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3 CONTEXTO GEOGRÁFICO, HISTÓRICO, SOCIAL E POLÍTICO DA

3.1 O PROJETO SOCIAL E EDUCACIONAL NO INÍCIO DA

ESTUDANTES DO IFES

A criação da escola é anterior à década de 1970, inserida no contexto da Primeira República,15 quando foram criadas, por meio do Decreto n.º 7566, de 23 de setembro de 1909, pelo presidente Nilo Peçanha, nas capitais da Federação (exceto Rio Grande do Sul e Distrito Federal), as Escolas de Aprendizes e Artífices (EAA), cujos objetivos – correcional e moralizante da formação do caráter pelo trabalho (KUENZER, 2009) – estavam explícitos no decreto, ao considerar

que o aumento constante da população das cidades exige que se facilite às classes proletárias os meios de vencer as dificuldades sempre crescentes da luta pela existência: que para isso se torna necessário, não só habilitar os filhos dos desfavorecidos da fortuna com o indispensável preparo técnico e intelectual, como fazê-los adquirir hábitos de trabalho profícuo, que os afastara da ociosidade ignorante, escola do vicio e do crime; que é um dos primeiros deveres do Governo da Republica formar cidadãos uteis à Nação (BRASIL, 1909).

No contexto de início do século XX – fim da escravidão e, consequentemente, do aumento do número de trabalhadores assalariados; crescimento demográfico e industrial e urbanização – havia a intenção, por parte das elites que controlavam o estado, de instruir as classes populares com o propósito de formar mão de obra para

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As informações sobre o bairro Jucutuquara foram retiradas do site da Prefeitura Municipal de Vitória. Disponível em: <http://legado.vitoria.es.gov.br/regionais/bairros/regiao3/jucutuquara.asp>. Acesso em: 6 jan. 2012, e dos livros de Daniel (1999) e Monjardim (2003).

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Primeira República ou República Velha corresponde ao período entre a Proclamação da República, em 1889, e a Revolução de 1930.

o nascente contexto industrial capitalista. Embora o Espírito Santo não representasse, no cenário nacional, a vanguarda da industrialização, o projeto da Presidência da República servia também como mecanismo político de presença e barganha com as elites locais (MANFREDI, 2002).

Com a educação, o Estado intencionava controlar a população, sobretudo as classes populares, por meio de um programa moralizador de instrução e programas de regeneração nacional (FRANCO, 2002) para (con)formar os cidadãos, ou seja, criar uma população “disciplinada, ordeira, trabalhadora, respeitadora e cumpridora das leis, portadora de hábitos e costumes saudáveis, para realização desse projeto e, necessariamente, alfabetizada” (FRANCO, 2002, p. 247). Não obstante a escolarização estivesse na pauta do ideal republicano, a universalização da escola pública não era garantida.

Desse modo, a educação refletia a luta de classes, categoria fundamental do pensamento marxista para analisar o desenvolvimento da sociedade burguesa, tal como está explícito na primeira frase de O manifesto comunista: “a história de todas as sociedades que já existiram é a história da luta de classes” (MARX; ENGELS, s/d, p. 11). Essa afirmativa elucida o pensamento marxista em relação aos conflitos nas relações sociais entre interesses antagônicos das classes. Marx e Engels indicam ser a sociedade capitalista o ponto culminante da revolução histórica das formas de sociedade divididas em classes, pois é nela que tais classes fundamentais se diferenciam e a consciência de classe é completamente desenvolvida (BOTTOMORE, 2001). Em nossa sociedade, a luta de classes está evidenciada, dentre outros espaços, nas relações educacionais. O projeto de educação formulado pela burguesia para a classe trabalhadora propõe uma escola laica, pública, gratuita e universal, projeto enraizado no ideário iluminista do conhecimento como livramento da tirania e do sofrimento.

Historicamente a burguesia, ao confrontar-se com o antigo regime feudal, uniu-se às classes trabalhadoras para a conquista do poder econômico e político, e nesse sentido exerceu uma ação revolucionária, pondo fim aos privilégios de origem divina dos reis e do clero. Porém, ao assumir o poder como classe hegemônica, busca defender apenas seus interesses e alija as classes trabalhadoras do exercício efetivo dos direitos sociais, entre os quais o direito à educação.

Nesse sentido, o projeto de escola burguesa não prima pela superação da luta de classes, mas a ratifica, ao manter a divisão e a alienação, com base na propriedade privada dos meios e instrumentos de produção (FRIGOTTO, 2011). Ponce (2001), ao analisar o contexto do século XVIII e XIX, apoiado nas declarações de teóricos burgueses, corrobora o pensamento de Frigotto quando destaca que “a burguesia não foi capaz de dar às massas durante todo esse tempo nem mesmo aquele mínimo de ensino que convinha aos seus próprios interesses” (p. 155).

Tais evidências persistem e são objeto de críticas e análises do presente modelo educacional, especialmente ao tratarmos da educação ofertada aos sujeitos trabalhadores jovens e adultos. Uma educação pautada na formação aligeirada e conformista, estruturada, ainda, nas funções do ensino supletivo “suplência, suprimento, aprendizagem e qualificação” (VENTURA, 2011, p. 71), apesar do avanço e das conquistas no campo da legislação, que considera a educação como direito fundamental, reiterando assim uma prática de educação bancária e opressora que se contrapõe ao projeto de educação popular emancipador (FREIRE, 2011).

Nessa perspectiva, a educação reproduz a dualidade presente na sociedade: de um lado, uma educação acadêmico-generalista-intelectualizada, voltada às classes dominantes; e de outro, a educação profissional em instituições especializadas ou no próprio trabalho para os trabalhadores. Para a primeira, o ensino propedêutico seguido do ensino superior; e para a segunda, uma formação com ênfase no aprendizado de formas de fazer, em habilidades psicofísicas (KUENZER, 2009), uma formação aligeirada, reduzida ao atendimento das necessidades do mercado e do Estado, sem perspectiva de emancipação (individual ou coletiva). Sobre essa questão, Ciavatta (2011, p. 35) destaca que na sociedade brasileira:

O ideal educacional, necessário à produção capitalista, implantou-se, de modo escasso e limitado, apenas nas funções de ler, escrever, contar e aprender um ofício. Manteve-se sempre, por artifícios legais e administrativos, a meia-educação para a população.

Essa problematização envolve o fato de a sociedade brasileira ter uma dívida histórica com a classe trabalhadora, pois os trabalhadores foram e continuam sendo excluídos da educação e de todos os bens elementares à vida, pela condição de

pertencerem a uma classe determinada, ou seja, a “classe-que-vive-do-trabalho”,16 sustentando a classe que não trabalha, mas que vive do trabalho alheio, que é a burguesia (ANTUNES, 2009). Essa, ao mesmo tempo em que explora a força de trabalho do proletariado, nega-lhe o acesso ao conhecimento escolar, senão àquele suficiente para a produção capaz de contribuir com os “padrões de organização e funcionamento compatíveis com as necessidades relativas às características psicológicas e cognitivas consideradas necessárias para conformar a força de trabalho” (RUMMERT, 2011, p. 140).

3.2 AS MUDANÇAS NO SISTEMA PRODUTIVO E SUAS CONEXÕES