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2. As estruturas de conhecimento e o tratamento de informação política

2.2. O processamento e avaliação da informação política

O facto da 2a edição do Handbook of Social Cognition (Wyer e Srull,

(eds), 1994) ter um capítulo dedicado à análise da psicologia política numa perspectiva cognitivista demonstra a relevância que este tema tem vindo a assumir também dentro do campo da Cognição Social. Nesse capítulo, Iyengar e Ottati (1994) apresentam em linhas gerais considerações que nos parecem relevantes para o nosso trabalho.

Iyengar e Ottati (1994) referem-se às diferentes fases de teóricas e empíricas da Psicologia Política. Assim, de acordo com os autores, o desenvolvimento da Psicologia Política faz-se em 3 etapas diversas, que tem correspondência cronológica com as preocupações dominantes da Psicologia

Social.

Nos anos 40 e 50 o paradigma dominante dizia respeito às teorias da personalidade (cf. o modelo de personalidade autoritária de Adorno et ai,

1950). Numa segunda fase, correspondente aos anos 60 e 70, os fundamentos teóricos relacionavam-se com a formação e mudança de atitudes, com especial incidência no comportamento de voto. A fase mais recente da Psicologia Política assenta nos pressupostos conceptuais e empíricos da Cognição Social e tenta explicar a opinião pública e o comportamento político em termos de processamento de informação.

No que se refere ao processamento de informação política, Iyengar e Ottati (1994) apresentam 3 abordagens fulcrais para a compreensão da dimensão política: os processos atribucionais que estão na base da decisão de voto; os efeitos da informação política televisiva (cf. a visibilidade de determinadas questões políticas face a outras e de determinados políticos..) na avaliação política; e o processamento de informação e avaliação política.

Dado que o nosso estudo empírico incide essencialmente no modo como os indivíduos processam informação sobre um evento político tendo em conta sua pertença ideológica, é nos modelos de processamento de informação política apresentados por Iyentar e Ottati (1994) que vamos focar a nossa atenção.

De acordo com os autores, o processamento de informação política faz-se de igual modo a qualquer outro tipo de informação social, isto é, a informação é tratada de acordo com as diversas fases do processamento de informação.

Dada a extensão e complexidade do universo de informação política,

21 Essas fases são: percepção, categorização, organização, inferência,

recuperação e decisão, tal como foi proposto por Fiedler (1996) e discutido por nós no capítulo 1.

os indivíduos não se encontram expostos senão a uma parte dessa informação, desempenhando um papel activo na procura de informação política que seja consistente com as suas expectativas e conhecimento prévio sobre política (Snyder e Swann, 1978; Wyer, Strack e Furhman, 1984, cit. por Iyengar e Ottati, 1994).

Este processo de atenção e codificação da informação política funciona como um reforço do esquema político do sujeito que por sua vez enforma os julgamentos e avaliações que este produz a partir da informação. Por outro lado, a forma como a informação política é compreendida varia em função da experiência que o sujeito possuí no processamento deste tipo de informação (Fiske e Kinder, 1981), bem como do contexto socio-político no qual está inserido (cf. Alwin, Cohen e Newcomb, 1991; Talion e Izquierdo,

1990).

A importância ou força dos esquemas políticos condiciona o modo como a informação política é tratada quer ao nível da avaliação, quer nos processos de recuperação da memória. E se é um facto que os modelos que se debruçam sobre o funcionamento dos esquemas (de que os estereótipos são um bom exemplo) predizem que quando estes são activados os sujeitos focalizam a sua atenção na informação relevante para o seu uso, já relativamente ao tipo de informação (consistente ou inconsistente) na qual essa atenção é focada a discussão permanece em aberto (Iyengar e Ottati, 1994; DijKsterhuis e Van knippenberg, 1995; Stangor e Mcmillan, 1992; Cano, Hopkins e Islam, 1991).

Judd e Krosnick (1989, cit. por Iyengar e Ottati, 1994) propõem um modelo de organização da memória política no qual princípios ideológicos, políticas concretas, grupos políticos de referência e posições políticas individuais estão relacionados entre si de acordo com regras específicas, as quais estabelecem a força relativa dessas relações. Este modelo assume que os peritos políticos possuem um esquema político mais integrativo e complexo do que os iniciados. No entanto, na medida em que são mais sensíveis ao conflito de valores (pela sua maior capacidade de processamento de informação

política) tem mais dificuldade em manter um esquema político no qual as relações entre princípios, práticas políticas e grupos de referência se apresentem totalmente consistentes entre si.

No caso do processamento de informação relativa aos candidatos políticos (e por extensão a outro tipo de informação política) os resultados salientam a existência de um maior número de respostas correctas (nas tarefas de reconhecimento) relativas a informação consistente com a posição e identificação partidária do candidato do que de informação inconsistente (Lodge et ai, 1989; Lodge e Hamill, 1986, cit. por Iyengar e Ottati, 1994).

Dijksterhuis e Van Knippenberg (1995) fizeram um estudo no qual pretendiam analisar o papel mediador da velocidade de apresentação dos estímulos na recuperação de informação (consistente ou inconsistente) sobre

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um dado grupo social.

Os participantes liam um conjunto de descrições de comportamentos de membros de um grupo (professores) e deveriam formar uma impressão sobre esse grupo. Neste estudo participaram 28 estudantes universitários, distribuídos aleatoriamente, por duas condições experimentais: na condição 1, o tempo de apresentação dos comportamentos era 1.8 segundos e na condição 2, o tempo de apresentação era de 10 segundos.

Os resultados mostram que na condição 1 (velocidade rápida) é mais recordada a informação consistente do que inconsistente e na condição 2 (velocidade lenta) é o inverso. No caso dos julgamentos avaliativos, na condição 1 (velocidade rápida), estes eram mais estereotipados do que na outra condição. Assim, o papel dos estereótipos é mais importante em situações em que os sujeitos tem de avaliar informação social cuja codificação foi realizada

Um aspecto interessante deste estudo prende-se com o facto do alvo de análise ser um grupo social e não uma pessoa individual, contrariamente ao habitual neste tipo de estudos.

de forma menos complexa.

No entanto, o processamento de informação política é ainda afectado por outros aspectos, nomeadamente os que dizem respeito aos factores motivacionais, afectivos (cf. Abelson et ai., 1982) e aos objectivos do processamento dessa mesma informação (que podem ser decisão de voto, participação em comemorações políticas, avaliação de propostas políticas, de candidatos, formação de juízos avaliativos sobre eventos políticos, entre outros...).

De acordo com Iyengar e Ottati (1994), o processamento da informação política poderá ser efectuado tanto em termos da sua relevância para o sujeito como para o seu grupo social de pertença. No entanto, no caso da informação política, o seu processamento em termos de consequências para o grupo social do indivíduo tem prevalência sobre uma perspectiva mais individualista.

McGraw e Pinney (1990, cit. por Iyengar e Ottati, 1994) afirmam que as opções políticas podem formar-se durante a exposição à informação política (cf. tempo de antena, comícios, etc.), sendo esta opção guardada na memória e integrada no esquema político do sujeito, por forma a contribuir para a avaliação de informação posterior.

Wyer e Ottati (1992, cit. por Iyengar e Ottati, 1994) referem que no caso dos sujeitos serem chamados a fazer um julgamento avaliativo dum candidato, inicialmente pesquisam a informação sobre esse candidato na memória e no caso de possuírem informação suficiente, usam-na como base para a sua avaliação.

Bless e Schwartz (1998), realizaram um estudo no qual procuraram

No nosso estudo empírico utilizamos uma tarefa distrativa como forma de estimular a utilização esquemas ou estereótipos políticos no tratamento de informação sobre o 25 de Abril.

avaliar o impacto do contexto no processamento de informação política e subsequente avaliação de mais informação política.

Num primeiro estudo experimental, os autores pediram aos 146 participantes (aleatoriamente distribuídos por 3 condições experimentais) que respondessem nomeadamente a uma questão sobre um político alemão altamente respeitado. Numa das condições experimentais o político era categorizado como membro dum partido político (CDU) e noutra condição experimental como Chanceler da Alemanha. Posteriormente era pedido aos participantes que avaliassem o partido político (CDU).

Os resultados mostram que existem diferenças significativas na avaliação do partido político em função das condições experimentais. Na condição em que o político é categorizado como membro do partido, o seu partido é avaliado de forma mais positiva (prestígio pessoal estendido ao grupo de referência pelo efeito de assimilação), enquanto que na condição em que o político é categorizado de forma suprapartidária, o seu partido é avaliado de forma mais negativa (efeito de contraste).

Os resultados encontrados confirmaram o modelo teórico sustentado pelos autores, no qual se postula que quando é pedido aos indivíduos que formem um julgamento sobre um dado estímulo, estes utilizam uma representação cognitiva desse estímulo e estabelecem um padrão de comparação constituído por informação que recuperam do sistema de memória e informação que apenas está temporariamente acessível, dependente da influência do contexto.

Em conclusão, podemos afirmar que o processamento de informação política ocorre de forma idêntica ao tratamento doutro tipo de informação social e que é influenciado por diversos factores como o contexto, os antecedentes socio-políticos dos sujeitos, a importância e complexidade dos seus esquemas políticos, a acessibilidade da informação, bem como factores afectivos ou motivacionais.

o tipo de informação que é guardado no sistema de memória (consistente ou inconsistente) e a avaliação que os sujeitos fazem dessa informação.