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O Princípio da Parcimônia, o Modelo de Interação Verbal e as propostas de Bickerton (1981),

4 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

4.2 Princípio da Parcimônia, Transcategorização e Teoria da Variação

4.2.2 O Princípio da Parcimônia, o Modelo de Interação Verbal e as propostas de Bickerton (1981),

Uma segunda vertente apresentada por Pereira (1992:141) relacionada ao “Princípio da Parcimônia” não diz respeito “tanto ao uso recursivo do material lingüístico disponível, mas antes à apropriação sistemática do saber que se pressupõe adquirido por parte dos potenciais interpretadores, como forma de redução de marcas explícitas, morfologicamente realizadas, de codificação das informações a transmitir”.

A autora afirma, ainda, que, em CCV, “sempre que a informação é previsível”, existe a tendência de economizar “material de codificação” (p. 146). Baseando-se em

Givón, estabelece o seguinte “corolário” para explicar essa propensão: “quanto mais previsível é a informação, menos material de codificação é usado para codificar”, explicando que informação previsível é aquela “que o enunciador pressupõe como dada ou acessível aos outros participantes da interacção” (p. 146).

Pereira (1992:146) explica que são três “as fontes dessa informação”: “o contexto discursivo anterior, o contexto situacional imediato ou referido e o contexto genérico (conjunto de pressupostos culturais partilhados pela comunidade e em grande medida codificadas no léxico)”. Essas fontes citadas pela autora se aproximam dos conceitos de arquivo ativo, as duas primeiras, e arquivo permanente, a última, sugeridos por Givón (1984), os quais foram citados no item 1.2 desta Dissertação para elucidar o “Modelo de Interação Verbal proposto por Dik (1997).

Segundo esse modelo, o falante antecipa as possíveis interpretações que o ouvinte possa estabelecer a respeito das expressões que serão proferidas pelo próprio falante. Assim, o ouvinte interpreta e reconstrói o que foi primeiramente intencionado e depois dito pelo falante. Nesse sentido, o referido modelo se aproxima da tendência em CCV, de acordo com o “Princípio da Parcimônia”, de que (F), antecipando as interpretações de (O), irá “economizar” “material de codificação” quando pressupor que para (O) aquela informação já é previsível.

Pereira (1992) apresenta muitos exemplos de ocorrências dessa natureza em CCV, e, na p. 149, comenta a opção pela utilização ou não dos “especificadores”, particularmente interessante para esta Dissertação. De acordo com a autora, o CCV possui “especificadores diferenciados para, junto do N, referir entidades definidas (tipicamente os demonstrativos e os possessivos) e indefinidas (tipicamente os indefinidos), por oposição às genéricas (tipicamente ø)”. Para ela, “a seleção dos especificadores do N depende directamente das informações anteriores, pressupostamente dadas pelas três ordens de contexto” mencionadas anteriormente. Assim, “sempre que, recorrendo a esses contextos, é possível identificar sem ambigüidade a referência do N, a actualização dos especificadores é suspensa e o N ocorre sozinho, aproximando – se, pelo traço [+ pressuposto], dos Ns genéricos”.

A autora, apresenta ainda três exemplos38 para comprovar sua afirmação:

1

38

(46) Bia ba kasa. Mai staba na kama. Tchabi staba na porta. Bia ir-PST casa. Mãe estar-PST na cama. Chave estar-PST na porta.

(A Bia foi a casa. A mãe estava na cama. A chave estava na porta).

(47) N gosta tcheu de limaria. Eu gostar-PRS muito de animal. (Eu gosto muito de animais).

(48) Omi dja bai. Homem já ir-PST.

(O homem já se foi embora).

A autora explica, p. 149 e 150, que “nenhum dos N’s recebe qualquer especificador abertamente realizado” pois:

- Bia é um nome próprio e os SN’s kasa e mai “referem-se a entidades

imediatamente associáveis a Bia”; já os SN’s tchabi e porta são associados ao SN

casa (de Bia e de sua mãe);

- limaria é um SN genérico;

- omi, “não tendo especificador, tem de ser interpretado como referindo-se a um

homem presente no contexto da enunciação ou já referido anteriormente no texto”.

Pereira (1992:150) afirma ainda que, em CCV,

“o optar por uma codificação menos pesada não resulta tanto das opções individuais dos falantes ao nível do discurso e em cada momento da enunciação, mas antes de uma instrução ao nível do sistema que a torna altamente provável, se não obrigatória, em alguns casos”.

Essa afirmação é importante para esta Dissertação, pois o objetivo deste trabalho é observar o funcionamento dos artigos em CCVS, de acordo com as variedades selecionadas, buscando parametrizar seu funcionamento nessas variedades.

É preciso dizer que a vertente do “Princípio da Parcimônia” apresentada neste tópico refuta as propostas de Bickerton (1981) e Givón (1984) quanto à utilização de artigos nas línguas crioulas, pois, de acordo com esse princípio não haveria a regularidade sugerida pelas duas propostas. O que para Givón (1984) seria irregular, ou seja, a possibilidade de ser utilizado artigo definido ou ø em SN’s genéricos, não condiz com a proposta de Pereira (1992) pois, para ela, SN’s genéricos apresentariam ø, como foi exposto. Ou seja, a proposta de Pereira (1992) não converge com a de Givón (1984) em nenhum ponto, e com a de Bickerton (1981) se aproxima no tocante aos SN’s genéricos, pois também para ele, esses SN’s teriam a marca ø.

A proposta de Pereira (1992) também se distancia da proposta de Lucchesi (1994a) quanto aos genéricos, pois, para o autor, SN’s não específicos, inclusive genéricos, não apresentariam uma marca regular, e para ela, como foi visto, esses SN’s apresentariam regularmente ø.

Aliás, para Lucchesi (1994a), os SN’s específicos pressupostos também não apresentariam uma marca regular, que, segundo Bickerton (1981) seria o artigo definido, “predominando a ausência do artigo nesses SN’s” (Lucchesi:1994:76). Então, pode-se dizer que a proposta de Pereira (1992) complementa a proposta de Lucchesi (1994a) nessa questão, explicando por que predomina a ausência de artigos nesses SN’s: porque se as informações forem mencionadas anteriormente no texto, ou se estiverem contidas na própria situação em que ocorre o discurso, a opção de (F) será por ø nos SN’s que fizerem referência a essas informações, ou a essas entidades, previamente mencionadas ou contidas na situação.

Nesse sentido, a proposta de Pereira (1992) também se aproxima da de Lucchesi (1994a), pois, para esse autor, o sistema de referência nos crioulos utiliza uma única forma, o artigo indefinido, cabendo ao artigo definido um papel secundário, servindo, ou para dar ênfase ao SN indefinido já mencionado, funcionando como marca estilística, “ou para reforçar a noção de ‘definição’, já previamente fornecida pela coesão textual” (LUCCHESI:1994a:77), o que explicaria seu uso bastante irregular.

É importante dizer que o “Princípio da Parcimônia” tende a se aproximar mais, como foi visto, da proposta de Lucchesi (1994a). Resta, agora, analisar o corpus disponível e constatar de qual(is) dessa(s) propostas essa análise estará mais próxima.