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5 O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE

5.1 O que é o SINASE?

Com o objetivo de elaborar parâmetros e diretrizes para a adoção de medidas socioeducativas, no ano 2002, iniciam-se as discussões coordenadas pela Secretaria Especial de Direitos Humanos – SEDH – e pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente - CONANDA. (SINASE, 2006)

No ano de 2004, a SEDH e o CONANDA, juntamente com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), estabeleceram estratégias de ação e compilaram os dados num documento intitulado Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE. O documento foi aprovado pelo CONANDA em julho de 2006, mas, desde 2004, vem sendo utilizado como parâmetro para construção de novas unidades.

O SINASE surge em meio a várias discussões entre membros do Sistema de Gestão de Direitos, juristas, pedagogos, psicólogos e assistentes sociais, e se apresenta como primeiro documento que, em seu rol, traz parâmetros arquitetônicos aliados com parâmetros de gestão pedagógica para a construção de edificações destinadas aos adolescentes em conflito com a lei, ressaltando assim a importância do espaço físico para a eficácia da ação socioeducativa.

Apesar disso, é importante destacar que os arquitetos e engenheiros não participaram das primeiras discussões sobre a proposta pedagógica. A arquitetura só foi incluída posteriormente, não houve uma interação multidisciplinar da equipe técnica com arquitetos e engenheiros. Tal fato pode ter resultado na contradição entre determinados pontos do documento e o programa de necessidades estabelecido, tal como será visto nas análises.

De acordo com entrevistado 7, o documento se apresenta como “um “cordão condutor” do sistema socioeducativo, pois cada Estado acabava adotando as suas próprias medidas, cada um fazia de uma forma. Com o SINASE, começa-se a ter uma espinha dorsal de como os Estados devem estar executando as medidas.”

O documento parte da premissa de “se constituir parâmetros mais objetivos e procedimentos mais justos que evitem ou limitem a discricionariedade” (SINASE, 2006, p.13), diminuindo assim a discrepância de interpretações do que está contido no Estatuto, que era evidente nas estruturas físicas e nas práticas adotadas no tratamento dos jovens, mesmo após a adoção da política socioeducativa. Sendo assim se apresenta como um documento que traz as diretrizes, mas também operacionaliza as práticas socioeducativas.

Em julho de 2007, o documento do SINASE foi apresentado como projeto de lei (PL 1.627/2007) e aprovado pela Câmara dos Deputados no projeto de lei da câmara (PLC) nº134/2009, hoje aguarda aprovação do Senado Federal. (VERONESE, LIMA, 2009)

De acordo com Levantamento Nacional do Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei (SEDH, 2009), o documento está em pauta para votação e aprovação, o que o tornará obrigatório na elaboração do projeto arquitetônico e nas ações socioeducativas desenvolvidas para o atendimento do jovem em conflito com a lei.

Tal como consta no mesmo levantamento (SEDH, 2009), o número total de adolescentes cumprindo medida socioeducativa de internação no Brasil, em 2009, foi de 16.940 jovens, sendo 11.901 em estabelecimento educacional de internação. Desses jovens, 96% eram do sexo masculino:

Figura 15: Gráfico com a variação das internações em unidades de atendimento socioeducativo, a partir dos dados do gráfico da SEDH (2009). Fonte: Acervo pessoal. Ano: 2011.

A figura 15 mostra uma redução do percentual de crescimento das internações de 2007 a 2009, fato que coincide com a construção de novas unidades de internação no Brasil e pode estar relacionado com a aprovação do projeto de lei do SINASE no ano de 2007.

De acordo com os dados da própria SEDH (2009), 15% das unidades existentes no Brasil foram concluídas de 2007 a 2009 (figura 16), ou seja, sua construção provavelmente se iniciou de 2004 a 2006, o que coincide com a compilação das orientações que dariam origem ao SINASE. A partir dessa época, as concepções pedagógicas passam a ser consideradas na proposta arquitetônica, reduzindo assim a formação dos grandes complexos arquitetônicos das antigas FEBEM. 0 2000 4000 6000 8000 10000 12000 14000 16000 18000 1996 1999 2002 2004 2006 2007 2008 2009

Figura 16: Gráfico com o início do funcionamento das unidades de internação no Brasil. Fonte: SEDH, 2009

O SINASE é um projeto de lei, mas pode-se dizer que o documento já se configura como uma política pública baseada em medidas socioeducativas para o tratamento de jovens em conflito com a lei, sendo de grande importância a análise da sua repercussão do ponto de vista arquitetônico.

É importante ressaltar que a coerência com o documento é exigida para a aprovação e liberação de financiamento federal para construção de unidades socioeducativas, fato que pode ter influenciado nos dados expostos na figura 15.

O documento está inserido no Sistema de Garantia de Direitos (SGD) e deve interagir com as demais políticas públicas de saúde, educação, segurança, assistência social que, por sua vez, devem ter programas voltados para o atendimento da criança e do adolescente, tal como pode ser visto na figura 17:

Figura 17: Funcionamento do SINASE e as relações mantidas no SGD. Fonte: SINASE, 2006.

Para a implantação de tais políticas, o SINASE envolve as três esferas do governo (União, Estados e Distrito Federal e Municípios) e os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Cada um possui competências e atribuições, sendo algumas comuns e outras específicas. Estes órgãos representam o Estado, mas o desenvolvimento da ação socioeducativa deve envolver também a comunidade e a família do jovem.

Considerando as esferas do governo, o documento é composto de órgãos de deliberação, órgãos de gestão e execução, entidades de atendimento, órgãos de controle e financiamento (figura 18).

Figura18: Composição do SINASE. Fonte: SINASE, 2006

A obrigatoriedade do SINASE, por enquanto, só é imposta quando o projeto é financiado pela União. Para tanto, o órgão de controle responsável por inspecionar a execução

das políticas públicas, considerando aspectos pedagógicos, técnicos, administrativos e financeiros, é a SEDH. Ela avalia a viabilidade dos projetos pedagógicos e arquitetônicos das entidades de atendimento.

5.1.1. Atores envolvidos no processo socioeducativo

De acordo com o SINASE (2006), a gestão do programa socioeducativo é composta de diversos atores. Diante da complexidade, no diagrama 02 foram sintetizados os atores que, de acordo com o documento, se utilizam dos espaços existentes em uma unidade de internação, se constituindo assim como usuários da unidade:

Diagrama 02: Atores que tem relação direta com a unidade socioeducativa de internação – Usuários da Unidade de Internação. Fonte: Arquivo pessoal. Ano: 2010

Podem-se dividir os funcionários de uma unidade socioeducativa de internação em quatro grupos: os diretores da unidade, os adolescentes, a equipe multidisciplinar e os socioeducadores. O projeto arquitetônico deve considerar a existência de todos eles.

Os diretores da unidade integram o colegiado gestor que é composto também pelo dirigente do sistema socioeducativo e pela equipe gerencial do sistema. O diretor é o único do

UNIDADE DE INTERNAÇÃO

COLEGIADO GESTOR DIRETORES DE UNIDADES

COMUNIDADE SOCIOEDUCATIVA ADOLESCENTES SOCIOEDUCADORES EQUIPE TÉCNICA MULTIDISCIPLINAR ASSISTENTE SOCIAL PSICÓLOGO PEDAGOGO ADVOGADO USUÁRIOS DA UNIDADE DE INTERNAÇÃO

colegiado que é usuário da unidade, sendo responsável pela articulação da “gestão democrática, participativa e humanizadora do projeto pedagógico e do processo de reorientação e transformação da instituição." (SINASE, 2006, P. 45)

A comunidade socioeducativa engloba os demais usuários, sendo composta por adolescentes e profissionais. O primeiro, alvo de toda a ação socioeducativa, e o segundo, responsável pela ação socioeducativa.

O adolescente é o ator ao qual a política social e educativa se dirige. Ele não é só usuário, mas habita, mesmo que temporariamente, a unidade. Todas as ações devem ser desenvolvidas considerando um fim maior que é a reinserção social do jovem. O espaço é o cenário onde as ações socioeducativas se desenrolam e, dessa forma, consideramos que deve facilitar a ação e refletir a função socioeducativa do edifício.

Os socioeducadores têm contato direto com o jovem e, junto com a equipe técnica, também ocupam um espaço dentro da unidade. A disposição, arrumação e localização dos espaços destinados ao uso de tais profissionais podem ter influência nas relações existentes no espaço a ser construído.

Para todos os atores acima citados existem espaços arquitetônicos correspondentes nas unidades socioeducativas de internação. Dessa forma, todos eles devem ser considerados na ação projetual. Os materiais construtivos, as cores, a localização dos ambientes, enfim, uma série de elementos arquitetônicos pode contribuir ou prejudicar na concretização da proposta pedagógica, e assim no cumprimento das diretrizes pedagógicas descritas no SINASE.

O que se percebe com o diagrama 02 é que o documento não considera a família e a comunidade como atores do sistema socioeducativo. Acredita-se aqui que tais atores devem ser considerados na elaboração do projeto arquitetônico, pois, mesmo que não estejam presentes diariamente na unidade, eles fazem parte do processo socioeducativo e contribuem na reinserção social do jovem.