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Abordamos até o momento a questão da necessidade da observância da totalidade na análise do impacto econômico, social, político, cultural ou espacial ocorrente em um determinado local a partir de uma ação, um fato novo, seja política pública (no caso em questão), seja atividade econômica, etc. Buscar a aproximação da totalidade significa a tentativa de reconstituição das múltiplas determinações às quais um local ou região estão expostos, para que se possa observar os efeitos do fato novo sobre estes.

A seguir, enunciaremos os procedimentos, para o caso específico de nosso estudo, adotados na coleta de informações junto aos envolvidos no processo, levando sempre em consideração os preceitos acima descritos.

Para a realização da etapa empírica da pesquisa, utilizamos uma adaptação à metodologia proposta por Bernardo Mançano Fernandes denominada Impactos Socioterritoriais. Fernandes (2002, p. 4), considerando sua perspectiva de pesquisa, entende os impactos socioterritoriais como mudanças que acontecem no território através das ações dos sem-terra, do Estado e dos latifundiários.

Na execução de nossa pesquisa, na qual observaremos os impactos a partir da perspectiva dos efeitos de uma política pública, optamos por algumas adaptações à metodologia proposta

pelo autor referido, apesar de manterem-se os caracteres estruturais. Continuaremos utilizando o conceito de impacto, na medida em que, das diversas acepções da palavra, a que diz respeito à “impressão ou efeito muito fortes deixados por certa ação ou acontecimento”11 parece bastante coerente com nossa proposta. Com relação ao segundo componente do título da metodologia, o caráter socioterritoral dos impactos, acreditamos ser possível definir tais impactos como

territoriais somente. A partir da discussão sobre a temática do território apresentada, defendemos

tal idéia, na medida em que consideramos a sociedade como um componente do território e o território por sua vez, abordado a partir de uma perspectiva integradora, definida de maneira sintética por Córdova (2003, p. 135): “Concebimos al territorio (o sistema territorial), como el

sistema conformado por los subsistemas económico, político, social y cultural; el sistema

espacial apropriado y organizado por los primeros, y sus mutuas interrelaciones.” (Grifo no original). Assim, torna-se impossível produzir impactos sobre o território sem afetar a sociedade e vice-versa. Desta forma, os impactos que atinjam o território serão obviamente sociais, políticos, econômicos, culturais e até mesmo naturais, como defendido por Rogério Haesbaert:

“Encontramos aqui um outro debate muito relevante: aquele que envolve a leitura de território como um espaço que não pode ser considerado nem estritamente natural, nem unicamente político, econômico ou cultural. Território só poderia ser concebido através de uma perspectiva integradora entre as diferentes dimensões sociais (e da sociedade com a própria natureza)”. (Haesbaert, 2004, 74)

A Análise de Impactos Territoriais (AIT) que aqui propomos está baseada na observação das diferentes dimensões nas quais o(s) impacto(s) possa(m) se manifestar, como as dimensões econômica, social, política, cultural, espacial, etc. Tal observação precisa ser realizada a partir de

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indicadores capazes de fornecerem subsídios à avaliação do impacto. Estes indicadores podem

ser de natureza horizontal ou vertical, proporcionando a noção de relação e escala. Os indicadores

horizontais dizem respeito à observação entre os principais envolvidos no processo, sejam grupos

sociais, unidades de produção, etc. Já os indicadores verticais pretendem dar conta da propagação do impacto no entorno mais ou menos imediato, como o bairro, o município ou municípios, a região, etc.

A escolha dos indicadores leva a definição das variáveis, que podem ser de natureza quantitativa ou qualitativa, de acordo com a natureza da informação. O quadro a seguir ilustra o esquema.

Figura 2: Estrutura da metodologia “Análise de Impactos Territoriais”

Fonte: Elaborado pelo autor.

Em nossa proposta de análise dos impactos territoriais utilizaremos três dimensões, dentre as diversas cuja análise seria perfeitamente possível. Serão abordadas as dimensões Econômica,

Social e Espacial do impacto. As três dimensões por sua vez definiram os indicadores verticais e

horizontais, além das variáveis qualitativas e quantitativas utilizadas. A seguir demonstramos as dimensões e indicadores utilizados que também podem ser observados nos questionários em apêndice (Apêndices B, C e D). Dimensões Indicadores Verticais Horizontais Definem Variáveis Qualitativas Quantitativas Determinam

Tabela 1: Dimensões de análise e seus respectivos indicadores.

Indicadores Dimensões

Verticais Horizontais

Econômica Utilização do Comércio, transporte e serviços. Permanência da unidade familiar na

condição produtiva.

Social

Renda familiar, condições de vida e das moradias, relações de ajuda-mútua inter e intrafamiliares, bem-estar do idoso.

Espacial Perspectivas de permanência/migração; motivo das permanências/migrações.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Definida a metodologia, o trabalho de campo foi realizado no segundo semestre de 2005 através da aplicação de questionários mistos, parte estruturados, para análise estatística de natureza descritiva, parte semi-estruturados, visando a aplicação de análise de conteúdo, procedimento qualitativo que será descrito a seguir. As entrevistas foram realizadas com a participação de três grupos de entrevistados distintos ou amostras, escolhidos de forma não- probabilística12. Foram definidas as amostras: a) estabelecimentos cujos responsáveis sejam beneficiários da previdência, b) estabelecimentos cujos responsáveis sejam agricultores fora da idade de aposentadoria e finalmente, c) agricultores beneficiários da previdência e atualmente domiciliados na área urbana do município. Em cada grupo foram entrevistadas trinta famílias, sendo a família tomada como unidade de análise, considerando que as informações não foram

12 Para que se tenha uma escolha probabilística da amostra, é necessário que os componentes do universo tenham

uma probabilidade igual ou conhecida, distinta de zero, de serem escolhidos para fazerem parte da amostra (RICHARSON, 1999).

tomadas somente de um indivíduo, mas dos membros destas, principalmente casais, que estivessem presentes na ocasião da entrevista, especialmente no que tange aos questionários semi-estruturados. Considerando os dados dos censos agropecuário de 1996 e demográfico no ano de 2000, as amostras a e b representam, cada uma delas, cerca de 1% do universo de unidades de produção contabilizadas no referido censo agropecuário.

A amostra c por sua vez representa cerca de 0,68 % da população total, formada por pessoas domiciliadas na área urbana, nas faixas etárias de 40 a 59 e de 60 anos ou mais de idade, corte necessário para que se abarcasse a população de mulheres aposentadas, devido à idade de 55 anos prevista para sua obtenção ao benefício de aposentadoria rural por idade. Também é necessário dizer que na amostra da área urbana foram focalizados os aposentados por idade somente, o que não ocorreu nas amostras da área rural. Em todos os casos, além do questionário estruturado, foi aplicada a entrevista semi-estruturada, para fins de análise qualitativa. As entrevistas não foram identificadas para que os entrevistados tivessem tranqüilidade no fornecimento das informações. As mesmas foram gravadas e transcritas para o posterior tratamento.

Na etapa rural do trabalho de campo, as trinta entrevistas de cada grupo foram obtidas através de visitas à seis localidades rurais do município, escolhidas com o intuito de cobrir de forma razoavelmente homogênea o espaço rural do município (Figura 3). Em cada localidade foram visitados cinco estabelecimentos do grupo a e cinco do grupo b.

Figura 3: Mapa das áreas de estudo no espaço rural de São José do Norte. -5 2.2° -5 2° -5 1.8° -5 1.6° -5 1.4° -5 1.2° -3 2° -3 1.8° -3 1.6° -3 1.4° 0 11 22 Km 101 P ra ia d o M a r G ros s o S ã o Jo sé d o N o rte P elo tas R io G ra n d e Ta vares 1º D i strito 2º D is trito 3º D i strito T eso u reiro P aro b é D iv isa G ra va tá C a pã o d o M eio S araiv a O rie n te S ão C a etan o R od ov ia se m p avim en taçã o R od ov ia p avim e ntad a Lim ites d is tritais Lo calid ad es

E s trad as inte rio re s

Legendas Á rea s de E stud o B a rra C u rr al V e lh o E streito V á rze a B a rr an c o P a ss in h o C a p iv a ra s C a p ã o d a A re ia B u ju ru

Fonte: Elaborado pelo autor.

Para que alcançássemos um resultado melhor, sobretudo no que toca à pesquisa qualitativa, adotamos uma estratégia para a abordagem dos entrevistados. Nas etapas rural e urbana do trabalho de campo, utilizamos a companhia do que chamamos interlocutores

privilegiados. Trata-se de pessoas com as quais estabelecemos contato prévio, esclarecendo

nossas intenções e os objetivos da pesquisa. Participaram membros do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural – CMDR, moradores de comunidades rurais e de bairros da cidade. Por se tratarem de pessoas amplamente conhecidas em suas comunidades, as entrevistas ocorreram num ambiente de maior tranqüilidade e confiança por parte dos entrevistados, refletindo-se também na ocorrência de apenas três recusas em realizar a entrevista de um total de noventa famílias.

Além das entrevistas gravadas com os principais envolvidos no processo, de forma a obter os indicadores horizontais, utilizamos outras abordagens e procedimentos, tanto para a obtenção dos indicadores verticais, quanto para a análise da situação geográfica em que incide a política, conforme descrito.

Com relação ao procedimento de análise de conteúdo, considerando o amplo espectro de metodologias existentes no universo da pesquisa qualitativa, bem como a breve tradição em seu uso, se comparada às abordagens quantitativas, consideramos pertinente o detalhamento do procedimento utilizado. Construímos um texto que explicita os procedimentos desta perspectiva de pesquisa, sendo que o mesmo encontra-se na seção de apêndices (Apêndice E).

Os resultados desta abordagem estão presentes nos capítulos 4 e 5. Os textos-síntese resultantes da aplicação da análise de conteúdo estão presentes sob a forma de Box. Estão presentes também citações que não originaram categorias da análise de conteúdo, cuja importância reside na informação que transmitem.

CAPÍTULO II – QUESTÕES SOBRE A ANÁLISE DO TRABALHO