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O Papel do Capital e do Estado no crescimento das bordas metropolitanas

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.4 Paisagem, crescimento urbano e as novas configurações das bordas

2.4.2 O Papel do Capital e do Estado no crescimento das bordas metropolitanas

Ao se relacionar as diversas práticas de apropriação do espaço pela sociedade, tem- se claramente que essas práticas obedecem a mecanismos de mercado, decisões políticas ou procedimentos informais de controle social. Leite defende que “a

paisagem e a região são os signos e os símbolos dessas práticas e das relações de poder que atravessam a sociedade em determinado momento” (LEITE, 1994, p. 50). Desta maneira, a cidade e a paisagem são feitas e refeitas por diversos agentes sociais, destacando-se os proprietários fundiários, os promotores imobiliários, os proprietários dos meios de produção, sobretudo os grandes industriais, representantes do Capital, o Estado e os grupos sociais excluídos (CORREA, 1995). Assim, a cidade é a representação espacial do sistema produtivo, fruto da iniciativa pública ou privada, resultado da ação reguladora do governo.

Castells (2000) aponta que o Estado surge como agente decisivo na organização espacial dos serviços de produção, distribuição e gestão dos meios de consumo coletivo necessários à vida cotidiana, da moradia às escolas, passando pelos transportes, saúde, áreas verdes, entre outros. Esses elementos são uma exigência da acumulação do capital, do processo de produção e de consumo e das reivindicações sociais. Tais serviços não são suficientemente rentáveis para serem produzidos pelo capital, daí nasce a crise urbana. Então, o Estado surge como agente decisivo na organização espacial desses serviços e como resultado de um processo político, determinado pelas lutas de classe. No entanto, o Estado não consegue atender a essas demandas sociais e concentra seus investimentos às funções urbanas ligadas ao funcionamento do capital. Neste sentido, o Estado se comporta como sujeito das ações através do Capital.

O produto gerado, ou seja, a forma urbana, de acordo com Harvey (1973), pode ser explicada como resultado de dois propulsores da sociedade: a acumulação de capital e a luta de classes. Esse autor define o papel funcional da cidade, o processo de acumulação, e afirma que “o trabalho usa o ambiente construído como uma forma de consumo e um modo para a sua própria reprodução” e que “o ambiente construído é transformado, essencialmente, pelo capital intervencionista, que age através do governo” (HARVEY, 1973, p. 97). Desta maneira, o capital deve intervir e ele o faz através da ação do Estado. A cidade, então, torna-se um espaço mais descentralizado do ambiente construído que funciona principalmente como o sítio de circulação de capital mais do que o local de produção.

Singer (1978) considera que o solo urbano é disputado por inúmeros usos devido à concentração de pessoas exercendo as mais diferentes atividades. Devido à

propriedade privada do solo, que proporciona renda, a disputa pelo uso se baseia nas regras do jogo capitalista.

O Estado, como provedor de infraestrutura e agente da regulação do uso do solo, os proprietários fundiários e os promotores imobiliários viabilizam a implantação e construção de loteamentos, seja para a classe alta ou para a de baixa renda.

Os loteamentos podem ser considerados como um modelo resultante da associação entre o Estado e o Capital. O Capital possui o papel de responder às demandas do seu cliente, preferencialmente com o menor ônus e o maior lucro possível. Essa rentabilidade é gerada pela venda dos lotes, que inicialmente têm preço reduzido e, posteriormente, acrescido. Os proprietários de terra atuam no sentido de obterem os maiores lucros com a renda fundiária de suas propriedades, interessando-se em que elas tenham o uso que seja o mais remunerador possível, especialmente com o comercial ou residencial de status (CORREA, 1995), no qual se incluem os condomínios fechados.

Assim, os proprietários fundiários exercem pressões junto ao Estado, especialmente na instância municipal, com interferências e pressões sobre a definição das leis de uso do solo e do zoneamento urbano. Alguns proprietários poderão até mesmo ter suas terras valorizadas através do investimento público em infraestrutura, especialmente a viária.

Lefèbvre (2008) chama atenção sobre o fato de as bordas metropolitanas serem objeto de atenção dos proprietários de terras. Isto se deve ao fato de elas estarem diretamente submetidas ao processo de transformação do espaço rural em urbano, como novas frentes de expansão urbana.

Com relação ao processo de ocupação dessas bordas, mais especificamente em relação aos condomínios fechados, segundo Bhering (2002), o Estado atua em tempos diferentes. Para garantir a existência dos condomínios, a acessibilidade deve ser garantida pela ação preliminar do poder público. Após a ocupação, são concedidos benefícios aos loteamentos, como o abastecimento de bens de consumo coletivo - sistema viário, calçamento, água, esgoto, iluminação, parques, coleta de lixo -, que é atrelado ao poder político da sua população, possuidora de um número considerável de votos.

O condomínio fechado, então um produto do ambiente urbano, é gerado de modo a potencializar os ganhos do capital imobiliário e a atender os interesses de parte da sociedade, que detém o poder de compra, e do Estado, que se beneficia dessa relação politicamente. É também uma estrutura espacial que produz transformações nos fluxos de circulação, localização de riqueza e de população ao gerar novos tecidos urbanos.

Além das questões abordadas até aqui, considera-se outra realidade nos condomínios fechados: o mito da natureza. Em muitos casos, a natureza é usada como forma de valorização da terra, como modo de simulação de uma realidade que não existe. A natureza realmente existe nos locais onde serão implantados os condomínios, embora quase sempre, ao se construir, haja o descarte das espécies nativas, desperdício de água e construção de vastos muros, que ameaçam a visão dos horizontes locais e suas paisagens ainda remanescentes.