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Capítulo II: Sensibilização à diversidade alimentar

1. Diversidade Cultural e Alimentação

1.2. O pão nas diferentes culturas

Enquanto forma de expressão de uma cultura, a alimentação “é um dos meios privilegiados para as sociedades efectuarem trocas de valores, relações identitárias e prazeres” (Santos & Cunha, 2011, p. 3).

Situações sociais, económicas ou religiosas são dos principais fatores que conduziram à modificação da alimentação ao longo dos tempos (Valerie, 1989).

Segundo Santos e Cunha (2011), a alimentação é vista como um meio de diferenciação das variadas civilizações, uma vez que é através da comensalidade que “surge a distinção entre o homem civilizado e os bárbaros: o primeiro junta ao alimento do corpo a valorização do espírito através da sociabilidade, algo que os segundos não fazem” (p. 3).

O pão não é só considerado um alimento básico na cultura portuguesa, mas também em outras culturas, nomeadamente em culturas do mediterrâneo, do norte de África e do médio oriente. Este alimento assumiu, ao longo dos tempos, um caráter simbólico. Contudo, existem alimentos que se equivalem ao pão, que, em outras culturas, também têm vindo a adquirir uma certa simbologia. Por exemplo, “Na cultura judaica, a simbologia do pão atinge um nível espiritual profundo. Tendo-se tornado símbolo de comunhão com o divino, o próprio Jesus adota-o para se tornar presente na Eucaristia” (Cabral, 2013, p. 7).

Na cultura portuguesa existe uma ampla variedade de diferentes tipos de pão espalhados pelas diversas regiões de norte a sul de Portugal, sendo eles o pão de milho muito característico da região norte, de centeio representativo da região da Serra da Estrela e o pão de trigo típico da zona norte (Brites & Guerreiro, 2008; Santos & Cunha, 2011).

39 Na península ibérica, o pão teve origem no império romano e, ao longo dos tempos, foi deixando marcos culturais. Este alimento foi fundamental na época dos descobrimentos, principalmente nas longas viagens. Este pão era cozido duas vezes no forno para garantir a durabilidade (Cabral, 2013). Também o simbolismo do pão influenciado pelo cristianismo, desde a sua origem até aos dias de hoje, foi um marco essencial na cultura popular portuguesa. Daí existirem várias lendas e contos associados ao pão. Uma das lendas mais emblemáticas é a “lenda das rosas”, que tem como protagonista a rainha Santa Isabel. Nesta lenda, assiste-se à transformação do pão destinado aos pobres em rosas (cf. Rocha, 2011). Assim, esta lenda para além de reconhecer o pão como alimento básico da alimentação, retrata também a simbologia da rosa como algo de perfeito, como símbolo da transformação e do amor fraterno. A variedade de provérbios sobre o pão constitui um símbolo da cultura portuguesa. Assim, “A alusão ao pão está presente nos provérbios sobre os efeitos das condições climáticas, a qualidade das colheitas, a sazonalidade do meio rural, o comportamento humano, as relações sociais, a alimentação, os laços familiares e a religião” (Cabral, 2013, p. 11).

Saindo de Portugal e viajando pelo mundo, encontramos diferentes culturas em que o pão, como alimento básico, assume também um caráter simbólico. Contudo, na história e cultura de um povo, para além do pão, existem outros alimentos que adquiriram ao longo dos tempos um determinado simbolismo.

Se observarmos o continente africano, facilmente percebemos quais são os cereais mais cultivados desde a antiguidade: o sorgo, o milho painço, o milho-miúdo, o feijão-frade e as lentilhas. Árvores como o embondeiro8 e a mulemba9, na cultura africana destacam-se pela “utilidade proporcionada à comunidade, que delas [se] servem” (Miranda, s.d.). Segundo Miranda, (s.d.), estas árvores para além de oferecerem benefícios às pessoas, também servem de meio de comunicação entre os humanos e os espíritos. Cabral (2013) acrescenta que o fruto do embondeiro, denominado em Angola como o “pão macaco”, e as suas folhas são utilizadas como remédio para a cura de feridas. Todavia, os tempos foram mudando e o desenvolvimento das rotas comerciais entre o continente africano e o continente asiático, através de mercados

8 “também conhecido por baobá, é uma árvore frondosa que chega a medir trinta metros de altura e até onze

metros de diâmetro de tronco” (Miranda, s.d., p. 2).

9 “ou figueira africana, é também uma árvore frondosa que chega a medir até trinta metros de altura e apresenta

40 de origem árabe, e os descobrimentos portugueses permitiram que alimentos básicos como o arroz, o milho e a mandioca fossem introduzidos em África (Cabral, 2013).

Remetendo-nos ao continente americano, mais concretamente à região brasileira, é possível verificar que existe uma vasta diversidade de alimentos básicos. Esta diversidade pode explicar-se pelas mudanças históricas e culturais provocadas pela era dos descobrimentos portugueses e pela imigração, já no século XX, de vários povos (italianos, japoneses, etc.) (Cabral, 2013). A mandioca, tal como o milho e a batata-doce, são alimentos básicos da região brasileira (Sonati, Vilarta e Silva, 2009). Só mais tarde, e a partir dos povos nativos e característicos dessa região, produtos alimentícios como o açúcar, o arroz, as bananas, as mangas e os cocos, por influência portuguesa, foram introduzidos na alimentação brasileira.

Focando-nos agora no continente asiático, podemos constatar que o arroz cozido é a base da alimentação chinesa. Já na Índia, as especiarias são reconhecidas pelas suas características “medicinais, espirituais e religiosas” (Cabral, 2013, p. 12). O arroz, na região sul da Índia, é um alimento base da alimentação, uma vez que a maior parte da população é vegetariana devido a motivos religiosos.

Conforme o que foi referido, podemos ver que o pão é um alimento básico da alimentação. Na cultura árabe o pão está presente em todas as refeições e é, muitas das vezes, utilizado como substituto dos talheres. Por sua vez, na cultura judaico-cristã o pão é visto como um dom de Deus, uma vez que sem este o ser humano não pode viver (Bento XVI, 2008), na medida em o pão representa a vida. Contudo, em algumas culturas o pão é substituído, na sua simbologia e presença, por outros produtos alimentares, produtos esses que são cultivados de acordo com o clima ou mesmo os solos das mais variadas regiões do mundo (Santos e Cunha, 2011).