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2. DIREITO DO TRABALHO E RELAÇÃO JURÍDICA

2.7. O PROLETARIADO

Passada, mesmo que brevemente, tal discussão, é preciso que notemos as condições e o caráter multifacetado assumido pelo Direito do Trabalho como segundo momento de reconhecimento das especificidades da relação empregatícia pelo Direito. Aqui falaremos especificamente do surgimento do proletariado a partir das condições materiais que permitiram o surgimento específico destas demandas, e como estas últimas, mesmo se apresentando como disposições de uma classe que não domina o Estado, são postas por meio dele e como isso implica na redução destas demandas à forma jurídica.

A constituição do proletariado enquanto classe em si está diretamente ligada a concentração do capital , apenas com a alienação do trabalho vivo por meio da troca por 196 trabalho objetivado equivalente a manutenção da mercadoria força de trabalho , ou seja, do 197

192 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do Trabalho . 16ª edição rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2017, p. 324.

193 MARX, Karl. O Capital: crítica da Economia Política: Livro I: O processo de produção do capital . Tradução de Rubens Enderle. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2013, p. 250.

194 Id. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da crítica da economia política . Tradução de Mario Duayer, Nélio Schneider, colaboração de Alice Helga Werner e Rudiger Hoffman; supervisão editorial Mario Duayer. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2011, p. 409.

195 Id. O Capital: crítica da Economia Política: Livro I: O processo de produção do capital . Tradução de Rubens Enderle. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2013, p. 250.

196 “A produção de capitalistas e trabalhadores assalariados, por conseguinte, é um produto principal do processo de valorização do capital.” (Id. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da crítica da

economia política . Tradução de Mario Duayer, Nélio Schneider, colaboração de Alice Helga Werner e Rudiger Hoffman; supervisão editorial Mario Duayer. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2011, p. 422). Um panorama geral da criação do proletariado e do capitalista, principalmente na Inglaterra, encontra-se em Id. O Capital: crítica da Economia Política: Livro I: O processo de produção do capital . Tradução de Rubens Enderle. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2013, Capítulo 24.

197 Id. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da crítica da economia política . Tradução de Mario Duayer, Nélio Schneider, colaboração de Alice Helga Werner e Rudiger Hoffman; supervisão editorial Mario Duayer. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2011, p. 424; Id. Cadernos de Paris; Manuscritos

Econômico-Filosóficos. Tradução de José Paulo Netto e Maria Antónia Pacheco. 1ª edição, São Paulo: Expressão Popular, 2015, p. 304.

trabalhador enquanto estômago ; apenas com a centralização por meio da força ou da 198 concorrência ; apenas com o crescente estranhamento dos meios de produção , a divisão do 199 200 trabalho e dependência do capital que a acompanham , surge a oportunidade do nascimento 201 desta classe. Entretanto, neste próprio processo há um segundo, a constituição de uma classe para si, sua miséria real não coaduna com a libertação que se diz alcançada, o escamoteio de uma apropriação de trabalho sem troca se torna cada vez mais visível , e a concorrência 202 estabelecida entre eles passa a ser perceptível como reguladora do salário, na medida dos ciclos econômicos mesmos , aqui, a partir dos interesses comuns visíveis, a classe se 203 constitui para si, e, nesse primeiro momento, a luta política, a que trataremos de forma específica no momento, se põe rapidamente como horizonte . 204

As coalizões nascem e seu posterior reconhecimento pelo Estado burguês se torna 205 um mistério acerca do caráter realmente de classe desse Estado. Todavia, conforme explicita Lukács é preciso entender certos horizontes dados deste Estado de classe, os próprios conflitos sociais que levam ao surgimento do mesmo implicam em uma limitação de interesses que possam se traduzir em termos legais, essa limitação se dá não só pela força real que uma classe que não o criou à sua imagem e semelhança passa a exercer politicamente, mas também pela heterogeneidade de interesses da classe dominante . Portanto, aqui temos 206

198 Id. Cadernos de Paris; Manuscritos Econômico-Filosóficos. Tradução de José Paulo Netto e Maria Antónia Pacheco. 1ª edição, São Paulo: Expressão Popular, 2015, p. 248.

199 Id. O Capital: crítica da Economia Política: Livro I: O processo de produção do capital . Tradução de Rubens Enderle. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2013, p. 701-703.

200 Id. Cadernos de Paris; Manuscritos Econômico-Filosóficos. Tradução de José Paulo Netto e Maria Antónia Pacheco. 1ª edição, São Paulo: Expressão Popular, 2015, p. 305.

201 Ibid. p. 248.

202 Id. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da crítica da economia política . Tradução de Mario Duayer, Nélio Schneider, colaboração de Alice Helga Werner e Rudiger Hoffman; supervisão editorial Mario Duayer. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2011, p. 419.

203 “Grosso modo, os movimentos gerais do salário são regulados exclusivamente pela expansão e contração do exército industrial de reserva, que se regem, por sua vez, pela alternância periódica do ciclo industrial.” (Id. O

Capital: crítica da Economia Política: Livro I: O processo de produção do capital . Tradução de Rubens Enderle. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2013, p. 712). O item 3 do cap. 23 do Capital discute largamente a questão do salário de acordo com a produção e a população proletária. Engels já avistava isso em ENGELS, Friedrich. A

situação da classe trabalhadora na Inglaterra . Tradução de B. A. Schumann; supervisão, apresentação e notas José Paulo Netto. 1ª edição revista, São Paulo: Boitempo, 2010, p. 253-254.

204 MARX, Karl. Miséria da Filosofia . Tradução de José Paulo Netto. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2017, p. 146.

205 Ibid. 144. Mesmo que Marx já em 1847 associe o reconhecimento das coalizões ao maior desenvolvimento econômico, Losurdo demonstra como as mesmas só começaram a ter uma maior liberdade na Europa após 1870 (LOSURDO, Domenico. Contra-história do Liberalismo . Tradução para a língua portuguesa Giovanni Semeraro. 2ª edição, Aparecida, SP: Idéias & Letras, 2006, pp. 224-227).

206 LUKÁCS, György. Para uma Ontologia do Ser Social II. Tradução de Nélio Schneider, Ivo Tonet, Ronaldo Vielmi Fortes. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2013 , pp. 232-233.

uma das chaves para entender o reconhecimento das coalizões, posteriormente dos sindicatos, etc.

A resistência dos trabalhadores frente aos ultrajes a eles infligidos é portanto uma guerra civil , imbuídos de sua colocação na sociedade reconhecem, após um breve 207 momento, a classe constituída no Estado como o fundamento de sua desgraça, sua luta, portanto, apenas enquanto luta de classes , assume um caráter político , ou seja, vêem-se 208 209 limitados por uma determinada forma singular de Estado . Em paralelo a isso, todavia, as 210 condições para que essa classe possa fazer demandas efetivamente aparecem simultaneamente no meio da produção: o ultraje atinge um limite natural na própria constituição física do homem, o dia só possui vinte e quatro horas, um país só possui determinado número de pessoas sob um determinado crescimento demográfico, portanto com o estranhamento do capital pela extração de mais-valor absoluto surge uma nova fase onde a maquinaria se expande e o desenvolvimento tecnológico dá ares a produção cada vez mais concentrada , se 211 o desastre humano é visível , por outro lado, mesmo a contragosto dos capitalistas, ela 212 permite que essas demandas se apresentem como viáveis pelo aumento do mais valor relativo e/ou da intensidade de trabalho , por sua vez, essas mesmas demandas “atendidas”

213 214

estimulam esse movimento tecnológico , aumentando a concentração e a centralização , e, 215 216 assim, o próprio movimento da classe operária, em certa medida, estimula o movimento geral

207 MARX, Karl. O Capital: crítica da Economia Política: Livro I: O processo de produção do capital . Tradução de Rubens Enderle. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2013, p. 367; p. 370. ENGELS, Friedrich. A situação da classe trabalhadora na Inglaterra . Tradução de B. A. Schumann; supervisão, apresentação e notas José Paulo Netto. 1ª edição revista, São Paulo: Boitempo, 2010, p. 248; pp. 254-261.

208 MARX, Karl. Miséria da Filosofia . Tradução de José Paulo Netto. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2017, p. 146.

209ENGELS, Friedrich. Ludwig Feuerbach e o Fim da Filosofia Clássica Alemã. Tradução de José Barata-Moura.

In : Obras Escolhidas em três tomos , tomo III, pp. 378-421 . 1ª edição, Moscovo: Editorial "Avante!", Edições

Progresso Lisboa, 1982. Disponível em: http://bit.ly/34gyogb. Acesso em 15/10/2019.

210 Id. A situação da classe trabalhadora na Inglaterra . Tradução de B. A. Schumann; supervisão, apresentação e notas José Paulo Netto. 1ª edição revista, São Paulo: Boitempo, 2010, pp. 261-262. MARX, Karl. Glosas Críticas Marginais ao Artigo "O Rei da Prússia e a Reforma Social". De um prussiano. Tradução de Ivo Tonet. In : Revista

Práxis , n. 5, Belo Horizonte: Projeto Joaquim de Oliveira, 1995. Disponível em: http://bit.ly/2pLqbBp. Acesso em 10/10/2019.

211 MARX, Karl. O Capital: crítica da Economia Política: Livro I: O processo de produção do capital . Tradução de Rubens Enderle. 1ª edição, São Paulo: Boitempo, 2013, p. 541.

212 Ibid. p. 543. 213 Ibid. cap. 10. 214 Ibid. cap. 13.3.c. 215 Ibid. pp. 545-548. 216 Ibid. pp. 701-703.

de inovação capitalista . Aqui, de certa maneira, há uma repetição do movimento do salário 217 já visto em momentos de expansão econômica, onde: “a elevação do salário pressupõe o acúmulo do capital e conduz a ele” , ou seja, assim como o salário, estas demandas levam ao 218 estranhamento do capital frente ao trabalho, produzindo mais capital e mais trabalhadores, com a diferença, entretanto, de se apresentarem como uma "barreira social intransponível" , 219 uma lei.

Mas o que é realmente interessante de se notar é a forma que estas demandas assumem ao se transformarem em uma “barreira social intransponível”, aqui finalmente chegamos no âmbito do Direito do Trabalho.

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