelmente porque não mexeu com a ordem social que produz e reproduz a frieza”. Com isso, pode-se entender que propor uma educação

emancipadora sem modificar a ordem social resultará em fracasso. Como comentou Adorno: “Não se trata de pregar o amor, se trata de mudar a ordem social”. Nesse sentido, há certeza de que qualquer mudança cultural e educativa não terá sucesso se não for acompanhada de transformações nas relações sociais. Por fim, enfatiza-se que a educação emancipatória não é apenas um método, mas sim uma filosofia, rompendo com a visão tecnicista estabelecida no conhecimento que privilegia a competição e o mérito.