• Nenhum resultado encontrado

O resgate do “status dignitatis” por meio da revisão criminal

O instituto da revisão criminal se utiliza de duas possibilidades para que se proceda com o resgate do “status dignitatis” do condenado. A primeira possibilidade consiste em se requerer a revisão da sentença criminal transitada em julgado, já amplamente apresentada no tópico anterior. A segunda possibilidade, é a de reconhecer o direito à indenização pelos prejuízos sofridos, como será demonstrado a seguir.

Em sendo julgado procedente o pedido de revisão e tendo o revisando requerido expressamente, poderá o Tribunal reconhecer o direito a justa indenização pelos danos sofridos. Tal disposição está contida no artigo 630 do Código de Processo Penal. Além da previsão no Código de Processo Civil, há previsão constitucional expressa, como se vê no artigo 5º, inciso LXXV,

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;

Porém, assim como na relação de hipótese de cabimento de revisão criminal, deve estar provado quando do ingresso com a ação revisional o erro judiciário, sob pena de se ter provida a revisão da sentença, mas não a fixação de indenização. O fato arguido é mais comum do que parece, como se percebe nos seguintes julgados do Tribunal de Justiça do RS,

que julgaram parcialmente o pedido revisional para prover a revisão, mas para negar a indenização,

REVISÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. PROVA NOVA. JUSTIFICAÇÃO JUDICIAL. PROCEDÊNCIA. INDENIZAÇÃO CIVIL

INCABÍVEL. A condenação do requerente fora fundamentada

precipuamente no depoimento da vítima e nos dizeres das testemunhas que apenas confirmaram o que ouviram da ofendida. Através de justificação judicial, a vítima afirmou em Juízo que mentira na época da denúncia e que as acusações contra o padrasto eram falsas, fruto de seu desejo de magoar a genitora. Descabe a fixação da indenização civil pretendida pelo requerente,

pois a condenação foi resultado da interpretação da prova existente na

época e não reflete erro judiciário. REVISÃO CRIMINAL

PARCIALMENTE PROCEDENTE. ABSOLVIÇÃO. UNÂNIME. “Nesse

contexto, a absolvição do requerente é de rigor, pois há provas novas que evidenciam a falsidade das acusações incriminatórias prestadas no processo originário. Enfim, a vítima em algum momento mentiu, ou durante o IP e a instrução ou agora no novel depoimento, o que, de qualquer forma, revive a dúvida. Apesar do julgamento procedente da presente revisão, não vinga o pleito indenizatório apresentado pela Defesa, pois a condenação, bem como sua manutenção pelos integrantes do colegiado, foi resultado da interpretação da prova existente na época, exaustivamente analisada, como facilmente se percebe das referidas decisões, e não reflete erro judiciário”. “Se antes montou uma farsa, que agora desmente, ou se agora está falseando a verdade, sabe-se lá por quais motivos, mais do que instalar a dúvida, oferece, ao acusado/condenado, a prova nova indispensável para a procedência parcial da revisão criminal, com fundamento no artigo 621, inc. II, do Código de Processo Penal, pois a própria ofendida deu conta de que os seus depoimentos primitivos eram falsos. E, para finalizar, tem razão o eminente Relator, ao indeferir a pretendida indenização, pois erro judiciário não houve.” (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo nosso).

REVISÃO CRIMINAL. FORMAÇÃO DE QUADRILHA, PECULATO, ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR E INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA DE

INFORMAÇÕES. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA DE CO-RÉUS

SUPERVENIENTE AO TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. ELEMENTAR DO TIPO. JUSTA INDENIZAÇÃO. I - Merece procedência o pedido de revisão criminal quanto ao delito de formação de quadrilha (art. 288, caput, do Código Penal), porquanto, decretada a absolvição superveniente dos demais co-réus no que pertine ao aludido delito, falta à configuração do tipo a elementar do concurso necessário. II - A procedência

da revisão criminal nesta parte não acarreta, necessariamente, o reconhecimento da justa indenização, por erro judiciário, pois a condenação do requerente quanto aos demais delitos descritos na exordial deve ser mantida, uma vez que o concurso de pessoas não se deu quanto a todos os fatos nela descritos, não havendo necessidade de comunicação ou

extensão dos efeitos. REVISÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. “O

direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos, por erro judiciário, encontra assento no art. 630, do Diploma Processual Penal, apenas não sendo devida ‘se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova

em seu poder, ou se a condenação houver sido meramente privada’ (redação dos parágrafos 1º e 2º, do art. 630). Tal previsão afina-se com o disposto no art. 5º, inc. LXXV, da CF, preceituando que ‘o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença’. No caso dos autos, julgada procedente a revisão criminal quanto ao delito de formação de quadrilha, insta verificar se a condenação do requerente pode ser classificada como erro judiciário, para fins de dar ensejo ao pleito de justa indenização. Penso que não, pelas simples razão de que, havendo a cisão dos feitos, e demonstrada a conduta delituosa do requerente, incidindo em várias ações típicas, ante os elementos de prova à disposição do julgador até aquele momento restou possível a conclusão de que incurso no aludido crime, pois teria agido em conluio com outros co-réus para a perpetração dos crimes descritos na exordial acusatória. [...] Destarte, tenho que a procedência parcial da revisão, por si só, não confere direito à justa indenização, pois mantida a condenação do réu quanto aos delitos remanescentes.” (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo nosso).

Muccio (2009, p. 1021), explica que, para que se possa ter direito à indenização, é necessário que a condenação se origine de dolo ou culpa pelos representantes do Estado no processo, quais sejam peritos, juízes, membros do judiciário, representantes do Ministério Público, delegados de polícia, entre outros. Trata-se, portanto, de responsabilidade objetiva do Estado, nos termos do artigo 36, §6º, da Constituição Federal, que dispõe que tanto as pessoas jurídicas de direito público, quanto as de direito privado prestadoras de serviços públicos, “responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa4”.

Assim, na lição de Grinover, Gomes Filho e Scarance Fernandes (2009, p. 263), há na Constituição Federal brasileira duas determinações quanto à responsabilidade objetiva do Estado. A primeira, prevista no artigo 37, §6º, da Constituição Federal, é mais ampla e discorre acerca do “dano decorrente de ato jurisdicional” e a segunda, prevista no artigo 5º, inciso LXXV, mais específica, que prevê “a reparação dos danos causados por erro judiciário”.

Tal indenização, conforme dispõe o §1º do artigo 630 do Código de Processo Penal, será liquidada no juízo cível e será devida pela União, se a condenação for proferida pelo Distrito Federal ou Territórios, ou será devida pelos Estados-membros quando a condenação for proferida por suas justiças.

4

Convém referir que, à luz do artigo 133,I, do Código de Processo Civil, que dispõe que o juiz responderá por perdas e danos quando proceder com dolo ou fraude, somente contra eles, juízes, poderá o Estado promover ação regressiva.

Avena (2011, p. 1258), menciona haver na lei, duas situações capazes de impedir a busca de indenização por erro judiciário, ambas contidas no §2º, alíneas “a” e “b” do artigo 630 do Código de Processo Penal. A primeira alínea refere que, não será possível o pedido de indenização se “o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em seu poder”, ou seja, em ocorrendo esta situação, o próprio revisando deu causa ao erro judiciário, portanto, não terá direito a indenização, por mais que a revisão criminal possa ter sido julgada procedente.

Muccio (2009, p. 1021), em estudo ao presente caso, afirma que a disposição da alínea “a” do §2º, sob a ótica da Constituição Federal não é mais observada, visto que por mais que o acusado confesse a prática delituosa ou venha a ocultar prova a seu favor, o Estado falhou com a sua obrigação de comprovar a culpa do acusado no processo e, assim, deve indenizar o revisando, mesmo que tenha ele concorrido ou colaborado para a ocorrência do erro judiciário.

Percebe-se que, de acordo com o modelo de processo penal vigente no Brasil, o entendimento acima delineado deveria ser o entendimento majoritário, seguido de decisões jurisprudenciais neste sentido. Como já anteriormente referido, o processo penal está formatado com base no princípio da dignidade da pessoa humana, sendo necessária a observação do princípio em todos os entendimentos e decisões, deixando de lado os juízos pessoais que são irrelevantes quando há a incidência de garantias processuais.

A alínea “b” do §2º do citado artigo, indica que não será caso de indenização se a acusação houver sido meramente primária. De uma forma geral, a doutrina rechaça este entendimento, visto que, ao dispor sobre o erro judiciário o constituinte não fez qualquer referência quanto à natureza jurídica da ação penal que antecedeu a sentença penal condenatória. Assim, é o entendimento de Lopes Jr. (2012, p. 1321), ao discorrer que se privada a ação penal, não há qualquer incongruência ou isenção quanto à responsabilidade objetiva do Estado, pois a ação que gerou prejuízo foi a sentença condenatória proferida pelo magistrado e não a acusação.

[...] mesmo porque não se pode ignorar que a decisão condenatória nas ações penais privadas, assim como ocorre nas públicas, emana do Judiciário, simbolizando a vontade do Estado, o qual deve responder pelo seu erro no caso de injusta condenação. Destarte, parece-nos descabido, na atualidade, o

óbice imposto pelo Código de Processo Penal à fixação do direito à indenização nesse caso. (AVENA, 2011, p. 1258).

Apresentadas as características e vantagens de se obter o julgamento positivo de uma revisão criminal, observando seus requisitos e características particulares, resta agora o estudo acerca da possibilidade de o instituto efetivamente contribuir para o resgate do “status dignitatis” do condenado.

Em havendo condenação por erro judiciário, a revisão criminal satisfaz efetivamente a pretensão de preservar a dignidade humana, seguindo os moldes de um processo penal adequado ao Estado Democrático de Direito brasileiro. Obviamente, o sistema não se traduz na perfeição, contudo, está alinhado à possibilidade de restaurar o “status quo ante” a condenação.

Pimentel (2008, p. 03), em estudo do princípio da dignidade da pessoa humana e sua aplicação no processo penal, afirma que quando da transformação social do Estado, de iluminista a Estado Democrático de Direito, a dignidade humana sofreu uma transformação que deu lugar a um conceito mais amplo e prático, compreendendo a partir de então a “segurança da vida individual e social, a proteção jurídica a salvaguarda da identidade e da natureza humana, a limitação do poder do Estado e o respeito da integridade corporal do indivíduo”. Assim, em um histórico do processo penal, simplifica afirmando que,

Se no passado os princípios tradicionais (da ampla defesa e do contraditório, acusatório, da publicidade, da presunção da inocência, da verdade, etc.) moldaram-lhe o rito, agora é o princípio da dignidade da pessoa humana que nos dirige à modernização do processo. É ele quem determina que incorporemos ao processo penal soluções inovadoras para otimizá-lo como instrumento da apuração e punição dos fatos delituosos e como anteparo do imputado. (PIMENTEL, 2008, p. 10)

Então, abarcando tanto o social quanto o individual, o princípio da dignidade humana se divide em duas vertentes. De um lado, dá validade à repressão estatal, quando, do outro, também impõe limite à atividade repressora do Estado quando da ocorrência de algum fato típico, em decorrência da observância da dignidade ínsita a cada um dos seres humanos.

Desta forma, tem-se um processo penal com garantias aos acusados, mas também com a possibilidade estatal de punir os indivíduos que transgredirem as normas. Portanto,

“mesmo que toda carga acusatória atinja o acusado, este continua sendo pessoa humana, sujeito processual e não objeto do processo; é sujeito de direitos e garantias processuais” (GIACOMOLLI, 2007).

Contudo, mesmo que com todo o aparato constitucionalmente legalizado de defesa dos interesses individuais do réu durante o trâmite de um processo penal, este vier a ser condenado ilegalmente, o Estado, também constitucionalmente, oferece uma saída, qual seja a revisão criminal. E, é com base neste instituto que o condenado se vendo renegado pela sociedade e muitas vezes pela própria família, pode alcançar a restituição da sua dignidade.

Conhecida de todo o meio jurídico é a famosa e sofrida história dos irmãos Joaquim e Sebastião Naves, vendedores de arroz, sócios de Benedito Caetano, que teve início em meados de 1937. Em novembro daquele ano, Benedito, filho de um rico fazendeiro mineiro, simplesmente desaparece, sumindo juntamente com ele uma grande quantia em dinheiro. Apavorados, os irmãos Naves procuram o sócio por toda a parte sem sucesso, quando decidem contatar com a polícia. Passado algum tempo, em 29 de dezembro do mesmo ano o 1º Tenente Francisco Vieira, que acabara de assumir a Delegacia de Araguari, conclui que os irmãos eram responsáveis pelo sumiço de Benedito e manda prendê-los.

A partir de então, os irmãos passam a sofrer maus tratos, a viver em condições sub- humanas e insalubres na cadeia pública de Araguari. Alamy Filho (1993, p. 50, grifo nosso), advogado dos irmãos Naves e autor do livro em que conta a história destes, descreve, da seguinte forma o sofrimento – dos irmãos e de sua mãe, presa por suspeita de ser cúmplice dos filhos,

Dez dias de prisão. Secreta. Sem falar. Sem comer. Apanhando. Amarrados. Amordaçados, como cães. Nus no porão da delegacia. Sem luz, quase sem ar. Conta. Não conta. Contam ou vamos acabar com vocês, seus bandidos! Seus assassinos! Seus covardes! Seus ladrões! Prendemos sua mãe. Prendemos suas mulheres. Elas vão falar. Fala. Não fala. Prenderam a veneranda Dona Rosa Naves, sessenta e seis anos. Nunca tinha ouvido contar uma história assim. Não acreditava no que estavam fazendo com seus filhos. Era demais. Gente não faria aquilo. Ela vem. Presa. Vê. Chora. Pede a Deus pelos seus filhos. Não os acusa. Nada sabe. Eles também não sabem do Benedito. Não falam. Ela é despida, ali, no porão imundo. Os filhos viram. Os filhos viam. Horror! O maior horror! Mandam Sebastião espancá-la. Mandam Joaquim. Eles recusam. Mas os soldados batem. Espancam. Seviciam.

Em outro trecho do livro, o autor antes de adentrar na fase da instrução processual, narra outros tipos de violência sofrida pelos irmãos, como serem amarrados em troncos de árvore em lugares distantes, terem o corpo untado de mel para atrair insetos, serem amordaçados e amarrados sob o sol forte sem receber água, entre outros tantos tipos de absurdos e diante de todos estes horrores os irmãos não aguentam e acabam inventando uma confissão para o crime não cometido.

Em juízo, os irmãos mantêm a versão inventada, enquanto que D. Rosa continua afirmando serem inocentes, ela e os filhos. As esposas também foram presas, contudo, Salvina, esposa de Sebastião foi presa e por dias a privaram - e também seus dois filhos menores, igualmente presos - de alimentação e agasalhos. Faziam-lhe ameaças de despi-la para que ela ratificasse a confissão armada dos irmãos, o que, sem saída, acabou por fazer. Neste tempo e por tais razões morre o filho mais novo de Sebastião e sua esposa (ALAMY FILHO, 1993, p.179).

Joaquim e Sebastião, apesar de não existir cadáver e nem corpo de delito, são pronunciados. Cabe ressalvar que nesta época, o promotor de justiça do caso era Moisés Rodrigues Alves “farmacêutico, substituindo o promotor efetivo, cujo cargo se encontrava vago”, enquanto que o juiz de direito responsável era “João da Silva e Oliveira, juiz de paz, substituindo eventualmente o juiz criminal” (ALAMY FILHO, 1993, p. 83, grifo nosso). Na sentença de pronúncia, o juiz se manifesta da seguinte forma,

O crime de que se ocupa este processo é da espécie daqueles que exigem do julgador inteligência aguda, atenção permanente, cuidado extraordinário no exame das provas, pois, no Juízo Penal, onde estão em perigo a honra e liberdade alheias, deve o julgador preocupar-se com a possibilidade tremenda de um erro judiciário. [...]. “É que o amor à responsabilidade, que deve guiar a consciência do magistrado, obriga à reflexão e ao exame da prova que se apresenta no processo como resultado da investigação da verdade, dessa investigação que envolve o interesse público, pois se de um lado se levanta a acusação forrada de monstruosidade, do outro se ergue a voz da Justiça, serena e augusta, imparcial e humana, e por isso mesmo sujeita às contingências da falibilidade. Já uma vez acentuamos o pavor que nos desperta a fraqueza do testemunho humano, que nem sempre procura o caminho da verdade, mas se lança na estrada poeirenta da mentira, no lodaçal da vingança, na explosão dos sentimentos vis, dos interesses inconfessáveis, perdendo inocentes e salvando criminosos” (ALAMY FILHO, 1993, p. 189, grifo do autor).

Quando da realização do primeiro julgamento realizado pelo Tribunal do Júri, os jurados por seis votos a um, votam pela absolvição dos irmãos. Irresignada, a Promotoria recorre da decisão e o Tribunal de Justiça mineiro torna nulo o julgamento, pois, em seu entendimento “tratando-se de crime de autoria incerta, era necessário que se formulassem os quesitos relativos ao auxílio anterior à execução, ao auxílio durante a execução e ao auxílio indispensável à execução – o que não se fez” (ALAMY FILHO, 1993, p. 276).

Realizado novo julgamento pelo Tribunal do Júri, o placar se repetiu, a promotoria recorreu novamente da decisão e mais uma vez o Tribunal de Justiça modificou o veredicto, afirmando que a decisão do Tribunal do Júri não encontrava respaldo frente às provas colacionadas aos autos, e, tendo cassado a decisão do júri, a Câmara Criminal de Apelos do Estado de Minas Gerais, condenou os irmãos a “25 anos e 06 meses de prisão celular e multa de 16 ¼ por cento sobre o valor do objeto roubado” (ALAMY FILHO, 1993, p. 313).

Em julho de 1940, o advogado dos irmãos ingressa com a primeira revisão criminal. Juntando como prova novos depoimentos dos irmãos e de testemunhas obtidos por meio de ação de justificação, ele buscou demonstrar que toda a confissão acostada aos autos do processo de conhecimento foi obtida sob coação e tortura. E assim, em acórdão, as Câmaras Criminais Reunidas do Tribunal de Apelação do Estado de Minas Gerais, reduziram as penas dos irmãos cominadas anteriormente em grau submáximo para grau submédio, ou seja, passaram a ter uma pena de 16 anos e 06 meses de prisão celular (ALAMY FILHO, 1993, p. 320).

Anos depois, em 1948, Joaquim Naves morre doente e vivendo como indigente. Sebastião, usufruindo de livramento condicional em julho de 1952, encontra Benedito Caetano, vivo. Alamy Filho (1993, p. 333, grifo nosso), conta o encontro da seguinte forma,

Sebastião se achava sob livramento condicional, ainda em Araguari, quando recebeu o telegrama de Nova Ponte, comunicando-lhe o reaparecimento furtivo de Benedito, naquele município. Imediatamente solicitou à polícia de Araguari uma escolta e autorização para efetuar a busca do MORTO, no que foi auxiliado pelo repórter do Diário de Minas, Felício De Lucia Neto. Em companhia deste e de alguns soldados, tiveram a ajuda do delegado de Nova Ponte, reforçando seu destacamento de capturas, e rumaram para a fazenda de João Pereira, pai de Benedito, onde chegaram pela madrugada. Cercaram a casa residencial. Acordaram o casal, e João Pereira confirmou a presença de seu filho, mas escondido a algumas centenas de metros da sede da fazenda, em casa de seu genro Antônio Pires. A polícia exigiu de João

Pereira que a acompanhasse ao local, para evitar que ele avisasse seu filho e este pudesse fugir novamente. Chegados à casa em que se escondera Benedito, Sebastião, angustiado e incontrolável no momento, entrou pela casa adentro, acompanhado da polícia. Benedito dormia placidamente. Sebastião colocando-lhe as mãos sobre os ombros, sacudiu-o, acordando-o. Benedito, tomado de surpresa e apavorado ante a presença de Sebastião, grita-lhe: “Pelo amor de Deus, Sebastião, não me mate”. E Sebastião, de lágrimas nos olhos, intensamente comovido, abraça-o dizendo-lhe: “Graças a Deus te encontrei para provar minha inocência. Ninguém te quer matar, vem pra cidade, pro povo ver que você está vivo e que eu sou inocente”.

Documentos relacionados