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4 PROJETANDO A PAISAGEM DA ESTRADA

4.1 O PROJETO DE ESTRADA

Os Serviços de Engenharia no Brasil são organizados em quatro fases interdependentes: projeto, construção, operação e conservação. O Projeto de Engenharia Rodoviária, de acordo com a Lei de Licitações nº 8.666 de 21 de junho de 19933, envolve projetos de duas naturezas: Projeto Básico de Engenharia e Projeto Executivo de Engenharia. O Projeto de Engenharia de Rodovia é composto diversos estudos, anteprojetos e projetos integrantes de determinado tipo de projeto de engenharia rodoviária, cujas diretrizes encontram-se nos Escopos Básicos e as orientações nas Instruções de Serviços. Dessa forma, cada Escopo Básico possui Instruções de Serviço para as sucessivas etapas técnicas a serem cumpridas (Anexo 2). Entre os componentes de projeto está a Instrução de Serviço 216 que refere-se ao Projeto de Paisagismo. Destaca-se outras Instruções de Serviço, além da IS-216, que estão relacionadas com o projeto da paisagem, uma vez que envolvem o meio físico natural e, portanto, com a estrutura da paisagem, são eles: IS-202; IS-203; IS-204; IS-205; IS-206; IS-207; IS-208; IS-209; IS-210; IS-246; ISA-02; ISA-03; ISA-04 e ISA-06. Também os projetos de elementos da estrada e que conferem qualidade à paisagem da estrada, são eles: IS- 213; IS-214; IS-215; IS-217; IS-218; IS-223 e IS-225 (Vide anexo 2).

Antes da execução do projeto geométrico, são realizados os estudos de traçado, na fase preliminar, com os objetivos principais da delimitação dos locais mais apropriados para a passagem da rodovia, “a partir da obtenção de informações básicas a respeito da geomorfologia da região e a caracterização geométrica desses locais de forma a permitir o desenvolvimento do projeto pretendido” (LEE, 2002, p.63). Por isso, julga-se de extrema relevância a análise da carta geotécnica da região, onde constarão as diretrizes de ocupação do solo baseado na litologia, geomorfologia e hidrologia. Estes estudos de traçado são uma das etapas essenciais para a integração da rodovia com o meio físico e a valorização da paisagem rodoviária. Então, observou-se que a qualidade do paisagismo está diretamente associada com o projeto geométrico,

3 Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal que institui normas para licitações

visto que são definidos: 1) o melhor traçado; 2) o greide (linha que determina os cortes e aterros); 3) as curvas; 4) as larguras da pista, do acostamento, dos canteiros central e laterais; 5) a concordância de curvas horizontais e verticais. Todas estas características definidas no projeto geométrico têm resultado na configuração da paisagem, já que são decisões que alteram as características naturais do sítio e interferem nas características culturais e sociais.

Os projetos de obras de arte, de sinalização, de defensas e barreiras, cercas, pavimentação, também são de interesse para o projeto de paisagismo, pois refletirão na qualidade visual da paisagem, na percepção ambiental, conforto ambiental e eficiência energética. Os estudos de desapropriação e de impacto ambiental também são primordiais para o desenvolvimento de um bom projeto de paisagismo, que pressuponha sustentabilidade e integração.

A estrada deve estar em harmonia com a paisagem, como se fosse uma parte da paisagem, tão imprescindível quanto os outros elementos naturais (MCCLUSKEY, 1985). Por isso, para o planejamento, projeto, implantação e gestão da estrada são necessários conhecimentos técnicos e do contexto no qual a estrada irá passar. PRINZ (1984, p. 36) apresenta esquemas da adaptação formal do traçado das estradas à paisagem, com a representação da situação inicial de um sítio (Figura 9), depois a simulação da abertura de uma via com traçado retilíneo, que desconsidera as particularidades da paisagem (Figura 10) e por fim a simulação de um traçado apoiado em elevações definidoras dos espaços visuais (Figura 11). Observa-se na Figura 11, que o traçado quando se adapta à paisagem proporciona variações de direção causam o deslocamento do ponto de vista do observador e criam sequencias contínuas de espaço e perspectiva.

Figura 9: Inicio. Fonte: Prinz, 1984. Figura 10: Incorreto. Fonte: Prinz, 1984. Figura 11: Correta. Fonte: Prinz, 1984. Moretti (1983) apresenta mapas geológicos, pedológicos, geomorfológicos e a interpretação de imagens aéreas como instrumentos que podem orientar a escolha do traçado de estradas. Para tal, leva-se em conta as potencialidades e as limitações do meio físico. Em função das

condições geotécnicas locais, taludes de corte e aterro poderão apresentar problemas distintos e muitas vezes previsíveis. Por isso, os estudos do meio físico devem ser considerados no projeto, na construção e na manutenção. Como potencialidades cita, por exemplo:

a) pesquisa de jazidas de materiais de empréstimos para execução de cortes e aterros;

b) delimitação das áreas mais favoráveis com relação à capacidade de suporte do subleito;

c) pesquisa de jazidas para execução de base e revestimento; d) previsão de problemas associados à execução de cortes e aterros. Como limitações dos recursos naturais, apresenta:

e) a delimitação das áreas de deposição que podem ter solos moles; f) a delimitação de corpos coluvionares que poderão entrar em

movimentação com as obras de terraplenagem para abertura da estrada (corpus de tálus);

g) a delimitação das áreas de falhamento;

h) as características básicas previsíveis das águas subterrâneas (afloramentos e surgências);

i) a previsão das características de erodibilidade associadas aos diversos horizontes do solo;

j) a previsão das decorrências da exploração de jazidas;

k) a previsão de características geotécnicas gerais do solo, incluindo a granulometria, plasticidade, resistência, permeabilidade.

A extração de minerais, assim como os deslizamentos e a erosão causam grande impacto no meio físico e causam uma desvalorização na paisagem. Além de que na estrada, os resultados destes eventos ficam bastante visíveis para o usuário, como se pode observar nas imagens abaixo que fazem referência ao estudo de caso, a BR-101/N-SC:

Figura 12: BR-101 km 139. Surgência D´água. Fonte: Higashi, 2010. Figura 13: BR-101. Contenção de talude. Fonte: A autora, 2012.

Nos mapas geológicos encontram-se as informações referentes ao substrato rochoso, enquanto no mapa pedológico encontram-se as informações do solo superficial, que não necessariamente estão associados com o substrato rochoso (Moretti, 1983). Os mapas geomorfológicos apresentam a delimitação de áreas, zoneadas de acordo com as características do relevo, levando em conta a declividade, amplitude e características das elevações, do sistema de drenagem, das deposições aluvionares. Os mapas geomorfológicos podem ser utilizados como instrumento na escolha do traçado através da comparação com as características topográficas de áreas conhecidas. Outro instrumento muito utilizado é a interpretação de fotos aéreas, especialmente em áreas de difícil acesso ou com cartografia deficitária. A partir da interpretação das fotos aéreas são geradas as plantas aerofotogramétricas que servem de base para os estudos de traçado, complementado com o trabalho de campo. (Moretti, 1983).

O Manual de Taludes em Rodovias (DER/SP, 1991) complementa os estudos do Moretti (1983). Este Manual trata dos problemas geotécnicos ocorrentes em taludes rodoviários associados a processos de instabilização de massas, como, por exemplo, escorregamentos, erosões e recalques. O Manual fornece ainda, aos profissionais rodoviários, informações geológico-geotécnicas básicas e subsídios para diagnóstico e soluções de problemas geotécnicos. Tal ação se justifica quando DER/SP (1991) aponta que os problemas em taludes rodoviários ocorrem basicamente devido: à falta de projeto específico; projeto inadequado, por falta de conhecimento do meio físico; por deficiências construtivas e por má conservação (Vide Anexo 3)

A qualidade de um traçado é determinada, segundo SILVA (2008) pela qualidade dos alinhamentos horizontais e verticais, ou seja, coordenação planta-perfil, homogeneidade de traçado, relacionada com as curvas circulares, e pela integração paisagística. A homogeneidade de traçado pode servir para alertar os condutores para as alterações da estrada por meio do agravamento gradativo dos raios das curvas. A coordenação planta-perfil serve para que o condutor compreenda facilmente o desenvolvimento do traçado à sua frente, identifique a tempo as zonas singulares, como as intersecções, o pavimento e eventuais obstáculos, a uma distância segura e possível de executar uma eventual manobra. Ou seja, a boa qualidade do traçado é essencial para se ter boa visibilidade, legibilidade e previsibilidade, resultando em uma rodovia mais segura.

A engenharia rodoviária conta com programas que permitem trabalhar nas três dimensões (planta, seção ou perspectiva simultaneamente), como, por exemplo, a Autodesk AutoCAD Civil3D. Também começam a ser utilizados os Sistemas de Informações Geográficas (SIG) para armazenamento e manipulação de dados numéricos e vetoriais e os sistema BIM (Building Information Modeling), utilizado para compatibilização de diferentes projetos e visualização da obra completa. Estes softwares permitem relacionar partes para compor um todo coerente, dessa forma é possível trabalhar simultaneamente os projetos de engenharia e da paisagem.

De maneira geral, pode-se considerar que a engenharia de estradas têm evoluído significativamente, em especial no sentido de garantir segurança e conforto aos usuários, mas muitas vezes, falha no atendimento aos aspecto ecológico, social e estético. Mas percebe-se uma tendência mundial na busca pela sustentabilidade, incluindo as rodovias, sendo a integração da rodovia na paisagem um destes quesitos.