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4 A CONSTRUÇÃO DOS TESTES ABC

4.3 O processo de aplicação e uso dos Testes ABC

O processo de aferição que acompanha os Testes ABC para a organização das salas em grupos homogêneos podia ser feita mediante a classificação crescente ou decrescente do número de pontos obtidos por cada aluno. Cada teste atingia entre 0, 1, 2 ou 3 pontos. Assim, o nível de maturidade poderia obter uma nota máxima (NM) de 24 pontos. Tal como explicitado por Lourenço Filho (1962, p. 136):

Como os resultados dos Testes ABC se apresentam em números absolutos, bastará – como medida preliminar de sua classificação para o fim da aprendizagem considerada – ordenar os alunos, segundo os pontos obtidos, na ordem crescente ou decrescente. Depois, separá-los em grupos, segundo a lotação das classes. Assim, os primeiros que a essa lotação corresponderem formarão uma classe; os seguintes, outra classe, e assim por diante. É evidente que as classes de alunos classificados com menor número de pontos deverão ter efetivo reduzido para que o professor possa cuidar dos casos especiais, dando- lhes tratamento individual.

Montava-se, por exemplo, uma sala de N.M. de 8 a 10 pontos, uma de 11 a 13, outra de 14 a 16 e assim prosseguia. No caso de escolas menores, ―a homogeneização será relativa, pois que o pequeno número de classes, resultante do menor número de alunos, obrigará a agrupar alunos classificados com variação maior que 4 pontos‖ (Ibidem, p. 136). Nessa combinação, as crianças ficariam agrupadas em salas de 0 a 8 pontos, uma de 9 a 16 e a de grupos fortes com N.M. de 17 a 24 pontos. Nas grandes escolas, outros critérios poderiam ser inclusos na organização das turmas, como a idade e o nível de escolaridade anterior entre novos e repetentes.

Outro modo possível a determinar o perfil de cada classe era somar os valores obtidos em cada teste e dividi-los pelo número de alunos. Esses resultados também podem ser representados por um gráfico: ―convirá transpor os valores médios encontrados, para a escala centesimal. Bastará multiplicar cada um desses valores por cem, e dividir o produto por quatro, que é o número de graus na notação parcial de cada prova‖ (Ibidem, p. 138,140).

Deste modo, a aproximação da matematização da pedagogia também se faz presente na investigação do perfil de classe, quando se obtém os valores, esboçado em um quadro de colunas, conforme o exemplo a seguir:

Figura 6 – Gráfico de colunas do perfil de uma classe da Escola do Brás

Fonte: LOURENÇO FILHO, M. B. Testes ABC para verificação da maturidade necessária à aprendizagem da leitura e escrita. Melhoramentos, 1962, p. 141.

Embora este gráfico seja apenas para ilustrar o perfil de uma classe na década de 1930 obtido por uma escola da capital de São Paulo, cabe ponderar, de modo mais específico, como ocorreram as representações no cotidiano escolar com a penetração dos Testes ABC de Lourenço Filho.

Como se pode ler em alguns Relatórios de Delegados de Ensino do estado de São Paulo, os Testes ABC se mostravam úteis na formação das salas de 1930 a 1960. Citando como exemplo o Relatório das Atividades desenvolvidas no ano de

1936, no Curso Primário anexo a Escola Normal de Casa Branca62, a organização

de classes selecionadas por meio dos Testes ABC trouxe ―vantagem‖ ao ensino,

pois possibilitava dar assistência aos ―débeis mentais‖ e a outros casos particulares

―supernormais‖, oferecendo-lhes oportunidade para o desenvolvimento máximo de seus dotes, no interesse especial de servir a coletividade. Em relação aos alunos fracos, o Relatório defende que a formação de classes evita o sentimento de complexos de inferioridade em confronto com os fortes.

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Por outro lado, é possível encontrar críticas ao referido teste. O Grupo

Escolar de Rebouças/SP63, sob direção do professor Genésio de Assis, menciona

algumas falhas dadas à sua aplicação:

As observações colhidas no momento de exame, referentes á conduta futura da criança ou às modalidades do seu caráter, geralmente não correspondem à verdade. Anotações tomadas no ano de 1934, e que diziam respeito à boa vontade de um educando, à teimosia de outro ou à desatenção de um terceiro, foram negadas cabalmente pela realidade. Contudo, observações de caráter mais geral, como sejam condições de saúde, educação e higiene, extensão de vocabulário, timidez excessiva ou desembaraço desmedido, podem ser obtidas com segurança durante o exame (FERRAZ; BOLLIGER, 1936, p. 53).

Conforme aponta as adjuntas Ana Nogueira Ferraz e Olga Bolliger, a experiência de alunos repetentes, por durante dois anos, demonstrou que os mesmos teriam encontrado dificuldades após alguns meses de trabalho em acompanhar os novos colegas de mesma pontuação. Haveria, portanto, três causas a essa razão: 1. repetição de exercícios realizados no ano anterior; 2. agilidade ou desembaraço que a escola transmite ao aluno; 3. ―mera coincidência‖ (Ibidem).

Mesmo não obtendo o êxito esperado, o trabalho com a seleção dos alunos não parou por aí. A escola continuou a proceder ao trabalho nos anos seguintes buscando corrigir as falhas anteriores. Nesse caso, supõe-se que a insistência pelo seu uso deveu-se pelo fato de os Testes ABC ser considerado o ícone da pedagogia científica, pois uma das finalidades dessa nova tendência é dada pela experimentação, pelo trabalho de investigação. Dar conta dessas representações cientificistas, também significa identificar as falhas para servir como correção de eventuais erros de aplicação. Esse é o espírito do moderno, que se sedimentava na cultura escolar em tempos da pedagogia científica.

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O Grupo Escolar de Rebouças foi criado em 1925, no município de Sumaré, pelo Governo do Estado de São Paulo e vinte anos depois passou a se chamar Grupo Escolar André Rodrigues de Alckmin. ―Foram Diretores dessa Escola os professores: Vicente Ferreira Bueno, Antonio Salustiano da Silva, Genésio de Assis, Ubirajara Paula Ferreira e Francisco Álvarez, este por volta de 1940. Em 1939, conforme relatório do Diretor Francisco Álvarez, o corpo docente se compunha dos seguintes professores: Plínio Machado da Silva, Olga Bllliger, Ana Costa, Geni Navarro, Diva Ferreira Rocha, Sofia Gigliotti Novais, Carlota Lobo de Paula, Elvira Mortiz, Ana Nogueira Ferraz, Benedita Morais Teixeira, Guiomar Tintori e Daizy B. de Oliveira, estas duas últimas substitutas efetivas‖. Informações disponíveis no jornal ―Tribuna Memória‖ (2012), conforme segue o endereço eletrônico: http://promemoriasumare.com.br/materias-jornais/29-05-12/edicao-2012-05-27-a.pdf.

5 A HOMOGENEIZAÇÃO DAS CLASSES ESCOLARES E AS