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O que falam escola e famílias sobre a relação estabelecida

Damaris Gomes Maranhão e Cynthia Andersen Sarti (2007) realizaram estudo de caso que analisou a relação entre a família e a creche no que se refere aos cuidados da primeira

infância, principalmente em relação à alimentação e higiene. A conclusão das autoras corrobora com as afirmações apresentadas. Para elas “os conflitos são inerentes às relações entre profissionais e familiares [...], evidenciando-se no processo de compartilhar cuidados [...].” (MARANHÃO; SARTI, 2007, p. 268) As autoras concluíram, também, que

Compartilhar cuidados infantis demanda dos profissionais preparo e disposição para escutar crianças, pais, avós, comunidade, em sua alteridade, constituindo um

fórum de reflexão sobre o que seja o melhor cuidado e a melhor educação para esse grupo específico, em seu contexto histórico, social e cultural. (MARANHÃO; SARTI, 2007, p. 268, grifos nosso)

Entretanto, as pesquisas que ouviram professores (BHERING; NEZ, 2002; FREITAS, 2003, GARCIA; MACEDO, 2011; KRAMER; NUNES, 2007; MARANHÃO; SARTI, 2007) mostram que, para eles, a relação com os familiares/responsáveis é de confronto. Tal situação pode ser observada na discussão de Bhering e Nez (2002), quando afirmam que a visão da creche sobre a relação com os pais é que:

[...] muitos pais abusam da abertura propiciada pela creche, não cumprindo as

regras e normas estabelecidas pela mesma, comprometendo assim, uma atuação que

fomenta o envolvimento de pais [...]. No entanto, a creche não consegue reconhecer sua postura ofensiva aos pais [...]. (BHERING; NEZ, 2002, p. 69, grifo nosso)

As autoras ainda relatam que o único elo entre escola-pais é a criança que conta aos pais o que acontece na escola, e conta às professoras o que acontece em casa. Este “elo”

possibilita “[...] a formação de opiniões em cima de informações superficiais.” (BHERING;

NEZ, 2002, p. 69) Superficiais no sentido de que tanto as famílias, quanto as professoras só sabem aquilo o que as crianças dizem, não há diálogo entre família-escola para que haja maior conhecimento da rotina e do desenvolvimento da criança.

Esta superficialidade é uma questão importante e que deve ser equacionada, uma vez que a educação e o cuidado com a criança pequena devam ser compartilhados com a família (BRASIL, 2009c). Mas há, ainda, outros pontos que afastam as famílias da escola e que precisam ser superados, que as autoras denominaram de postura ofensiva aos pais, sobretudo porque se trata de regras. Quem elaborou as regras da instituição? Qual a finalidade de cada regra? A quem se destinam as regras?

Katia Siqueira de Freitas (2000) apresenta fragmentos de entrevistas e visitas realizadas pelo Programa Gestão Participativa, implantado na Bahia. Neste programa as escolas decidiram se participariam e, caso o aceitassem, o programa desenvolveria atividades com a comunidade escolar, a fim de levantar coletivamente os problemas enfrentados e buscar

soluções. Dos fragmentos apresentados das entrevistas, há um que analisa a participação dos pais na escola, sobre o qual Freitas (2000, p. 56) afirma que “parece-nos que participação é entendida [pela escola] como repreender pais e filhos [...].”

Esta repreensão causa afastamento das famílias e relutância em participar e se posicionar diante de conflitos ou qualquer outra questão envolvida na relação escola-família. Esse dado corrobora com os estudos apresentados.

Ainda sobre a pesquisa realizada por Bhering e Nez (2002), as autoras concluíram, com base nas informações coletadas em entrevistas, que há uma relutância, por parte dos pais, pois

[...] por um lado pode se tornar muito ameaçador emitir suas reais opiniões a respeito da creche, professores e o tratamento recebido por eles; por outro lado, percebe-se uma falta de conhecimento sobre a creche que não os permitem formar opiniões sobre a mesma (em termos pedagógicos, de planejamento, funcionamento, socialização – projeto político pedagógico). Esta postura de favorecimento permite que a creche faça escolhas e tome decisões sem a participação dos pais. (BHERING; NEZ, 2001, p.68)

Este discurso a respeito do medo das famílias aparece em outras pesquisas já citadas, mas é importante destacar deste trecho que a falta de conhecimento por parte das famílias sobre planejamento, funcionamento, socialização, projeto político pedagógico é real e, de certa forma, compreensível, pois eles não são obrigados a ter conhecimento pedagógico, sendo que esse conhecimento deveria ser passado pela escola. Porém, se a escola realizasse, de fato, um esforço por uma gestão democrática, é dever dela explicar, discutir, repensar as práticas junto com os familiares e a comunidade.

Maria Malta Campos, Jodete Füllgraf e Verena Wiggers (2006) realizaram levantamento bibliográfico sobre pesquisas empíricas acerca da qualidade na EI. Entre os resultados observados, um dos eixos de discussão foi a relação com as famílias, ao que elas concluem que

A maioria desses resultados, porém, aponta para grandes bloqueios existentes no relacionamento entre educadores e pais de crianças pequenas, principalmente nos contextos onde a população atendida é identificada como pobre e marginalizada, mesmo que sua realidade não corresponda exatamente a essa imagem. (CAMPOS; FÜLLGRAF; WIGGER, 2006, p. 117)

Apesar deste cenário exposto por pesquisas empíricas, Nancy Nonato Alves (2010) realizou pesquisa documental de políticas públicas e de propostas de gestão democrática em Goiânia e discutiu, no XIX Simpósio de Estudos e Pesquisa da Faculdade de Educação, da

Universidade Federal de Goiânia, que “aparentemente, é reconhecida a necessidade do envolvimento dos pais e da comunidade, como estratégia de democratização da educação e adequação da ação educativa à realidade e à cultura dos grupos sociais atendidos nas instituições.” (ALVES, 2010)

Dessa forma, as pesquisas apresentadas até aqui caminham para a mesma direção, ao concordarem, com base na análise dos dados, que a participação das famílias não acontece da forma que a legislação, também aqui apresentada, prevê. Os estudos indicam que mesmo que elas queiram participar mais ativamente, a escola não propõe mecanismos para que a participação seja efetiva, ao contrário, ela cria situações de repreensão e de afastamento os familiares.

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