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Capítulo II – Os Direitos Fundamentais do Trabalhador nas Constituições Portuguesa e

3. Princípios gerais em matéria de Direitos Fundamentais

3.1. O Princípio da universalidade

Este princípio é o primeiro princípio comum aos direitos fundamentais e também aos demais direitos existentes, quer na ordem jurídica portuguesa, quer na angolana: ―todos quantos fazem parte da comunidade política fazem parte da comunidade jurídica, são titulares dos direitos e deveres aí consagrados; os direitos têm ou podem ter por

sujeitos todas as pessoas integradas na comunidade política, no povo‖160

. Este princípio, embora incindível do da igualdade, com se confunde com este. O princípio da

160

MIRANDA, Jorge – Direitos Fundamentais – Introdução Geral: Apontamentos das Aulas. Lisboa: AAFDL, 1999, p.117.

74 universalidade sustenta que todos têm todos os direitos e deveres, ao passo que o princípio da igualdade defende que todos ou, em certas épocas ou situações, só alguns, têm os mesmos direitos e deveres. Se ―o princípio da universalidade diz respeito aos destinatários das normas, o princípio da igualdade ao seu conteúdo. O princípio da universalidade apresenta-se essencialmente quantitativo, o da igualdade essencialmente qualitativo‖161

.

A Constituição portuguesa actual distingue-os nos arts. 12º e 13º e a Constituição angolana actual nos arts. 22º e 23º, tal como a Declaração Universal dos Direitos do Homem nos arts. 2º e 7º. Em adição ao art. 12º, nº1, da CRP, o art. 71º, nº1 e, à semelhança deste, o art. 83º, nº1, da CRA reitera o art. 22º, nº1.

O princípio da universalidade acolhe dois vectores essenciais: a possibilidade de as pessoas colectivas poderem deles desfrutar-se adequadas à sua natureza e a possibilidade de estrangeiros e apátridas acederem à titularidade dos direitos fundamentais162. ―A primeira faceta do princípio da universalidade diz respeito à

questão de saber se as pessoas colectivas também são titulares de direitos fundamentais, podendo aqui subdistinguir-se entre pessoas colectivas públicas e

privadas, e abrindo-se dentro de qualquer delas diversas classificações‖163.

A orientação geral dominante é ―a de que as pessoas colectivas são titulares de direitos fundamentais, em nome deste princípio da universalidade, desde que os direitos fundamentais concretamente a analisar se harmonizem, na protecção concedida, ao sentido existencial da pessoa colectiva em causa, até podendo haver, no extremo, direitos fundamentais só para pessoas colectivas: a liberdade religiosa individual não se aplica numa sociedade comercial, mas a inviolabilidade do domicílio já pode ter razão

de ser, em nome da protecção de segredos da actividade económica‖164

.

Em relação ―à distinção entre pessoas colectivas públicas e privadas, a lógica primária fundamental dos direitos fundamentais, a despeito de a formulação do princípio da universalidade não o dizer, não parece consentir que as pessoas colectivas públicas possam beneficiar de tais direitos: é que os direitos fundamentais, no Direito Constitucional, visam defender a liberdade e a autonomia da sociedade, e não defender

161

Idem, p.118.

162

GOUVEIA, Jorge Bacelar – Direito Constitucional de Angola. Lisboa: IDILP – Instituto do Direito de Língua Portuguesa, 2014, p.325.

163

Idem, p.326.

164

75 segmentos do poder contra outros segmentos de poder, ainda que pontualmente se

possam admitir excepções‖165

.

A outra faceta do princípio da universalidade diz respeito à titularidade de direitos fundamentais por parte de pessoas jurídicas que não sejam de cidadania angolana e portuguesa, residualmente interessando às pessoas colectivas estrangeiras. A CRA dedica um preceito específico a esta problemática, o art.25º, sob a epígrafe

Estrangeiros e Apátridas, à semelhança da CRP, no art.15º, com a epígrafe Estrangeiros, Apátridas e Cidadãos Europeus, cidadania esta que se torna imperativa

abordar isoladamente, individualizar, em resultado da União Europeia e, assim, da sua especificidade e importância.

Da leitura de ambos os artigos, percebe-se que ambas as Constituições acolhem o princípio da equiparação, segundo os quais os direitos fundamentais que aplicam aos cidadãos, quer angolanos, quer portugueses, beneficiam os cidadãos estrangeiros e os apátridas e ainda, no caso português, os cidadãos europeus. Todavia, esta orientação comporta diversas limitações, em relação a certos domínios que ficam reservados aos cidadãos nacionais, angolanos e portugueses, ―embora se admita que essa excepção não se aplique aos estrangeiros de comunidades regionais ou culturais de que Angola seja

parte, sem condições de reciprocidade e mediante convenção internacional‖166

, conforme se depreende da leitura dos números do art.22º da CRA, o mesmo se passando no caso português, como é o caso referido da União Europeia, como se constata da leitura dos números do art.12º da CRP.

Posto esta noção geral do princípio da universalidade, passemos à exemplificação da concretização deste princípio no caso dos direitos dos trabalhadores consagrados nas Constituições Portuguesa e Angolana.

No nº1 do art.55º da CRP é reconhecida (a todos) os trabalhadores a liberdade sindical, em condições de igualdade. Nos nºs 1 e 2 do art.57º da CRP é garantido (a todos) o direito à greve, competindo (a todos) os trabalhadores defini-la. Mas estes direitos consagram o princípio da universalidade de modo implícito, porque pressupõe a autonomia de decisão, ser ou não sindicalizado, aderir ou não à greve, do trabalhador.

De modo inequívoco, o princípio da universalidade materializa-se, por exemplo, no art.58º, nº1 da CRP, ao estabelecer-se que todos têm direito ao trabalho e que todos têm os direitos enumerados no nº1 do art.59º da CRP.

165

Ibidem.

166

76 O nº1 do art.50º da CRA refere que é reconhecida (a todos) os trabalhadores a liberdade de criação de associações sindicais para a defesa dos seus interesses individuais. Também o nº1 do art.51º da CRA dispõe que (todos) os trabalhadores têm direito à greve. Mas, à semelhança do que se passa no caso português, o princípio da universalidade surge implicitamente. E, tal como sucede na Constituição Portuguesa, este princípio aparece, de modo explícito, nos nºs 1 e 2 do art.76º da CRA: o trabalho é um direito e um dever de todos.