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1 CAPÍTULO VIOLÊNCIA EXPRESSÃO DA QUESTÃO SOCIAL NA CONTEMPORANEIDADE

1.4. O SETOR SAÚDE NO SISTEMA DE PROTEÇÃO SOCIAL

A legislação brasileira garante o respeito à condição peculiar de desenvolvimento integral da criança e do adolescente, porém, por vezes, quem deveria protegê-los pratica os atos de violência, o que nos leva a crer na existência da não compreensão de que estes indivíduos devem ser respeitados e educados pelo

princípio da dignidade da pessoa humana. Portanto, uma maior compreensão de que essas crianças e esses adolescentes são sujeitos de direitos por parte dos profissionais da área da saúde é fundamental no sistema de garantias de direitos. Entendemos, ainda, que na cultura da violência doméstica exista uma lógica manifesta que obscurece o modus vivendi de proteção da sociedade no que tange ao cuidado adequado a ser dispensado para as crianças e adolescentes no ambiente familiar.

No setor saúde, segundo Minayo (2006, p. 69b), existem duas vertentes de análises de conceber a violência: a primeira reflexão, no campo filosófico (teórico); já a segunda está localizada no campo operacional (técnico) que se baseia na lógica do diagnóstico dos transtornos mentais, seqüelas emocionais ou traumas físicos. Para a autora, estas vertentes não são excludentes, mas complementares e caracterizam os meios necessários de entender e analisar o fenômeno.

Para Minayo, a violência entra na agenda do setor saúde nos anos 1980. Em diferentes momentos e situações, principalmente quando os índices de morbimortalidade por causas externas assumem taxas alarmantes; porém, como assevera a autora, o reconhecimento como um problema de saúde pública vem ocorrendo de forma fragmentada8. Entretanto, existe consenso entre os pesquisadores ao afirmarem que o setor saúde e os profissionais não encontram nenhuma positividade nos eventos de violências. Ao contrário, para a autora as violências fazem mal à saúde dos indivíduos, ao setor saúde e à sociedade (MINAYO, 2006b, p.69).

Andrade e Fonseca (2008, p. 593), com relação aos serviços básicos, afirmam que

[...] são importantes para detecção da violência devido à sua proximidade e ampla cobertura e a assistência [...] pode funcionar como um espaço importante para sua identificação representando a porta de

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entrada para se abordar a violência, estabelecendo vínculos [...] e encorajando a notificação.

As unidades e hospitais de referência devem estabelecer fluxos internos de atendimento, definindo o profissional responsável por cada etapa da atenção. Isso deve incluir entrevista, registro da história, exame clínico e ginecológico, exames complementares e acompanhamento psicológico. Também deve estar incluso no processo condições especiais, como intervenções de emergência ou internação hospitalar, quando precisar. Pois,

[...], para que ocorra visibilidade da violência doméstica na rede [...] de saúde são necessárias mudanças organizativas no serviço e nas abordagens realizadas pelos profissionais, no sentido de não priorizarem apenas o cumprimento de metas e a execução das técnicas propostas pelos programas. Isto significa que devem ser estabelecidos diálogo e relações mais simétricas entre os profissionais e usuárias (ANDRADE; FONSECA, 2008, p. 593).

Destarte, na maioria das vezes a violência, como problema de saúde, só é observada e analisada devido às conseqüências que a situação demanda ao setor e os profissionais de saúde projetos de formação profissional. Entretanto, esses projetos trazem em seu bojo, tanto no campo da educação profissional em saúde como na concepção de educação permanente para o SUS, compreensões distintas entre si sobre formação profissional.

Pereira e Ramos (2006, p. 99) afirmam que o Ministério da Saúde define a educação profissional como sendo o

[...] ensino formal legalmente regulamentado, que, por ter como objetivo principal conferir ao estudante o estatuto de profissional por meio da expedição de diploma de habilitação técnica se voltaria a todos que tenham concluído o ensino fundamental ou médio [...] e, além disso desenvolveria um conjunto de conhecimentos, valores e habilidades que compõem o respectivo perfil profissional.

Já a educação permanente é definida nas publicações do Ministério da Saúde como

[...] aprendizagem no trabalho, onde o aprender e o ensinar se incorporam ao cotidiano das organizações e ao trabalho. A educação permanente se baseia na aprendizagem significativa e na possibilidade de transformar as práticas profissionais. A educação permanente pode

ser entendida como aprendizagem-trabalho, ou seja, ela acontece no cotidiano das pessoas e das organizações. Ela é feita a partir dos problemas enfrentados na realidade e leva em consideração os conhecimentos e as experiências que as pessoas já têm. Propõe que os processos de educação dos trabalhadores da saúde se façam a partir da problematização do processo de trabalho, e considera que as necessidades de formação e desenvolvimento dos trabalhadores sejam pautadas pelas necessidades de saúde das pessoas e populações. Os processos de educação permanente em saúde têm como objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho (BRASIL, 2009, p, 20).

Todavia, concordamos com Pereira e Ramos (2006, p, 103) quando asseguram que

[...] todas essas políticas mantêm-se marcadas por um reducionismo tecnicista, que implica separar a técnica, a tecnologia e a ciência. Ainda que a ênfase numa dessas dimensões possa configurar formas arbitrária e mecanicamente o que a realidade humana une dialeticamente. Na base dessa separação, situa-se a divisão técnica do trabalho, que limita ou impede o trabalhador de compreender a unidade dessas dimensões do trabalho humano.

Deste modo para Pereira e Ramos, ao defendermos uma formação profissional contra-hegemônico9, conseqüentemente contribuiremos para uma construção de uma nova concepção de educação profissional, ou seja, a criação de “uma nova concepção deve tomar a educação profissional como importante mediação no processo de construção de conhecimento científico-tecnológico na esfera nacional e na formação humana dos trabalhadores, na perspectiva de se tornarem dirigentes”. Ou seja, “uma política formada nestes termos deve ser elaborada no sentido estratégico de fortalecer os setores públicos comprometidos com a produção nacional e com a capacidade de trabalho qualificado dos cidadãos brasileiros” (idem, 2006, p.105).

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CF. PEREIRA; RAMOS (2006). Sobre a perspectiva de um novo projeto de educação profissional em saúde mais detalhado consultar.