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5. DA CONCEPÇ ÃO DE PROFESSORES ÀS PRESCRIÇ ÕES

5.2 O professor como agente do currículo da SME

Visando à amplitude dimensional com que transcorreram as práticas professorais voltadas à educação das crianças, enfoco a seguir a descrição de sete categorias cujas temáticas centrais estão intrinsicamente vinculadas às ações e orientações aos docentes, ao currículo e à qualidade da Educação Infantil pretendida pela SME.

5.2 O professor como agente do currículo da SME

A atuação docente constitui-se de um espectro de norteadores de diferentes esferas, provindos de conhecimentos técnicos adquiridos em formações; de práticas metodológicas resultantes de suas experiências; de diretrizes educacionais estabelecidas por legislações; e, por fim, do currículo proposto pelo órgão de atuação.

Essa primeira categoria pretende apresentar o professor como agente do currículo da SME, diante dos elementos que compõem este currículo, assim como suas intencionalidades e fundamentações.

A análise inicia-se na abordagem da Avaliaçã o na educaçã o infantil: aprimorando

olhares (2013) na qual é expressa sua intencionalidade de transformar as unidades de

Educação Infantil em um território para se viver a infância, composto de brincadeiras, falas e expressões; onde os professores ouçam as vozes, propiciem descobertas e conhecimentos de diferentes linguagens; onde a relação com o espaço/tempo e materiais valorizem as relações entre outras crianças, demais bebês e adultos.

Em conformidade com o ECA, a concepção de infância adotada está interligada à construção social e histórica, conforme seu tempo e espaço oscila, transformando e sendo transformada.

Nessa ótica, as crianças tornam-se “sujeito potente”, capazes de enxergar o mundo com autonomia, elaborando teorias, construindo relações, culminado nas culturas infantis, compostas de expressividade advindas de copiosas linguagens, nas quais os adultos são aprendentes.

A definição de currículo explicitado nessa normativa abarca o entendimento nas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil (2013), em seu Art. 3o, que dispõe:

o currículo da Educação Infantil é concebido como um conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o

119 desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5 anos de idade. (BRASIL, 2013).

Dessa forma, as trajetórias experienciais emergem e se efetivam no currículo, verificadas por meio de registros sócio-históricos de seus envolvidos.

A Rede Municipal de Educação intenciona que o currículo na Educação Infantil seja integrador, por meio dos eixos lúdico e artístico, rompendo com a cisão entre CEI, Emei e Emef, e tendo o envolvimento dos protagonistas do processo educativo: bebês, crianças, professores, famílias e comunidade.

O movimento dialético existente no trabalho pedagógico nas instituições de Educação Infantil se dá na relação crianças/adultos, e é imprescindível no crescimento e na trajetória das crianças pautadas no ato de educar e cuidar.

O professor de Educação Infantil deve centralizar os bebês e crianças no processo educativo, considerando em seu planejamento a autonomia da infância na aquisição de novos conhecimentos, tendo como primazia a observação participativa, embasada em registros escritos, audiovisuais e fotográficos cotidianos educativos na educação paulistana.

A fim de contemplar as especificidades da Educação Infantil enquanto fase das diferentes linguagens, as experiências do projeto político devem culminar da construção coletiva, instrumento centrado na criança, em conformidade com as Diretrizes Curriculares Nacionais.

Proposta pedagógica ou projeto político-pedagógico é o plano orientador das ações da instituição e define as metas que se pretende para a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças que nela são educados e cuidados. É elaborado num processo coletivo, com participação da direção [equipe gestora], dos professores e da comunidade escolar. (SÃ O PAULO, 2014).

Esse instrumento de historicidade institucional possibilita o acesso e as informações a todos os membros da comunidade escolar, e é dinâmico, por divulgar proposições pedagógicas e administrativas, bem como a necessidade de novos encaminhamentos.

O PPP da Educação Infantil e esse documento objetivam contemplar os elementos da cultura da infância e das culturas infantis, de modo a oportunizar a escuta das crianças. Seus processos auto-avaliativos contínuos visam a fundamentar nova metas.

O documento Currículo integrador da infância paulistana (2015), na perspectiva de uma educação democrática, enseja superar modelos curriculares fragmentados, assumindo

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um novo desafio no processo educacional. A estruturação de um currículo requisita a partilha de concepções e princípios de infância, com propostas pedagógicas em que ecoem as vozes de bebês, respeitando suas trajetórias e experiências.

A fundamentação de currículos e propostas pedagógicas assentava-se na concepção de criança como seres inconclusos, inaptos e desprovidos. A criticidade do professor de Educação Infantil o impulsiona a descontruir esse conceito de desenvolvimento infantil, descolonizando e desnaturalizando o currículo, também quanto às demais culturas hierarquizadas e estratificadas por raça, gênero e idades.

O Currículo Integrador reconhece a infância como uma construção social e histórica em que bebês e crianças são sujeitos de direitos, autônomos, portadores e construtores de histórias e culturas, repleto de potencialidades e caracterizado pelas “cem linguagens”, como escreve Loris Malaguzzi. (SÃ O PAULO, 2015)

As culturas infantis constituem-se continuamente, expressando cenários diversificados com ascensão de potencialidades. Na Educação Infantil e no Ensino Fundamental, a interação perpassa pares e linguagens, constituída de vivências com enredos lúdicos, cujos brinquedos e artefatos são socializados e negociados no contexto infantil. Bebês e crianças tornam-se sujeitos da inteireza da vida.

Ao considerar as culturas infantis (tudo aquilo que expressam sob a forma de diferentes linguagens) como fonte importante de conhecimento, transformação e qualificação da ação educativa para professores, torna-se imprescindível apurar e fomentar a escuta de bebês e crianças na Educação Infantil e no Ensino Fundamental, de forma contínua.

Buscar formas de ouvir bebês e crianças é, portanto, um desafio a ser abraçado cotidianamente por educadoras e educadores, e constitui, ao mesmo tempo, a expressão da concepção de criança capaz, competente e com direito à participação, além de ser fonte inesgotável de saberes necessários ao aprimoramento e à qualificação da prática educativa. (SÃ O PAULO, 2015).

Os espaços coletivos de educação constituem contextos privilegiados que possibilitam aos bebês experiências de convivência com outros adultos e outros bebês e crianças. Ouvir histórias, narrativas, poesias; apreciar e criar desenhos, pinturas, modelagens; brincadeiras, danças, sons, músicas; explorar espaços amplos como os parques;

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e outras ações que envolvem um corpo que, na sua integralidade, sente, percebe, pensa, imagina, cria, planeja, investiga, age e se encanta com o mundo e seus diferentes contextos.

Esse percurso construído na Educação Infantil e no Ensino Fundamental tem um valor em si, pois as experiências vividas no presente são relevantes: não constituem um período de preparação ou antecipação das futuras etapas do processo de educação. E porque privilegia a vida e o tempo presentes, respeitando seus tempos e modos de viver suas infâncias, cria bases sólidas para a vida futura.

Professores como organizadores de experiências em que bebês e crianças são igualmente protagonistas (brincantes, artistas e cientistas) que pensam, projetam, agem, descobrem, criam e recriam o mundo, e expressam tudo isso de forma ativa, rica e autoral. A infância está presente na Educação Infantil e no Ensino Fundamental de forma viva, resistente, provocativa e precisa ser considerada em suas diversidades e potencialidades para a construção de um currículo que, efetivamente, se integre com a realidade desses atores sociais, respeite suas singularidades e formas de ser e estar no mundo, e promova processos de aprendizagem e desenvolvimento pleno em bebês e crianças, sem que essas vivam rupturas em seu cuidado e educação.

Mas eu estava a pensar em achadouros de infâncias. Se a gente cavar um buraco ao pé da goiabeira do quintal, lá estará um guri ensaiando subir na goiabeira. Se a gente cavar um buraco ao pé do galinheiro, lá estará um guri tentando agarrar no rabo de uma lagartixa. Sou hoje um caçador de achadouros de infância. (SÃ O PAULO, 2015).

A organização desse currículo considera que os conhecimentos apresentados nas Unidades Educacionais, apropriados e construídos por bebês e crianças, não devem ser fragmentados em disciplinas estanques, sem diálogo com suas vidas e reduzidas a um rol prescritivo de ações e conteúdos desprovidos de sentido. Considera que o direito à educação, ao conhecimento e à cultura deve constituir um processo único e contínuo, que contemple diversas linguagens e direitos de aprendizagem de forma integrada e contextualizada. Como afirma Arroyo (2008, p. 38):

Guiados pelo imperativo ético dos direitos dos educandos, seremos obrigados a desconstruir toda estrutura escolar e toda organização e ordenamento curriculares legitimados em valores do mérito, do sucesso, em lógicas excludentes e seletivas, em hierarquias de conhecimentos e de tempos, cargas-horárias.

122 Por exemplo, desconstruir o atual ordenamento em saberes, áreas, tempos, mais nobres, menos nobres, desprezíveis, silenciados, ausentes nos currículos. Essas estruturas e ordenamentos não têm garantido o direito à educação, ao conhecimento e à cultura; antes, vêm sendo ordenamentos que limitam e negam esse direito.

A Rede Municipal, por meio das Orientações curriculares: expectativas de

aprendizagens e orientações didáticas para educaçã o infantil (2007), trata de orientações

didáticas enquanto ações educativas que buscam estimular os professores na construção não somente de suas práticas, mas também do currículo. Tem como primícias orientar o trabalho com as crianças por meio dos instrumentos projeto pedagógico, currículo, e programações didáticas, e a cada qual são atribuídas definições:

✓ O projeto pedagógico é um instrumento político que aponta as aprendizagens a serem promovidas em função de metas coletivamente traçadas.

✓ O currículo é o agrupamento de experiências, atividades e interações propulsoras de aprendizagens das crianças.

✓ A programação didática, por sua vez, inclui o roteiro de atividades a serem desenvolvidas em cada turma, estruturando o ambiente de vivência e aprendizagem para melhor realizá-las.

Os Padrões básicos qualidade na educaçã o infantil paulistana (2015) ressalta a relevância do PPP como documento central da instituição, por retratar a trajetória dos bebês, crianças e professor de Educação Infantilde um mesmo território, implicando o atendimento às necessidades e aos interesses pautados nos princípios éticos, estéticos e políticos. Nele estão definidas as intenções, concepções e práticas pedagógicas do currículo organizado pela unidade educacional.

Considerando sua amplitude, condizendo ao seu caráter vivo e dinâmico, constitui- se de inúmeros itens históricos e diagnósticos da unidade e comunidade atendidas, perfil sociocultural das crianças e equipe de profissionais, e mapeamento dos equipamentos de saúde, cultura e lazer, para a articulação da rede de proteção social.

A concepção de criança, infância e educação infantil contida no documento advém das DCN. A finalidade e os objetivos são partes integradoras.

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O plano de gestão, em consonância com a legislação vigente, a articulação com os órgãos auxiliares - Conselho de Escola, Associação de Pais e Mestres, colegiados dos CEUs e instituições de ações educativas - será relacionado no documento.

A descrição das formas de organização da unidade educacional, o quadro de recursos humanos, a proposta curricular e pedagógica, constituirá o PPP, assim como o calendário de funcionamento da unidade e os critérios de quantidade para cada agrupamento.

O parecer dos documentos denota que o professor de Educação Infantil, agente desse currículo, deve ter como norteador o PPP, e suas práticas centralizadas na concepção de infância e suas linguagens, de maneira a configurar um “achadouro de infâncias”. Para tanto, a atuação docente deverá se desdobrar para as demais instâncias, igualmente identificadas neste trabalho como categorias e, posteriormente, analisadas, incluindo a integralidade do processo educativo Educar e Cuidar; o equilíbrio entre a intencionalidade de planejar e dar espontaneidade; as faces distintas do professor na cultura infantil: propositor, observador, interventor e mediador; a organização de espaços; o papel do professor avaliador; e, por fim, os saberes necessários aos professores da Educação Infantil.