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4. DIAGNÓSTICO SITUACIONAL DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL

5.3 Primeiras aproximações

5.3.6 O Residente e sua experiência formativa na educação básica

Analisando a vida escolar dos residentes em relação ao ensino médio, constatamos que 87% estudaram somente na escola pública, e apenas 4,5% apenas em escola particular. Entre os que estudaram em escola particular, 71,4% possuíam bolsa de estudos. Percebe-se, que em sua maioria, os estudantes que têm acesso a essa política de assistência estudantil são oriundos de escolas públicas, conforme preconiza o Plano Nacional de Assistência Estudantil – PNAES.

Gráfico 3 Vestibular/ENEM

Fonte: Pesquisa direta - elaboração própria.

45%

36% 19%

Quantas vezes prestou

vestibular/ENEM

uma vez duas vezes três vezes ou mais

sim não

48

63

Frequência em curso pré-

vestibular/ENEM

No que se refere à frequencia em curso pré-vestibular, 43% frequentaram curso preparatório. Sobre a tentativa de ingresso na Universidade, 45% tentaram exame vestibular ou ENEM apenas uma vez, 36% pretenderam duas vezes e apenas 19% buscaram três ou mais vezes. Quanto à forma de ingresso, 71% entraram na Universidade por meio do concurso vestibular180, 24% ENEM, e 5% transferência.

Infere-se que estes estudantes ingressaram na UFC, em sua maioria, sem preparação em cursinhos, e foram aprovados na primeira tentativa de ingresso. Esse fato não implica dizer que estes jovens tiveram facilidade em ingressar no ensino superior, pois encontram diversas dificuldades para dar continuidade aos seus estudos, desde óbice financeiro até embaraso de transporte para cursar o ensino médio181.

Se este dado for comparado com a realidade geral desta Universidade, conforme explicitado no capítulo 3, no ano de 2010, de cada 14,03 estudantes inscritos no exame vestibular que cursaram todo o ensino médio na escola pública, somente um foi aprovado no exame. Com base neste comparativo, percebemos que o bom desempenho destes estudantes está mais associado à superação de limites e esforços pessoais do que à qualidade do ensino médio que cursaram, uma vez que correspondem a uma pequena parcela de jovens, conforme se verifica esta afirmação:

Para suplantar todo tipo de adversidade, os alunos das classes populares precisam se destacar, através do bom desempenho, desde o início de suas trajetórias escolares [...] Além de assegurar a longevidade escolar, a boa performance seria também uma importante estratégia, talvez a única, na busca por um lugar no competitivo ambiente acadêmico. Frente à escassez de títulos entre seus antepassados e sem possuir capital social, os universitários pobres lançam mão do bom desempenho para se destacar entre os pares. (VARGAS, 2008, p.65)

180

Pelos dados expostos percebemos que a moradia universitária ainda não reflete, pelo menos de forma

acentuada, o novo cenário de seleção para o ensino superior, por meio do ENEM/SISU, que objetiva produzir mobilidade entre os estudantes. Se a mobilidade de fato estivesse ocorrendo em maiores proporções, ocasionaria aumento de demanda nas moradias universitárias.

181

Alguns estudantes do interior do Estado enfrentam diariamente vários quilômetros em estradas precárias para poderem chegar ao local da escola.

Não queremos, entretanto, engrossar as fileiras que defendem as premissas do capital humano, ao advogar a ideia de que o sucesso pessoal é resultado do esforço da pessoa. Este esforço, dentro das abissais dificuldades que a classe trabalhadora enfrenta é, na maioria das vezes, suplantado por torpes condições objetivas de existência impostas à classe trabalhadora.

5.3.7 Sobre a “escolha” do curso: o peso das condições objetivas de classe Sobre os motivos para a escolha do curso, 66% relataram que buscavam a realização pessoal, 10% afirmaram que fizeram sua escolha com base na análise das reais possibilidades de aprovação, optando pela área ou curso de menor concorrência, 9% apontaram como critério a avaliação da valorização social (salarial) da profissão no mercado, 3% só desejavam obter um diploma qualquer que fosse e 12% escolheram por outros motivos, entre eles a opinião de parentes e amigos.

Gráfico 4

Motivação para a escolha do curso

Fonte: Pesquisa direta - elaboração própria.

A residência é mais procurada por estudantes de cursos de baixa concorrência. Questiona-se o que significa a ideia de realização pessoal, considerando as limitações que estes estudantes enfrentam para ingressar e se manter em um curso superior. Entendemos, neste caso, que a realização pessoal está presente no fato de o estudante conseguir romper as barreiras sociais, culturais

realização pessoal 66% possibilidade salarial 9% baixa concorrência 10% para ter um diploma 3% Outros 12%

e econômicas ao ingressar no ensino superior e alcançar novo status social. Vale destacar, neste sentido, a seguinte asserção:

A presença mais frequente de estudantes oriundos das classes populares nas instituições de ensino superior tem sido também apontada por estudos sobre o perfil dos alunos e egressos dos cursos ofertados por universidades brasileiras (GAZZOLA, LACERDA e BRAGA, 2003; BRAGA, PEIXOTO e BOGUTCHI, 2001; SCHWARTZMAN, 1995; PAUL e FREIRE, 1997). De acordo com estas pesquisas, os universitários oriundos das camadas populares se concentram em cursos de menor prestígio social e que oferecem, em média, remunerações mais baixas no mercado de trabalho, em comparação com as carreiras de maior status. Os cursos mais valorizados socialmente e que possibilitam o acesso a rendimentos mais elevados, ainda são frequentados, em sua maioria, por indivíduos das camadas dominantes da sociedade. (VARGAS, 2008, P.51)

A escolha do curso é determinada por condições precárias objetivas, que limitam as possibilidades em razão, entre outros fatores, das lacunas deixadas pela educação básica para o estudante de escola pública, principalmente no interior do Estado, onde faltam vontade política e investimento para uma educação de qualidade, pois as escolas funcionam em péssimas condições e os professores, além do trabalho precarizado, não dispõem de estrutura adequada para exercer sua atividade, e instâncias políticas consolidadas que representem seus interesses na luta cotidiana por melhores condições de trabalho.

Soma-se o fato de que, quando estes estudantes ingressam em cursos de maior status, além de todas as dificuldades que já foram enfrentadas e superadas, convivem com os efeitos nocivos da discriminação, pois, no pensamento de Vargas (2008), em curso de maior segregação social, como Medicina, o estudante pobre passa a não pertencer ao grupo formado pelos outros discentes, pois difere deles nas condições de existência material, nas possibilidades de realizar viagens, cursos, atividades de lazer, etc.

Na sociedade capitalista o processo educativo ocorre de maneira contraditória, pois o trabalhador se educa em uma relação de alienação, de trabalho estranhado, em um contexto de expropriação da força de trabalho, em que a educação também constitui uma mercadoria e a formação educacional da classe trabalhadora está submetida à lógica e ao interesse do capital. Nesse enfoque, a classe trabalhadora depara as sequelas deste fenômeno, como na sequência assinalado:

A crise que os sistemas educacionais latino-americanos enfrentam hoje, extrapola a questão puramente educacional. Decorre de um modelo de desenvolvimento que exclui parte significativa da população das condições mínimas de sobrevivência material. Tal modelo responde às exigências de um novo padrão de acumuação capitalista fundado em novas bases tecnológicas e em novo arcabouço tecnológico – o neoliberalismo. (CABRAL NETO E RODRIGUEZ, 2007, p. 44)

Interessou-nos também compreender o período de permanência e conclusão nas residências universitárias, como se veremos a seguir.