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1.6 O público e o privado no contexto educacional brasileiro

Ao discutirmos as relações entre o público e o privado, sobretudo na história das instituições escolares, faz-se necessário estabelecer o conceito do que vem a ser a expressão escola pública e privada no intuito de evitar a adoção imprópria, o que poderia dar a ela um entendimento unívoco e consensual. Tal discussão é complexa; e a

25 Quirino e Montes (1987) informam que o Governo Provisório, instalado após a Revolução de 1930,

convoca uma constituinte, instalada em 10 de novembro de 1933. Em 16 de julho de 1934 é promulgada a terceira Constituição (a segunda da República).

26 A quarta Constituição foi publicada no Estado Novo. Após fechar o Congresso Nacional e as

assembleias estaduais, Vargas decreta a terceira Constituição da República, em 10 de novembro de 1937 (QUIRINO; MONTES, 1987).

complexidade ganha relevância se não delimitarmos o período de análise, no presente caso, o período 1950–80. Igualmente, é preciso conceituar as concepções de público e privado e tomá-las para referendar nossa tese. Vale destacar algumas abordagens sobre a concepção que trata da relação público–privado presente na educação.

[...] parte do princípio de que a construção do público na educação brasileira encontra-se relacionada à organização do Estado e, particularmente, às formas de intervenção estatal no processo de estruturação e generalização das instituições destinadas a promover a educação do povo. (XAVIER, 2003, p. 234).

Segundo Saviani (2005), podemos atribuir três acepções ao termo público. Em primeiro lugar, em um sentido amplo, público pode significar o que é comum e coletivo, contrapondo-se ao privado, que se refere ao particular e individual. Em segundo lugar, o termo público pode aludir ao que se refere à população em oposição ao que se limita aos interesses das elites. Em terceiro lugar, associa-se ao Estado e ao governo, isto é, ao órgão instituído em determinada sociedade para cuidar dos interesses comuns, coletivos, relativos ao conjunto dos membros dessa mesma comunidade.

O termo escola pública na história da educação do Brasil incorporou esses três sentidos acima. No entanto, nesta pesquisa, quando o empregamos, temos em vista a terceira acepção. Ou seja, referimo-nos a uma escola organizada e mantida pelo Estado pela qual o poder público é de todo responsável por suas condições de funcionamento.

Agregado ao significado de público como o que se passa fora da vida na família e cujo centro é a cidade, surgiu com a constituição da sociedade moderna uma outra conotação de público, relacionado ao poder público, que é o Estado. Com este conteúdo, o público é uma categoria histórica própria desta sociedade e que dizer poder público. (PINHEIRO, 1996, p. 257; grifos da autora).

A responsabilização do Estado como mantenedor indica funções que determinam condições as quais incluem a construção ou a aquisição de prédios específicos para funcionar como escolas; a dotação e manutenção nesses prédios de toda a infraestrutura necessária para o seu adequado funcionamento; a instituição de um corpo de agentes, com destaque para os professores, definindo-se as exigências de formação, os critérios de admissão e a especificação das funções a ser desempenhadas; a definição das diretrizes pedagógicas, dos componentes curriculares, das normas disciplinares e dos mecanismos de avaliação das unidades e do sistema de ensino em seu conjunto (SAVIANI, 2005).

Já o conceito de privado que permeia este texto se refere ao ensino mantido por particulares como a Igreja, as ordens religiosas ou os proprietários leigos (BUFFA, 2005). Neste momento, pode-se afirmar que a concepção de público e de privado, embora sejam categorias distintas, tenham sido constituídas em uma dimensão que faz com que sejam confundidas. Podem ser referenciadas conforme suas intervenções na vida cotidiana, conforme os sujeitos adotam determinadas práticas políticas, sociais e econômicas.

Um dos lugares-comuns do secular debate sobre a relação entre a esfera do público e a do privado é que, aumentando a esfera do público, diminui a do privado, e aumentando a esfera do privado diminui a do público; uma constatação que é geralmente acompanhada e complicada por juízos de valor contrapostos. (BOBBIO, 1995, p. 14).

A retração, a proximidade, a confusão em relação aos termos dizem às práticas dos sujeitos inseridos no âmbito social. As rupturas ou as continuidades são determinadas nestes embates.

É em relação a esta múltipla importância da esfera pública que o termo “privado”, em sua acepção original de “privação”, tem significado. Para o indivíduo, viver uma vida inteiramente privada significa, acima de tudo, ser destituído de coisas essenciais à vida verdadeiramente humana: ser privado da realidade que advém do fato de ser visto e ouvido por outros, privado de uma relação “objetiva” com eles decorrente do fato de ligar-se e separar-se deles mediante a um mundo comum de coisas, e privado da possibilidade de realizar algo mais permanente que a própria vida. (ARENDT, 1987, p. 68; grifos da autora).

Deriva-se do pensamento da autora que é no privado que o sujeito tem “isonomia”, mas sua realização ocorre no contato público — ou no Estado, o campo das organizações. Daí entender a privatização do público, que é levar ao público o que foi decidido no espaço privado, nos gabinetes; isso caracteriza no privado um consenso determinador e legitimador das organizações.

Os dois processos, de publicização do privado e de privatização do público, não são de fato incompatíveis, e realmente compenetram-se um no outro. [...] O Estado pode ser corretamente representado como o lugar onde se desenvolvem e se compõem, para novamente decompor-se e recompor-se, estes conflitos, através do instrumento jurídico de um acordo continuamente renovado, representação moderna da tradicional figura do contato social. (BOBBIO, 1995, p. 27).