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A.3 Eletrofisiologia elementar

A.3.2 O potencial de ação

Desde os primórdios do século XX, principalmente na iminência do final da primeira metade daquele século pode-se verificar a informação e o seu respectivo processamento atingindo relevos cada vez maiores no avanço do conhecimento humano. Não foi diferente com a Neurociência e, sendo assim, torna-se necessário entender a natureza da informação

coloca em situação mais evidente a computação realizada pelas sinapses e pela forma como os neurônios se conectam. Trabalhos recentes têm apontado que as características lineares e não-lineares dos dendritos podem permitir funções elementares de computação [131, 132].

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Figura A.11: O processamento da informação no neurônio. Adaptada de [209].

processada neste cenário. De certo que ainda se está longe de uma resposta completa quanto ao processamento da informação no encéfalo, no entanto há um considerável consenso sobre um elemento fundamental de tratamento de informação neste contexto encéfálico: o neurônio e o processamento de informação realizado por ele, pode ser estudado do ponto de visto da dinâmica das propriedades elétricas. Nesta abordagem, entendendo este tipo de célula como um elemento de tratamento de informação, sob a forma de estímulos elétricos, o neurônio recebe as informações ao seu redor através do sinais elétricos que entram pelos dendritos, e disponibiliza o resultado do seu processamento através do axônio [81].

“Os sinais neuronais consistem pulsos elétricos curtos e podem ser observados colocando um fino eletrodo perto do soma ou do axônio do neurônio (...) Os pulsos são então chamados potenciais de ação ou spikes, têm uma amplitude em torno de 100mV e um duração típica de 1-2 ms. A forma do pulso não muda quando este se propaga ao longo do axônio” [81].

Desta forma, neste modelo informacional/computacional5 do neurônio, a informação de

saída é apresentada no axônio através de um potencial, denominado potencial de ação. Na

5Já aconteceram outras revoluções que influenciaram igualmente na abordagem de produção do

conhecimento nas demais ciências. No século XVII, havia a preparação conceitual de uma das primeiras grandes revoluções modernas: a revolução industrial; a qual tinha como base tecnológica a força do vapor, onde os conhecimentos em hidráulica tiveram papel importante no domínio desta força. Neste momento histórico, um dos grandes anatomistas da época Andreas Versalius juntamente com grandes pensadores da época como René Decartes defendia a “a teoria de fluido mecânico” onde o encéfalo figurava como um tipo de máquina executando uma série de funções hidráulicas no corpo, explicando inclusive o movimento dos membros [16, 65, 90]. Por conta disto, fica a lição que tudo o que está sendo desenvolvido e estudado hoje sob

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Figura A.12, pode ser vista uma ilustração da coleta da informação do potencial de ação em um neurônio. Nesta figura, pode-se perceber a necessidade de micro-eletrodos capazes de captar a informação do potencial dentro e fora da célula e enviar esta informação para equipamentos de visualização (osciloscópio) ou registro do potencial elétrico.

Figura A.12: Ilustração da coleta do sinal do potencial de ação intracelular no neurônio. a) micropipeta de vidro, de aproximadamente 100µm de diâmetro inserida no axônio gigante, com aproximadamente 1mm de diâmetro, de uma lula. b) Uma imagem do potencial de ação gravado no axônio, picos da senóides de período 2ms. Adaptada de [96].

Na Figura A.13, podem ser encontrados os detalhes da forma da curva do potencial de ação. Para a visualização ou até mesmo o registro do valor do potencial de ação no neurônio torna-se inicialmente necessário posicionar o eletrodo dentro da célula para medir a diferença de potencial entre a parte de dentro e a parte de fora da célula. Em uma situação de equilíbrio, a célula tem o potencial do seu citoplasma mais negativo (aproximadamente de 65mV) que o meio externo à célula. No momento anterior à geração do potencial de ação, ocorre a polarização positiva no interior da célula tornando seu interior mais positivo que a parte externa da célula, até atingir um pico de aproximadamente 40mV, quando esta diferença de potencial cai e torna-se mais negativa que na situação de equilíbrio, voltando depois ao valor de equilíbrio inicial. Como pode ser visto na Figura A.13, todo este processo dura apenas alguns milissegundos. Quando ocorre o pico do potencial de ação diz-se a que célula disparouou ativou.

a luz informacional ou computacional pode ser encarado no futuro próximo como são encaradas hoje aquelas idéias, defendidas inclusive por mentes como a de Descartes, com relação aos modelos funcionais do encéfalo.

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Figura A.13: Ilustração da curva do potencial de ação. Imagem original: Wikimedia Commons.

Da Figura A.13, pode-se observar que o potencial de equilíbrio no interior da célula tem valor em torno de -70 mV. A polarização positiva no interior da célula ocorre pela entrada de íons com carga positiva no citoplasma da célula. Se esta ionização provocar um potencial maior que o potencial limiar, a célula dispara com o seu potencial atingindo o pico de aproximadamente 40mV. Após este momento ocorre a despolarização da célula levando o seu potencial interno baixar até valores inferiores ao potencial de equilíbrio e logo depois voltando ao valor de equilíbrio, este momento é denominado período refratário [16,17,205]. Nesta figura, é possível perceber que, entre o momento de início da polarização e o instante que o potencial volta ao valor de equilíbrio, decorrem aproximadamente 2ms, com o período refratário tem mais dois 2ms, totalizando aproximadamente 4ms.

É importante mencionar que existe um valor mínimo de diferença de potencial a ser alcançado durante a fase ascendente da curva, esta diferença é denominada potencial limiar, ou simplesmente limiar. Caso este valor não seja alcançado, a diferença de potencial não evolui e o pico não é atingido. Neste último caso, diz-se que a célula não disparou ou não ativou. O conhecimento desta “regra de disparo” e do valor limiar6, é bastante importante na

6Já em 1943, Warren McCulloch e Walter Pitts [138] propuseram modelos computacionais de neurônios, ou

seja neurônios artificiais que levavam em conta estas informações. Esta proposta foi um dos primeiros passos para uma área de estudo conhecida como Redes Neurais Artificiais [4, 94, 112, 138].

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construção de dispositivos de registro de potenciais de ativação, pois normalmente o interesse maior dos registros é nos momentos em que ocorrem o disparo da célula, sem a preocupação da forma da curva. Outro dado importante quando se observa a curva mostrada na Figura A.13 não é comum termos picos a uma distância menor que 3-4ms. Esta informação pode ser utilizada na construção de filtros de remoção de ruídos em registros de potenciais de ação.

Já em 1943, David Goldman propôs uma equação mais elaborada para o potencial de ação [16, 113], no entanto para os fins deste trabalho interessa-nos menos a forma e mais a ocorrência do potencial de ação.