• Nenhum resultado encontrado

O Roteiro de Cães, trabalho em processo e o artesanato somático

Foto 13 — Gina Tocchetto em apresentação de Cães (13/12/2018), Dourados (MS)

2. O estado de sintonia para a atuação articulado a partir de

3.2 Relato de experiência sobre a criação e apresentação de um solo para pesquisa de

3.2.2 Tempo 2: Segundo semestre de 2018 – Dourados (MS)

3.2.2.10 O Roteiro de Cães, trabalho em processo e o artesanato somático

Relaciono a seguir o roteiro de Cães, trabalho em processo, dividido em seus fragmentos, com os produtos do artesanato somático assinalados. As ressonâncias das conquistas realizadas com as apresentações estão descritas no Terceiro Tempo desta narração, que trata das apresentações de Cães.

FRAGMENTO I: Canção Vento

A obra inicia com a canção Vento que para nós é a ação de apresentação e convite ao público para acompanhar-me nas histórias que vou contar. Esta relação primeira estabelece o código direto de comunicação. O canto traz a imagem de elementos da natureza e introduz o tema da navegação, sendo o vento o responsável pela condução das caravelas e a esperança do descobrimento. Tempo de duração: em torno de dois minutos.

Foto 13 — Gina Tocchetto em apresentação de Cães (13/12/2018), Dourados (MS)

Fotógrafo: Raique Moura, 2018

Artesanato somático: - A cantadora de histórias;

- A conexão com a música para instalação do estado criativo;

- A afinação musical como concentração para a sintonia como estado criativo; - A partitura de ações da peça e a subpartitura;

O Segundo momento é a cena da Carta de Cristóvão Colombo aos reis da Espanha. O espaço cênico se configura em formato de T, criando um corredor perpendicular ao público frontal, que pode remeter ao corredor em que Colombo desfila até chegar à frente dos tronos de suas majestades, assim como indica o espaço de chegada de Colombo à nova terra. Tempo de duração: em torno de quatro minutos.

Foto 14 — Gina Tocchetto em apresentação de Cães (13/12/2018), Dourados (MS)

Fotógrafo: Raique Moura, 2018

Eu e Beto investimos na linguagem sonora-musical como fonte de sentidos e porque o universo musical estava fornecendo pistas para minha investigação. Foi assim que encontramos as transições dos segmentos na costura simbólica e de atmosfera feita pela música.

Artesanato Somático: - Partitura de movimentos como estrutura aberta;

- Impulsos corporizados de “potro” e “onça”; - Interlocução somática com o momento político; - Ação física do “barqueiro”;

- Dramaturgia como afirmação da voz interior;

- A relação com o objeto (alface) na criação de ações físicas; - A partitura de ações e a subpartitura;

- A sintonia realizada através do figurino. TRANSIÇÃO I

Quando finalizo a carta de Colombo, vou ao fundo do palco e repico o sino fundante das aldeias cristãs. Saio da vista do público, quando acrescento o vestido negro ao figurino e coloco a máscara. Desde o final da emissão do som do sino, canto a poesia de Leila Diniz “Brigam Espanha e Holanda pelos direitos do mar” numa melodia composta em tempo de valsa. Tempo de duração: em torno de dois minutos e 30 segundos.

Artesanato Somático: - A cantadora de história;

- Conexão com a música para a instalação do estado criativo – sintonia do organismo como afinação;

- A partitura de ações da peça e a subpartitura;

- A sintonia para a atuação feita pela relação com os instrumentos musicais (chocalhos e sino).

FRAGMENTO III: Ninguém está a salvo

No terceiro segmento, surjo com a máscara, situando-me ao meio, no fundo, para correr pelo corredor cênico em direção ao público. Tempo de duração: em torno de cinco minutos e 30 segundos.

Foto 15 — Gina Tocchetto em apresentação de Cães (13/12/2018), Dourados (MS)

Fotógrafo: Raique Moura, 2018

Ninguém está a salvo, de Beto Mônaco, é um texto que retrata o clamor por ajuda feito por uma mãe frente à ameaça assassina de um poder obscuro que sem justiça ou justificação mata e tortura os cidadãos. Ela pede ajuda para salvar seus filhos desta ameaça, devaneia sobre sua sina e alerta que, como ela, ninguém está a salvo.

Beto havia iniciado vários textos, mas só quando deu forma ao desespero desta mulher escrevendo este chamado/lamento, achamos que finalmente tínhamos o contraponto ao paraíso vislumbrado por Colombo. A violência denunciada como decorrência das intenções colonialistas não é explícita na cena, mas sustenta nossa lógica dramatúrgica interna.

Artesanato Somático:

- Partitura de movimentos, como estrutura aberta; como MATERIAL (matéria prima);

- Impulso corporizado “onça”;

- Interlocução somática com o momento político brasileiro e o desejo de falar; - Dramaturgia como afirmação da voz interior e da relação com o ambiente;

- A partitura de ações da peça e a subpartitura;

- Sintonia feita pela relação com o objeto (meia máscara) e figurinos.

Foto 16 — Gina Tocchetto em apresentação de Cães (13/12/2018), Dourados (MS)

Fotógrafo: Raique Moura, 2018

TRANSIÇÃO:

Quando retiro a meia máscara, crio uma transição de silêncio até tamborilar um pandeiro, marcando o ritmo de uma ladainha vigorosa e ruidosa, desta vez para cantarolar e contar uma fábula. Tempo de duração: em torno de um minuto.

Foto 17 — Gina Tocchetto em apresentação de Cães (13/12/2018), Dourados (MS)

Fotógrafo: Raique Moura, 2018

Artesanato Somático: - Gradação das energias;

- A sintonia para a atuação feita pela relação com objeto (a retirada da máscara);

- A sintonia realizada através das energias identificadas por Lessac.

FRAGAMENTO IV: Fábula-poema Ossos

O quarto segmento é a cena Ossos. Chamamos de “poema-fábula” porque desde sua gestação existe a fixação de uma imagem incompleta como pedaços de um esqueleto anônimo lançados no ar na presença de uma mulher, cuja relação com os ossos também está inconclusa. A imagem está ligada a um ritmo ruidoso. Eu senti que devia respeitar estas características, pois quando buscava desenrolar o fio em prosa, a imagem musical energética se desmanchava. Por isso a mantivemos como um poema. No entanto, faltava compor melhor a imagem para que pudesse ser comunicada. Então, eu e Beto decidimos encará-la como uma pequena fábula

brechtiana, acrescentando outras figuras para caracterizar melhor o clima de opressão representado pela relação da mulher com os ossos. Era outra mãe que, de uma forma distanciada, narrava o nonsense da ameaça policial masculina repressiva quase como um desdobramento da cena anterior, mas com uma pitada burlesca. A contação da fábula-poema feita com a descrição do ambiente (que é apresentado como uma oposição deteriorada do paraíso visto por Colombo) e dos objetos imaginários, era alternada pelo repique do pandeiro e um cantarolar animado e ruidoso. Com esta adaptação, mantivemos a fonte rítmica imagética e energética que surgiu com a contadora de histórias. Tempo de duração: três minutos e 30 segundos.

Artesanato Somático: - A cantadora de histórias;

- A conexão com a música para a instalação do estado criativo — a sintonia do organismo como afinação;

- O tema-imagem do anonimato dos ossos e o mistério da morte;

- Dramaturgia como afirmação da voz interior e da relação com o ambiente; - A sintonia para a atuação através da relação com objetos e figurinos.

Foto 18 — Gina Tocchetto em apresentação de Cães (13/12/2018), Dourados (MS)

Foto 19 — Gina Tocchetto em apresentação de Cães (13/12/2018), Dourados (MS)

Fotógrafo: Raique Moura, 2018