• Nenhum resultado encontrado

2 OS CAMINHOS DA PESQUISA: A METODOLOGIA

2.2 Os instrumentos utilizados para pesquisa

2.2.2 O questionário

Para a compreensão e a contextualização do lugar da pesquisa, consideramos importante, primeiramente, conhecer o perfil dos alunos que estão matriculados nas turmas de Ensino Fundamental/Anos Finais e de Ensino Médio da EJA nas escolas públicas estaduais da cidade de Conselheiro Lafaiete-MG. Inicialmente, realizamos uma consulta na Superintendência Regional de Ensino (SRE) localizada na cidade de Conselheiro Lafaiete, com o propósito de identificar quais escolas da rede pública estadual oferecem a EJA e obter a autorização para a entrada nessas escolas. A Secretaria Municipal de Educação de Conselheiro Lafaiete-MG oferece a modalidade de EJA apenas no Ensino Fundamental/Anos Iniciais, mas esse nível de ensino não fez parte da nossa pesquisa, devido à pouca presença de jovens no segmento.

Em consulta ao quadro de escolas e de turmas da EJA em Conselheiro Lafaiete- MG, por meio de dados oferecidos pela SRE da cidade, havia, no segundo semestre de 2018, aproximadamente 500 alunos matriculados no Ensino Fundamental/Anos Finais e no Ensino Médio, distribuídos em oito escolas com turmas de EJA. Após os pedidos de autorização para aplicação dos questionários para os diretores das escolas que possuem turmas de EJA, sete diretores autorizaram a investigação. Assim, com a autorização do Comitê de Ética da Universidade Federal de Ouro Preto (ANEXO A) que aprovou o projeto de pesquisa, fomos a

campo e aplicamos os questionários em todas as escolas públicas da rede estadual que nos autorizaram.

No contato com as escolas, foi apresentada aos diretores uma carta de apresentação sobre o desenvolvimento da pesquisa e o ofício enviado pela SRE. Os diretores (as) que autorizaram a investigação e assinaram um termo de consentimento para a investigação. O questionário foi aplicado por amostragem, ou seja, para todos os que estavam presentes nas datas escolhidas. Para aplicação do questionário foi estabelecido pela escola, datas e horários para a investigação da pesquisa.

Após aplicação nas sete escolas autorizadas que possuíam turmas de EJA, insistimos em conseguir autorização em uma escola que atende somente a EJA de forma semipresencial, e após inúmeras tentativas de incluir essa escola conseguimos o consentimento da SRE e em seguida da diretora para aplicar os questionários na instituição. Primeiramente a SRE não a considerou como uma escola para EJA e declarou que se tratava de um projeto para a EJA, por apresentar uma metodologia diferenciada11.

Apesar disso, a aplicação dos questionários ainda dependia da autorização da diretora e como, no primeiro semestre de 2019, acontecia a escolha de novos diretores para as escolas estaduais, somente com a admissão da nova diretora foi permitida a aplicação na referida escola.

Sendo assim, foram pesquisadas sete escolas que possuem turmas da EJA com ensino presencial e uma escola com ensino semipresencial. A primeira etapa foi concluída e a amostragem resultou em 297 questionários aplicados entre estudantes dos níveis de Ensino Fundamental/Anos Finais e Ensino Médio, em escolas estaduais de Conselheiro Lafaiete-MG.

11 A metodologia da escola semipresencial: para concluir os níveis de Ensino Fundamental e Ensino Médio, o aluno é matriculado nas disciplinas de cada nível de ensino e não existem turmas formadas. Por exemplo: o aluno matricula-se em Matemática. Nas salas de aula são realizadas aulas expositivas, resolução de atividades no momento presencial e o aluno necessita ter, no mínimo, 16 horas de frequência. Para a sua aprovação, deve entregar os trabalhos e realizar as provas dos módulos estabelecidos em cada disciplina da matriz curricular da EJA. Ao concluir essa disciplina, matricula-se em outra, e assim sucessivamente, até ser aprovado no nível de ensino matriculado. Se o aluno for assíduo e cumprir todos os prazos, geralmente, consegue concluir em menos de um ano cada nível de ensino. Nesta escola, se concentra o maior número de alunos menores de idade, que vêm de escolas municipais que não conseguem concluir o Ensino Fundamental na idade recomendada pelas legislações. Sem opção de entrar em turma presencial, ele recorre ao semipresencial e, geralmente, conclui o Ensino Fundamental, “acerta” a idade e volta para a escola regular, mas, em muitos casos, demoram a concluir esse segmento e ali permanecem para o Ensino Médio.

A seguir, nos Quadros 2 e 3, apresentamos as escolas que participaram da pesquisa.

Quadro 2: Escolas analisadas com ensino presencial da EJA (2º semestre de 2018)

Escolas Nº. de matrículas EF/Anos Finais Quantidade de questionários aplicados Nº. de matrículas Ens. Médio Quantidade de questionários aplicados

E.E. Geraldo Bittencourt 0 0 25 10

E.E. Luiz Mello Sobrinho

25 12 41 23

E.E. Mons. Antônio José Ferreira

0 0 55 20

E.E. Monsenhor Horta 25 12 48 15

E.E. Narciso de Queirós 0 0 104 68

E.E. Astor Viana 51 16 34 26

E.E. Pacífico Vieira 28 09 37 22

07 escolas 129 49 344 184

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Quadro 3: Escola analisada com ensino semipresencial da EJA (2º semestre de 2019)

Escolas Nº. de matrículas EF/Anos Finais Quantidade de questionários aplicados Nº. de matrículas Ens. Médio Quantidade de questionários aplicados Cesec Não informado 64 Não informado 0 Fonte: Elaborado pela pesquisadora

As escolas apresentadas no Quadro 2 não são instituições específicas para atendimento da EJA e atendem a Educação Básica “regular”: Ensino Fundamental e Ensino Médio. O atendimento da EJA funciona no período da noite. Apenas em duas escolas não conseguimos permissão para aplicar os questionários pessoalmente, e as diretoras optaram por nomear alguém da equipe escolar para isso.

O interessante da nossa própria participação na aplicação foi perceber a rotina da escola, sua estrutura física, os educadores, a sala de aula, como os estudantes se comportam e como reagem as nossas observações. Nas escolas visitadas, foi possível perceber a linguagem dos estudantes, como se comunicam e como a escola reage à nossa presença. Tivemos várias oportunidades de conversar com os alunos sobre pontos importantes da pesquisa, percebemos que são carentes de conhecimento, de cultura e de afeto. Vimos rostos cansados e sofridos, talvez fosse um dia desgastante de trabalho, ou talvez seja um espelho de uma vida com trajetórias de luta. Muitos declararam satisfação em responder o questionário, outros,

especialmente os mais jovens, não demonstraram tanto interesse em responder todas as questões. Portanto, foi visível perceber a fragilidade com que esses jovens e adultos chegam às salas de aula da EJA.

2.2.3 As entrevistas

Na segunda etapa, o objetivo foi realizar entrevistas narrativas, inicialmente individuais, com cada jovem, e, posteriormente, com cada pai/mãe ou responsável, separadamente, a fim de analisar como aconteceram os percursos escolares na Educação Básica “regular” desses alunos e dessas alunas, e os significados de escolarização para eles e seus pais a partir dos seus relatos individuais. Embora o levantamento feito pelos questionários e pela análise dos dados quantitativos e qualitativos tenha nos fornecido informações importantes sobre esse assunto, isso não nos permitiu ampliar a compreensão sobre a condição de ser jovem, como foram suas experiências vividas no contexto escolar e de vida. Em busca de entender com profundidade esses contextos vividos, os procedimentos metodológicos selecionados são importantes e se completam. Com as entrevistas narrativas, pretendíamos ouvir os jovens, sujeitos principais dessa pesquisa. A escolha pelas entrevistas narrativas como instrumento principal de coleta de dados baseou-se na compreensão de que é um importante recurso para responder o problema da pesquisa, uma vez que são esses sujeitos que viveram as etapas da Educação Básica “regular”. Segundo Souza (2014, p. 41):

o movimento biográfico que se desenvolve e consolida nas Ciências Humanas e Sociais, mais do que invadir a vida humana, parte de princípios deontológicos busca assegurar a vida, ao abrir espaços para socializações e partilhas de modos próprios de como os sujeitos vivem, se desenvolvem, aprendem, enfrentam conflitos, buscam alternativas para superar as adversidades da vida frente aos processos de inclusão/exclusão social.

As entrevistas narrativas permitem a aproximação da realidade vivida, dos significados e da experiência ao longo da vida. Segundo Galvão (2005), a narrativa, na forma oral ou escrita, pode compor um método rico de investigação. Esse aspecto também é comentado por Teixeira e Pádua (2006), ao relatarem que as entrevistas narrativas vêm se

destacando nas pesquisas qualitativas e trazem experiências subjetivas por meio de histórias orais.

A técnica que seria utilizada para as entrevistas narrativas seguiriam os pressupostos de Flick (2004), ao estabelecer uma questão geradora, a partir da qual o entrevistado inicia a narrativa e, ao término da primeira, o pesquisador pode fazer perguntas para esclarecimentos de detalhes que interessam à pesquisa. Esse segundo momento é chamado, por Flick (2004, p. 110), de “estágio das investigações da narrativa, no qual são completados os fragmentos de narrativa que antes não haviam sido exaustivamente detalhados pelo narrador”. Assim, perguntas podem ser realizadas pelo pesquisador em busca de detalhes que poderão responder a questão-problema da pesquisa, portanto, uma nova narrativa inicia-se para compor a primeira questão. No terceiro e último estágio, chamado de “fase de equilíbrio”, perguntas explicativas do tipo “como?” e “por quê?” podem ser usadas.

Entretanto o procedimento adotado pelo método com entrevistas narrativas não foi efetivo, e declinaram para uma entrevista semiestruturada. As entrevistas foram significativas e proporcionaram uma grande contribuição para a pesquisa. Porém, por se tratar de jovens adolescentes, tivemos extrema dificuldade de conseguir narrativas profundas, pois eles falam muito pouco. No caso da mãe e da tia, por serem muito tímidas e com pouca escolaridade, também não conseguimos narrativas extensas, e também utilizamos uma entrevista semiestruturada. Apesar do recurso das entrevistas narrativas não ter proporcionado o que se esperava desse tipo de entrevista, os poucos trechos das entrevistas semiestruturadas e as questões abertas do questionário conseguiram responder o problema da pesquisa.

As entrevistas semiestruturadas são utilizadas em pesquisas qualitativas e permite que o participante da pesquisa discorra sobre o tema da pesquisa (BONI; QUARESMA, 2005). Segundo as autoras o entrevistador realiza algumas questões iniciais, utilizando um roteiro previamente elaborado com questões abertas e/ ou fechadas, possibilitando uma entrevista mais flexível, as entrevistas abertas ou semiestruturadas produzem uma amostra consistente sobre o problema da pesquisa. Para Szymanski (2011, p. 19), “os objetivos da entrevista devem estar claros, assim como a informação que se pretende obter, a fim de buscar uma compreensão do material que está sendo colhido e direcioná-lo melhor”. Assim, para as entrevistas com os jovens e pais dessa pesquisa optamos por utilizar uma entrevista semiestruturada aberta e reflexiva.

Nesse contexto, acreditamos que a adoção do instrumento de coleta de dados referentes ao grupo focal, sendo um com estudantes e outro com mães, poderia complementar

os dados deste trabalho. No entanto, isso não foi possível, devido às limitações de tempo das mães e das escolas para fazer a interlocução com os estudantes, visto que os estudantes da EJA, durante todo o tempo em que estávamos nas escolas, demonstraram estar naquele espaço para concluir atividades pré-determinadas, como realização de trabalhos e provas, muitas vezes sem cumprir os horários de aulas, pois chegavam atrasados e iam embora mais cedo.

Por outro lado, quanto à possível aplicação do instrumento de coleta do grupo focal, isso requer do pesquisador um planejamento que envolve outros participantes para o funcionamento efetivo da técnica, além da organização a respeito do número e da duração dos encontros. Para compor a técnica de aplicação, é necessário um moderador do grupo (a pesquisadora), que realiza toda a dinâmica e a intermediação do processo de interação do grupo, e, no mínimo, mais dois participantes, que seriam os observadores para “acompanhar e registrar as expressões dos participantes (verbais e não verbais – dimensão implícita da tarefa) e auxiliar na condução dos encontros, além de controlar o tempo e o equipamento de gravação” (KINALSKI et al., 2017, p. 447. Além de toda essa composição para realizar a coleta do material, após o processo, o tempo para análise seria extenso. Desse modo, devido ao prazo de pesquisa e à composição de participantes necessários, não foi possível a realização desse instrumento para contrapor as entrevistas narrativas, assim, adotamos a entrevista semiestruturada.

As entrevistas foram realizadas em lugares diferentes, e em horários previamente combinados. Quatro nas escolas, três entrevistas foram realizadas fora do contexto da escola, sendo, duas no trabalho do estudante junto com a tia, e outra em um local público a pedido do participante. As entrevistas foram gravadas, transcritas e posteriormente analisadas.