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O PROCESSO CRIATIVO DA ILUMINAÇÃO CÊNICA NA SALA

O processo criativo

da iluminação cênica

na sala de ensaio

[...] a luz cênica deve ser entendida não como um elemento separado, mas como um processo que deve fazer parte da construção da cena, isto é, luz e cena necessitam ser pensadas como um processo vivo e co-evolutivo. Não há como compreender o papel que a luz desempenha nesse processo sem levar em consideração a relação de trocas que ela estabelece com a cena, e vice-versa (CAMARGO, 2006, p.11).

2.1- A iluminação cênica como linguagem ativa na era

da encenação.

Para compreender os processos de criação da iluminação cênica no teatro, sobretudo na perspectiva de entendê-la como linguagem, requer que reflitamos sobre a “era da encenação” (DORT, 1977, p. 61). Um movimento europeu que repensou o fazer teatral no ocidente, a partir do final do século XIX, e principalmente ao longo do século XX. Nesse período aconteceram grandes avanços tecnológicos na área da iluminação cênica que aprimoraram tecnicamente os refletores, possibilitando cada vez mais opções de utilização dos mesmos e pesquisas que se voltaram para entender o papel da luz no espetáculo, tanto tecnicamente como artisticamente. A encenação fez perceber “que a função da iluminação não é apenas dar visibilidade ao espetáculo, mas sim, e principalmente, compor juntamente com outros instrumentos do espetáculo, um discurso cênico coerente e articulado” (ARAÚJO, 2005, p. 124).

Historicamente sabemos que a lâmpada elétrica foi criada no século XIX, e que logo após de ter sido descoberta, foi sendo aprimorada para que o seu uso pudesse ser ampliado para todos os lugares em que o ser humano habitava.24 Esse processo tecnológico que se desenvolveu com a luz a partir do advento da eletricidade, unindo-se à força do movimento da encenação, possibilitou o surgimento de um novo olhar para o entendimento da iluminação cênica teatral, o que potencializa a ideia de que “enquanto for registrada a presença da luz, será imprescindível sua abordagem como sujeito estético” (TUDELLA, 2012, p. 14).

[...] as técnicas nascidas do progresso e da investigação científica, das fórmulas propostas pela indústria, introduziram- se, a pouco e pouco, no teatro, a partir do final do século passado. E, sobretudo, a luz, depois de ter sido apenas um meio de iluminar, tornou-se um dos fatores essenciais da encenação, um dos principais elementos do espetáculo. (BABLET, 1964, p. 290)

24 Sabe-se que antes da lâmpada elétrica em 1849 já se utilizava a de arco-voltaico que produzia uma luz

muito branca e só poderia acender e apagar de uma vez. Já a lâmpada incandescente o seu fluxo de elétrons pode ser controlado o que permite uma graduação de intensidade do escuro à claridade total.

Podemos analisar alguns pontos na “era da encenação” (DORT, 1977, p. 71) que vão de maneira determinante transformar o fazer e o pensar teatro no século XX. O primeiro é o surgimento do encenador que passa a ser considerado como “o gerador da unidade, da coesão interna e da dinâmica da realização cênica. É ele quem determina e mostra os laços que interligam cenários e personagens, objetos e discursos, luzes e gestos.” (ROUBINE, 1998, p. 41). Age a partir de um ideal, de um conceito e principalmente de um sentido particular, que se coletiviza, para compor o espetáculo. Seus propósitos para a criação cênica têm objetivos claros. Complexo é o caminho das descobertas na sala de ensaio. Segundo Bernard Dort, antes do surgimento do encenador:

Ainda no século XIX era muitas vezes um ator que, segundo suas afinidades, gostos literários pessoais ou segundo a autoridade que tinha sobre seus companheiros, se encarregava da organização material do espetáculo, daquilo enfim que chamaremos sua “direção” (ou esta função era assumida pelo cenógrafo, pelo diretor do teatro, ou pelo maquinista chefe). Hoje esta confusão de funções não mais existe: a encenação não vem se acumular a outra função. [...] é uma atividade em si, geralmente, assumida por alguém que a ela se dedica integralmente, excluindo-se de qualquer outra tarefa. (1977, p. 62)

Na encenação tudo que compõe o espetáculo precisa estar rigorosamente dentro de um sentido, exatamente a força motriz, a ideia central, ou seja, o elo de comunicação entre cena e espectador. Esse pensamento gera uma compreensão que entende que os elementos cenográficos não devem ser postos no palco de maneira a decorar a cena, pelo contrário, tudo precisa agir em torno do sentido da encenação. É nessa perspectiva que passaram a surgir artistas-pesquisadores com um olhar voltado para o processo criativo da iluminação e demais elementos, tais como cenografia, maquiagem, figurino e etc. Dessa forma iluminadores, cenógrafos, figurinistas tornaram-se artistas presentes no processo criativo dentro da sala de ensaio.

O grande diferencial é que as concepções passam a ser norteadas pelo mesmo sentido que impulsiona o encenador, o que de fato vai mover a criação na sala de ensaio, é a interação de diálogos e de experimentações práticas,

orquestradas pelo um mesmo objetivo, um mesmo desejo que constantemente é atualizado devido a incessante pulsação da criação. O encenador é então a figura que sinaliza percursos para o processo criativo da encenação e os demais artistas o encorajam gerando um elo de confiança e de proposições que fortalecem a criação na sala de ensaio.

[...] reconhecemos o encenador pelo fato de que a sua obra é outra coisa – e é mais – do que a simples definição de uma disposição em cena, uma simples marcação das entradas e saídas ou determinação das inflexões a gestos dos intérpretes. A verdadeira encenação dá um sentido global não apenas à peça representada, mas à prática do teatro em geral. Para tanto, ela deriva de uma visão teórica que abrange todos os elementos componentes da montagem: o espaço (palco plateia), o texto, o espectador, o ator. (ROUBINE, 1998, p. 24) Dentro da perspectiva histórica e, sobretudo, para termos um exemplo, podemos analisar o Teatro da Corte de Meiningen, mantido e dirigido pelo duque George II, na Alemanha25, considerado no final do século XIX, pioneiro e

de grande importância para a compreensão do conceito de encenação, principalmente, no que se diz respeito à relação mais elaborada e processual dos elementos cenográficos que compõem o espetáculo.

[...] foram os grandes inovadores: a autenticidade dos seus cenários, figurinos e objetos de cena não só é pioneira como influenciou, com as suas famosas tournées pela Europa, vários encenadores como Stanislávski e Antoine, dando início à era das reconstituições arqueológicas e ao realismo histórico, que terá grande influência nas técnicas do espetáculo [...] Em relação à iluminação havia o mesmo esmero técnico e cuidado com a precisão na escolha do posicionamento dos equipamentos, visando maior realidade nos ângulos de incidência da luz. [...] Mas a grande inovação dos Meininger, que pontua uma mudança fundamental de procedimento em relação à iluminação cênica, se deve ao fato do Duque Georg II ensaiar com a luz pronta (assim como cenário e figurinos), permitindo uma relação pensada e experimentada entre o espaço e a sua ocupação, entre a luz e a marcação do espetáculo. Essa necessidade de ensaiar com a luz de cena, que na prática significa o ineditismo de ensaiar a própria ação da luz, diferia dos costumes da época, onde a iluminação só encontrava com os intérpretes, na hora apresentação. (FORJAZ, 2008, p. 70)

O fato da Cia. Meiningen ensaiar com os elementos cenográficos pensados, construídos e elaborados de acordo com a encenação, descortinou um caminho de descobertas sobre o processo criativo da luz, por exemplo, ressaltando o quanto é necessário e importante que toda a equipe do espetáculo, sobretudo o ator, tenha contato com a cenografia, iluminação, figurino para estar cada vez mais imbuído do sentido global da encenação. É nessa perspectiva que entendemos que é extremamente necessário que os processos criativos na sala de ensaio interajam em todas as etapas, para que todos os artistas estejam envolvidos conscientemente com a ação dramatúrgica da iluminação, bem como com a compreensão do papel da cenografia, figurino e maquiagem na execução do espetáculo.

Em se tratando especificamente da luz no século XX, o conceito de encenação se modificava e principalmente se ampliava a cada nova vanguarda. No caso do teatro naturalista, por exemplo, percebemos nas pesquisas que abordam os trabalhos de grandes encenadores tais como André Antoine e Constantin Stanislávski, que pelo fato do espetáculo ser uma tentativa mimética da realidade, exige que a iluminação tivesse uma atuação mais determinante e limitada nos processos de significação da cena, sua função era meramente descritiva. É preciso reconhecer que em se tratando do realismo, de fato, não podemos nos utilizar de alguns efeitos de luz ou de cores na cena, pois não é possível de maneira repentina, um foco de luz em formato de círculo ou retangular, atravessar o teto de uma casa e se fazer presente numa sala de jantar, a não ser que algo aconteça para que esse efeito possa ter uma ação justificada e contundente na cena. Os espetáculos teatrais que são criados nessa perspectiva do realismo na contemporaneidade, estão cada vez mais buscando estratégias de apresentarem, não somente uma luz que torne visível a cena, mas que possa também construir significados e ter uma ação expressiva na construção cênica.

Ainda no século XX temos no simbolismo uma compreensão da construção cênica diametralmente oposta ao que o naturalismo entendia. A diferença principal é que o simbolismo no teatro se dedica a criação fabulosa e fantástica, numa perspectiva que instala cenicamente ambientes mais diversos

e distantes possíveis da noção de realidade. A poesia é levada à cena através da dramaturgia, da interpretação e, sobretudo, a partir dos elementos cenográficos que conseguem na estética simbolista uma atuação expressiva, totalmente importante para a compreensão sígnica do espetáculo teatral. Para (CAMARGO, 2006, p. 13), na estética simbolista é que “Pela primeira vez, foi possível perceber que a luz trocava informações com a cena”, deixando de ser um elemento apenas pictórico, no sentido de descrever cenograficamente um espaço, e atingindo “uma concepção de luz diretamente vinculada à dinâmica, à mobilidade do fenômeno cênico”. Adolph Appia foi um grande pensador da luz no teatro influenciado pelo simbolismo, que evidenciou a iluminação na perspectiva de considerá-la como um elemento aglutinador dos elementos cenográficos. Refletia sobre a cena como um lugar em que todas as suas partes se amalgamavam para produzir uma unidade viva, pulsante, absolutamente contundente e mantenedora de um mesmo sentido. A iluminação para Appia não deveria ser apenas descritiva ou simuladora da realidade, sua atuação no espetáculo é muito mais que criar paisagens pictóricas para sugerir um determinado espaço.

A questão principal é investigar o fenômeno da luz como elemento integrado ao fluxo da cena, àquela realidade física que se apresenta num dado momento e com a qual a luz negocia, troca informações, como parte de um organismo vivo. Em outras palavras, não basta criar uma luz que possibilite vislumbrar a cena enquanto paisagem, quadro ou fotografia, com a intenção de imitar a realidade ou simbolizá-la de algum modo. É necessário entender a luz como algo que vibra e acompanha o fluxo da cena e não como um elemento de representação que obedece às didascálias do texto ou às „deixas‟ e marcas preestabelecidas na mesa de operação. Appia refere-se à luz como aglutinador de todos os elementos cenográficos. Segundo ele, nenhum dos códigos visuais do teatro dispõe de autonomia. Ao contrário, todos se complementam, produzindo uma unidade viva. (CAMARGO, 2006, p. 55-56)

Outra questão sobre a encenação é a que corresponde “a explosão do espaço” refletida e abordada por Jean-Jacques Roubine (1998, p. 81). É preciso que entendamos o espaço sob duas perspectivas, a primeira no sentido de uma popularização do teatro, ou seja, o espetáculo deixa de ser algo absolutamente fechado para a elite, e, passa a ser, um lugar para a apreciação

de um trabalho artístico oferecido para toda a população; e em segundo lugar, a noção de cena ampliada, podendo ser qualquer espaço o lugar para que o fenômeno teatral possa acontecer “cuja natureza extrapola o campo da materialidade e opera a travessia entre aquilo que consideramos concreto e aquilo que consideramos existir apenas no nosso imaginário” (ARAÚJO, 2005, p. 84). Algumas encenações durante o século XX é que vão elucidar esse pensamento e por isso modificaram a relação espacial entre espetáculo e espectador. Os trabalhos de Jerzy Grotowski no teatro das 7 Filas em Wroclan na Polônia, são exemplos de espetáculos que mudaram de maneira determinante a relação do espectador com a encenação:

“Renunciamos a uma área determinada para o palco e para a plateia: para cada montagem, um novo espaço é desenhado para os atores e para os espectadores. Dessa forma, torna-se possível infinita variedade no relacionamento entre atores e público. Os atores podem representar entre o espectadores, estabelecendo contato direto com a plateia e conferindo-lhe um papel passivo no drama (por exemplo, as nossas montagens de Cain, de Byron, e de Shakuntala, de Kalidasa). Ou os atores podem construir estruturas entre os espectadores e dessa forma incluí-los na arquitetura da ação, submetendo-os a um sentido de pressão, congestão e limitação de espaço (como a montagem de Acropolis, de Wyspianski). Ou os atores podem representar entre os espectadores, ignorando-os, olhando “através” deles. Os espectadores podem estar separados dos atores – por exemplo, por um tapume alto que lhes chegue ao queixo (como a montagem de O Príncipe Constante, de Calderón); dessa perspectiva radicalmente inclinada, eles olham para os atores como se vissem animais numa arena, ou como estudantes de Medicina observando uma operação (além disso, o olhar para baixo confere à ação um sentido de transgressão moral). Ou então a sala inteira é usada como um lugar concreto: a última ceia de Fausto, no refeitório de um mosteiro, onde ele recebe os espectadores que são convidados de uma festa barroca servida em enormes mesas cujos pratos são episódios de sua vida. A eliminação da dicotomia palco-plateia não é o mais importante: apenas cria uma situação de laboratório, uma área apropriada para a pesquisa.” (GROTOWSKI, 1971, p. 6)

A iluminação cênica na encenação passa a ser “A Fada Eletricidade, [...] deslumbrando o espectador, facilmente conquistado pela magia do efeito e da ilusão de um mundo irreal." (BABLET, 1964, p. 289), ou seja, é a capacidade

de reinvenção do espaço cênico no sentido de criar sobre ele inumeráveis possibilidades de “lugares teatrais” (MANTOVANI, 1989, p. 7) 26.

O público durante todo o século XX se deparou com uma propulsão de espetáculos ligados a variados conceitos vanguardistas. Estamos refletindo sobre um período de grandes reviravoltas sociais que vão influenciar diretamente a arte. Os movimentos de vanguarda tais como o simbolismo, expressionismo, o teatro épico e moderno modificaram intensamente, cada um a seu modo, os procedimentos de criação da encenação em todos os seus aspectos. A iluminação cênica por sua vez, na medida em que foram sendo aprimorados os seus equipamentos, constituiu-se como um elemento cênico de grande importância que pode “modificar” (SERRAT, 2006, p. 44) o espetáculo, tanto no seu aspecto visual, mas principalmente, na sua semântica. A possibilidade de controlar a luz através de mecanismos elétricos faz com que o homem se volte para a iluminação cênica com um olhar criativo e, sobretudo, de pesquisador. A luz começa a ganhar movimento na cena, ajuda na criação de paisagens, edita os espaços escondendo e revelando a cenografia e o ator, constrói focos em diversos formatos geométricos e sua intensidade pode ser da escuridão à claridade total. Essas novas dinâmicas é que começam a despertar um novo olhar para a construção cênica da luz no século XX, especialmente, para o seu entendimento sígnico no teatro. É nessa perspectiva que acreditamos ter iniciado de maneira mais enfática a compreensão da iluminação cênica como uma linguagem de incomensurável importância para a criação teatral, e, devido a isso, o seu processo de criação passa a ter rigor e valor na sala de ensaio.

Antonin Artaud, artista de teatro, poeta, dramaturgo que viveu de 1896 a 1948, presenciou a “linguagem da encenação teatral” (ROUBINE, 1998) no seu auge de transformação ininterrupta. A partir dessa experiência escreveu um livro intitulado “O Teatro e seu duplo” que apresenta apontamentos críticos ao teatro feito no ocidente, através de uma comparação com o do oriente e, além

26 A luz elétrica só foi utilizada no palco no ano de 1849 na ópera Meyerbeer. Sua função foi a de criar e

demonstrar o sol nascente, fato que maravilhou o público. Os experimentos de utilização da luz apenas como um elemento que passará a possibilitar criar ambientes da realidade vai fazer com que essas técnicas se espalhem ligeiramente pela Europa.

disso, reflete sobre o processo de criação no teatro, evidenciando o potencial semântico que tem os elementos cenográficos, sobretudo a iluminação. Artaud (2006, p. 92) se refere a uma luz “que não é feita apenas para colorir ou iluminar e que traz consigo sua força, sua influência, suas sugestões”, ou seja, é compreendida como uma linguagem que não está ligada a uma expressão verbal para ser entendida, sua natureza é física e sensorial, não estabelece significação por meio de palavras, age na cena teatral através de uma compreensão que se dá na sensibilidade do espectador. Esse agir pelo sensível se trata de uma “linguagem concreta” que se articula no teatro através da “música, dança, artes plásticas, pantomima, mímica, gesticulação, entonações, arquitetura, iluminação e cenário”, reconhecendo que cada um desses elementos tem uma “poesia própria, intrínseca” (ARTAUD, 2006, p. 38). Embora Antonin Artaud esteja no seu livro fazendo uma crítica ao teatro ocidental, sobretudo ao naturalismo que “obedece à expressão através dos discursos, das palavras” (Ibidem. p. 35), ele nos possibilita alargar os níveis de compreensão dos elementos cenográficos que estão presentes na cena, reconhecendo-os como fatores que se estabelecem como “linguagens ativas”, ou seja, que são responsáveis pela significação do espetáculo tanto quanto a palavra. A forma como a luz é concebida, organizada e colocada em prática, requer princípios criativos específicos, ou seja, os percursos criados e elaborados estrategicamente para que a iluminação consiga dialogar com a cena instalando uma ação determinante na encenação.

A luz intervém no espetáculo; ela não é simplesmente decorativa, mas participa da produção de sentido do espetáculo. Suas funções dramatúrgicas ou semiológicas são infinitas: iluminar ou comentar uma ação, isolar um ator ou um elemento da cena, criar uma atmosfera, dar ritmo à representação, fazer como que a encenação seja lida, principalmente a evolução dos argumentos e dos sentimentos etc. Situada na articulação do espaço e do tempo, a luz é um dos principais enunciadores da encenação, pois comenta toda a representação e até mesmo a constitui, marcando o seu percurso. Material milagroso de inigualáveis fluidez e flexibilidade, a luz dá o tom de uma cena, modaliza a ação cênica, controla o ritmo do espetáculo, assegura a transição de diferentes momentos, coordena os outros ritmos cênicos colocando-os em relação ou isolando-os. (PAVIS, 2008, p. 202).

Todos esses pontos históricos tocados até agora à respeito da iluminação cênica no teatro, demonstram que houve um processo longo para que pudéssemos entendê-la como um sistema determinante na construção da semântica teatral. Durante o teatro moderno, período que corresponde até meados do século XX, é que vamos ter um olhar ainda mais apurado para essa questão, ou seja, a luz passa a ser um elemento utilizado intensamente para ajudar a compor as noções de significação de um espetáculo, principalmente as que estão ligadas às questões de tempo e espaço da encenação. Em se tratando de Brasil, muitos artistas se profissionalizaram na condução criativa da luz e passaram a se dedicar sobremaneira ao seu processo minucioso de ação na cena. É no modernismo do teatro que a encenação vai iniciar uma propulsão de novos iluminadores para suprir a demanda significativa da luz para a construção de espetáculos, isso abriu espaços para se desenvolverem pesquisas e pensamentos que objetivam construir uma epistemologia para se compreender a luz enquanto linguagem.

A linguagem da luz [...] interrompe a ação, quebra a lógica linear, fragmenta a narrativa. Mais do que isso, na medida em que a luz rege o que é visível, e como é visível, ela pode iluminar várias ações ao mesmo tempo, porém de forma diferente, separando e multiplicando os planos de realidade. A luz coloca em cena vários tempos em um mesmo espaço, ou vários espaços visíveis ao mesmo tempo. Muitas vezes, em não-lugares ou não-tempos, outras vezes, aqui e agora, convidando a plateia a uma quebra da própria ideia de espaço

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