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2.3 O NOVO PARDIGMA DAS LICITAÇÕES

2.3.2 O princípio constitucional da isonomia

Conforme exposto na Constituição Federal a Administração deverá atuar sempre pautada pelos princípios constitucionais6. Os processos licitatórios por sua vez também deverão atuar de acordo com os princípios inerentes à atuação

5 Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

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Nas palavras de José Sérgio da Silva Cristóvam (2016, p. 89) os princípios constitucionais são normas que sustentam todo o ordenamento jurídico, tendo por função principal conferir racionalidade sistêmica e integralidade ao ordenamento constitucional. Podem ser expressos mediante enunciados normativos ou figurar implicitamente no texto constitucional.

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estatal. Neste trabalho vamos analisar as licitações com fulcro no princípio da isonomia nas contratações.

Desta maneira, todos os dispositivos da Lei de Licitações devem ser interpretados sob a égide de tal princípio, o qual não busca proibir completamente qualquer diferenciação entre os candidatos, pois esta, inclusive, é consequência da seleção da proposta mais vantajosa. Seu principal objetivo é inibir qualquer diferenciação que não esteja previamente definida pela Administração Pública.

No mesmo sentido, Justen Filho (2014, p. 498) disciplina:

Há equívoco em supor que a isonomia veda que a Administração Pública adote tratamento discriminatório entre os particulares que pretendem contratar com ela. Quando a Administração escolhe alguém para contratar, está efetivando uma diferenciação entre os interessados. Não se admite, porém, a discriminação arbitrária, produto de preferências pessoais e subjetivas do ocupante do cargo público. A licitação consiste em um instrumento jurídico para afastar a arbitrariedade na seleção do contratante.

A isonomia é desdobramento do princípio da igualdade presente da Constituição Federal de 1988, no âmbito licitatório. O dispositivo veda aos agentes públicos inserir ou retirar dos Editais de licitação condições que retirem ou diminuam o caráter competitivo ou estabeleçam diferenças em razão da naturalidade, da sede ou domicilio dos licitantes (MEDAUAR, 2004, p. 216).

A questão da isonomia nas licitações públicas começa a gerar mais polêmica a partir do surgimento de legislações que buscaram inserir nas normas referente às compras públicas alguns dispositivos que, ao tentar utilizar as licitações com o objetivo de fomentar o desenvolvimento nacional sustentável, acabam por beneficiar algumas empresas no bojo do processo licitatório.

A Lei nº 2.349/2010 ao inserir o desenvolvimento nacional sustentável como finalidade da licitação faz com que o critério do menor preço não seja o único a ser considerado pela Administração, sendo acompanhado também por uma análise de vantajosidade sob a égide do desenvolvimento nacional (JUSTEN FILHO, 2014, p. 498).

Logo essa nova legislação abre espaço para adjudicar o objeto da licitação para uma proposta que tenha o valor mais elevado, desde que se evidencie, por

critérios objetivos e prévios, ser ela a mais adequada para promover o desenvolvimento nacional sustentável (JUSTEN FILHO, 2014, p. 498).

É diligente demonstrar que essa prática não significa possibilitar que a Administração faça discriminações que não estejam fundadas em critérios previstos em Lei ou mesmo que afrontam princípio da proporcionalidade. É imprescindível a existência de regras claras e objetivas que viabilizem a demonstração da proposta que atende aos ditames do desenvolvimento nacional sustentável (JUSTEN FILHO, 2014, p.498).

Há, portanto, suposta mitigação – do ponto de vista formal – do princípio da isonomia. Permite-se que determinado proponente seja tratado diferente dos demais. Sobre o tema é importante colacionar aqui o entendimento de (JUSTEN FILHO, 2014, p. 505):

Trata-se de uma preferência de cunho impessoal, relacionada aos objetivos fundamentais da Nação. Apesar disso, admitem-se diferenciações entre propostas que, sob certo aspecto, podem apresentar-se como semelhantes. O tratamento preferencial para as propostas mais aptas a promover o desenvolvimento nacional sustentável não infringe a isonomia.

Outra legislação que alterou os critérios de seleção de proposta nos processos licitatórios foi a Lei Complementar 123/2006 que, em síntese, concedeu alguns benefícios para empresas enquadradas como Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, tais como participar dos certames ainda que não esteja com sua situação fiscal regularizada e, caso seja vencedora, será concedido um prazo de (cinco) dias úteis para sua regularização.

Já na hipótese de haver empate de propostas, no quesito menor preço, a microempresa tem a vantagem de tomar conhecimento do menor valor ofertado pela concorrente, podendo, caso queira, fazer uma proposta financeiramente menor e mais vantajosa para o Poder Público, o que lhe garantirá o contrato.

Tais hipóteses, de plano, já importam num tratamento diferenciado para essas empresas, resultando em grande discussão por parte da doutrina acerca de uma suposta infração ao princípio da isonomia nas contratações públicas. Sobre o assunto, Di Pietro (2008, 337) defende que as exceções mencionadas não entram

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em conflito com o princípio da isonomia, uma vez que o artigo 5º da Constituição somente assegura igualdade entre brasileiros e estrangeiros em matéria de direitos fundamentais.

Além disso, no caso das microempresas e empresas de pequeno porte, o tratamento diferenciado resulta da própria situação desigual dessas empresas em relação a outras que não têm a mesma natureza; por outras palavras, o instituto versa sobre tratar os desiguais de acordo com suas desigualdades.

No caso concreto, é a própria Constituição Federal, em seu artigo 1707, que impõe, como princípio da ordem econômica, o tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

Conclui-se, portanto, que as diversas modificações legislativas que buscavam, através das contratações, um tratamento diferenciado para determinado licitante, têm repercussão direta num dos princípios mais importantes das licitações.

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