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CAPÍTULO 4 ANÁLISE DE DADOS

4.2. O significado do lazer

Na investigação, pude perceber que a mesma falta de consenso sobre o significado do lazer encontrada no campo teórico está presente no relato dos entrevistados. O lazer assume uma pluralidade de significados na vida dos sujeitos, entretanto, ao serem questionados sobre o que era para eles, a maioria hesitou em responder, parou, pensou e muitos ficaram sem palavras. Verifiquei que tiveram dificuldade em elaborar suas idéias, emitindo respostas vagas, e às vezes, de difícil compreensão, o que, de certo modo, demonstra a dificuldade do grupo de formular um conceito de lazer, que provavelmente nunca havia sido dito em outras palavras. Sendo assim, o lazer é fácil de ser vivenciado4, mas difícil de ser explicado. Sua compreensão pelos idosos não teve uma uniformidade, e o significado encontrado nas falas esteve ligado a divertimento, distração, prazer, alegria, tempo fora do trabalho e obrigações. Muitos, em vez de o conceituar, citavam atividades relacionadas aos conteúdos culturais de lazer.

Os aspectos tempo e atitude, abordados no segundo capítulo deste trabalho, também estiveram presentes nas falas dos entrevistados. De acordo com Marcellino (1983, p. 26), o lazer considerado como atitude é marcado pelo significado que as pessoas atribuem a ele, ou seja, caracteriza-se pelo tipo de relação verificada entre o sujeito e a experiência vivida, basicamente, a satisfação provocada pela atividade. Nesse caso a subjetividade predomina. O sentido atribuído ao lazer pode alterar-se dependendo da compreensão do indivíduo mediante sua vivência. A linha que enfatiza o aspecto atitude, considerando o lazer como um estilo de vida, é, portanto, independente de um tempo determinado, podendo qualquer atividade ser considerada lazer, até mesmo o trabalho, desde que atenda a determinadas características, como a escolha individual e um nível de satisfação e prazer elevados.

4 Tanto é fácil de vivenciar que, quando se pergunta aos idosos sobre o conceito de lazer, eles sempre o relacionam à

O aspecto atitude esteve presente na fala de duas entrevistadas. Ao serem questionadas, assim se expressaram: “Estar feliz com a atividade de que você está exercendo. Qualquer que seja ela” (Amarílis – UNATI-2). “Eu considero que quando você faz uma coisa em que está contente, feliz, com o que está fazendo, não é?” (Margarida – UNATI-2). Nesse caso, o lazer está relacionado a uma atitude psicológica de quem o vivencia, até o trabalho poderia ser lazer.

O aspecto tempo também esteve presente na fala dos entrevistados. Como já conceituado, a linha que privilegia o aspecto tempo situa-o como liberado do trabalho ou como “tempo livre” não só do trabalho, mas de outras obrigações – familiares, sociais, religiosas. Nesse caso, o aspecto subjetivo não predomina, pois o lazer não é mais compreendido pela forma como o sujeito o representa e sim pelo aspecto objetivo do “tempo livre”:

Ah, lazer para mim é uma coisa que você... que você faz, assim, é... vamos dizer, é uma coisa que você faz extra-casa, uma coisa que você faz que não é o trabalho de casa... (Bromélia – UNATI-1).

Para mim, particularmente, o que não faz parte da minha área de trabalho. (Flor-de-lis – UNATI-2).

No significado de lazer emitido pela maioria dos idosos, tempo e atitude foram abordados de forma isolada. Apenas uma das entrevistadas o fez considerando os dois aspectos. “Coisa agradável, que não seja obrigação” (Orquídea – UNATI-2). Nessa fala, encontramos o aspecto subjetivo – “coisa agradável” – e o objetivo – “que não seja obrigação”. Apesar da concordância entre os estudiosos do lazer, no sentido de considerá-lo tendo em vista os dois aspectos, pode-se perceber que o significado encontrado entre a maioria dos idosos não coincide com tal conceito.

Foi verificada uma tendência maior entre os entrevistados em associar o significado do lazer a experiências individuais, o que leva a uma redução do seu conceito ao conteúdo de algumas atividades:

Quando eu vou ao cinema, para mim, é lazer, quando eu jogo baralho é lazer... (Gardênia – UNATI-1).

Por exemplo, dançar, ouvir música e passear para mim é o principal. (Dália – UNATI-1). É um passeio, uma caminhada, uma ginástica, é um lazer que eu vou te falar, é demais. (Begônia – UNATI-2).

Olha, a atividade física para mim é... passear é lazer, caminhada quando a gente faz, para mim, é um lazer também. (Petúnia – UNATI-2).

Olha, eu acho que até você ir num shopping é um lazer, né? É um lazer ir no cinema, vou muito ao cinema... (Calêndula – UNATI-1).

Pode-se perceber que, na maioria das respostas, os idosos associam o lazer a seus conteúdos culturais, sendo que os mais citados foram os físico-esportivos (dança, caminhada, ginástica) e os turísticos (passeios). A associação entre lazer e turismo teve maior ênfase quando questionados se participavam de experiências de lazer na UNATI.

Todos que tem, quando a professora sugere uma festa, um passeio em São Paulo, uma excursão. (Gardênia – UNATI-1).

Ah, as viagens, né? As viagens que a gente faz. (Bromélia – UNATI-1).

Viagens, só viagens, porque aqui não tem atividades de lazer. (Dracena – UNATI-1). Então, participo de todas, ah, quando vão viajar, quando vão fazer um passeio, agora mesmo, na semana passada, nós tivemos na exposição de barco, certo? A turma toda também foi, né? (Violeta – UNATI-2).

De lazer? Tipo assim, das viagens, é lazer... (Calêndula – UNATI-1).

É assim, olha, um pouco eu viajo com minha filha, um pouco eu vou com a faculdade e um pouco eu vou com a Seicho-no-ie também, que me leva para passear, né? Então não perco, quando às vezes minha filha fala “ai, vamos aqui”, eu falo não. Tenho que ir com a faculdade, não tive tempo de ir com ela, né? Que nem agora, ela está viajando, ela está em Águas de Lindóia e eu não fui para não perder a faculdade... (Camélia – UNATI-1).

A associação entre lazer e turismo também aparece na fala do coordenador da UNATI-2. Quando lhe perguntei se eles tinham lazer no programa, ele o associou apenas a um dos seus conteúdos culturais – o turístico:

tem os passeios culturais, o próprio nome já diz, é um passeio cultural, porque nós fomos a lugares que a maioria não conhecia, por exemplo, Piracicaba. Nós fomo conhecer a ESALQ, a história toda daquela faculdade é maravilhosa, tem mais de cem anos, né? Nós fomos conhecer o museu da água, o engenho, tudo isso em Piracicaba. Aqui em Campinas também, nós fomos conhecer os pontos turísticos, né? No segundo semestre, nós vamos pra Holambra, que é um passeio cultural fantástico, nós vamos no salão do humor em Piracicaba, então é... (C2).

Verifica-se que a limitação do entendimento do lazer não está relacionada apenas ao seu conteúdo, mas também, aos seus valores. Buscando na literatura, verifica-se que a compreensão de lazer dos entrevistados se reduz às funções de descanso e divertimento apontadas por Dumazedier (1979). A possibilidade de desenvolvimento pessoal e social não é apontada na fala de nenhum entrevistado.

A visão funcionalista de lazer aparece sendo entendida por eles como fuga da realidade, possibilidade de esquecer os problemas, evasão, distração:

Lazer? É tudo que você possa, vamos dizer assim, se divertir, né? Você vai ter uma... esquece os problemas normais que se possa ter, né? Financeiros, familiares, assim, esquece disso aí, eu acho que lazer pra mim é isso aí... (Cravo – UNATI-1).

Lazer é assim, para mim é uma distração mental, uma higiene mental, é onde você, ah, movimenta todo seu corpo.... (Magnólia – UNATI-1).

De acordo com Werneck (2000), existem muitas visões restritas que ainda dominam o senso comum, impedindo reflexões mais consistentes sobre seu significado:

reqüentemente entende-se o lazer como o não trabalho, tempo livre ou desocupado dedicado à diversão, à recuperação das energias, à fuga das tensões e ao esquecimento dos problemas que permeiam a vida cotidiana. Para algumas pessoas representa inclusive uma perda de tempo e, enquanto tal, o lazer é visto como algo não sério configurado como alvo de valores preconceituosos. (p. 13).

Não foram encontrados significados do lazer ligados a uma visão crítica, em que é visto como direito social, elemento de transformação social ou possibilidade de desenvolvimento pessoal e social.

Essas visões parciais e desconectadas imperam no senso comum, impelindo o estabelecimento de reflexões mais consistentes sobre os significados históricos, sociais e culturais do lazer. São valores e significados enraizados culturalmente, introjetados pelas pessoas, pois o sujeito não produz seu próprio significado sobre lazer, mas o constrói a partir das relações que estabelece com a sociedade. E o lazer é um objeto em contínuo processo de construção e reconstrução de sentido em nossa realidade sociocultural e histórica.

4.3. ENTRE O CONHECER E O LAZER – UNATI – ESPAÇO DE APROPRIAÇÃO OU