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Similitudes na protecção dos direitos fundamentais dos trabalhadores nas ordens

Capítulo III – Síntese comparativa

1. Similitudes na protecção dos direitos fundamentais dos trabalhadores nas ordens

É interessante notar as similitudes constitucionais, à qual à matéria dos direitos fundamentais não escapa, entre ambas as ordens jurídicas em estudo. Com efeito, a ordem jurídica angolana e, especialmente, a Constituição angolana é fortemente influenciada pela Constituição portuguesa. Ambos os países são fortemente centrados na lógica do sistema de mercado e, como tal, as ordens legislativas e, assim, coincidem em muitas ideias políticas e económicas, o que os faz deterem-se em formas e visões de protecção dos direitos dos cidadãos em geral e, tendo em conta o objecto do nosso estudo, dos trabalhadores muito próximas.

E, no que concerne à extensão, ou seja, à concretização destes direitos constitucionalmente consagrados, a preocupação legislativa, ainda que com sistematizações ligeiramente diferentes, acaba por assentar nas mesmas temáticas. Poder-se-á considerar que esta coincidência ou convergência temática resulta de uma preocupação laboral global, fruto do mundo globalizado em que vivemos hoje.

Ambas as ordens jurídicas consagram, quer direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, quer direitos económicos, sociais e culturais semelhantes em ambas as Leis Fundamentais, sendo marca de ambas a sistematização distinta destas categorias de direitos em dois títulos. Assim, a CRA de 2010 seguiu, o exemplo dado em 1976 pela CRP.

No que toca à legislação laboral, na qual destacamos a LGTA e a CTP, podemos considerar que estas concretizam os direitos constitucionalmente consagrados, grosso modo, de uma maneira muito similar306. Ambas se preocupam, nomeadamente, com a fixação de um salário mínimo nacional, que assegurem o seu bem-estar e a sua subsistência, e na fixação de limites horários de trabalho e de férias, que assegurem o descanso e o lazer dos trabalhadores. A visão objectivista da relação laboral procedeu, no CTP e na LGTA, ―à introdução da temática dos direitos de personalidade (…) até

306

Também em Leis como a da Greve, a Sindical, que concretizam e regulam direitos fundamentais, enquadrados no espectro de direitos, liberdades e garantias, e em Regimes como o RJATDP, que asseguram a protecção do trabalhador na eventualidade e no caso concreto de a sua integridade física se ver lesada, de um modo genérico, podemos verificar muito mais convergência do que divergência, que acaba por assentar muito mais em pormenores que em discordâncias de fundo.

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então só consagrada na esfera civil‖307. Esse personalismo laboral surgiu,

consequentemente, como uma novidade. A personalidade jurídica, constante dos arts.70º de ambos os Códigos Civis, português e angolano, consiste na aptidão concedida a cada ser humano para se constituir como um núcleo de direitos e deveres. Mas as leis laborais dos dois países vêm consagrar estes direitos de personalidade no âmbito laboral.

Bossu, citado por Quintas308, argumenta que ―não é a pessoa do trabalhador, mas

sim a sua actividade que constitui o objecto contratual‖. Contrariamente a esta perspectiva, Ramalho, igualmente citada por Quintas309 considera que alguns autores ―optam por considerar como objecto do contrato não a actividade do trabalhador mas a sua disponibilidade para o prestar. Ora, esta inseparabilidade entre a actividade de trabalho e a pessoa do prestador evidencia o integral envolvimento desta no vínculo‖. No mesmo sentido, Abrantes310 frisa que ―é o próprio objecto do contrato – a disponibilidade da força de trabalho que torna inevitável todo um conjunto de notáveis

limitações à liberdade pessoal do trabalhador‖. E, como reforça Assis311, ―no quadro da

sujeição em que se encontra face à autoridade e direcção do empregador, o trabalhador acaba por ver aí também envolvida a sua própria personalidade e a sua autonomia, as quais perdem, em menor ou maior medida, a amplitude que conhecem fora do âmbito da

relação laboral‖. Ramalho, citada por Quintas312

, considera que o trabalho subordinado ou actividade laboral se distingue das demais formas de actividade laboral ―pelo relacionamento desigual entre as partes, manifestada na posição de subordinação do trabalhador e na posição de domínio do empregador, conjugado com a sua natureza ou actuação jurídica privada. A dimensão subjectiva do elemento de subordinação manifesta a especificidade do fenómeno laboral, ao mesmo tempo que confirma o sentido unitário do conceito de actividade laborativa, na sua estrutura objectiva‖.

No personalismo ético que acolhemos, ―só a pessoa, titular de direitos emergentes e conaturais com a sua natureza, pode constituir a razão de ser do Direito, acolhendo ainda o constitucionalmente consagrado quanto à dignidade da pessoa humana como valor único e irrepetível, entendemos que o trabalho deve dignificar o

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QUINTAS, Paula – Os Direitos de Personalidade Consagrados no Código do Trabalho na Perspectiva Exclusiva do Trabalhador Subordinado – Direitos (Des)Figurados. Coimbra: Almedina, 2013, p.55.

308 Idem, p.56. 309 Ibidem. 310 Idem, pp.56-57. 311 Idem, p.57. 312 Idem, pp.57-58.

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homem e não coisificá-lo, colocando-o em resguardado de um certo estado da natureza,

permissivo a práticas selvagens e selváticas de sobrevivência (…). Sendo que terminologicamente o termo trabalho, já contém em si próprio, o pendor da penosidade. O próprio legislador ao dotar a retribuição de um carácter alimentício e irrenunciável, antevê que trabalho por prazer é figura que factualmente não existe‖313.

Deste modo, podemos concluir-nos pela consonância e sintonia em matéria de protecção dos direitos fundamentais dos trabalhadores, acolhendo e seguindo, de forma atenta, a legislação laboral de instrumentos internacionais, como a OIT e a DUDH, o que revela a preocupação que ambos os Estados têm com os seus cidadãos, com o seu bem-estar, com a sua dignidade pessoal e com os princípios de igualdade e de universalidade, sendo sua tarefa assegurarem e promoverem esta forma de subsistência. Os direitos da dignidade humana ―acolhem-se no conceito de dignidade humana,

considerada como um bem axiológico de natureza absoluta‖314. E, tanto a CRP como a

CRA proclamam, no art.1º, a dignidade humana como valor fundamental. Loureiro,

citado por Quintas315, propõe que se entenda a dignidade humana como ―valor

intrínseco, originariamente reconhecido a cada ser humano, fundado na sua autonomia ética e que alicerça uma obrigação geral de respeito da pessoa, traduzida num feixe de deveres e de direitos correlativos‖.

2. Diferenças mais significativas dos regimes jurídicos de protecção dos direitos