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Foto 3 Local de realização das reuniões formativas

2 A PESQUISA QUALITATIVA COMO POSSIBILIDADE DE ANÁLISE DO SER E

2.4 Técnica de Análise de Dados: a opção pela Análise de

2.5.4 O Primeiro Momento com o Grupo de Professores

Estudamos por vários dias o modo como procederíamos durante o início das inserções nas reuniões formativas com o objetivo de “planejar a entrada no ambiente ou contexto (campo)”, de modo a evitar uma chegada brusca, mas tornar esse momento o mais natural possível (SAMPIERE; COLLADO; LUCIO, 2013, p. 385). Assim, em casa, organizamos a apresentação e na escola a equipe pedagógica combinou com o grupo de professores que o início das reuniões formativas no ano de 2018 contaria com a apresentação de um estudo de mestrado e uma proposta de estudo de Doutorado. Cada ação que compõe o procedimento metodológico foi importante, pois a apresentação anterior do estudo contribuiu para que todos os professores fossem informados anteriormente sobre a nossa presença. Sendo assim, na tessitura do nosso caminho metodológico, as ações e os dizeres de cada colaborador foi uma espécie de fio que atravessa o tear rumo à construção do tapete epistemológico sobre a FC.

Na manhã do dia 15 de maio de 2018, havia aproximadamente 16 pessoas na sala de reuniões: eram professores, o coordenador geral e orientadores pedagógicos. Iniciamos a apresentação da pesquisa de mestrado com a música Leituras, de

Humberto Gessinger, e prosseguimos apresentando o objetivo do estudo, os sujeitos e o contexto da pesquisa. Explicamos que Paulo Freire era um dos autores que sustentava teoricamente o estudo e, ainda, apresentamos alguns autores que tratam do tema letramento. Primeiramente, surgiram algumas dúvidas por parte dos professores referentes à apresentação do estudo. Após responder os questionamentos, alguns começaram a socializar suas experiências24.

Ao prosseguir a apresentação rumo à socialização de alguns achados da pesquisa, Afrodite, professora da sala de aula pesquisada nesse estudo de mestrado, nos contou que a realidade da Penitenciária Feminina passou por algumas mudanças positivas no decorrer do tempo. Entre elas, destacou:

[...] quando eu trabalhei tinha as crianças e isso era muito complicado para mim, inclusive, há uns dois anos atrás, eu tive Síndrome do Pânico, aí eu fui ao médico e ele disse que era emocional. Ao mesmo tempo em que eu trabalhava, eu via as crianças de uma forma vulnerável, eu as via pequenas batendo nas grades e repetindo os gestos que suas mães faziam. Aquilo ali, não deveria, mas ficava na minha cabeça. Hoje, o juiz autorizou a retirada das crianças (DIÁRIO DE CAMPO IV, 15 de maio de 2018, p. 23).

A decisão de se retirarem as crianças é compatível com a Lei 13.257/16, que dispõe sobre as políticas públicas para a primeira infância. Em seu Artigo 2º, é considerada primeira infância os primeiros seis anos completos de vida da criança. No Brasil, mulheres presas que se encontram em regime aberto25ou aquelas que estão cumprindo prisão preventiva (desde que tenham filhos menores de doze anos ou estejam grávidas) podem requerer ao juiz prisão domiciliar. O mesmo se aplica aos homens que sejam os únicos responsáveis pelo cuidado com os filhos de até doze anos.

No calor do debate sobre a situação comovente das crianças no espaço de privação de liberdade feminino e o desfecho dessa situação, para complementar a

24O pedido para apresentação da pesquisa de mestrado se deve ao fato que o estudo intitulado

“Práticas de Leitura, Escrita e Letramento na Penitenciária Feminina em Cuiabá-MT: a visão da professora e suas alunas” foi realizado pela pesquisadora em uma sala de aula dessa unidade escolar.

Disponível em:

http://ri.ufmt.br/bitstream/1/920/1/DISS_2013_%20Luciana%20Ferreira%20da%20Silva%20Moraes% 20Scariot.pdf

25Regime de prisão no qual a pessoa sai de dia para trabalhar e à noite retorna à casa do Albergado

ideia de Afrodite, professora Atena continuou apresentando algumas características da Penitenciária Feminina e do público atendido:

O presídio feminino é totalmente diferente do masculino. Duas realidades totalmente diferentes. Muitas das que estão lá foram por causa dos maridos, dos namorados. Na quarta que é visita, você vê os parentes que estão lá. Em contrapartida, no masculino, a mulherada faz fila [...]. Ou seja, elas não abandonam seus maridos e namorados (DIÁRIO DE CAMPO IV, 15 de maio de 2018, p. 24)26.

Após o intervalo de alguns minutos para o café, retornamos e, desta vez, apresentamos a proposta de estudo de doutorado da seguinte maneira:

Primeiramente, apresentei o tema do projeto, nome da orientadora, instituição e segui a apresentação. Expliquei as motivações que me levaram a pesquisar tal tema, por exemplo, a falta de pesquisa na área e sobre o trabalho com formação docente desenvolvido por mim no Cefapro. Falei sobre a introdução do trabalho e citei António Nóvoa e suas ideias sobre a importância de trazer a formação para a profissão docente, neste caso, para a escola (DIÁRIO DE CAMPO IV, 15 de maio de 2018, p. 29).

Entre os motivos que me levaram a pesquisar esse tema, destacamos as nossas experiências como professora formadora; nesse período, observamos que nem todas as unidades escolares nos recebiam com o mesmo acolhimento e que, em algumas reuniões formativas, observávamos a resistência de alguns professores à FC.

Sobre a Formação Continuada, durante a apresentação, ouvimos em um tom baixo de voz de um dos professores, o Apolo, a seguinte frase, que soou como uma indignação: “Baseada nas ideias dos autores lá de Portugal !!!” (DIÁRIO DE CAMPO IV, 15 de maio de 2018, p. 30).

Ainda, nos fizeram alguns questionamentos sobre a minha experiência com a Formação Continuada no período em que atuamos como professora em uma escola do campo. Sobre este assunto, eles queriam conhecer a dupla identidade27. Primeiro,

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27Dupla identidade é descrita por Gobatto (2016) como aquela que os professores formadores dos

Cefapros possuem: de um lado, professor formador de professores e, do outro, professor da Educação Básica.

nós havíamos compartilhado as vivências como professora formadora e, em seguida, eles queriam conhecer a nossa opinião sobre a Formação Continuada como professora da Educação Básica:

Fui sincera, respondi que já havia visto de tudo no “Sala de Educador”, até professor chorando. Para mim, como professora de uma Escola do Campo, era um momento de desabafo, troca de experiência e que eu considerava que aprendi nesse processo com os meus pares mais experientes. Sendo assim, ao meu entender, esse momento proporcionava um espaço em que podíamos choramingar, discutir, desabafar e aprender (DIÁRIO DE CAMPO IV, 15 de maio de 2018, p. 29).

O diálogo foi tão rico, que se encharcou de problematizações, de troca de experiências, questionamentos, enfim, de aprendizagem resultante do encontro de nossas subjetividades. Prova disso é que utilizamos a metade do tempo do encontro formativo programado para a semana seguinte. Por esse motivo, somente no dia 22 de maio de 2018, pedimos autorização para a realização da pesquisa e, naquele dia, o grupo de professores aceitou colaborar. Para isso, os professores assinaram o termo de Livre e Esclarecido contido no Apêndice B.

A socialização da proposta do estudo permitiu a pronúncia e a participação dos professores no processo de coleta de dados e a definição de alguns caminhos a serem percorridos para obtê-los, por meio da escuta atenta de suas dúvidas, críticas e proposições, pois obstaculizar a comunicação, a manifestação de seus dizeres poderia transformar os colaboradores “em quase ‘coisa’ e isto é tarefa e objetivo de opressores, não dos revolucionários” (FREIRE, 2011a, p. 172). Tal afirmação se reafirma, em especial, neste estudo, pois, ao imporem-se os anseios do pesquisador e a sua não disponibilidade para o diálogo, corre-se o risco de se desenvolver uma pesquisa como instrumento de opressão e não de humanização.

2.5.5 O Segundo Momento com o Grupo de Professores e a Seleção da Amostra