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Antes de nos dedicarmos ao conteúdo propriamente dito que concerne a este ponto, pretendemos esclarecer da forma mais evidente possível que as imagens cuja fonte remete para captação do autor não foram de maneira alguma manipuladas após o momento da sua captação. Convenha-se que as mesmas foram reduzidas de forma a adaptá-las ao formato que o trabalho apresenta. Todavia, não se utilizaram ferramentas de corte, instrumentos de embelezamento, de condicionalismos de brilho ou apuramento de cor. São, por assim dizer, autênticas no sentido em que foram transpostas das máquinas fotográficas para o computador e deste remetidas para ficheiro de processamento de texto, sem que outro ruído propositado houvesse que não o seu – mencionado – redimensionamento proporcional que só assim viabiliza o seu uso no formato de tese que apresentamos.

No que remete para as imagens cuja autoria é independente da captação autor, aplica-se-lhes o mesmo princípio de não manipulação explanado, tendo sido a sua transposição para o trabalho efectuada tal qual nos são apresentadas pelos devidos autores os quais, sem excepção, figuram manifestamente como fonte.

O registo fotográfico, ou a captação de instantâneos do real em registo fotográfico, embora não o tenha sido assim pensado inicialmente, constitui um

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99 sustentáculo basilar à análise compreensiva e à explicativa, bem como um facilitador à inteligibilidade da leitura do trabalho e seus resultados.

Tal como o caderno de bordo, as imagens capturadas, os instantâneos do real, providenciam-se como auxiliar de memória futura. Não menos importante, de certo modo são em formato de imagem, de instantâneo retirado à realidade quotidiana, valor de prova da postura etnográfica que assumimos, tal como os excertos de textos, estes em formato escrito, se fazem valer como prova da postura envergada pelo investigador (Bernard, 2006, pp. 387-450).

Imagem 3

Legenda: ‘Observado’ a ‘observar’ (i) Fonte: captação do autor (02/09/2012)

Imagem 4

Legenda: ‘Observado’ a ‘observar’ (ii) Fonte: captação do autor (08/09/2012)

Como observamos nas imagens 3 e 4, que o são apenas a título exemplificativo, nem sempre é pacífica, ou pelo menos consensual, a convivência dos actores sociais com a lente da máquina fotográfica. Contudo, tal obstáculo não nos impediu de utilizar

a captação de imagens como veículo de fornecimento de informação e de conteúdos que se mostrava ser de mais-valia.

O uso recorrente da imagem pretende-se como uma aproximação ao que se denomina por etnografia visual e, ainda, a uma dita sociologia visual. No primeiro caso, o uso da imagem como instrumento de trabalho é justificado, em primeira instância pela Antropologia, como um elemento de suporte cognitivo de um determinado fenómeno. Segundo Judith Hanna, referindo-se a investigações de cariz etnográfico sobre a dança, quando os investigadores iniciaram estudos sobre a dança faltava-lhes conhecimento sobre os elementos do movimento e treino requerido para associar a imagética visual com elementos de conceptualização verbal, pelo que a descrição da dança se manteve em boa medida limitada até meados do século XX. Acrescenta que é a partir de 1970 que o uso da imagem, tanto estática como dinâmica, foi reconhecido de forma mais firme pela disciplina, incorporando-se como uma forma de melhor compreender as características associadas aos movimentos da dança (Hanna, in Barnard & Spencer, eds., 2010, p. 180). Este uso da imagem veio facilitar, suportar e até validar uma melhor apreensão e a compreensão de um fenómeno que sem o recurso à mesma seria bem mais difícil de descrever e de, portanto, o tornar mais acessível à inteligibilidade.

Na mesma linha, outro autor considera o filme e a imagem, particularmente a fotografia, na antropologia visual como um meio de representação visual que é empregue pelos investigadores que recorrem à etnografia dita visual para facilitar a comunicação e, de certa forma, a transposição do real (Banks, in Barnard & Spencer, eds., 2010, p. 292). Assim sendo, acaba por ter, a imagem, uma função e responsabilidade de documentar o quotidiano, podendo tornar-se essencial para um entendimento etnográfico holístico (idem, ibidem). O filme, tal como a imagem obtida pela captação da fotografia, contam como que uma narrativa, que pode e deve ser separada do mero entretenimento e contar com o seu lugar no seio da ciência (Banks, in Barnard & Spencer, eds., 2010, p. 293). Tanto o filme, vídeo, como a fotografia, acrescentamos, tornam-se nas palavras de Banks numa representação visual considerada como ‘uma janela do mundo’ (Banks, in Barnard & Spencer, eds., 2010, p.

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101 294). Morphy reconhece que a fotografia tem vindo a cimentar a sua legitimidade no meio científico como recurso para a pesquisa antropológica e para a análise e interpretação históricas. Adianta igualmente que o uso da fotografia se tornou relevante tanto como uma peça de cultura material por direito próprio, como também relativamente a fonte de informação tanto no que remete para o tempo passado como para o presente (Morphy, in Barnard & Spencer, eds., 2010, p. 454). Não nos é assim difícil de asseverar que a fotografia é actualmente uma linha metodológica e teórica e um elemento da prática social integrante e integradora de uma etnografia entendida em sentido mais lato (Edwards, in Barnard & Spencer, eds., 2010, p. 538).

Para o efeito igualmente concorre o facto, como bem aponta Bernard, que também sustenta que o uso da fotografia é uma forma de documentação da cultura e das alterações ocorridas no seio de uma cultura (Bernard, 2006, p. xiii), que nos dias actuais o material de suporte para a captação de imagens se tornou economicamente mais acessível, mais compacto e daí igualmente mais fácil de transportar e de utilizar, ao passo que simultaneamente permite captações de elevada qualidade gráfica tanto de imagens estáticas como em vídeo, durante o percurso etnográfico levado a termo pelos investigadores (Bernard, 2006, p. xiii).

No âmbito da sociologia visual, José Martins sustenta dizer menos a fotografia do que o acontecido, proposição que obtém o nosso acordo. No entanto, não deixa o autor de notar que a fotografia, em alguma da sua essência, reforça a necessidade de representar. Nas fotografias, sugere, as pessoas fazem supor. Todavia, e em simultâneo, a fotografia propõe-se como apontamento da memória, e não como memória, funcionando como lembrete do que se perdeu no quotidiano. Sem a imagem, que codifica interpretação de quotidianos, sintetiza que a quotidianidade seria impossível (Martins, in Pais et al, orgs., 2008, p. 43).

Referindo-se à cidade, simulação menor do mundo todo (Serén, in Pais et al, orgs., 2008, p. 59), Maria do Carmo Serén refere-se à mesma como um espaço que está saturado de informação invisível, onde se está em presença de um novo mundo

onde a matéria – o corpo – é superado e é a técnica que captura o corpo lugar (Serén, in Pais et al, orgs., 2008, p. 60). A fotografia, diz, pulveriza o espaço urbano. Sendo que a composição da imagem se organiza pela estruturação espacial, a fotografia surge como como enquadramento, em que é corte e fragmento de uma ausência maior. As fotos, adianta ainda, reenviam à totalidade urbana luzes e movimento, bem como o drama colectivo ou individual, onde tudo se encontra conectado de forma invisível com a ideia que dela conhecemos. Até a figura humana é uma representação do sujeito que invade a fotografia e se coloca no lugar do fotógrafo e também no de quem a vê (Serén, in Pais et al, orgs., 2008, p. 61).

José Machado Pais instiga que as fotografias não nos dão o quotidiano, mas revelam o modo como o mesmo foi, por alguém, captado. A fotografia, que refere valer por sua própria imagem, produz o que denomina como um efeito hiper-realista porque, nas suas palavras, representa uma realidade excedida e exacerbada no modo como e por quem é representada, tal sucedendo por existir uma diferença entre o visto e o visível, tal como, finaliza, entre o dito e o dizível (Pais, in Pais et al, orgs., 2008, p. 20).

Finalizamos com uma proposição de Lorenzo Tripodi, que sustenta que na vida urbana como a que vivemos, modernidade e visualidade são conceitos que se têm vindo a desenvolver paralelamente (Tripodi, in Hutchison, ed., 2010, p. 140).

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