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O processo de elaboração do questionário

Capítulo 2 – Enquadramento empírico

2.1. O processo de elaboração do questionário

Feita a devida revisão da literatura sobre os temas que pretendíamos ver abordados e a consequente reflexão acerca das informações que nos interessava obter para uma melhor e mais atual ilustração daquilo que significa ser professor de História hoje em dia, em todas as suas vertentes, chegara o tempo de elaborar o questionário que nos permitiria atingi-las. Metodologias comuns na área das ciências sociais, como a observação e a realização de entrevistas, revelar-se-iam úteis, porventura até mais, pois permitiriam

atingir novas profundidades. Contudo, dada a natureza deste estudo, integrado num relatório de estágio, num ano acompanhado de tantas outras solicitações, o questionário foi a opção que nos pareceu mais viável, tendo em conta as condicionantes, por nos permitir uma relativamente rápida aplicação, sem levantar problemas de maior na análise e interpretação dos dados, mas ainda assim possibilitar uma caracterização completa, através de questões concretas. No entanto, sabemos que “Os questionários e as entrevistas dão-nos os dados expressos pelos próprios inquiridos. Tais dados reflectem o que os sujeitos pensam, mas estes podem ser influenciados, tanto pela auto-consciência como pelo desejo de criarem uma impressão favorável” (Tuckman, 2000, p. 358), o que deve sempre ser tido em conta na hora da análise dos resultados.

Para elaborar o inquérito por questionário aplicado, começámos por realizar uma análise bibliográfica de alguns artigos que explicavam, passo a passo, os procedimentos necessários à construção de um questionário fiável e corretamente estruturado do ponto de vista científico, tarefa não tão fácil como aparentemente podemos pensar. Bell (2004) refere exatamente isso: “Planificar um bom inquérito é bem mais difícil do que imagina. […] Há que atentar na selecção do tipo de questões, na sua formulação, apresentação, ensaio, distribuição e devolução dos questionários” (p. 117). Esta tarefa prévia revelou- se essencial para que o primeiro inquérito, uma espécie de rascunho, demonstrasse já alguma coerência, não obstante a multiplicidade de temas que queríamos ver abordados.

O inquérito em questão teve por base dois outros: um questionário europeu anónimo, na sua versão dirigida a professores, no âmbito de um projeto de 1997 que tinha como objetivo perceber como é que os jovens entendem a História e traçar um perfil da sua consciência histórica, cujo coordenador nacional foi José Machado Pais (1999). Este está disponível na íntegra na obra “Consciência histórica e identidade: Os jovens portugueses num contexto europeu”, da autoria daquele investigador. Ao mesmo tempo, baseámo-nos também numa versão do questionário inicialmente elaborado por Rafael Porlán Ariza aquando da sua tese doutoral3, o INPECIP (Inventario de Creencias Pedagógicas y Científicas de los Profesores), adaptado por Garcia, Sólis e Grosso acerca

3 Porlán, R. (1989). Teoría del conocimiento, teoría de la enseñanza e desarrollo profesional. Las

concepciones epistemológicas de los profesores. Tese de doutoramento (inédita). Universidad de Sevilla: Sevilla.

das representações científico-pedagógicas dos professores de ciências sociais e humanas, retirando e ajustando partes de um e de outro, organizando-as conforme nos parecia mais lógico, tendo em conta a grande variabilidade de assuntos a tratar.

Desde cedo nos interrogámos acerca da forma de apresentação do questionário, uma vez que “Um questionário preparado de uma forma excelente perderá muito do seu impacto se tiver uma apresentação pouco cuidada” (Bell, 2004, p. 125). Apesar de preferirmos, desde logo, a opção online, com recurso à plataforma gratuita Google Forms, que já havíamos utilizado em trabalhos anteriores, fomos advertidos para a potencialmente fraca adesão dos participantes, ainda mais tratando-se de professores, sempre tão ocupados, assoberbados por e-mails diários e, não raras vezes, pouco familiarizados com este tipo de tecnologia. No entanto, os benefícios deste tipo de aplicação, distribuição e recolha de inquéritos são múltiplos, como já escreviam Matthew & Sutton em 2004:

A vantagem dos questionários eletrónicos é que os dados podem ser automaticamente recolhidos para um ficheiro que, por sua vez, pode ser importado para um pacote de análise adequado. O questionário eletrónico pode ser escrito de forma a que a seleção acidental de um número inapropriado de categorias ou a não resposta possam ser evitadas4 (p. 160).

Ainda assim, hesitámos, por momentos, pensando em aplicar o inquérito de forma híbrida, isto é, criar uma rede de contactos composta, por exemplo, pelos orientadores dos vários núcleos de estágio e pelos seus colegas de área disciplinar, dispondo-nos a entregar em mão os questionários ou contando com a colaboração dos colegas estagiários nessa tarefa, ao mesmo tempo enviando a versão eletrónica do mesmo a outras escolas, cujo contacto teríamos de recolher, garantindo, desta forma, que, caso ninguém ou poucas pessoas respondessem ao inquérito online, teríamos um número suficiente de questionários para analisar. No entanto, tal acabou por não ser necessário, optando-se pela aplicação do instrumento de inquirição somente pela via amiga do ambiente.

4 Tradução livre da autora. No original: “The advantage to Web-based questionnaires is that the data can

automatically be placed in a data file that in turn can be imported into a suitable analysis package. The Web-based questionnaires can be written in such a way that the accidental selection of an inappropriate number of categories or failure to respond can be avoided” (Matthew & Sutton, 2004, p. 160).

O papel não foi inteiramente posto de lado, uma vez que começámos por fazer um rascunho em suporte físico, para analisar e aperfeiçoar ao máximo cada questão e afirmação, com o objetivo de diminuir qualquer ambiguidade e torná-lo o mais simples e objetivo possível. Além disso, a versão em papel permitiu agilizar o processo de testagem, como adiante veremos.

Numa primeira fase, demos primazia às perguntas de resposta fechada, cujas vantagens, “em termos da facilidade de tratamento dos resultados, são evidentes” (Moreira, 2004, p. 124), optando-se em segunda instância por acrescentar algumas questões de resposta aberta, de forma a enriquecer o questionário e a permitir traçar uma caracterização mais fidedigna da população respondente, os professores do grupo de recrutamento 400, conscientes de que, como escreve Youngman, “As respostas a questões verbais [ou abertas] podem produzir informações úteis, mas a sua análise levanta alguns problemas. É possível que seja necessária uma espécie de análise de conteúdo […]” (citado por Bell, 2004, p. 119).

Posto isto, a nível de organização, o questionário aplicado encontra-se dividido em sete partes, seguindo as recomendações de Bell (2004): “Deixe as questões delicadas para mais tarde. Comece com perguntas mais simples e fáceis de responder e vá avançando para os tópicos mais complexos” (p. 126) e de Matthew & Sutton (2004): “É importante que as questões estejam organizadas por áreas de tópicos semelhantes”5 (p. 171). Assim,

começámos pela identificação e pelos dados académicos e profissionais, passando depois pela formação para a docência de História, questões acerca do processo de ensino- aprendizagem e sobre os documentos estruturadores, terminando com uma secção global acerca do exercício da profissão docente. Sendo este um inquérito por questionário de largo espectro, as perguntas seguiram tipologias variadas (abertas, lista, categoria, quantidade, grelha) consoante o objetivo que pretendíamos, privilegiando, contudo, as respostas dadas em escalas de Likert. Nenhuma das questões e afirmações, fossem de resposta aberta ou fechada, eram obrigatórias.

Deste modo, o questionário, mais longo do que eventualmente seria desejável,

5 Tradução livre da autora. No original: “It is important that the questions are organized by similar topic

aborda de forma exaustiva muitas das questões que se consideram pertinentes para traçar um perfil do docente de História no século XXI.