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Capítulo II – Leitura: o lugar da escola e do professor

2.2. O papel do professor

O poder dos professores é eterno Não é possível dizer onde termina sua influência. Henry Adams

O professor é muito importante no processo de aquisição de leitura. Ele contribuirá para o desenvolvimento intelectual do aluno, à medida que transforma o trabalho com o texto, em um problema a ser resolvido. As tarefas solicitadas às crianças devem significar um desafio intelectual, que vá além do mero exercício dos conhecimentos já adquiridos.

O papel do professor modificou-se, por volta das décadas de 70 e 80, depois da mudança de foco na aprendizagem, em que o aluno torna-se o centro das atenções, sendo o sujeito de sua própria aprendizagem. Assim, o professor age como o

Conhecer, para Satiro & Puig (2000), passa a ser a integração de conhecimentos prévios ao que se está aprendendo, como abordamos no tema: compreensão de leitura.

Quando o professor apresenta intenções de leitura muito vagas: ler para aprender, para obter informações, para revisar conteúdos, porque o autor é importante... sem apresentar o porquê esse autor é importante. Obter que tipo de informação? Enfim, sem esclarecer suas intenções, o aluno também não terá clareza sobre o que vai ler. A escolha do texto, para o aluno ler, precisa estar bem clara para poder envolvê-lo e o professor atingir a intenção da leitura. Essa fase, afirma Braga (2002), é o início para a formação de um “leitor competente”.

Para a formação de leitores competentes, capazes de compreender e interpretar aquilo que lêem, construir significados, Brito (1991) enfatiza: “exige-se do professor uma intervenção adequada, contínua e explícita durante toda a vida escolar do aluno”(p.20). Braga (2002) reafirma a importância do professor, pois acredita que só ele pode transformar o que precisa ser lido em algo significativo e prazeroso.

Numa perspectiva da pedagogia de projetos, Jolibert (1994) acredita que, para que as crianças leiam e se tornem bons leitores, o professor tem a responsabilidade de ajudá-las a serem exigentes, estruturando suas aquisições e utilizando-as de maneira operatória e autônoma; refletindo sobre as estratégias, entre outras formas.

Solé (1998) comenta que os alunos de hoje são bem diferentes dos de ontem, faltam-lhes vontade, interesse. Braga (2002) acredita que falta maturidade para compreender a importância de ler.

A este respeito, Martins(1994) esclarece que não adianta exigir esse ou aquele nível de leitura ou compreensão pois faltam-lhes o básico: saber ler e escrever. Por isso, desistem na menor dificuldade.

Por fim, Chartier (1994) propõe o diálogo entre professor e aluno. Ao dialogar com os alunos, o professor coloca-os como sujeitos e possibilita a aprendizagem do saber fazer e da autonomia na leitura, possibilitando as escolhas, esclarecendo os objetivos de leitura. Dessa forma, o aluno transforma-se em um leitor ativo.

É importante conhecer um pouco dos estudos que procuraram saber a visão dos professores sobre leitura.

Richards (2001) examinou as crenças e conhecimentos de professores sobre a leitura e de seus alunos também. Participaram 24 professores e 144 alunos. Todos os participantes fizeram entrevistas individuais e completaram um perfil teórico de orientação de leitura, como um questionário sobre concepções de leitura. Os resultados mostraram que professores apresentaram conhecimentos inconsistentes sobre leitura: eles tendem a igualar ensino de compreensão de leitura e provas; não mencionam a responsabilidade cultural do ensino de leitura. Somente quatro professores mencionaram que fazem grupos de discussão de leitura. Não mencionaram a conexão entre leitura-escrita que existe diariamente. Muitos estudantes pedem ajuda a outros para compreender o que lêem e todos relataram que não há Clube do Livro em sua escola.

Saveli (2001) analisou como os professores compreendem e trabalham a leitura na escola. Trabalhou com 22 professoras, em duas fases. Na primeira, realizou um contato com a equipe administrativa e docente da escola e observou o cotidiano escolar. Na segunda, dividiu a amostra em dois grupos operativos. Em 15 reuniões, a pesquisadora realizou observações da prática docente, discussões nos grupos e proposta de temas. Em sua análise é possível identificar as crenças que alicerçam essa prática. A primeira é a de que o “domínio da leitura passa por um conjunto de processos uniformes e invariáveis ao longo do qual a criança vai se apropriando da estrutura da língua”(p.101). Dessa forma, a leitura é a decodificação da língua escrita, sem a busca do significado. Outra crença é “o ato de ler se confunde com o de oralizar”(p.103). A leitura em voz alta é a “verdadeira leitura” para provar que se sabe ler. Ou ainda, a leitura é deixada em segundo plano na escola. Existe a crença do texto “auto-suficiente”, que busca a interpretação correta do texto, da visão do autor e ignora a leitura como “atividade produtora de significados”. A pesquisadora acredita que as representações que os professores têm da leitura influenciam a sua prática.

Prado (2002), na reportagem “Histórias de leitura sem fim”, faz uma sugestão aos educadores :“o melhor jeito de formar leitores é deixar as crianças livres para investigar, folhear e escolher o que quiserem”(p.50).

É interessante observar que formar leitores não é tão simples como parece. Nem todos concordam com a liberdade de escolha da leitura, como nos mostra o estudo de Santos (1993), que descreve qual a visão de 45 mães de crianças e adolescentes, de uma escola particular de Ribeirão Preto, segundo um Roteiro para a investigação do comportamento de leitura, que foi preenchido durante uma entrevista. A análise dos dados revelou dados pertinentes: crianças e adolescentes lêem para cumprir exigências escolares; à medida que a idade aumenta , diminui a freqüência de leitura, mas aumenta a procura de um lugar adequado para ler e o prazer dá lugar à obrigação; as mães têm uma expectativa de ter um filho leitor/culto, por isso selecionam livros para os filhos, deixando de lado revistas de histórias em quadrinhos, por exemplo.

Outro estudo com dados positivos foi o de Grotta (2000) que analisou experiências significativas para o processo de formação de leitores, com quatro entrevistas orais sobre a história de vida e de relações com a leitura. Depois da transcrição das fitas, faz uma análise qualitativa e conclui que foram outros leitores que, na interação social e por meio da linguagem, tornaram possível tanto o acesso quanto a apropriação da prática de leitura. As leituras na infância foram determinantes na configuração da forma de ser e de pensar dos sujeitos, bem como de seus interesses, desejos e opções de vida; a qualidade afetiva presente na leitura medeia a interação sujeito/leitor com a cultura.

A leitura é um precioso instrumento no processo de produção de conhecimento. Para Magnani (1994b), a formação de leitores emerge como prioridade e como um grande desafio da Educação.

No processo de construção de conhecimento mencionado, a escola e os professores têm mais um desafio: construir competências. Trabalhar a competência em leitura na escola, possibilitaria ao Brasil almejar outros patamares de desenvolvimento.

Jolibert (1994) acredita que ler com decifração é uma competência que vai sendo aprendida. Antes dela, a criança vai se familiarizando com a leitura e construindo outras competências. Inicialmente, se aproxima com coragem de qualquer texto que lhe é oferecido; lê em silêncio; é capaz de dizer do que se trata ou encontrar a informação procurada; lê de forma expressiva, sabe ser autônomo com seu texto e pedir ajuda, quando necessário.

Segundo essa autora, existem competências lingüísticas em sete níveis para a construção de conceitos. O professor deve ter o domínio desses níveis: contexto; principais parâmetros da situação de comunicação; tipos de textos; superestrutura da forma lingüística, textual e da frase; palavras e microestruturas que as constituem, para auxiliar os alunos. O leitor vai localizar indícios deixados no texto, por esses níveis, coletá-los e processá-los como informações, para a construção do sentido da leitura. Na leitura, as marcas lingüísticas do texto se manifestam como indícios pertinentes para construir o significado do mesmo. “As competências lingüísticas a serem construídas devem , pois, ser representadas como competências conceptuais” (p.142). Os alunos devem ir formando idéias, conceitos a respeito da Língua.

Numa primeira abordagem, Perrenoud (1999) define ser a noção de competência uma “capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles” (p.7). Acrescenta que os conhecimentos profundos são necessários para se analisar um texto e reconstituir as intenções do autor, por exemplo. Porém, “as competências manifestadas por essas ações não são, em si, conhecimentos, elas utilizam, integram ou mobilizam tais conhecimentos” (p.8). Ele procura deixar claro que uma competência nunca é uma “implementação racional pura e simples de conhecimento”. Não basta conhecer, é primordial que o sujeito saiba o que está fazendo, como e porquê. Para confirmar esse fato, ele relata que

...a construção de competências é inseparável da formação de esquemas de mobilização dos conhecimentos com discernimento, em tempo real, ao serviço de uma ação eficaz. Ora, os esquemas de mobilização de diversos recursos cognitivos em uma situação de ação complexa desenvolvem-se e estabilizam-se ao sabor da prática ...(Perrenoud, ibid.:10)

Os professores que optam trabalhar com competências recebem um convite a mudar sua prática, a conquistar uma nova identidade profissional. Devem considerar os conhecimentos como recursos a serem mobilizados; trabalhar regularmente por problemas, utilizar vários meios de ensino; negociar e conduzir projetos com seus alunos; entre outros aspectos.

Todos os estudos citados enfatizam o papel do professor, acreditamos que o desafio da mudança no sistema educacional só será maior se ela beneficiar, em primeiro plano, os alunos que fracassam na escola. Em termos de leitura, podemos finalizar esse capítulo com a citação:

Aumentar a proporção de crianças que lêem bastante e que fazem isso com evidente satisfação deve ser um objetivo do ensino da leitura tanto quanto aumentar o número de leitores competentes.(R.C. Andersen)

Acreditamos ainda que o professor tem um papel fundamental, ele é conhecedor de muitas estratégias e metodologias para incentivar o gosto pela leitura, além de propiciar aos alunos os objetivos que eles devem ou podem atingir quando cumprem determinadas atividades. Ao se trabalhar a competência aliada aos conhecimentos tanto do professor quanto do aluno temos boas chances de conquistar novos leitores.